Vício M(eu) escrita por Menina Sem Tabu


Capítulo 14
Capítulo 13 – Tem alguma passagem subterrânea para a lanchonete aí?


Notas iniciais do capítulo

Hei! Vocês me odeiam né? Gente, desculpa! Sei o quanto é ruim deixar vocês esperando e até parece falta de respeito, arrogância ou descaso, mas por favor, jamais pensem isso! Atualmente, vocês são uma das coisas com que eu mais importo nessa vida e juro não é falta de respeito ou nada do tipo. Minha infinta demora dessa vez foi aconteceu por causa da falta de tempo, como sempre, mas além disso, também estou tendo um maldito bloqueio criativo e também minha vida não tá lá essas coisas. Um muito mais que obrigada, para a Bailarina demoníaca por me dar a honra da minha primeira recomendação!



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Capítulo 13 – Tem alguma passagem subterrânea para a lanchonete aí?

Anne Fox completa 20 anos daqui a dois meses, se mudou da casa de mamãe há um ano e alguns meses para ir atrás do seu sonho de ser dançarina profissional. Minha irmã saiu de nossa atual cidade, Epopeia, no sul dos EUA, para ir estudar em uma das mais famosas academias de dança, a Presente Passado, fundada por uma francesa. Uma madame não sei das quantas, cuja a família rica, veio para em 1900 e vai pedrada, que está instalada numa cidade que se chama de vizinha por não ser tão longe, mas também não é tão próxima para poder chama-la assim. Apótema, fica a uma meia hora de Epopeia, se for de carro, ignorando é claro, os engarrafamentos monstruosos.

Desde que Anne se mudou que nosso contato diminuiu bastante, nunca a visitei e mamãe também não, ela só vem nos visitar, com muita sorte, em datas comemorativas. De acordo com uma rápida ligação, mais ou menos um mês após sua mudança, ela havia se instalado definitivamente num apartamento, cujo o endereço eu segurava naquele momento, sentada em um banco do trem, com Emi sentada ao meu lado direito comemorando por temos pego o transporte num horário vazio. Minhas outras informações sobre minha irmã mais velha é que estaria trabalhando numa lanchonete temática das décadas vintages, em que as garçonetes dançam e fazem performances enquanto servem os clientes, e que paralelamente ao trabalho, estaria estudando na Presente Passado e sendo muito elogiada.

Enquanto vejo as árvores nascidas na beira dos trilhos através das janelas retangulares do trem, tenho inevitáveis flashes de minha infância. Minha irmã na sala ou no seu quarto, ensaiando as coreografias da sua equipe de líderes de torcida. Linda, magra e curvilínea, com lindos e longos cachos dourados e uma sedução inerente a si própria, Anne era a Sofie de seu tempo, só que bem menos nojenta. Sempre que ela se trancava no seu quarto para passar a dança eu ia junto e acabava dançando também. Minha irmã dizia que eu levava jeito, mas eu sabia que era apenas por que eu era criança e ela queria compensar por a preferida de nossa mãe ser ela. Mesmo depois das inúmeras brigas pós 15 anos das duas, a preferência sempre foi para a bailarina. “Por que você não se veste que nem a Anne?” “Quem sabe você não quer fazer ballet que nem a Anne?” “Por que você não faz que nem a Anne?” “Por que você não segue o exemplo da Anne?”Foram questões que me acompanharam a minha vida toda, todas, é claro, sendo entoadas pela minha mãe.

Como sempre, estou nervosa, há tempos que não vejo minha irmã, e se ela não me procurou, talvez seja por que não quer me ver. Pensar nessa possibilidade me entristece bastante, afinal, dentro do possível, nós duas sempre nos damos bem. Na verdade Anne era e ainda é meio que minha ídola, que juntamente com minha mãe, me dá a plena noção do que é ser a mulher perfeita.

Tenho medo de chegar em momento importuno, talvez esteja na aula, estudando, trabalhando, montando uma coreografia própria, ou sei lá o que. Talvez ela se negue a ajudar na minha coreografia, e eu não terei nem o direito de reclamar se caso o fizer. Talvez seja melhor eu descer na próxima estação e pegar o próximo trem para voltar pra casa. Talvez eu deva desistir definitivamente dessa história de teste.

Avisto a plataforma do trem e sinto a velocidade diminuir. Levanto e me encaminho à porta com adesivos de “Cuida, porta automática”.

–– Ainda faltam duas estações, Emily. –– ouço a voz de Emi atrás de mim.

–– Vamos voltar para a casa, Emi. –– digo telepaticamente.

–– Emily, você está louca? Acho que se esqueceu do time de Zack e das coisas horríveis que eles falaram.

Não digo nada a Emi, mas quando se tem alguém que pode ler os seus pensamentos, você pode se dar o luxo de se calar sem temes más interpretações do seu silêncio. Ela sabia perfeitamente que eu não havia esquecido nem daqueles garotos imundos, nem da minha exaustão de mim mesma.

A última coisa que Emi e eu precisamos é de algum diálogo explícito, portanto sei que seu olhar fincado nas minhas costas enquanto estou estática, na frente da porta oposta ao seu banco, me diz algo mais ou menos assim: “Se você voltar para casa irá continuar sendo esse nada, se ir atrás de sua irmã terá uma chance de mudar as coisas.” Acontece que tenho minhas dúvidas se realmente tenho alguma chance de mudar algo.

O trem para, as portas se abrem. Duas mulheres, uma morena e a outra ruiva, ambas de altura mediana com corpos curvilíneos entram conversando animadamente sobre alguma transa inesquecível. Um homem de descendência asiática, aparentando ter 40 anos, com uma roupa formal e uma pasta de couro preta na mão direita, que era enfeitada por um relógio importado, desce na estação.

As portas se fecham. O trem volta a se movimentar. Eu me sento novamente ao lado de Emi.

–– Sábia escolha, gafanhoto. –– ela diz.

A encaro com cara feia, mas sei que tem razão, sei que eu deveria transformar essa coisa que to sentindo aqui no peito, um misto de medo, receio e constrangimento em força e convicção para eu não virar a chacota oficial do colégio depois desse bendito teste.

As duas estações demoram para passar e quando chega a nossa desejo que tivesse demorado um pouco mais. Minha boca está seca, meu coração acelerado e meu estômago embrulhado, com um nó de forca feito por algum escoteiro experiente. Sei que é vergonhoso o que vou dizer agora, mas minha existência por si só já é vergonhosa, então... Com meus 17 anos de idade não sou habituada a pegar o metrô, nem a ir em outras cidades. Na verdade, para ser honesta, não sou habituada a sair de modo geral. Meu Deus, quem estou querendo enganar? Não sou habituada a viver. Portanto, não sei bem como funciona tudo isso, e por “tudo isso” quero dizer: Tudo. Isso. É essa a minha justificativa para estar paralisada no meio da plataforma da estação de Apótema, a pequena grande cidade famosa por suas famílias nobres, suas noites e suas tribos alternativas.

À minha direita, na diagonal, vejo uma escada rolante com uma placa azul celeste, escrita em letras caixa alta branca “Desembarque”. Meu instinto de sobrevivência me diz que é por ali que devo ir, e é por ali que vou. Emi me segue com passos curtos e rápidos, está parecendo uma gueixa, apesar de vestir um shorts jeans claro cintura alta, que deixa aparecer a polpa de sua bunda e um cropped estampado com a bandeira dos EUA, com um belo salto 13 vermelho escarlate, e hoje seus cachos estão presos com lecinho Poá. Minha outra eu é uma pin-up de araque.

–– Uma pin-up de araque sexy. –– Ela me corrige do degrau abaixo do meu. Eu sorrio, Emi já me conquistou por completo, e ela sabe disso.

A escada nos deixa num espaço muito grande, com janelas amplas, algumas pessoas, poucos seguranças, uma lanchonete com anúncios da coca-cola e mais algumas coisas que compunham o lugar cinzento.

–– Emi –– acho que sempre que Emi tiver a oportunidade, irá me chamar de Emi –– há roletas lá. Temos que passar por elas, não? –– A pin-up sexy aponta para o norte.

Seguimos até as roletas e escolho uma aleatória para passar, enquanto minha outra eu passa pela do meu lado direito. Um porta prata com duas passagens e detectores de metais nos aguarda para sairmos da estação. Coloco meu celular, chaves e minha carteira no recipiente que intercala o lado de dentro com o de fora, enquanto Emi atravessa e me espera tranquilamente. Passo pela porta sem apitos ou alarmes desnecessários, pego minhas coisas e então, finalmente, estou oficialmente pisando em solo apoteano.

Pego o papel de novo e leio o endereço de minha irmã. Rua Marlyn Monroe, edifício 401, apartamento 4E. Já falei o quanto eu acho extraordinário Anne morar numa rua chamada “Marlyn Monroe”? Uma rua mais ou menos movimentada me separa de um ponto de táxi e eu me pergunto o porquê de não terem feito o ponto na entrada da estação, mas sim do outro lado da rua. Algumas pessoas não têm logística nenhuma.

Espero dois carros passar e cruzo a rua, dois táxis, ambos amarelos e de 4 portas que não sei o nome, pois não entendo nada sobre carros e não me preocupei em ver estão estacionados, eu me direciono ao mais de trás. Dou duas batidas leves na janela com uma fresta aberta do banco do carona e um motorista gordo, careca, com bigode grisalho, olhos verdes e nariz batata vermelho, aparentando ter 60 e poucos anos abaixa o resto e me diz um “Sim?” como quem diz “Posso ajudar?”

–– O senhor poderia me levar nesse endereço? –– pergunto para ele, o entregando o papel.

–– Monroe, 401? Mas é claro que sim, só entrar, moça! –– ele diz, me dando um sorriso.

Tenho medo de ser estuprada, mas mesmo assim entro. Sento no banco do meio enquanto Emi se senta atrás do banco do carona.

O trajeto é silencioso, constrangedor e receoso, combinando direitinho com o meu estado de espírito. Entramos e saímos de várias ruas, cruzando por várias outras e esperando em vários semáforos. Estou começando a achar que estamos andando em círculos quando estacionamos na frente de um prédio antigo, marrom claro e caindo aos pedaços.

–– US$ 40 dólares, moça. –– arregalo os olhos ao ouvir o preço e agradeço por não ter gastado toda a minha mesada em café.

Pago-o e desço do carro. Encaro o prédio a minha frente enquanto escuto o taxista arrancar. Aquele edifício não se parecia em nada com o que Anne havia descrito por telefone. Ela não havia citado luxo, nem nada do tipo, mas “um apê pequeno, porém moderno e aconchegante” não era o melhor jeito de definir o que eu via.

O prédio comprido e estrito com duas janelas idênticas por andar se levantava bem na minha cara. 5 andares de tinta descascada e rachadura, do prédio espremido entre uma farmácia e uma casa de classe média branca de dois andares.

Olho para Emi que está com um ponto de interrogação na sua expressão. Anne só pode ter nos dado o endereço errado, minha irmã jamais moraria num prédio como aquele. Deve ter ratos lá naquele interior. É, definitivamente Anne não colocaria os pés num lugar que nem esse, quem dirá morar.

–– Nem pense que vamos sair por aí sem rumo a procura de outro táxi sem ao menos tentar. –– Emi diz cruzando os braços, mas lãs não precisaria de muito para me convencer, eu realmente não gostava da ideia de ir procurar outro táxi e gastar mais 40 dólares.

Devolvo um “está bem” para minha outra eu, mas na verdade, eu falava mais para mim do que para ela. Respiro profundamente por 3 vezes, fecho os olhos e percebo meus batimentos pausados impactantes. Eles fazem um barulho clichê contra a parede de pele de meu peito. Começo a avançar com meu corpo e subo os cinco degraus com muitos defeitos, propícios a causar acidentes, que antecediam uma pseudovaranda, sem encanto algum, a não o seu charme de velharia não restaurada. Ao lado direito da porta, noto um interfone, procuro pelo apartamento que está escrito no papel e quando finalmente o acho, pressiono o botão do 4E.

Pela saída do som interfone, ouço o toque do suposto lar de minha irmã mais velha. Meu coração prestes a rasgar meu peito e sair rodopiando pelas ruas de Apótema, aguarda não muito pacientemente.

–– Alô? –– uma voz feminina meio chiada por causa da qualidade do aparelho aparece. Fico muda por um instante e a moça e repete o “alô” umas duas ou três vezes. Não era a voz de Anne. Tenho vontade de chorar, mas Emi me dá um beliscão e com os olhos faz menção para que eu fale alguma coisa.

–– Ah, o-oi! Esse é o apartamento de Anne Fox? –– minha voz sai mais trêmula do que o normal.

–– Quem quer saber se esse é o apartamento de Anne Fox? –– a mulher pergunta com uma voz risonha.

–– Sou Emily Fox, irmã de Anne. –– agora minha voz fica normal e eu fico muito feliz por isso.

–– Meu Deus! Emi? Meu Deus! Meu. Deus. –– ela começa a exclamar. –– Vou destrancar aqui, entra! –– diz e em seguida ouço um “track”, giro a maçaneta e com alguma dificuldade consigo abrir a porta.

O hall do grande edifício contava com uma escada rente a parede da esquerda, que depois, com uma curva, fica rente a parede de trás, logo após, grudando na parede da direita e assim por diante, formando uma espiral. Além da magnífica escada, duas portas de apartamentos, uma em cada uma das paredes laterais. Ao lado da porta do 2B, uma mesinha com um vaso de flores murchas e empoeirado. Não tinha elevador, isso significa que eu, Emi e seu salto alto, teríamos que subir 5 andares na pernada. Bendita seja minha condição de sedentária. Com meu coração na garganta eu e a pin-up sexy começamos a subir. Emi avançava rapidamente como se não estivesse calçando o que estava e reclamava de minha moleza, ao invés de me dar apoio moral. Com minha persistência, conseguir chegar ao quinto dos infer... ops, andar. Um corredor em formato de quadrado com quatro portas iguais, todas marrons, de madeira e com um olho mágico. A 1E, 2E, 3E, que tinha um vaso de “comigo ninguém pode” de enfeite e finalmente a 4E. O último apartamento do último andar.

Aperto a campainha e em um segundo há uma mulher branca, com olhos verde escuros e o cabelo também verde, baixa, com seios fartos, corpo curvilíneo e lábios finos. Ela vestia apenas uma camiseta branca e uma calcinha rosa com bolinhas brancas. A pessoa a minha frente não era nem de longe minha irmã.

–– Emily? –– ela pergunta com um sorriso perfeito.

–– Ahn, sim... sou eu... –– as palavras sem embolam para sair da minha boca.

–– Muito prazer, sou Regina. –– a mulher estende sua mão para apertar a minha e eu faço o movimento de forma recíproca. –– Moro com sua irmã.

–– Ah, ela não havia contado que morava com uma amiga. –– digo finalizando o aperto de mãos que já se estendia mais que o necessário. –– E... por acaso a Anne está em casa? –– pergunto sem jeito e me parece que o “sem jeito” da minha voz é transmitido para o seu rosto.

Regina abre a boca para dizer algo, consigo ver até a sua língua se levantado para dar início a sua fala, mas ela pensa duas vezes e seus lábios se fecham como duas portas grandes e pesadas de uma igreja só iluminada por velas no altar. Franzo as sobrancelhas voluntariamente por causa de seu ato. Estou prestes a perguntar se há algum problema quando vejo as portas se abrindo novamente, dando passagem para a luz sola que mata a escuridão.

–– Ela está no trabalho, não é muito longe daqui. Entra, eu vou colocar uma roupa e te levo lá. –– a amiga de minha irmã diz enquanto abre a porta, me dando espaço para passar.

Dou um passo para dentro e me deparo com uma pequena sala totalmente bagunçada. Um sofá de couro sintético branco daqueles de canto era encostado em duas paredes, sendo dividido por três lugares na parede lateral a minha direita, e os outros três na parede a minha frente, que aliás, no fim da mesma, começava um corredor, limitado por ela e pela porta da cozinha, logo ali na única porta, com exceção da de entrada, que havia naquela sala.

Um rack bege, sem nada de especial, servia de apoio para uma televisão de 40” preta. Na mesinha de centro também bege, umas cinco revistas, uma embalagem de pizza numa caixa vermelha, dois copos e no chão, ao lado de um dos pés da mesa, três garrafas de vodka. O sofá enfeitado com dois travesseiros, ambos com as fronhas do conjunto de roupa de cama preferido de Anne – com o fundo branco e uma delicada flor azul celeste ––, um sutiã vinho tamanho G atirado no chão perto do sofá, algumas roupas no braço do móvel branco, sapatos de salto e meias brancas encardidas por todo o lado. O apartamento tem um leve odor de tabaco. Eu não comento nada sobre a bagunça, Regina também não. Apenas me diz para ficar a vontade. Sento no sofá, recostada em uma almofada laranja e sinto algo duro em baixo de minha bunda. Levanto uma nádega e tiro o objeto. É uma algema com pelugem rosa. Minha boca cai e meus olhos se arregalam, preciso dizer alguma coisas, mas engulo a algema e ela prende minhas voz às minhas cordas vocais. Emi gargalha e senta-se ao meu lado.

–– Acho que poderíamos levá-la para incrementarmos nossas brincadeiras. –– ela fala com o seu quase sempre sorriso malicioso.

Ouço passos de Regina vindo do pequeno corredor e escondo o objeto atrás da almofada. Anne nunca moraria numa casa igual aquela. A cada de minha irmã seria impecável, com decorações temáticas sobre ballet saindo até do forro. Penso que a suposta amiga de cabelo verde na verdade é uma fugitiva de algum manicômio. Uma sociopata não medicada, que guarda Anne amarrada e amordaçada atrás de alguma das três portas daquele corredor.

Regina aparece vestindo um shorts jeans curto e uma regata que provavelmente antes era uma camisa, pois o corte era típico de tal. Nos pés, um vans clássico e preto.

–– Vamos? –– ela fala.

Murmuro um “uhum”, me levanto e finjo que não vi nem sei de nada. Saímos, descemos a escada e saímos do prédio em silêncio. O cabelo de Regina acaba indo um pouco para o lado e noto que ela tem uma rosa vermelha tatuada no lado direito do pescoço.

–– Puxa assunto com essa mulher. Esse silêncio tá me matando. –– Emi diz enquanto levas as mãos à cabeça e se escabela. Penso em discutir, mas aquele silêncio estava estranho até para mim, o problema é que não sabia e não fazia ideia de como puxar assunto.

–– A lanchonete fica muito longe? –– tento.

–– Lanchonete? –– a amiga de minha irmã enruga a testa.

–– A lanchonete que Anne trabalha... –– explico.

–– Ah, a lanchonete... –– Regina dá um riso nervoso.

–– Não me diga que ela foi demitida. –– falo, mas não me surpreenderia se fosse, Anne nunca se daria bem servindo os outros.

–– Demitida? Não, sua irmã não fui demitida, ela continua trabalhando onde sempre trabalhou. –– ela diz.

–– Dobre nessa rua –– Regina volta a falar.

Conversamos sobre o tempo, minhas notas, Sheron e ela me conta como que conheceu Anne, diz que foi no trabalho, mas Regina também tinha se mudado para Apótema para estudar na Presente Passado, mas por uma ironia do destino, não passou. Passamos por um salão de beleza, dobramos à esquerda e já consigo ver a placa da lanchonete, meu coração acelera a cada passo com mais intensidade. Atravessamos a rua, passamos por um grupo hippie liderado por um ruivo barbudo, um bazar e finalmente a lanchonete. Paro em frente a porta e espio a decoração. Minha irmã estava lá dentro em algum lugar.

–– Emily, é por aqui. –– a garota de cabelo verde fala.

Regina está parada na porta do prédio que fica exatamente ao lado esquerdo da lanchonete. Chego mais perto do prédio preto de dois andares e poucas janelas, fico assustada quando passo os olhos pela placa “Boate Club Camisa de Vênus”.

–– Tem alguma passagem subterrânea para a lanchonete aí? –– pergunto, fazendo pausa para engolir a saliva. A garota ri enquanto abaixa a cabeça e a balança negativamente. Ela abre a porta e mantém o braço esquerdo esticado, deixando a porta aberta e me dando espaço para passar. Éramos recebidas logo de cara com escada preta cheia de furinhos, aparentando ser frágil e barulhenta. O som, vindo de baixo, era alto e irritante, típico do ambiente.

–– Emily, é só descer. –– a voz da amiga de minha irmã soa atrás de mim.

–– Não precisa ficar receosa, Emi. Estamos no meu habitat natural, qualquer coisa eu te protejo. –– minha outra eu diz e acho que acredito na sua fala, pois é a partir dela que desço o primeiro degrau da escada caracol. Um degrau para cada pé, cada pé para cada batimento e todos os batimentos para a minha ânsia de vômito. Eu ainda não entendia por que estávamos ali.

Fiquei sem entender até descer o último degrau e me deparar com um espaço que cheirava a tabaco, álcool e um outro cheiro indescritível. Várias mesas redondas eram dispostas pelo salão, as cadeiras, de pernas para cima, fazendo os móveis redondos de chão, provavelmente uma tática para facilitar a limpeza. À minha direita, uma bar muito bem equipado, com bebidas que sequer sabia existir. Atrás do balcão, uma garota de olhos cor de mel, cabelo loiro escuro, só de sutiã preto, ajeitando alguns copos. A minha frente, um palco em formato de T virado, contando com um poledance em cada ponta. Algumas meninas ensaiavam ali, todas em perfeita sincronia com a coreografia e com o grupo, com passos perfeitamente sensuais. O grupo era feito de umas 10 garotas ou mais, mas uma se destacava mais do que todas, mais até mesmo da que estava a frente.

Foi aí que compreendi a piada trágica, a garota não era uma garota, mas sim a minha ídola. Naquele momento eu esquecia de respirar, só conseguia olhar sem piscar para o palco. Observei tudo, a garota de longos, lisos e negros fios de cabelo, que agora ganhara mechas azuis escuro, vinha para a frente juntamente com mais duas meninas. As três foram para a beirada do palco, a garota destaque ficou na ponta esquerda – para mim -, e uma outra garota, essa magra, com silicone, rosto angelical, olhos e cabelo castanho, ficava na ponta direita, a do meio, uma ruiva de olhos verdes e sardas, era mais gordinha e tinha tatuado em suas coxas cintas liga, no seu braço direto, uma mandala. As três se exibiram para então depois, as da ponta seguirem cada uma para os seus respectivos poledances, enquanto a ruiva dá uma estrelinha para trás e volta para o grande grupo, que continuava dançando. Minha atenção se foca especificamente na garota da cabeleira negra, que foi até o seu poste, girou, se coloco de cabeça para baixo, se segurando com as pernas entrelaçadas a barra, enquanto tremia seus ombros a medida que ia estivando seu tronco. Foi aí que nossos olhos azuis se cruzaram e vi sua boca carnuda muito bem conhecida por mim se abrir.

Minha irmã havia se tornado uma prostituta.

Uma prostituta estática, que havia parado de dançar enquanto a música continuava tocando e todas as outras meninas faziam o seu papel. Ninguém havia percebido a pausa de Anne Fox, pelo menos não até a música parar bruscamente, colocando um ponto de confusão na expressão de cada uma das putas.

–– Anne, gostaria de fazer uma pausa? –– uma mulher de cabelo castanho escuro volumoso e olhos verdes escuro, quase castanhos, com um nariz perfeito, usando um vestido bordô curto e um salto maior do que os saltos de Emi, diz. Ela aparentava ter 40 anos e ser a dona do local.

Minha irmã olhou de mim para ela e d’ela para mim, para então voltar seu olhar novamente para ela.

–– Eu acho que sim, Marie. –– a voz de Anne sai seca.

–– Intervalo até eu mandar. –– Marie grita e os garotas começam a se dispersar, coversando, tomando água e apalpando os seios umas das outras.

–– E você, meu anjo? –– a mulher se dirige a mim –– Está procurando emprego? Olhe, estamos sema vaga agora, mas com esse rostinho inocente faria meu clientes enlouquecerem na beirada desse palco. Se quiser podemos marcar um teste... –– a fala de Marie se perde em ao seu olhar que oca em meus lábios enquanto uma leve ruga se forma no meio de suas sobrancelhas. Seus olhos se moviam da minha boca para algo atrás de mim, e ficaram repetindo o movimento até a sua expressão passar de curiosidade para espanto, é nessa hora que me viro e dou de cara com uma Anne de regata branca e calcinha rosa. Eu não digo nada, quem começa o nosso diálogo é ela.

–– Emily? Meu Deus! O que você está fazendo aqui? –– ela diz e traz um tom de indignação na sua voz.

–– O que eu estou fazendo aqui? O que você está fazendo aqui? –– tento não gritar, mas não consigo. Estou com raiva de Anne. Enquanto eu pensava que ela estava feliz, estudando ballet, ela esta estava se prostituindo num puteiro de quinta.


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Notas finais do capítulo

Gostaria de dizer que eu me forcei a escrever esse capítulo, pois como disse lá em cima, tô com bloquei criativo, então podem dizer que ficou uma merda, mas por favor, falem alguma coisa, só para eu não enlouquecer, ok? Obrigada por ler! Obrigada Bailarina demoníaca!