Die Finsternis escrita por Briz


Capítulo 1
Die Finsternis




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N.A.: Fic de presente de Amigo Secreto de Halloween da comunidade do Orkut "Fics No Jutsu", para uma das pessoas mais meigas e queridas que conheço. Adivinham quem é?

Eu sei que esse alemão provavelmente tá errado (o certo seria der finsternis). Mas o título é alusivo à musica "AM ANFANG WAR DIE FINSTERNIS", de E Nomine, que foi minha inspiração.


Usei Fear oh the Dark, porém. Tsc.

 

 

-

 

DIE FINSTERNIS¹

 

Sexta-feira, 31 de outubro. Eram quase meia noite, e eu havia acabado de sair da faculdade. Rua deserta, eu fui até a parada de ônibus, e tive a sorte de chegar exatamente no momento em que o meu carro parava. Subi no transporte, e logo notei que, além do motorista mal encarado que arrancou enquanto eu ainda subia e do cobrador mal-educado que tentou roubar-me quase um euromünzen² no troco, eu era o único no coletivo.

 

Relevei o comportamento dos dois. Era a última corrida do dia, deviam estar cansados. Mas, por via das dúvidas, fui sentar-me à janela da última fileira do ônibus, o famoso “fundão”. Havia algumas baratas andando por entre montinhos de lixo – restos de picolés e outras coisas que ambulantes vendiam no carro.

 

 Abri um livro de metodologia que peguei horas antes na biblioteca, folheando-o apenas. O sacolejar do ônibus, que mais parecia estar levando um boi a um ser humano, e o barulho de metal solto batendo não me deixava concentrar. Logo desisti da leitura e pus-me a olhar pela janela, tomando o ar frio da noite em meu rosto cansado.

 

A viagem ainda demoraria um pouco, pensei com pesar, quando enveredamos pelas ruas estreitas do centro histórico da cidade. Ainda estava longe. E eu não era particularmente um fã daquela área. Os prédios, datados do início do século XX, mantinham ainda sua arquitetura européia original, algumas tendo ainda o mesmo glamour, porém, o limo nas paredes e o aspecto acabado de algumas construções denunciavam a idade dos prédios. E lhes davam uma aparência horripilante de filme de terror.

-

 

Eu sou um homem que caminha sozinho
quando eu ando em uma estrada escura
De noite passeando pelo parque

 

-

Tremi quando dobramos em uma rua particularmente estreita e mal iluminada. Porém, ali, pude ver alguns mendigos pelo chão, uns rapazes mal encarados... E, mais a frente, uma garota em um ponto de ônibus. Não parecia ter mais de dezesseis anos, vista de longe. Estava vestida em jeans e blusa negra, parecia mais uma “roqueira”. Devia vir de alguma festa em uma dessas casas antigas, perfeitas para reuniões desse tipo de jovens.

 

Ela fez sinal para o ônibus, porém, o motorista, ao ver o sinal e os garotos mal encarados que se aproximavam, acelerou ainda mais, e a mão da garota ficou no ar quando o carro passou por ela. Ainda tive tempo de encará-la... E ela a mim. Sua expressão era indecifrável, mas certamente de desgosto. Sorri simpático para ela, em uma desculpa muda pelo comportamento do motorista. Cheguei inclusive a ter tempo de me preocupar pela segurança da jovem, lembrando-me dos homens que se aproximavam.

 

Mas, de repente, um calafrio tomou conta de mim. Ouvi um grito de mulher na rua, vindo de onde a jovem havia ficado... E, quando o carro dobrou na próxima rua, percebi a escuridão na qual a rua que deixamos pareceu ser mergulhada. A pouca iluminação dos postes pareceu desaparecer, e então não pude perceber mais nada quando entramos totalmente na nova rua.

-

 

Quando as luzes começam a falhar
Eu algumas vezes me sinto um pouco estranho
Um pouco ansioso quando está escuro

 

-

Fechei a janela, amedrontado. Olhei para as outras janelas do coletivo, e tive vontade de fechá-las também. Contentei-me em fechar apenas aquelas ao meu alcance, e tentei voltar minha atenção ao livro. A tática pareceu funcionar, até o final da rua. Foi então que pressenti que a escuridão não havia ficado para trás.

 

As luzes do ônibus começaram a piscar freneticamente, ao mesmo tempo em que as da rua pareceram se apagar. Vi apenas uma sombra enorme, que pareceu rodear o ônibus, correndo aos seus lados. Desesperei-me, ficando nervoso, e olhei para o cobrador e o motorista... Não pareceram notar nada, até o momento em que as luzes do ônibus se apagaram por completo, e a escuridão entrou pelas janelas abertas, como uma fumaça maldita.

 

Nesse momento, eu gritei. Alto, com todo o ar de meus pulmões. Um grito de desespero na noite, abafado pela escuridão sufocante que tomou conta do transporte. E, no meio dessa escuridão, eu pude sentir. Não era simplesmente escuridão.

-

 

Medo do escuro, medo do escuro
Eu tenho medo constante de que algo está sempre perto
Medo do escuro, medo do escuro
Eu tenho uma fobia de que alguém está ali.

 

-

Havia algo maligno ali. Um mal maior do que a mente humana era capaz de imaginar.

 

Senti sua presença na frente do ônibus, como uma alma maldita pairando pelo ar, o centro de toda aquela escuridão. Calei-me, tolamente deduzindo que poderia estar chamando a sua atenção. Meus gritos cessaram, e senti que me abaixei involuntariamente, me encolhendo para me proteger da coisa, torcendo para ela não notar a minha presença.

 

Foi então, quando me calei e preenchi o meu redor de silêncio, que ouvi o que acontecia na parte da frente do ônibus. A escuridão podia abafar o que acontecia apenas parcialmente, e foi com horror que ouvi gritos desesperados vindos da dianteira. Um frio percorreu a minha espinha, e senti cada pelo de meu corpo se eriçar.

  -

 

Você já correu seus dedos pela parede
E sentiu a pele de sua nuca arrepiar
Quando estava procurando a luz?

 

-

Notei que o carro continuava em movimento, mesmo com o terror que estava acontecendo, quando uma curva brusca me jogou contra a lateral de ferro, fazendo um barulho alto, ao mesmo momento em que os gritos cessaram. O carro caiu em quietude, e a presença maligna não era mais sentida na dianteira... Mas no centro do carro.

 

Entendi então que em nenhum momento ela esteve alheia a mim.

-

 

Algumas vezes quando você está com medo de olhar
No canto da sala
Você sente que alguma coisa está observando você

 

-

Meus olhos arderam, e os fechei, apertando bem, à medida que sentia o ser mais e mais perto de onde eu estava. Não ousei abrir os olhos, apavorado. Mas eu podia sentir. Ela estava ali, parada à minha frente, me vendo. Meu coração acelerou, e eu julguei que fosse morrer, ou, no mínimo, desmaiar. E, no fundo, eu torcia para isso: para perder a consciência, e me livrar do pior sentimento que eu já havia sentido: O medo. E não apenas um medo qualquer. Mas um pavor, um terror acima do que qualquer ser humano seria capaz de suportar.

 

Eu, que sempre havia sido tão cético, agora via todos os medos que eu reprimira ao longo dos anos à minha frente, através de pálpebras cerradas.

 

Ela tocou minha mão, e me senti queimar. Eu queria gritar de dor, mas não podia. Minha voz morreu em minha garganta, e eu apenas senti, impotente, meu pulso ser queimado.

 

Foi então que a coisa mais incrível aconteceu. A presença se desvaneceu de perto de mim, e senti a iluminação voltar ao coletivo. Ousei abrir os olhos devagar, e vi a escuridão se desvanecendo lentamente, em direção à dianteira do ônibus.

 

Suavemente, o automóvel freou, e as portas traseiras foram abertas violentamente. Percebi que estava na minha parada. Olhei ainda para frente, amedrontado. A escuridão ainda encobria parte do ônibus. Fiquei receoso de sair.

 

Porém, quando a cadeira do cobrador revelou-se sangrenta e nojenta, moedas espalhadas pela gosma humana, e o que parecia ser um osso humano pareceu jogado ao chão, não tive dúvidas, e saí correndo pela porta traseira, em desabalada carreira. Não quis esperar para ver o que mais tinha ali.

-

 

Medo do escuro, medo do escuro
Eu tenho medo constante de que algo esteja por perto
Medo do escuro, medo do escuro
Eu tenho uma fobia de que alguém esteja ali

 

-

Corri o máximo que pude, sem olhar para trás. Meus instintos me guiaram até o final da rua, onde vi a Basílica. Por que eu havia corrido na direção contrária à minha casa, nem eu mesmo sabia. Apenas corri.

 

 Mas, ao contrário do que pensei, não fui capaz de entrar no templo. Alguma força de dentro de mim me impedia. Uma ansiedade que ameaçou me botar de joelhos se eu ousasse ultrapassar os portões ainda abertos. Culpei o cansaço, me apoiando nas grades de ferro, fraco.

 

 

Foi então que ousei olhar para trás. Olhar na direção do ônibus. Nada lá. Peguei meu celular e liguei para meu pai, apavorado. Inventei a história de um assalto, pedindo que viesse me buscar na igreja. Eu não ousaria sair à rua sozinho.

 

Minutos de desespero depois, o carro de meu pai parou à porta da igreja, com uma buzina leve. Saí correndo, choroso, para entrar no carro. Passamos pelo ônibus, agora todo apagado, e nem ao menos ousei olhar em sua direção. Apenas escutei o discurso aborrecido de meu pai, por ter sido acordado, transforma-se em um preocupado ao ver o meu abalo. Meus nervos estavam em frangalhos.

 

Só então notei que meu pulso, onde ela havia tocado, ardia febrilmente. Olhei o local e, para mina surpresa, havia uma marca em brasa ali. Um símbolo estranho, que esfriou e tornou-se negro rapidamente. Assustei-me, esticando o braço para longe do corpo. Meu pai assustou-se também, olhando para meu pulso.

 

- O que foi, Vince? – ele indagou, olhando meu pulso, que eu esfregava. – O que está tentando fazer?

 

Parei o que fazia, olhando para ele assustado. Meu pulso estendido, a marca escura em minha pele clara visível... E meu pai não parecia vê-la. O pentagrama em fogo em meu pulso era visível apenas para mim.

 -

 

Você alguma vez já esteve sozinho a noite
Pensou ouvir passos atrás de você
E quando virou de costas, não havia ninguém lá?

 

-

Viramos a esquina de casa, e novamente um calafrio percorreu meu corpo. Parada, ali no canto, estava a mesma garota que o ônibus havia se negado a pegar, no centro. Arrepiei-me completamente, meus olhos se arregalando, e ela me sorriu simpática, acenando para mim de longe. A mesma marca em mim estampada no pulso dela, brilhando em fogo.

 

O relógio do carro apitou, marcando meia noite. Curioso como nunca notei que ele marcava a hora e a data ao mesmo tempo, no seu display esverdeado. Vi as zero hora, e a mudança do dia 31 de outubro para o dia primeiro de Novembro...

 

Olhei de volta para fora. Não havia mais garota alguma. Apenas uma nuvem negra se desvanecendo no ar, e sumindo completamente.

-

 

E a medida que você acelera seu passo
Você acha difícil olhar novamente
Porque você tem certeza de que alguém está ali

 

-

ooOOoOoOOoo

 

Desde este dia, cinco anos se passaram. Nos dois primeiros anos, busquei toda a ajuda possível para me recuperar do trauma sofrido. Eu poderia, após essa experiência, ter procurado ajuda para entender o que aconteceu. Entender o que foi que entrou no carro, entender o que aconteceu comigo, entender porque apenas eu via a marca em meu pulso. Mas eu não tentei. Não procurei.

 

Eu apenas aceitei minha nova condição. Eu não preciso saber de mais nada, pois o que sei já é o bastante.

 

E tudo o que eu sei é que, em todo dia 31 de outubro, minha marca brilha em fogo, e a cidade banhada em sangue submerge na escuridão.

-

 

Eu sou o homem que caminha sozinho.

Quando estou andando por uma rua escura
-

(Iron Maiden – Fear of the Dark)

 

-

 

Der Ende

 

 

 

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¹ - Die Finsternis – A escuridão, em alemão. Sim, está errado. Mas já disse, é alusão a E Nomine.

² - Euromünzen – Euro, em alemão.

 

 

N.A.: Presente de Amigo Secreto de Halloween, para a Isa... Pra ela, eu realmente me esforcei pra coisa sair aceitável, porque dar presente pra uma escritora tão boa é realmente difícil.

 

Parenta, te adoro. Espero que essa coisinha esteja à altura da sua perfeição.

 


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