Nova Herança escrita por Rob Sugar


Capítulo 1
Despertar




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/474008/chapter/1

Estou jogado num chão frio. Sinto o cheiro de ferrugem e sou tomado por lembranças imediatamente. Lembranças de quando meu pai me levava para um lugar que ele chamava de Herança, me dizia para nunca ir até lá sem ele. As lembranças da infância são conectadas ao cheiro de ferrugem pelo portão da Herança. Fui uma única vez sem ele até lá. Foi o dia em que o perdi.

Ouço passos e me dou conta de que não estou sozinho. Levanto-me do chão sujo para procurar uma parede onde possa me apoiar. Quando finalmente abro os olhos vejo quatro pessoas na minha frente.

Uma mulher extremamente atraente com as mãos na cintura olhando para o chão, onde um senhor de idade desenha com um pedaço de tijolo algo que não compreendo daqui. Um homem com um bigode cheio está encostado na parede ignorando o que o senhor diz. Há também um segundo homem que está desacordado com o rosto para o chão. Não vejo nenhuma característica marcante. Tirando, talvez seu cabelo rubro como chamas.

–Você quer ajudar? – a mulher sussurra para mim. Ela nem sequer levanta o rosto quando fala, está focada nos desenhos do velho.

–Com o quê? – pergunto a ela.

Ela levanta o rosto para me ver e descubro que seu rosto é ainda mais bonito que seu corpo. Olhos castanho-claros simetricamente sobrepostos numa pele clara que trazem uma boca que já deve ter concedido sorrisos devastadores e beijos apaixonantes.

–Com a saída. – ela responde como se fosse a coisa mais óbvia do planeta. E é.

Saio da parede e vou para junto do velho. Os rabiscos com o tijolo são difíceis de compreender por causa da falta de luminosidade aqui. Consigo identificar no máximo um quadrado, que imagino ser onde estamos com alguns traços dentro. Há também outro traço do lado de fora do quadrado. Levanto a cabeça e descubro que os traços são pessoas, pois há um carcereiro do outro lado das barras.

O sotaque do velho é muito forte e, assim como seu desenho, não entendo muita coisa. Ele parece estar sugerindo que prensemos as barras até caírem, mas isso é impossível, pois estamos em quatro, e eu mesmo não estou na minha melhor condição física.

–Que tal pegar as chaves? – sugiro. A mulher, o velho e o homem com bigode olham para mim. Estão prestando atenção. Bom começo – Podemos atrair a atenção dele e pegar as chaves do bolso.

–As chaves não estão no bolso dele. – o bigodudo diz para mim.

Não é nenhum mistério que celas possuem chaves para abri-las, e elas têm de estar por perto. Após alguns minutos de olhos semicerrados forçando a visão, encontro-as em cima de uma mesa, não muito longe das barras. Acho que com alguma coisa conseguiríamos pegar, mas o carcereiro viria com certeza.

Começo a pensar em simplesmente distrair o carcereiro, mas isso pode não dar muito certo. Se ele visse, sacaria a arma e atiraria em qualquer...

–A arma. – digo baixinho para que ele não me ouça – As chaves estão em cima da mesa, podemos usar o cassetete dele para pegar, mas não vamos conseguir com ele nos olhando.

–Quer matar um carcereiro? – a mulher pergunta. Sua expressão é de pura surpresa, como se tivesse visto um fantasma.

–Alguém sabe usar uma arma? – pergunto, usando um tom de voz para disfarçar a conversa.

O bigodudo levanta a mão. Digo que precisamos de distração e todos olhamos para a mulher. Ela suspira e se levanta e vai até as barras. Eu ia perguntar se ela tinha alguma ideia, mas se ela quis se arriscar, tudo bem pra mim.

–Você parece ser um cara legal. – ela diz para o carcereiro com um tom sedutor que me faz ter vontade de vomitar – Me diz o seu nome.

–Senhora, vou pedir pra que a senhora saia das barras e volte para dentro. – ele diz sem nem olhar para ela.

Ela se vira para nós com uma expressão que eu sei que significa “e agora?”. Faço um sinal com as mãos para que ela continue e tente de novo. Ela volta para as barras e prolonga seu jogo de distração.

–Você não tem cara de menino certinho. – ela diz indo um pouco mais à frente – Tenho um palpite que você gosta de quebrar as regras.

O carcereiro se vira e vai até ela. Finalmente ela conseguiu atrair sua atenção. Ele a segura na cintura e começa a agarrá-la freneticamente.

Isso tudo é carência?

Enquanto ele está ocupado povoando os poros dela com seu DNA, a mulher consegue tirar a arma do coldre e a atira graciosamente para nós. Pego e entrego para o bigodudo. Espero-o se posicionar e dou o sinal, uma tosse fajuta, para que ela se afaste.

–Não posso fazer isso! – ela grita se afastando do carcereiro. Ela põe a cabeça nas mãos e finge um choro – Sou uma mulher casada e isto é errado...

Antes que o carcereiro possa dizer qualquer coisa, o do bigode já acertou um tiro em sua testa. Ele cai morto e a mulher vai até ele pegar seu cassetete. Ela estica o braço para fora da cela e alcança as chaves com o cassetete. Cautelosamente ela traz as chaves para dentro.

O bigodudo e o velho se levantam e vibram emudecidos pela alegria. Tento acordar o homem ruivo e sou surpreendido com sua resposta.

–Estou acordado. Só estava esperando. – ele diz sem moléstia nenhuma na voz. Ele de fato estava acordado e esperando. O homem se levanta e seus olhos congelam minha alma. Sua boca está intensamente clara e ele está branco – Não se assuste, eu sou sempre assim.

Dito isto, ele passa e sai da cela com os outros. Sigo-os para tentarmos sair dali. Mas assim que ponho o pé do lado de fora da cela; ouvimos uma voz sombria num tom impecável e estranhamente estável.

–Fico feliz que estão livres, Nova Herança. – a voz diz. Procuro por alto-falantes, mas não consigo encontrar nenhum. É como se estivesse entre nós, mas não está – Mas creio que sua união não acaba agora.

Ninguém diz nada. Todos simplesmente param e encaram o nada.

–Há um motivo de estarem aqui. Mas ele não é importante agora. – a voz continua. O velho cutuca o ouvido furiosamente para saber se é algum defeito de seu aparelho auditivo.

–Estamos todos ouvindo. – digo a ele para tranquilizá-lo.

–Vocês são a Nova Herança. – a voz pronuncia pausadamente. Nova Herança? O que isso quer dizer? – São um batalhão de humanos aparentemente comuns, que serão usados para promover mudanças na sociedade.

Isso pode não ser bom. Todos ainda estão em silêncio.

–Posso afirmar que vocês não serão bandidos, tampouco criminosos. Muito pelo contrário, Nova Herança, vocês serão heróis. – a voz insiste – Uma sociedade que levará nossas civilizações a uma maturidade moral nunca antes vista. Seguirão as minhas ordens e tudo sairá bem.

–E se não quisermos? – a mulher pergunta cruzando os braços. A voz ri tenebrosamente no mesmo tom intocável.

–A senhora Mylles não dirá mais nada pessoalmente se você se recusar. – a voz responde. A mulher recua como se de fato houvesse alguém em sua frente, mas acho que esta senhora Mylles é alguém muito importante para ela – A Nova Herança lança os dados hoje. Sua primeira diretriz é encontrar uma sede para a Nova Herança.

Tudo silencia após a última fala da sinistra voz.

–Onde será a sede? – a mulher pergunta às pressas.

–Por que mudou de ideia tão rápido, caça-carcereiro? – o de bigode pergunta rindo.

–Onde será a sede? – ela repete com firmeza.

Não quero dizer isto. Mas meu subconsciente está gritando para que eu diga. Conheço um lugar que seria perfeito como sede de uma sociedade anônima. Somos quase maçons, mas não há nada confirmado.

Levarei a Nova Herança à Herança.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Nova Herança" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.