Falando de Flores escrita por Arabella


Capítulo 5
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

GALERA, ESCOLHAM QUEM VAI ENTRAR NA ARCA DE NOÉ PORQUE VAI TER UM DILUVIO, EU POSTEI NO DIA LAALALA
Deixando claro que vou postar todo dominGo, ou sabado, coisa assim.
Quero agradecer demais aos comentário super fofos e a quantidade de viasualizações.
Esse é um dos meus capítulos preferidos, já tenho outros dois prontos e espero que gostem, comentem e blábláblá.
UM BEIJO NA BUNDA
Mari



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“Welcome to the new age”

Imagine dragons (Radioactive)

“Você não quis, vishe, perfeito, sua amiga…” a música chegava na esquina de sete quarteirões dali. Assim que pisei no clube tive vontade de voltar andando mesmo. E teria feito isso se Olívia não tivesse percebido a minha expressão e me arrastado até a mesa onde os amigos dela de ontem estavam. No caminho até o grupinho senti meus membros de retesarem.

Olhei desesperadamente para todos os lados, o lugar estava cheio e minha altura não ajudava em nada, mesmo com o salto gigante da bota que minha prima escolhera. Preferi pensar que era só o sono me enganado, porque, além do mais, não tinha dormido nada no dia anterior e esse se resumiu a testes de penteados, dez mil roupas e minha prima fazendo perguntas como “Essa blusa está larga demais?”, “Você acha que eu pinto as unhas de vermelho ou laranja” e “Esse sapato combinou? Ai meu Deus, eu não tenho sapato pra usar.”. Só tive tempo de praticar enquanto ela estava no banho. E como o banho dela era demorado. Nunca gostei muito do som do teclado, mas de qualquer modo, era o que tinha que ser. Não cabia um piano ali, nisso eu tinha que concordar com minha mãe.

Mesmo depois de cumprimentar as pessoas e ser apresentada a outras, meus olhos ainda dançavam atentamente pelo palco onde tinha o equipamento de som, a piscina e a bancada onde pediam as bebidas. Mas nada, era só falta de uma noite bem dormida.

– Alô, Terra chamando Valentina. – Fernanda mexeu as mãos na frente de meus olhos. – E então? – acho que ela esperava que eu respondesse alguma pergunta que eu não tinha escutado. – Eu perguntei o que achou da festa, desligada.

– Não sei – falei alto, mesmo estando próximas o barulho atrapalhava – Essa música está insuportável.

– Eu sei, é sempre assim – ela revirou os olhos. – Na maioria das vezes o Daniel dá uma de louco, interrompe os caras lá – apontou pra mesa onde uns meninos cuidavam do som, eles deviam estar quase surdos – e toca alguma coisa. Se bem que hoje ele está demorando.

Ela deu de ombros. Senti que era uma chance de perguntar se alguém da escola tocava instrumentos, e se sim, se algum tocava guitarra. Antes de pronunciar uma palavra, minha prima entrou na conversa.

– O Dani já chegou? – ela perguntou e notei um familiar brilho em seus olhos. Era a terceira vez que ela fala sobre essa garoto.

– Há um bom tempo, só está sumido. – alguém que não lembrava o nome disse.

– Ah... – Olívia parece desapontada.

– Relaxa, garota, daqui a pouco ele aparece. – Fernanda piscou para ela.

– E quem seria esse tal Dani? – imitei a voz apaixonada da menina e me abano.

– Fique quieta, Aninha, ele é só... – ela corou.

– Aquele de blusa xadrez com a guitarra na mão. – Fernanda a interrompeu apontando para o garoto no palco.

Era ele. Era ele. E não havia duvidas quanto a isso. O cabelo negro não estava mais desgrenhado do que antes. Os olhos concentrados enquanto ele ligava algo á algo no meio dos fios. Ele falou alguma coisa ao cara perto do aparelho de som que foi direto para atrás de uma bateria que eu não havia notado. Ele se agachou para continuar a batalha com os fios quando olhou para cima. Seu olhos, daquela cor indecifrável, passearam pelas mesas e pararam em mim. Fiquei constrangida e passei as mãos pelo meu cabelo, então lembrei que ele estava amarrado em um coque. De novo papel de boba. O Solto rapidamente para tentar disfarçar, mas acho que é tarde demais. Tentei segurar o riso de mim mesma. Ele deu um meio sorriso e balançou a cabeça se divertindo. Então seu olhar se levanta mais um pouco e seu sorriso cresce.

Olho para o lado e vejo que o sorriso de agora é direcionado a minha prima. Olívia fica vermelha e novamente tenho que segurar o riso.

– Você gosta dele. – disse. – Não acredito. Olívia, a leve-livre-solta, apaixonada.

– Quem? Eu? – ela perguntou ainda sorrindo.

– Não, a outra Olívia. A tia do churros, lembra?

– Cale a boca, Ana, ele vai cantar.

– “Ele”, você se refere ao teu amor? – ela chutou minha perna por baixo na mesa. – Ok, parei. Ele é da sua sala?

– Ele é do primeiro B. Nós somos da A. Quer dizer, a Isa e a Barbie são da B também. E o Lip. – ela acrescenta rapidamente com um sorriso. – Ficamos com o Félix, mal negócio, né? Mas isso não importa muito, na parte da tarde e nas aulas fora da classe as três turmas ficam juntas.

– Humpf. São muitas aulas fora da classe? – afundo na cadeira.

Nanda me dá um tapa na cabeça no exato momento que estou bebendo meu suco. Tenho que cobrir a boca com a mão para evitar cuspir suco por causa da minha crise de riso. Isso me faz bem, me faz lembrar desse clube há 4 anos.

We've been on the run. Driving in the sun.”

Paro de rir e olho para a parte da frente da área de festas do clube. Se eu ainda duvidava que essa tal Daniel era meu novo vizinho, agora tinha certeza. Voz não se confunde.

– Essa não é a abertura de The O.C.? – pergunto.

– The o quê? – grita minha prima enquanto bate palma. Então percebo que a maioria das pessoas se levantou e canta a música animadamente.

The O.C. – repito. – Você sabe, aquela série de TV antiga. A que uma família ricaça resolve tomar conta de um menino em condicional... – começo a gesticular. É minha série preferida. Assisti no mínimo três vezes. – Vimos ela quando você me visitou nas ultimas ferias.

– Aquela que o delinqüente pega a vizinha da família rica que acolhe ele? – ela para, parecendo resgatar algo do fundo da memória .

– Essa mesma, Liv. É dos Phantom Planet.

– Qual é o nome da música?

Califórnia here we come. Coisa assim, por que?

– Por nada. – ela diz, olho pra ela confusa e ela pisca. – Você vai saber daqui a pouco. E obrigada.

Olho pra Nanda sem entender o que minha prima disse. Mas ela está pulando e cantando a música junto com todos. Pego meu celular e decido mandar uma mensagem pra Júlia, então a música para.

– Por que parou? – pergunto á Isabella, na verdade á mesa, mas ela é a única que me dá atenção.

– Ele sempre faz isso. Ele para e temos que adivinhar o nome e quem canta. Quem acerta pode mandar alguém fazer algo. Por isso todos tentam acertar antes, mas o cara só escolhe música velha ou desconhecida. É uma espécie de verdade ou conseqüência.

Antes que eu pudesse perguntar se foi por isso que Olívia quis saber o nome da música, ela grita e o garoto a lança um olhar impressionado. Ela diz que ‘com o poder a ela concedido’, quer que a Nanda dê um beijo em um garoto que se sentava ao lado dela.

Pelo medo que Fernanda encarou minha prima, eu sabia que teria vingança. Tanto ela quanto o garoto estavam vermelhos, entretanto, parecia que ambos queriam aquilo quando Olívia sussurrou “é só um empurrãozinho, Nanda”.

Outra música que reconheci. Meus pés começaram a bater no ritmo. Mesmo o Dan Reynolds sendo um dos meus cantores preferidos, tinha que admitir que a música ficava melhor saindo dos lábios a minha frente.

–I’m waking up. I feel it in my bones. Enough to make my system blow. – cantei.

– Ah não, Ana, não me diz que tu sabe essa também. – Olívia perguntou animada.

– Todo mundo conhece essa, não? – olhei para os rostos em volta da mesa, ninguém se moveu. – Deus. É Radio...

– Na-ão diga nada, Val. – Nanda me cortou. – Não perto dessa daí. – ela apontou para minha prima.

– Eu é que não vou falar. – disse.

– Por que não?

– Simplesmente não. Estou aqui há um dia, não conheço ninguém.

– Claro que conhece, olha aqui. – Felipe falou apontando para a mesa, onde sentava as pessoas que eu encontrara ontem e mais algumas que eu tinha acabado de conhecer.

Poderia dizer que tinha me esquecido da presença do Felipe ali, já que ele ficou em silencio o tempo todo. Acontece que esse silencio era preenchidos por beijos e sussurros de Bárbara, que sentava ao seu lado.

– E mesmo que não conhecesse, isso não importa. – ele continuou. – o Dan é um cara legal. Você devia é subir lá e tocar também. Você ainda toca, certo?

– Sim, toco, mas... – comecei e a música parou novamente.

– A Ana sabe. – Felipe gritou antes que alguém possa abrir a boca.

Todos os pares de olhos se viram em nossa direção. Minha boca abre, mas não para falar, pelo contrario, por não saber o que fazer. Amasso meu copo de plástico e jogo no garoto. A Mãe natureza iria me perdoar por isso. Eu espero.

– Você vai falar ou não, garota? – Bárbara perguntou impaciente.

Não sei de onde surgiu tal coragem, talvez por não agüentar mais todos os olhares, ou pelo comentário da menina, mas me virei e disse em bom e alto tom.

– Radioactive, Imagine Dragons. Um Grammy e um TCA.

– Uau. – é tudo que o garoto da guitarra falou.

– Vai, Val, escolhe alguma coisa. – minha prima disse.

– Escolher o que?

– Sei lá, qualquer coisa. Você acertou. – Bárbara se meteu de novo.

A raiva ferve e dou um sorriso diabólico. Ela quer isso? Bem, eu sei jogar também.

– Quero que a Maria Bárbara entre na piscina. – anunciei.

A reação das pessoas ao meu redor foi completamente cômica. Todos os meninos riram, inclusive o cara no palco e o namorado da garota. A rodinha de meninas em volta dela fizeram uma cara de espanto, mas nada foi comparado ao ódio estampado no rosto da Bárbara.

– O quê? Olha aqui, garota, nem morta eu... – ela começou a dizer.

Olha aqui garota nada. Você mandou eu escolher logo, eu escolhi. – falei indiferente.

A garota se levantou, pronta para começar uma discussão e Daniel, que devia ter pensando a mesma coisa que eu, apareceu do seu lado, a levantando do chão e seguindo em direção da grande piscina. Todos assoviavam e gritavam ao mesmo tempo. E senti uma cotovelada.

– O ciúmes era pra tanto? – minha prima perguntou, ao menos ela teve a decência de sussurrar,

– Que ciúmes, chica? Quando vai entender que o que rolou entre o Felipe e eu não foi nada? – respondi seca.

– Tente me enganar, Ana, acha que eu não percebo os olhares dele? – ela indicou com a cabeça o menino que variava os olhares da sua namorada na água e... eu – Tenho certeza que você precisa dizer só algumas palavrinhas que ele larga da Barbie e vai correndo pra você.

– O que quer insinuar? Eu já lhe expliquei que...

– Mas não me convenceu... – ela me interrompeu.

Bufei e me sentei novamente.

– Se você não gosta da Maria Bárbara, por que anda com ela? – tentei mudar o foco da conversa.

– Nessa escola, nem tudo é questão de gosta, prima. Os mais fortes sobrevivem. Os fracos... – ela fez um barulho com a boca como se algo estivesse afundando.

Ignorei e respondi mais uma dúzia de provocações da minha prima sobre como agora que estou de volta eu deveria dar outra chance ao Felipe. Resolvi também ignorar cada vez que meu coração agia de forma diferente quando eu o pegava me olhando.

– Você me paga. – a voz tremula por conta do frio disse ao meu ouvido.

Me virei e deparei com uma Bárbara completamente molhada e enrolada em uma toalha, seus dentes batiam de frio e ela dava passos firmes até o namorada. Ela tem que ficar bonita até molhada que nem uma ratazana?, resmunguei para mim mesma. Felipe tirou seu casaco e o botou sobre o ombro da menina, deixando-a com um sorriso gigante. Revirei os olhos e agradeci mentalmente ao Daniel quando a música começou.

Essa eu não conhecia, tinha uma batida atual e pela cara do garoto, não era algo que ele gostava, então imaginei que ele tivesse que intercalar músicas que a maioria das garotas gostavam com as do gosto dele. Não demorou muito para música acabar e Bárbara praticamente berrar tudo sobre ela. Ela me encarou de um modo assassino e deu um sorriso diabólico.

– Dan, meu querido, você nunca pensou em ter uma voz feminina te ajudando?

Meu sangue gelou e meu olho soltou das orbitas. Não, ela não estava sugerindo isso.

– Sempre. – Daniel respondeu.

Me preparei para fazer algum comentário sobre quã idiota isso tudo era quando fui surpreendida por duas pessoas agarrando meus braços.

Felipe em algum momento se levantou e segurou um dos meus braços enquanto o outro era tomado por Victor, – acho que é esse o nome dele. Eles me levantaram de modo que não consigo usar os meus pés para me segurar no lugar e me carregaram até o teclado cinza enquanto eu dizia uma série de palavrões. Gritei frustrada parecendo uma criança sem querer tomar banho.

– Vocês não podem estar falando serio. – falei.

– Estamos. – Felipe disse. – Vamos, baixinha, vai fazer décadas que não ouço você tocar.

– Dois anos. – corrigi automaticamente.

– O quê?

– Dois anos que você não me vê tocar. – expliquei.

Ele me pôs no chão e me encarou durante alguns segundos. Aqueles profundos olhos me observando, como se avaliasse se minha resposta estava certa. Esqueço as pessoas, esqueço o mundo.

– Você ainda gosta de tocar em pé, certo? – ele me tirou do transe.

Afirmei com a cabeça e ele volta para o lugar. Olho ao redor congelada, a maioria das pessoas voltou a conversar em seus grupinhos e esperam a música começar.

–Sugere que comecemos com que música, vizinha? – Daniel perguntou.

– Por que concordou com essa palhaçada? – perguntei cheia de expressão.

– Oras, três tocam melhor do que dois. – ele levanta a sobrancelha e eu bufo. – E depois da tarde de hoje eu queria ver você tocar direito.

– Não acredito nisso. – não acredito que ele me viu tocar. Ok que eu o vi tocar. Não acredito que me fez subir aqui por puro capricho.

– Você sabe tocar o quê? – ele ignorou o que eu disse.

– Sei lá. – fico mal humorada.

– Ótimo. Conhece alguma do Bom Jovi? – ele perguntou e pensei se o volume do meu som estava realmente alto quando minha prima conversou com ele no telefone.

– Óbvio. – é tudo que respondi.

***

Por incrível que pareça, eu estava me sentindo bem.

Na verdade eu estava me sentindo eu. O inicio da música errei uma imensidão de notas. Podia ouvir a voz da Dona Roza me repreendendo durante nossas aulas. Ela me ensinara em minha primeira apresentação que quando se está tão nervosa como eu estava na hora, e estou agora, encontrar um ponto fixo que te faça lembrar de algo bom ajuda a esquecer o resto dos olhos em você e a aflição. Nada de imaginar pessoas de roupa intimas ou carecas.

A pequena diferença é que geralmente tocávamos sinfonias ou músicas de algumas décadas atrás, e meu pai sempre estava presente. Quando eu não encarava minha pulseira de contas eu o olhava e me sentia segura. Agora era uma música que eu estava acostumada a tocar dentro do pequeno e isolado estúdio. Sozinha. Foi quando senti um par de olhos específicos queimarem meu rosto.

Não sei bem quando decidi usar ele como o ponto fixo “barra” ancora. Na real nem me lembro de ter decidido isso. Só sei que depois que segurei seu olhar não errei mais nada.

Foi aí que comecei a me sentir bem. Eu estava tocando novamente por diversão. Não para simplesmente não desencaminhar. Comecei a sentir o mesmo que eu sentia quando tocava pelas primeiras vezes. Coisa que eu tinha esquecido de como era desde aquele importuno aniversário. Onde o teclado estragou tudo. Dr. Francisca dizia que seria normal eu culpar o instrumento por tudo o que houve. Mas eu não podia fazer isso. A música era o que me fazia esquecer de tudo, se eu culpasse ela, não teria outra coisa para me fazer relaxar. Preferi assumir a culpa. Claro que não disse isso a ela, ela não sabe que todas as noite eu me lembro dos meus dedos correndo pelo teclado enquanto ignorava a gritaria. Claro que ela não sabe que nunca consegui voltar a tocar aquela canção sem que meus dedos me traíssem. Se ela soubesse ela não teria me liberado e eu ainda iria ao psicólogo quatro vezes por semana. As vezes é preciso fingir que está tudo bem para realmente ficar bem. Ou ao menos melhor. E foi naquele momento, olhando naqueles olhos castanhos que decidi fazer isso. Fazer isso de novo. Eu já estava ficando mestre nisso. Mestre em fingir que está tudo bem. Isso me assustava, tinha hora que eu nem sabia mais se realmente estava bom ou se eu estava fingindo para mim mesma. Isso me fez perguntar se eu sei o que significa estar bem.

Quer saber? Quem se importa? Vi o canto daqueles olhos se enrugarem e percebi que ele sorria. Eu me importo. Pensei. Ele sorriu pra mim. E muito.

Ouvi gritos e aplausos quando me juntei ao Daniel cantando. Como eu tinha dito pra mim mesma vinte vezes ontem e hoje de manhã, eu voltei. Voltei pra onde eu sempre serei a filha da Helena, prodígio no piano. Se eu quiser mudar essa imagem tinha que ser logo. Mas e se eu não quisesse?

Continuei cantando até Daniel piscar para mim e parar subitamente de tocar. Alguém acertou a música. Alguém teve que dançar ridicularmente. Daniel sugeriu outra musica e assenti dizendo que conhecia. Alguém acertou novamente. Outro alguém teve que obedecer e pagar um mico.

Tudo acontecia tão devagar e tão rápido ao mesmo tempo. Simplesmente decidi não me preocupar em acompanhar esse ritmo.

– Eu estou morto. – o garoto que estava na bateria (que eu ainda não sabia o nome) disse começando a desmontá-la. – Desolado.

Ele tinha razão. A festa estava acabando. Algumas pessoas iam embora, a mesa que eu estava antes continuava com as mesmas pessoas. Tocamos varias e varias músicas, até dar meia noite, quando o clube proibia música alta. Havia começado a garoar também, o espaço das mesas e da comida/bebida era fechado, mas onde as pessoas estavam dançando/se agarrando não. Os garotos começaram a arrumar o som e os instrumentos que deviam ser levado para outro lugar e me ofereci para ajudar.

Algumas pessoas já haviam ido embora, outras estavam se despedindo. A mesa que eu tinha estado antes continuava cheia e minha prima não parecia afim e ir embora, e como eu iria embora com ela, comecei a desembaraçar os fios ligados ao teclado.

– Deixa disso, cara. – Daniel disse desconectando alguns fios. – Nem foi tanto assim.

– Não estou falando da música – ele respondeu seco –, mas da Isabella ter que beijar o cafajeste do Rafael.

Segurei meu riso. Lembro-me de que a Maria Bárbara pediu algo assim. Só não parei pra olhar para meu companheiro de som. Sua cara agora era de desgosto total. Ele tinha uma carinha de bebê e cabelos ruivos. Garotos com sardas são sempre bonitos. Será que a Isa sabia dos sentimentos dele?

– Eu já lhe disse que se você não fizesse nada logo, outro faria antes. – Daniel respondeu ao amigo.

– Ela nem deve saber da minha existência, Dan.

– Não é como se ela tivesse gostado de beijar o cara. – pensei alto e arrependi logo. – Ou, como conseguiram fazer isso com esses cabos? Nunca vão conseguir arrumar. – apressei tentando disfarçar.

– Acho que é um dom. – Daniel disse sorrindo, ao mesmo tempo que o outro menino ficou surpreso.

– Comovocêsabequeelanãogostou? – o ruivo disparou.

– Como eu sei o que? – perguntei desentendida.

– Que ela não queria beijar o Rafael, ela não gostou? – ele se desajeitou – Tipo, ela não pareceu feliz? Queria que não acontecesse?

– Ah, sei lá. – minhas pernas doíam de ficar agachada, sentei no chão cruzando as pernas – Estou só dizendo. A Isa não parece o tipo de garota que beijaria um cara por beijar. Também acho que a Bárbara devia estar de complô com o tal menino aí, além de que, geralmente, quando uma garota é beijada por um cara que... – bochechei sonolenta. Não tinha dormido noite passada e nem na outra, a viagem ainda pesava.

– Você está aqui há quanto tempo? – Daniel perguntou antes que eu pudesse voltar a falar.

– Um dia e meio, coisa do tipo. – respondi sem entender o por quê da pergunta.

– E já é uma das Sugar? – ele parecia decepcionado. – Digo, você estava com elas, diz sobre elas como se as conhecesse, mas não age como elas.

– Você disse que eu sou uma o que?

– Uma Sugar, sabe, a Bárara, a Isabella, a Liv e as outras menores.

– Isso é o que? Uma ceita? Um grupo? Tipo as garotas malvadas ou os marotos? – ri e voltei para os fios que pareciam se mover, eu realmente estava cansada.

– Dan, tu interroga a garota depois. – o carinha ruivo disse. – Agora continua aquele “quando uma garota é beijada por um cara que...”

Ri vesti meu casaco que estava amarrado na minha cintura. Estava esfriando. O garoto realmente gostava dela e estava preocupado com ela possivelmente ter beijado o outro e se apaixonado de uma vez? Ele achava que eu era o que? Um guru de relacionamentos? Apesar disso, decidi ser legal e me lembrar ‘cidade nova, vida nova, amigos novos.’

– Por um cara que ela realmente queria ser beijada, os olhos dela brilham, suas bochechas ficam extremamente coradas e ela passa o resto do dia, ou o resto da noite, com um sorriso bobo. – tentei explicar o que eu sabia através de livros e séries. – No caso da Isa, ela só ficou corada, mas não no sentindo bom. Então: a) o cara não beija bem; b) ela não tá afim dele; c) ela é lésbica. – contei as alternativas nos dedos.

– Como você sabe disso tudo? – ele perguntou, encantado.

– Olha, colega, eu não sei se você percebeu, mas eu sou uma garota.– eu disse inclinando a cabeça e Daniel fez um som estranho, como se segurasse o riso.

– Eu, eu percebi, é só que... não sei. – falou, mexendo as mãos freneticamente. – Quer dizer, claro. Você sabe se ela disse alguma coisa sobre mim ou sobre alguém... especial?

– Como eu disse – falei – eu estou aqui vai fazer dois dias. Saí com eles – apontei para mesa – ontem, e porque fui meio que arrastada. Só estou me baseando no que consegui entender dela.

– Você saiu com eles ontem? – Daniel começou curioso – Então era você que...

O que quer que fosse que ele ia dizer, se interrompeu. Olhei para trás e vi que minha prima estava vindo em nossa direção carregando sua bolsa em uma mão e na outra meu celular que me entregou logo que se aproximou.

– Obrigada. – funguei.

– Te ligaram duas vezes e eu disse que estava ocupada botando as aulas de música em prática. – olhei para tela e vi mensagens da Júlia. – Está tudo bem? – Olívia perguntou.

– Só cansada da viagem ainda. – ela me ajudou a levantar do chão e espirrei. – Ai, merda...

– E aparentemente um pouco gripada. – Felipe disse surgindo do além, digo, de trás da Liv.

– Oi, Dani – minha prima disse em uma voz talvez um pouco melosa demais.

– Cerejo. – ele sorriu e ela o imitou.

Acotovelei-a achando que se dependesse dela, passaríamos o resto da noite ali com ela sorrindo. A chuva estava começando a engrossar e tinha medo do Felipe estar certo.

– Sem querer estragar sua felicidade nem nada, mas vamos nos afogar daqui a pouco. – falei baixo para que só ela ouvisse.

Olívia me deu um olhar matador e deu um esbarrão no meu ombro.

– O Guilherme vai passar na porta daqui cinco minutos. O que na linguagem dele significa dez, mas se não estivermos lá ele vai passar o resto da vida falando. – ela disse.

– Meu sonho – abri as mãos para o céu. – é que peguem esse traste dirigindo sem carteira e ele dançar. Aí quero ver ele se gabando e... – meu celular começou a tocar. – É ele. – revirei os olhos.

– Agora a gente dançou. – minha prima falou.

Me despedi rapidamente das pessoas. Disse aos meninos que foi um prazer conhecê-los, o ruivo-ainda-sem-nome me agradeceu sorrindo, deixando a Liv e o Felipe com caras de confusos. Corri até a mesa e tentei dar um ‘tchau’ coletivo, mas a Isabella me segurou e me deu dois beijinhos na bochechas, iniciando uma seção de beijinho na bochechas das Sugar (pelo lado bom agora eu não precisava decorar o nome de todas as meninas ali) e, por acidente – totalmente culpa do sono –, acabei dando um beijo no canto da boca do Felipe. Me afastei rapidamente mas ele me puxou e me deu um também. Nunca gostei de contatos físicos, nada de abraços nem beijos na bochecha, nem com minhas amigas, mas me lembrava que ali era comum todo mundo se cumprimentar e se despedir assim. Do mesmo modo que era comum menores de idade dirigindo carros dos pais. Não entendia porque, aparentemente aqui não tinha blitz ou a cidade era comandada por pais malucos, como a minha mãe.

Entrei no carro sem ouvir uma palavra da reclamação do meu irmão, botei a mão onde o Felipe depositara o beijo, debilmente.

Por alguma razão, depois de chegar em casa, fiquei sentada na escrivaninha lendo um livro qualquer, simplesmente esperando alguma música vinda da casa á frente.


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