Jogos Divinos - A Faísca escrita por


Capítulo 3
Nico


Notas iniciais do capítulo

Capítulo de Desenhado À Lápis, espero que gostem



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Eu realmente não fazia idéia do que estava acontecendo. Nunca tinha ofendido Hera, então porque ela me castigava daquela forma? Estava muito bem comendo meu McLanche Feliz quando senti minhas mãos vazias e os sons a minha volta que antes eram os ruídos habituais de Nova York serem substituídos por paços quase sincronizados e conversas ocasionais. Imediatamente levei as mãos a minha espada que sempre carrego, mas ela não se encontrava comigo. Minhas roupas haviam sido substituídas por vestes formais negras, meu anel não estava em meu dedo e meus dracmas também deveriam ter sido levados juntamente com meus jeans. Hera aparecera brevemente e não me dera explicações, tudo o que fez foi dizer “Aja como as pessoas ao seu redor filhote de Hades, não utilize de seus poderes porque a névoa não funciona aqui. Confisquei sua espada e você a terá de volta no final se tudo der certo. Tente não destoar demais. Quando eu lhe ordenar, diga que se oferece como tributo e não faça perguntas para as pessoas.” Ela havia me arrancado de meu conforto, me causado prejuízo pelo McLanche perdido e ainda se achava no direito de falar-me como se eu fosse culpado por algo que estava sendo castigado de forma não suficientemente dura.

Ela havia me dito para não destoar, mas eu me encontrava como Lady Gaga em um convento. As pessoas daquele lugar, que ouvi das bocas que passavam chamar-se Distrito 11, tinham pele escura, cor de oliva, cabelos castanhos ou negros e olhos em sua grande maioria castanhos. Eu era completamente pálido como quem não vê o sol há muito tempo, meus cabelos eram pretos assim como meus olhos e entre os garotos de minha idade (sem contar, é claro, com meus anos passados no Cassino Lotus) eu parecia muito magro e pequeno. Como se minha aparência já não fosse o suficiente, Hera obrigou-me a me oferecer como tributo o que obviamente não acontecia com frequência. Pelo pouco que eu havia conseguido entender pelo vídeo e por fragmentos de conversas aleatórias, os Jogos Vorazes eram praticamente suicídio. O que me levava a mesma pergunta de sempre: Que diabos pretendiam os Deuses? Nós, semideuses, havíamos acabado de passar por uma guerra horrível contra os Titãs e não tivemos nem ao menos tempo para descansar!

Sim eu disse “nós”. Por mais lisonjeado que eu me sentisse por ter sido escolhido para uma missão pela rainha dos deuses, tinha uma impressão de que não era o único trazido pela deusa. Uma desconfiança que mais tarde se confirmou quando descobri que Percy, Thalia, Connor, Travis, Clarisse e Annabeth também estavam naquele evento chamado Colheita e assim como eu haviam se voluntariado.

– Nicholas Danjelo? – a voz de Sophia ecoou e zumbiu em meus ouvidos na mesa de jantar onde nos encontrávamos como se fossem as primeiras palavras em voz alta que ouvi em um longo tempo, o que provavelmente era o caso. Quando levantei meu olhar para seu rosto extremamente maquiado ela sorriu de forma radiante e continuou. – Eu fiquei realmente emocionada quando se ofereceu, isso não acontece com frequência no 11. É bom saber que ainda existem aqueles com o verdadeiro espirito dos Jogos Vorazes. – ela tinha um sotaque afetado e se vestia como aquelas cantoras de POP bizarras, só que ainda pior.

– Sim. – eu disse em um tom seco que pareceu passar despercebido para ela.

– Nicholas Danjelo. Um nome estranho para um garoto estranho. – Chaff falou com um ar interrogativo e zoado ao mesmo tempo. Meu mentor sem dúvidas me odiava, a não ser que sua postura fosse efeito do álcool. – Nunca vi alguém tão pálido assim, como alguém do Distrito 11 pode parecer nunca ter visto o Sol na vida? Mesmo na Capital sua cor deve ser considerada anormal, muito pálido, quase doentio, nada que alguns dias quentes na arena não resolvam. Imagino que não tenha comido muito bem ultimamente ou talvez esteja assim por conta dos Jogos, mas você se ofereceu como tributo então deveria estar nervoso.

Lembrei-me com certa amargura dos discursos de Deméter sobre como cereais são importantes no desenvolvimento de um garoto e sobre como teria uma aparência muito mais saudável se comesse mais.

– Não estou nervoso. – eu disse vagamente bebendo mais um gole de meu chocolate quente. Por um momento consegui imaginar que bebia néctar no Acampamento. – E também não tenho tido problemas em comer nos últimos dias.

– De qualquer forma, é melhor comerem enquanto ainda podem. Não se sabe quanto tempo podem ficar sem comer quando chegarem à arena, o que me leva ao primeiro e mais importante conselho. – ele se inclinou sobre a mesa para se aproximar de nós. O sorriso que se abrira em seu rosto segundos antes desaparecera por completo, Chaff revelava em seu rosto o quão sério estava. - Nenhum dos dois é grande ou atlético, morrerão rapidamente se chegarem perto da cornucópia. Quando os Jogos começarem, fujam. – ele deixou aquelas palavras pairarem no ar, e nem eu nem Rue ousamos quebrar o silêncio tenso que havia se instalado. Eu não tinha medo dos Jogos, era um semideus, e embora Chaff não soubesse, eu poderia facilmente matar todos os outros vinte e três tributos da mesma forma que ele venceria uma luta com quatro crianças enérgicas, mas não disse uma única palavra sobre o assunto. Novamente me perguntei o que Hera tinha em mente. Ela esperava que parássemos essa carnificina doentia? E se era isso que pretendia como esperava que este objetivo fosse alcançado? Se não podia utilizar de minha espada ou de meus poderes como diabos eu iria mudar a merda do mundo do futuro? Além de que com sete semideuses juntos na arena não sobraria apenas um vencedor, nós não iriamos nos matar.

– No final dos Jogos, se conseguirem se esconder por tempo suficiente, não tentem lutar diretamente com aqueles que sobraram mesmo que eles pareçam enfraquecidos, vocês não sabem lutar, devem se concentrar no que são realmente bons. – Chaff não fazia ideia de com quem estava falando. Certamente era um bom conselho para Rue, mas não para mim. – No Distrito 11 conhecemos muito mais de ervas e plantas do que alguém de qualquer outro distrito. Concentrem-se em se lembrar ao máximo de tudo o que já viram no 11 e levem isso para a arena. Prestem atenção nos treinamentos, escolham uma única arma e treinem com ela todos os dias. O mais importante não é usar muitas armas, o importante é saber usar bem ao menos uma arma.

Com o canto do olho vi Rue engolir em seco. Como podiam levar uma garota de doze anos para uma matança? Como podiam levar qualquer um daquele Distrito miserável para uma matança? Como podiam promover uma matança e trata-la como motivo de comemoração? Ninguém naquele lugar era um guerreiro, e ninguém naquele lugar poderia se tornar um guerreiro de repente. Vencer os Jogos para qualquer um deles era algo completamente surreal. Para vencer precisariam de muita sorte.

“Feliz Jogos Vorazes e que a sorte esteja sempre ao seu favor!” – essa frase ridícula... Essa sorte não estava ao favor de todos esses jovens sorteados para morrerem num banho de sangue. E por algum motivo eu duvidava que a sorte estivesse com frequência ao lado deles mesmo longe dos Jogos. O Distrito 11 não era um lugar que poderia ser chamado de um bom lar ou coisa parecida. Eu me recordava de ter visto as pessoas andarem como se temessem algo a todo tempo. Quase como se um passo em falso pudesse causar suas mortes, e eu entendia muito bem sobre isso, pois afinal sou um semideus. Já vivi situações em que um passo em falso poderia causar não somente a minha morte, mas a de outras pessoas. No entanto, não me parecia certo que gente normal que nada têm haver com deuses e monstros tivessem que temer a cada segundo do dia o que um mínimo erro poderia causar à suas famílias e amigos. Era triste, era doentio e o Mundo Inferior me parecia aconchegante naquele momento.

Rue levantou seus olhos e por um momento nossos olhares se cruzaram. Naquele momento senti o peso do mundo cair sobre meus ombros. Aquele rosto, aqueles olhos dourados...

“Hazel...” pensei naquela minha irmã romana e pensei tê-la visto em Rue, provavelmente eu estava enlouquecendo, pois Hazel não estava ali, aquele não era seu rosto e aqueles olhos não eram dourados. Ali havia apenas uma garotinha que eu nunca tinha visto antes, pequena demais para ser minha irmã. Mas por algum motivo Rue me lembrava de uma forma exagerada Hazel, eu tinha vontade de clamar pela minha irmã, mas ficar calado naquela situação era a melhor opção.

– Nicholas, você está bem? – perguntou Chaff em um misto de curiosidade e reprovação, provavelmente meu rosto esboçava algum tipo de terror. Ele realmente não gostava de mim.

– Sim... – falei desviando o olhar. – Só confundi Rue com uma pessoa.

– Quem? – perguntou Rue olhando em meus olhos.

– Minha... – eu não sabia se dizer aquilo me traria algum problema, mas sendo encarado por Rue daquela forma não conseguiria mentir. – Minha irmã. – completei me voltando novamente para minha caneca de chocolate quente.

Eu esperava que aquilo desse o assunto como encerrado e voltássemos para o silêncio anterior onde tudo que se ouvia era o sutil ruído produzido pelo movimento do trem, um som quase imperceptível que por este motivo me pareceria agradável devido às circunstancias.

– Ela se parece comigo? – Rue perguntou quebrando meu precioso silêncio.

– Sim. – disse, movendo-me desconfortável. – Mas é um pouco mais velha e tem olhos dourados.

– Difícil acreditar que tenha uma irmã que se pareça com ela. – disse Chaff bebendo um longo gole de algo que com certeza continha álcool.

– Não temos a mesma mãe. – respondi em um tom que encerrava a conversa e me levantei. – Estou sem fome.

– Onde estão seus modos? – perguntou Sophia indignada, mas não fiquei tempo o suficiente para ouvir o resto, a ultima coisa que vi foi que Chaff e Rue haviam se voltado para seus pratos. O mentor comia com apetite, não estava preocupado comigo com certeza, não deveria se importar se eu morreria ou não. Mas deveria se preocupar com Rue. Imaginei se garotinhas caminhando em direção à uma morte violenta e sangrenta já havia se tornado parte de seu cotidiano para que agisse daquela forma ou se ele simplesmente não queria demonstrar o que se passava em sua mente conturbada. Bianca era apenas um ano mais velha quando ocorreu aquele incidente e Hazel tinha treze em sua época, mas ela estava de volta e mesmo que a conhecesse há pouco tempo já se tornara importante para mim, ela era minha responsabilidade. Rue se parecia tanto com ela, eu não poderia aceitar que morresse sem fazer nada, naquele momento decidi que a protegeria como se fosse minha própria irmã que me esperava no passado. Não deixaria que Rue tivesse o mesmo destino que Bianca.


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