“Talvez o problema sempre estivesse nela”.

Esse foi o pensamento da mulher ao olhar a noite estrelada, talvez se não tivesse sido tão firme e exigente, teria dado outro rumo para sua vida. E logicamente para a vida de Goku.

Lembrava da primeira vez que o viu, tinha sido trapaceada por Yamcha, então logo apareceu aquele menino numa nuvem voadora...

Com um rabo estranho e atitudes impertinentes, tão inocente o seu Goku.

Ela não devia ter o pressionado tanto para esse casamento, ainda mais porque o homem simplesmente não sabia o que significava esse compromisso.

Mas como lutar contra o coração? Chichi tinha criado seu mundo futuro todinho com Goku, o amava.

Talvez apenas merecesse o fato dele ser tão ausente, se ela não tivesse se “aproveitado”, nada disso teria acontecido.

Chichi suspirou.

O problema podia estar nela, mas não se arrependeria. Nunca.

Goku tinha uma criação impecável, era o homem da casa na medida do possível e ainda tinha lhe dado Gohan.

Seu filho tão amado, nunca o teria com outro. E era o que existia de mais importante em sua vida.

Claro que estavam propensos a tornarem o menino um delinqüente, mas ela não permitiria! Após a luta contra Cell — que já tinha deixado clara, ser a ultima de Gohan —, eles finalmente voltariam a agir como uma família normal.

Da forma que eram antes dos saiyajins chegarem a Terra.

Só que alguma coisa em sua mente, avisava que não seria assim.

Sentiu um vento que lhe causou calafrios, lembrou-se de Bulma e aquele pequeno bebe inocente. Obviamente sua mente focou no mirai Trunks, que estava ali para lutar também.

Tinha se tornado um fraudulento, claro, sendo filho de quem é!

Ela tinha que ter passado para Bulma os truques que evitavam uma gravidez, ah não, ela não tinha experiência como a cientista. Mas nem todo estudo de Bulma seria capaz de prever como se poupa uma gestação de saiyajin. Afinal simples remédios e preservativos de nada adiantariam.

E Chichi soube disso na pratica.

Mas como ela iria prever?

Como ia imaginar que a amiga iria se juntar ao inimigo? Francamente Bulma já foi mais inteligente, se deitar com aquele assassino?

Mas o que estava feito, feito estava.

E o bebe não tinha culpa.

Por algum motivo, cada vez que estava perto daquele pequeno, sentia algo estranho, uma sensação que conhecia, mas que há anos não sentia.

Era completamente esquisito. Principalmente o fato de não lembrar quando sentiu algo do tipo.

Como se ela correspondesse a ele, mesmo quase não o pegando.

Um tremor estranho que invadia suas entranhas, uma resposta.

Olhando o anoitecer que caía, forçava sua mente para encontrar a razão dessa interação com o pequeno filho de Bulma.

Pensou por um instante, recordando que logo Goku estaria em casa, sentiu no corpo um leve aquecimento e suas faces esquentaram. Não era um constrangimento, era apenas... Ansiedade.

Desde o café da manha, almoço e esbarros, Goku tinha dado indiretas sobre uma possível conversa noturna... De fato era ansiedade.

Principalmente levando em conta que na manha seguinte iniciaria o torneio de Cell, então por mais que tivesse contragosto com relação a essas lutas, Chichi sabia que nada adiantaria falar. Afinal seu marido precisava lutar para viver, era como um alimento.

Um péssimo alimento.

Tocou o rosto, tentando dissipar o calor, lembrou-se novamente da luta que viria.

Goku tinha garantido que Gohan não iria lutar, ele prometeu a Chichi... Mas a duvida era se manteria essa promessa. Não queria seu filho arriscando a vida pelos outros.

Era apenas uma criança inocente.

A mulher sentiu a tensão do estresse pesando seus ombros, e fez uma rápida massagem no local enquanto sentava-se num banco de madeira em seu quintal.

Fazia questão de deixar clara a importância dos estudos de Gohan, pegar no pé, gritar e espernear.

Era um modo automático de proteção. E significava na verdade, que ela apenas não queria perdê-lo. Não queria estar só, afinal já tinha o marido ausente.

Não queria correr o risco de ver sua família evaporar.

Escolas e estudo era apenas uma desculpa para algo bem mais serio.

Ela era ótima com blefe.

Mas tinha consciência que Goku entendia suas reais razões. Então o resto não lhe importava.

Sentiu um leve tremor abaixo do ventre, e tocou o lugar enquanto suspirava.

Era um ato simples e feito de forma impensada.

Mas não evitou que sentisse algo estranho a esquentar.

Será que...

Essa conexão estranha ao bebe de Bulma.

Uma sensibilidade forte e diferente, já que ela era sempre durona e previsível.

O corpo avisando de que não estava tudo normal, não estava igual.

Será que...

Ela estava se preocupando muito com tudo, e esquecendo-se dos avisos. Os pontos desatados onde se encaixava a duvida, ou nesse caso, a certeza.

Era isso. Era exatamente isso que martelava sua mente.

Estava grávida!

Tinha certeza mesmo sem exames para comprovar.

Certeza porque foi exatamente desse jeito que aconteceu com Gohan, certeza porque se sentia vinculada ao pequeno Trunks, da mesma forma que o bebe parecia estar ciente de algum semelhante vindo.

Como isso pode acontecer?

Ela sempre foi tão cuidadosa, sempre dedicada, sempre vigiando para que tudo ocorresse da forma mais clara possível. E tinha falhado em algo.

Não, não o ser que crescia em seu ventre... Ele não tinha culpa. Mas ela falhou. Não era à hora.

Nunca seria a hora certa.

Jurou internamente que não seria responsável por semear delinqüentes no mundo. Jurou que isso começaria e terminaria com Gohan.

Mas daí veio Trunks, e agora ela era tão culpada quando absolvida.

Agora ela sentia o coração explodir em mil pedaços, era um sentimento mais tolo e puro que existia: Amor.

Podia haver mil fatores para provar que ela falhou.

Mas nenhum deles poderia suprir o amor imensurável que já crescia em seu interior, algo primitivo e lindo.

Seu filho.

E então como uma verdadeira mãe, sentia necessidade de ir ao torneio no outro dia. Destruir Cell e trazer Goku e Gohan para casa. Prendê-los ali ate que o novo bebe nascesse. Então viveriam como uma família unida para sempre.

O bebe merecia isso. Ela merecia.

***

Quando Goku voltou para casa com Gohan, estranharam tanto silencio no jantar. Geralmente a mulher era mais faladeira, só que ali estava. Quieta em seu mundo fechado.

Chichi optou por guardar a informação. Nunca se perdoaria se fosse responsável por tirar a atenção de Goku e Gohan na luta, com a novidade de um acréscimo na família.

Quando eles voltassem, ela...

Pensar nisso lhe dava calafrios. Não estava normal. O ambiente tinha quebrado a sintonia.

Algo aconteceria, e a certeza era tanta que tirava seu sono.

Sentiu os braços fortes de Goku a apertarem, era o aviso para que ela aquietasse e dormisse.

— Vai dormir Chi. — ele murmurou.

— Não consigo.

Seu coração batia tão forte, tão rápido que era possível que Goku estivesse ouvindo. O abraço dele se fechou ainda mais, a mão grande estava pousada em seu ventre. Como ele não percebia?

Ela mesma sentia o local vibrar de uma forma diferente. Como se o pequeno estivesse o tempo inteiro ansiando atenção, principalmente agora que ela tinha se atentado a sua presença.

Então na verdade tudo estava vibrando, pois ela estava tremendo por inteira.

Ouviu o marido suspirar, e isso fez seu cabelo agitar.

— Vai dar tudo certo. Você esta diferente, seu KI esta alterado.

Ela queria espernear como uma criança, gritar em alto e bom som.

Não era o KI dela que estava alterado, o alterado era o KI de seu filho, do seu pequeno bebe guardadinho que era destacável. E não estava tudo certo! Não ia ficar.

Droga... Ela não...

— Goku, vamos embora. Vamos fugir agora. Eu, você e Gohan. Vamos...

— Chichi não vou fazer isso.

— Podemos nos salvar.

— Não vou fugir, estão contando comigo, é o futuro de todos e não somente o nosso.

— Eu só queria... — ela suspirou.

Engolindo o choro que ameaçava iniciar.

Goku a virou de frente para ele, dando um beijo em sua testa e outro nos lábios.

— Vai dar certo, confie em mim.

— Tudo bem.

Ela murmurou fechando os olhos e o abraçando com toda força, deixando o cansaço sucumbir seu corpo.

***

Goku não voltou quando todos retornaram.

E serviu apenas para comprovar o que Chichi sentia, uma espécie de premonição na noite anterior a aquela luta.

Cada um foi para seu canto, Gohan estava em casa para seu alivio.

E ela esperou na porta.

Esperou que não fosse real.

Esperou que ele apontasse a qualquer momento no céu, dando seu sorriso abobado e avisando que estava com fome.

Como ele podia ser tão egoísta? Como ele podia não voltar? Não querer voltar.

Na verdade ela nem se surpreendia mais, afinal era Goku.

Mas isso não impedia que sentisse esse vazio, essa dor que a saudade criava...

Ela respirou fundo, sentada ao lado do berço, admirando seu pequeno bebe.

Estava velando o sono de Goten, quando sentiu a mente vagar meses antes. Para o dia que teve certeza sobre sua gravidez, para um dia antes do torneio Cell.

Nossa, parecia ter passado anos, e, no entanto eram no máximo dez meses. Todos tinham evoluído, Gohan amadurecido tanto, os remanescentes unidos. Um novo saiyajin chorão.

Ela não sabia que era possível amar tanto novamente, não imaginava que conseguiria dobrar o tamanho de seu coração para caberem os dois filhos e mais Goku.

Sentia-se completa, mesmo faltando algo.

Sabia que Goku a via de certa forma, e mesmo assim, o homem sempre estaria em seu coração. O amava com a própria vida e isso nunca mudaria.

Gohan sempre seria seu filhinho responsável... Mas Goten...

Goten era igual a Goku, idêntico em aparência, em gestos, expressão e jeito. Era exatamente o que Chichi precisava.

Goten... Seria apenas para lembrar, o que ela nunca poderia esquecer.