Cinderela às Avessas escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 25
A gata borralheira sente falta do que perdeu




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Ela já tinha participado daquela festinha algumas vezes. Antes de irem passar o réveillon com suas famílias, a turma gostava de se reunir para darem uma pequena festa. Só que daquela vez ela não era um deles. Era apenas uma amiga que Cascuda tinha convidado. Ninguém ali a conhecia mais.

– Meninas, essa é a Carmem, minha amiga.
– Oi, Carmem! – Mônica cumprimentou junto com as outras procurando ser simpática.
– Oi, prazer em conhecer. – Carmem respondeu meio constrangida. Era tão estranho estar sendo apresentada a pessoas que ela conhecia desde a infância! Ela conhecia todos, mas ninguém ali se lembrava dela.

No início ficou um clima meio estranho por causa daquele dia em que ela apareceu na frente deles parecendo uma louca desvairada. A moça se sentia em clara desvantagem pois não era mais a garota rica e mimada. Sua situação era outra: uma empregada doméstica lutando para sobreviver e sem mais ninguém no mundo. No fim, todos foram gentis e aos poucos ela foi se sentindo mais a vontade. Ninguém lhe tratou com pouco caso como ela esperava.

Os rapazes até se interessaram porque apesar de tudo, ela ainda era muito bonita. De vez em quando Cebola lhe lançava alguns olhares e ela procurava ficar longe dele o máximo possível. Se a Mônica implicasse com ela, tudo estaria acabado.

– Ei, não precisa ter medo dos meninos! – Cascuda falou tentando acalmá-la.
– Preciso sim! Viu como o Cebola ficou me olhando? Já pensou se a Mônica arma barraco com ele por minha causa?
– Calma, não precisa apavorar. Ah, olha! A Irene chegou e ele foi lá conversar com ela. A Mônica vai ter outra coisa com que se preocupar. Agora tenta aproveitar um pouco a festa, né?

Cascuda estava certa. Apesar dos pequenos incômodos, a festa estava muito boa. Quim preparava um churrasco, havia refrigerantes, salgados e docinhos. Uma música agradável tocava num volume confortável e todos conversavam alegremente. Quando foi se servir de alguns salgados, Carmem viu que Maria Melo se contorcia diante da mesa, querendo e ao mesmo tempo não querendo devorar aquelas delícias.

– Por que não come? – Carmem perguntou. – Você não vai engordar só porque comeu uma coxinha.
– Ué, como sabe que eu tenho medo de engordar? – a outra perguntou surpresa.
– Porque eu também tenho, né?
– Só que eu quero ser modelo e até enviei fotos praquela agencia super badalada da cidade! Será que dessa vez vão me aceitar? Cansei de ser rejeitada, ai que dor!

Carmem acabou ficando com pena da amiga e aquele incômodo aumentou ainda mais. Seria justo ela conseguir ser modelo tão facilmente e ainda por meios desonestos enquanto a pobre da Maria Melo quase se matava para realizar seu sonho?

Mais adiante, ela viu Mônica fazendo cara feia, para variar. Era porque Cebola estava de papo com a Irene. Sempre a Irene!
– Grrrr! Aquele folgado tá afim de começar o ano com a cabeça cheia de calos, não é?

“Hehe, antes ela do que eu!” Carmem pensou aliviada por não ser motivo de briga entre aqueles dois.

Em outro ponto da festa, ela ouviu o Cascão conversando com os rapazes.

– E no fim era a minha prima Tonica que tinha aprontado aquilo tudo. Véi, tem algo errado no gene da minha família, fala sério!
(Xaveco) – E vocês andaram numa nave espacial?
(Ninbus) – Enfrentaram vilões? Que doido!
(DC) – Blé, nem foi grande coisa!

“Puxa, eles tiveram outra aventura e eu nem fiquei sabendo!” ela ficou chateada por se ver a margem de tudo. Trabalhar naquela casa lhe deixava praticamente isolada do mundo porque ela não podia mais ver televisão, ouvir rádio ou mexer na internet. Como tinha pouco dinheiro, também não podia sair. Seus únicos passeios era ir a casa da Cascuda e só.

– E aí, gatinha? A gente não se viu no natal, mas podemos passar o ano novo juntinhos! – Toni falou com seu jeito cafajeste de sempre, deixando-a irritada.
– Sai pra lá, Mané! Ela não quer nada com você! – Titi falou aparecendo de repente e os dois começaram a discutir, deixando Carmem muito desconfortável.
– Gente, eu não quero ficar com ninguém hoje não, tá?
– Ah, qualé! Olha só esses músculos! Você vai recusar? – ele falou tentando colocar um braço ao redor do ombro dela e sentiu um forte apertão no pulso.
– Sim, ela vai recusar, seu tosco! – Mônica falou muito zangada. – Eu não vou te bater porque é ano novo, mas pára de encher o saco!

Os dois se afastaram e a festa seguiu seu curso. Muito curiosa com a nova garota, Denise se aproximou para conversar e logo estavam papeando como se conhecessem há muito tempo, o que era verdade embora Denise não se lembrasse.

– Menina, que bafão! Então a Super Zoom vai tocar na festa dos seus patrões? Me quebra um ovo que eu tô chocada! – a conversa logo chamou a atenção das outras garotas.
(Isa) - Você vai ver aqueles gatinhos de perto? Ai que inveja!
(Magali) – Eles são lindos e cantam muito bem!
(Mônica) – Agora fiquei com vontade de ir. Pena que precisa pagar!
– Pois é, a festa é pros ricaços fazerem suas doações pra caridade.
(Denise) – Eles bem que podiam fazer a caridade de me deixar entrar. Ai, vou chorar litros!

Ao ouvir a conversa, Cebola fez cara feia e disparou.

– Bah, eu não sei o que vocês vêem naqueles babacas! Eles são uns otários, isso sim!

Vários olhares furiosos se voltaram para ele, que se encolheu todo e saiu dali discretamente. Elas voltaram a conversar animadamente de novo e depois de um tempo, Carmem já se sentia parte da turma novamente.

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Creuzodete passeava na beira da praia aproveitando que o movimento estava menor. Dentro de algumas horas, ia ficar lotado de pessoas. Ela pensava em Carmem e em como ela ia resolver aquele problema. Era um grande dilema moral e não havia como prever o desfecho das coisas.

“Será que ela vai fazer alguma coisa ou o egoísmo será mais forte? Confesso que nem eu sei dizer. Mas estou bem curiosa!”

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A festa tinha acabado há um tempo e cada um foi para sua casa passar o ano novo com suas famílias. Carmem também ia para a casa da Cascuda, mas quis passar em um lugar antes.

“Será que eles vão passar o ano novo aqui? Ai, que saudade!” a visão familiar da sua casa fez com que algumas lágrimas surgissem em seus olhos. Nunca seus pais fizeram tanta falta quanto naquele momento em que ela estava desamparada, coagida, sozinha e precisava do apoio deles.

No início, ela sentia falta da boa vida que levava. Embora isso ainda lhe fizesse falta, a saudade dos seus pais era maior. Será que tudo aquilo teria sido evitado se ela fosse boa filha? Talvez, se tivesse feito algumas coisas diferentes, ainda estaria com sua família. Como será que eles estavam agora? Como era a vida deles sem ela como filha? Estava melhor ou pior? Não havia como saber.

Carmem olhava a frente da mansão na esperança de que eles chegassem ou saíssem de carro. Assim ela poderia vê-los ao menos um pouco. Ao pensar que ela nunca mais ia ter sua família de volta, o choro se tornou incontrolável. Como ela queria poder voltar para casa!

A saudade era tanta que ela se sentiu capaz de renunciar a carreira de modelo para trabalhar naquela casa como empregada e assim poder ficar perto deles. Claro que nesse caso, ela não seria tratada como filha, mas isso nem importava mais. Ela apenas queria ter seus pais de volta nem que fosse só a presença física deles.

– Por que essa estrela não aparece, por quê? Eu quero voltar pra casa! Tô morrendo de saudade! – ela falou alto tentando enxugar as lágrimas que teimavam em banhar seu rosto. Uma mão pousou em seu ombro. Era Cascuda.
– Eu imaginei que você estivesse aqui. Ah, fica assim não, amiga!

Sem falar mais nada, Carmem abraçou Cascuda e desatou a chorar mais ainda. A jovem apenas tentava consolar a amiga enquanto evitava chorar também. Ela nunca tinha visto Carmem daquele jeito. A patricinha às vezes chorava porque quebrava uma unha ou quando alguma bolsa de grife se estragava. Era a primeira vez que ela a via chorar porque lamentava a falta de alguém. Era uma situação muito triste, e ao mesmo tempo uma surpresa saber que aquela garota mimada tinha um coração afinal de contas.


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