Nova Jersey, 1992

A mulher encarava cuidadosamente a paisagem de fora da sua janela. O céu estava cinzento, não se via a lua e muito menos as estrelas. A pequena garoa que caia dava um aspecto sombrio à paisagem. Mas ela sabia o que estava para acontecer, ela sentia que algo muito poderoso estava por vim. A energia que o ar transmitia não lhe dava duvida alguma.

Ela fecha as cortinas e volta a sua atenção a jovem que estava deitada em sua cama, se contorcendo de dor, por conta das contrações. A velha a examina novamente e percebe que logo ela iria ganhar a criança. Ela encara novamente a garota, tão jovem e ingênua, mal sabia que a criança dentro de si a estava matando por dentro. Mas não era culpa de ninguém, o amor faz a gente cometer loucuras, e pecados gravíssimos. O amor, uni espécies, raças diferentes, mesmo sabendo as consequências. Por que ele é maior que qualquer coisa, maior do que qualquer força obscura.

Um grito estridente ecoa pelo quarto. A garota sentia que estava na hora de seu filho nascer.

- Esta na hora. – escuta a velha dizer. – Empurre com todas as forças que tiver.

Ordenou-lhe. E assim ela fez. O suor descia pelo seu rosto, e algumas mechas loiras grudavam em sua testa. A dor era insuportável, ela joga a cabeça para trás e aperta ainda mais os ferros da cabeceira da cama.

Ela empurrava com todas as forças possíveis para que a criança saísse, mas pareciam em vão suas tentativas.

Um medo se apoderou dentro de si. Sua criança poderia morrer sufocada. Então várias lembranças se passaram em sua mente, sua infância, na época em que ela era apenas uma garota normal tentando se encaixar no mundo, quando descobriu o que realmente era e quando o conheceu. A imagem dele lhe dizendo o seu ultimo eu te amo, foi o que há fez ter força de vontade para salvar seu filho, salvar o fruto daquele amor.

- Isso, a cabeça já está aparecendo. – anuncia a parteira. – Só mais um pouco.

- Eu não vou aguentar. – a garota diz entre os gritos.

- Aguenta firme.

Então um raio cai sobre a mata de New Chance, juntamente com o barulho de um trovão, o som se misturou com um choro de criança. Um misto de alegria, alivio e tristeza se misturava no sorriso da exausta garota, que tinha acabado de dar a luz a uma linda menina.

A velha parteira enrola a pequena criança em um manto branco e estrega a mulher.

Instantaneamente a criança para de chorar quando sua mãe a pega no colo. Assim que a pequena garotinha abre os olhos, ela derrama lagrimas de várias emoções. Ela tinha os olhos do pai, um azul tão claro.

- Já sabe algum nome para ela? – a velha pergunta enquanto observava aquela cena.

Ela balança a cabeça positivamente.

- Vitória.

Aquela garotinha era a sua Vitória, mesmo que a batalha não tenha terminado, e que infelizmente haveria muitos dias de escuridão pela frente, ela era sua Vitória.

Uma pontada bate em seu peito. Ela sentia que não aguentaria. Uma tristeza invade, ela não teria oportunidade de ver sua pequena crescer. Mas sabia que um dia elas iriam se ver, em breve.

- Seja forte, minha Vitória. – fala baixinho no ouvido da criança.

A velha percebe o que estava preste a acontecer, retira a criança dos braços dela e leva até uma cesta que servia como um berço de improviso.

Ao voltar para o lugar de antes, viu que a garota encarava um ponto especifico do quarto, a janela. A velha vai até ela e tampa seus olhos. Agora parecia que ela estava dormindo.

Uma alma inocente se foi. Suspira pesadamente.

Então retorna novamente a janela, e fica surpresa ao notar que não chovia mais, e que o céu estava estrelado, e a lua estava coberta pelo sol. Um eclipse. Uma parte da profecia tinha se cumprido.

- Pobre criança, mal sabe o que lhe espera.

Diz suspirando pesadamente.

Ouve então batida na porta. Sabia exatamente quem era, e para quer vieram.

Ao abrir a porta se depara com um casal. Eles olhavam apreensivos para ela.

- Entrem. – dá passagem para eles entrarem.

- Onde ela está Judith? – a mulher pergunta olhando ao redor da pequena sala.

A velha caminha até o quarto e eles a segue. Assim que viram o corpo abatido na jovem, morta na cama, eles se assustam. A mulher abraça o marido e lágrimas derramam de seus olhos castanhos. Sua melhor amiga estava morta.

O homem tentava consolar a esposa, mas era triste ver aquela cena. Conviveram tantos anos com Luciana, ela também era sua amiga. Luci - como a chamavam- sempre tinha uma alegria refletida em seu rosto, e agora não havia nenhuma expressão nele.

- E a criança? – ele pergunta.

- Esta ali. – a parteira aponta para o pequeno cesto.

O casal caminha até lá, e se surpreendem quando vê aquele pequeno ser. A criança era idêntica aos pais.

- Ela se chama Vitória, a mãe lhe deu este nome antes de falecer.

Judith se pronuncia. Eles de entreolham e não ficam surpresos com isso, o nome era perfeito para aquela ocasião.

- Temos que ir Mariah. – Carlos fala para a mulher.

Antes de irem, Mariah caminha até a cama e se agacha, pegando as frias mãos de Luciana.

- Prometo que a cuidarei dela como se fosse minha. – diz, sabendo que em algum lugar ela estava escutando.

Carlos já estava com o cesto na mão, a criança dormia calmamente. Ela se levanta e caminha até a saída, Judith logo atrás os acompanhando.

A velha segura o braço do homem e o encara profundamente.

- Cuidem bem dela, ela é a única capaz de detê-los.

Depois disso, eles vão embora. Judith sabia que não demoraria muito para que eles fossem atrás dela, e esperava que quando esse dia chegasse à pequena Vitória esteja pronta para o embate.