Se não te mata, te acorrenta escrita por micoelho


Capítulo 2
Talvez, quem sabe


Notas iniciais do capítulo

Oie, tudo bem?

O segundo capítulo chegou, aleluia! Haha. Brincadeiras a parte, considero-o muito mais revelador e cômico do que o anterior. Talvez alguém diga que também é mais agradável. Bom, mas vocês só vão saber isso se lerem, e aqui está!

Aproveitem ✌



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Ainda madrugada de sexta-feira, 14 de maio.

Eram apenas letras em forma de pixels em meu celular, mas parecia que elas estavam rindo e caçoando de minha situação. Quando se tem 15 anos e diz isso durante a madrugada, dá a impressão de que sou uma drogada ou alcoólatra. Sem caretice, porém o recado é que odeio esses pré-julgamentos que vem junto com aquele sermão á favor de mais responsabilidade.

O que me tirou o ar negativamente foram as palavras ''Sim, A, preciso mesmo falar contigo.''. Tina vinha desviando sua atenção de mim de uma maneira bem fria, me ignorando de todas as formas possíveis. Eu tentava compreender o que teria causado essa pausa e porque logo agora, á duas semanas do meu aniversário, tudo de imprevisível resolvera acontecer. Era difícil não ficar relembrando a cada segundo o turbilhão de problemas que rodavam em volta de minha cabeça.

Mas, andando através daquela rua em Sarah's Ville, meu antigo bairro, se sobressaiam as palavras e gestos daqueles que eu quis muito perto e agora não sei definir o que farei sobre. Eu perdi minhas principais apostas em pouco tempo e agora caminhava em direção á um lugar onde provavelmente não teria a chance de fazer nenhuma jogada.

A casa dos Grail era um exemplo de moradia familiar: um muro pintado no mesmo amarelo que encobria as paredes e com grades, portas e tudo mais em branco. Me aproximei. Não foi necessário tocar a campainha porque bem ali, num pequeno espaço entre seu jardim da frente bem cuidado e a calçada, encontrava-se uma menina que eu não via há muito tempo. Mesmo assim, seus cabelos de um loiro médio natural encaracolados eram tão facilmente reconhecíveis quanto os olhos gentis. Seu sorriso mesmo inexistente revelava que era dono de um gigantesco coração. Tina.

Eu sabia que estava diferente dela naquele momento. Havia tomado um banho de chuva e uma enxurrada de decepções em poucas horas. Revelava insegurança no que trajava, em como andava de um jeito vazio e nos poucos olhares fracos que consegui lhe dar. Ela parecia rebater tudo isso e controlar os extintos para não me expulsar. Afinal, Tina iria fechar com seu tapa em minha cara a noite.

– Hamilton, há quanto tempo. Me desculpe, mas você está detonada! - ela falava isso da maneira maliciosa que veio á aparecer á seis meses atrás.

– Não consigo me ver, T, fazendo mais nada nesta madrugada do que escutar lamurias.

Então ela parou. Pelo visto tinha pensado bastante em como fazer isso, porém a forma como ajeitou o corpo e tentou restabelecer a voz denunciava que seu lado mais frágil e carinhoso do que o atual estava prestes á sair.

– A, eu deixei que viesse aqui mas também tenho meus motivos.

– Imagino que seja relacionado ao gelo que está me dando diariamente.

Uma risada de deboche dela fraquejou e ficou no ar entre nós. Com um sinal de sua mão, acompanhei-a para dentro dos muros e depois através dos jeitosos cômodos - sem ninguém até então - que se seguiam até seu quarto. Eu conhecia muito bem aquele espaço cor-de-rosa, porém agora ele estava com algumas coisas diferentes. Tinha sensação de que estava perdendo algum detalhe. Quando o achei, bom, aí quis que ele não existisse.

Por cima de umas fotos antigas e no lugar onde estavam antes alguns de seus posteres, haviam quadros e panfletos de uma campanha anti-depressão. Papéis com dietas alimentares, programas de exercício e artes. Ficou óbvio que o problema era algo além das futilidades juvenis.

Observei tudo com os olhos arregalados e boquiaberta, mas sem conseguir expressar nada que não o meu espanto. Não queria ser indiscreta, o que não quer dizer que alguma parte do meu corpo obedeceu á este comando. Já estava inquieta, olhando Tina na esperança de que ela fosse dizer que era assistente do projeto ou apertar um botão para as câmeras e a equipe de um reality show saírem de dizendo que é uma pegadinha e tal.

– Alice, você não é a única com problemas. Nunca foi, nunca será. Eu poderia dizer que até não os tem.

– Deixou eu vir para competir quem tem problemas? Por que não falou nada antes?

Não sabia se tinha ido longe demais nem o motivo daquelas palavras minhas me ofenderem mais do que em quem deveria surtir tal resultado. Tina olhava em volta, porém não consegui decifrar sua feição. Era uma mistura de orgulho e ódio. Ela cruzava os braços e os descruzava com agonia.

– Sabe, por muito tempo eu achei que você estava certa. Na verdade, desde o momento que a conheci decidi que me tornaria fechada. Passar o tempo com a Hamilton, garota de ferro, era um hobbie e uma honra. Mas não cumpri a promessa que fiz a mim mesma: eu continuava a mesma idiota, tentando te defender perante os insultos dos quatro cantos e me proteger de tudo mais que passei a atrair quando me juntei a ti. Eu era fraca.

– Nunca me disse que te fazia mal ser minha amiga, nem me dera a chance de impedir isso tudo.

– Pois é, mas o que a grande Alice ia ter feito? Não vê que seu jeito covarde de se esconder afeta os outros que estão por perto? - me senti prensada contra a parede a cada frase dita do jeito maçante como ela as dizia - O pior jeito, querida, de lutar contra isso que a faz tão mal é não ter o que esconder. É assim que eu vivo agora. Já me fez coisas horríveis tomar suas dores também.

– Como acha que me sinto?

– Eu me importo com as pessoas de verdade, A. Aprendi a me amar também. Agora eu ajudo outros com os mais diferentes problemas.

– Tina, eu admiro sinceramente sua superação...

– Espere, não acabei. Depois você se lamenta, o que é totalmente justo á nós. Continuando: passei seis meses longe de alguns amigos, menos Dave. Seu apoio e o da minha família foram extremamente importantes, como diz nos panfletos, sabe? Mas o Saxton vivia me importunando para lhe falar disso tudo, te perdoar. - comecei a escutar mais avidamente - Usei essas 24 semanas para varias coisas, uma delas foi pra pensar: será que eu quero me destruir de novo?

– Eu não sabia disso tudo! Nunca faria nada de mal á você!

– Não se preocupe, Alice, eu não preciso da sua proteção. Mudei. Você depende mais de mim, acredite. Acho que sou capaz de te modificar. Porém não agora, querida. A hora certa chegará. Por enquanto, eu convivo contigo de boa vontade. - esboçou um leve sorriso que sumiu instantes depois, sem graça.

– Tina, me modificar? Não estou acreditando nisso. Olha, querida, me faz muito mal ver o quanto sofreu e como sou culpada pela crise de uma maravilhosa amiga. Me despedaça ver isso. Me alivia enormemente, no entanto, que esteja tão bem. Preciso de um tempo para processar isso tudo, desculpe. Essa pena enorme. - não consegui mais encara-la. Meus sapatos estavam mais agradáveis.

Um barulho de carro no lado de fora e do portão se abrindo anunciou a chegada de seus pais. O Sr. Grail era muito gentil, assim como a mãe de Tina. Ela olhou pela janela e em seguida para mim, de uma forma diferente do que no princípio disso tudo. O peso em suas costas desaparecera. Sua confiança ainda estava lá, mas os seus olhos voltaram a brilhar daquela forma suave que eu havia conhecido 7 anos atrás.

– Vou arranjar uma carona, Tina. Te ligo e falamos mais amanhã.

Mandei uma mensagem para Dave perguntando se ele podia vir. Agora não era eu quem encarava o chão e os detalhes dos cadarços. Enfim reparei que sua roupa indicava que ela havia saído por aí antes de me encontrar e descartar as mágoas. Como se estivesse adivinhando meus pensamentos, ela falou:

– Tenho novos amigos, A. Sou capaz de falar com os outros sem temer.

– Fico muito feliz por isso!

– Sei que sim. Esperava por isso. Quero que saiba, Alice, que mesmo com tudo, você sempre soube amar as pessoas. Eu tive a sorte de ser uma delas.

– Que bom que reconhece. - amoleci

– Saiba, querida, que eu continuo te adorando.

– Um carinho ou uma piedade? - ela gelou.

– Um carinho, Alice. - riu, zombeteira.

Nesse minuto Eddie me ligou. Instantaneamente me preocupei com Dave, já que meu irmão era muito amigo dele também e os dois tinham ido á um show juntos nesta longa noite.

– Dave está bêbado o suficiente para não dirigir. Não sei por que precisa tanto dele e não me diga nada sobre sua vida amorosa.

– Eddie, cala a boca!

– Qual é, tá na cara que vocês dois...

– Não, não tem nada! Escuta, pode vir na casa da T me buscar?

– Posso, mas só se você pedir ''Por favor, ó grande poderoso mestre...''. - suspirei bem alto - Ok, eu vou!

– Acho bom.

– Voltando ao Dave,...

– Tchau, Eddie, tchau.

Acontecem coisas assim quando o seu irmão é 3 anos mais velho que você, ou seja, da idade do seu melhor amigo, e os dois se falam muito. Anos atrás rolou um boato de que Eddie e Tina se pegavam, e ficou isso por um bom tempo, até que ele saiu da escola para a faculdade. Sinceramente, foram dias cômicos aqueles em que T ficava vermelhaça diante de Ed. Ao olhar para ela naquele instante atual me revelou ela corando de novo.

– Olha, Ed está vindo me buscar com Dave.

– Ahn, ele vem?

– Ele quem? - e T ficou mais corada.

– O Dave, dã! - sorri para ela, maliciosamente - Você não muda, cara! A, estou esperando você me ligar. Precisamos conversar

– Tina, saiba que eu respeito a sua mudança. Com isso tudo, gosto muito de você também. Mas por favor entenda que vai levar tempo para nós duas nos acostumarmos com isso, ok? - não compreendi o que se sobressaia em mim: confusão ou nostalgia - Eu passo aqui para irmos, sei lá, tomar sorvete?

–Parece que a Alice aí está voltando á antigamente. - foi irônico, porque eu pensava a mesma coisa sobre ela.

Rimos bastante disso, tirando a tensão. Ela me contou que tinha visto umas coisas para sua festa de 16, o que me fez lembrar do meu aniversário. Aquilo tudo havia me feito ficar de cabeça para baixo, então esqueci que a data se aproximava. Sinceramente, não tenho planos para esse dia.

A conversa não foi muito longa. Vimos o Eddie estacionando o carro em frente á casa dos Grail, então descemos. Os pais de Tina pareceram surpresos com a minha visita, porém o tempo que tive era curto, sabendo da boa vontade de Ed. Os cumprimentei de longe, passando pela sala de estar, onde estavam.

Tina abriu o portão, esbaforida. Logo vi que Eddie andava em círculos, ajeitando o cabelo atrás das orelhas. Ambos vermelhos. Procurei socorro no esportivo de meu irmão, olhando fixamente para o banco traseiro onde Dave estava se levantando. Pela sua cara amassada, estivera cochilando. Uma conversa atrás de mim começou de um jeito bem nervoso, como se as palavras saíssem empurradas da boca de T e Eddie. Os dois eram bem tímidos quando por perto um do outro.

– Então a Alice voltou para te encher o saco, hein?

– Ah, típico da Hamilton. Mas só dessa Hamilton. - T olhou de uma maneira simpática para mim, e depois voltou-se á meu irmão, que tinha o mesmo sorriso sutilmente carinhoso que ela nos lábios - É muito bom te ver, Eddie.

– É, estava ficando com saudades. Sabe, deveríamos acabar com isso, né? Que tal sairmos amanhã?

– Hm, só se a A me liberar. - estranhei a intimidade maior do que eu esperava entre os dois, mas gostei tanto dela quanto a que estava voltando entre mim e minha melhor amiga.

– Gente - eu disse -, esse é um país livre!

– Ah, então tá fechado. - Ed completou, olhando para Tina.

Dei um sorrisinho discreto para Dave e ele pareceu entender o que quis dizer: não eram só boatos. Nossa comunicação mental foi interrompida quando ele disse:

– Espero que tenha sobrado alguém aí para me levar em casa, sabe. Alice está na mesma que eu.

– Pois é, Eddie, vamos! - falei já entrando ao lado de Dave.

Meu irmão se despediu meio sem jeito. Observei que ele não é assim com todas, muito menos Tina, que retribuiu o abraço apertado. Me perguntei o porquê daqueles dois não estarem juntos, e a resposta chegou tão rápido quanto desfez meu sorriso: eu era o motivo. A onda de infelicidade me invadiu suavemente.

Parecia que fazia muito tempo desde quando estive em outro carro com pessoas diferentes. Eram duas da manhã. Em algumas horas eu mais do que apreciei a companhia daqueles á minha volta: gente que era mais do que as aparências. Comecei, então, a pensar que esse tempo que pedi a Tina não seria tão longo. Eu deveria aceitar a sua ajuda, de uma certa forma.

Mas tudo isso foi por água abaixo quando o meu celular vibrou e, novamente, causou um surto: Gus me ligava.


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Notas finais do capítulo

Espero que você não tenha fugido para cá, hein? Já leu?

Deixem suas opiniões aqui em baixo, divulguem e todo aquele blá blá blá. Preciso saber o que estão achando para dar continuidade á fic. De qualquer forma, obrigada!

♡ xoxo ♡



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