Oito pontos de aço cirúrgico. Cada um brilhando insistentemente diante daquela luz amarelada. E ela odiava isso. Não, seu ódio não era para com seus “filhos”, como gostava de apelidar cada uma das perfurações em seu corpo, incluindo a que se escondia em sua nuca. O que odiava era aquela iluminação. Amarelo sempre lhe lembrava de coisas desagradáveis, e o tom, que deveria dar um ar aconchegante ao café em que estava, apenas lhe dava repulsa.

Amarelo por todos os lados. Porém ela amava aquele local, a tranquilidade para sua escrita, a comida adocicada e o café. Seu companheiro inseparável, um café forte e gelado, desprovido de açúcar, contrastando com o doce que degustava dessa vez.

Se concentrava de tal maneira no que fazia, que não tinha muito tempo de reparar nas pessoas que passavam por perto. Mas, sentada ali, naquela poltrona verde musgo, com seu caderno antigo e seu lápis mordido em uma das mãos, sabia muito bem que as pessoas olhavam para ela, com curiosidade. Não pelo que fazia, afinal a escrita era comum no local, quer fosse a escrita por teclas ou a por folhas de papel, mas sim por suas roupas.

Um vestido, confeccionado em sua grande parte por um tecido leve, ia até seus joelhos, e cobria seus ombros, com delicadas mangas quase bufantes. Suas vestes possuíam um tom quase branco, mas que, se fosse bem analisado, se encaixaria na gama de cores bege. Meias brancas com adornos de coroas se harmonizavam com sua roupa, e o sapato possuía a mesma coloração do vestido, juntamente com algumas amarrações em sua frente, e um salto levemente largo. Os cabelos, cuidadosamente cacheados, levavam consigo um pequeno corsage, também bege, com pequenas pérolas brancas.

Suas pálpebras carregavam uma leve sombra branca cintilante, e seus olhos bem delineados por vezes se desviavam de seu intuito, fitando com interesse as pessoas que passavam por si. Cobaias. Era assim que ela as considerava. Um meio de estudo, e uma inspiração para suas histórias fantasiosas e por vezes mórbidas. Às vezes ria consigo mesma, pensando em como uma lolita, tida pelas pessoas “comuns” como uma criatura doce, poderia escrever coisas tão repulsivas. Apenas achava graça. Estereótipos. Sempre gostava de brincar com eles, e aquela não era uma exceção.

Porém sua atenção, mesmo que despejada em sua escrita, sempre era cortada por algo alheio a seus pensamentos. Fazendo com que criasse novas situações em sua mente, ou se lembrasse de velhos acontecimentos. Ela era assim mesmo, nunca havia conseguido se concentrar em algo por mais de cinco minutos, e simplesmente não conseguia mudar esse pequeno fato incomodo.

A distração da vez eram seus fios de cabelo pretos. Fixava-se neles, pensando consigo mesma que aquilo não duraria muito, e que em breve eles voltariam ao tom que tanto odiava: amarelo. Porém um amarelo suave, do qual realmente gostava. Pousou os lábios sobre os mesmos durante alguns segundos, como se eles pudessem escutar seus pensamentos e entendê-la.

Voltou-se para seu lápis corroído, novamente com uma idéia em mente. Pousou o mesmo sobre o papel, e a escrita era veloz. Sempre que se inspirava, as palavras fluíam. E em pouco tempo, seu novo texto estava terminado. Deixou um pequeno espaço entre a ultima palavra e sua assinatura, que dessa vez, felizmente, se resumia a Mixy. Dessa vez, Elizabeth, Bianca e nem Justine estavam com ela. Dessa vez.