Despertar escrita por Seto Scorpyos


Capítulo 10
Capítulo 10




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Kai encarou os músicos com um sorriso aberto. Pelo jeito, a folga foi boa para todos. Nada daquelas nuvens estranhas e nada daquela tensão que quase arruinou tudo.

- Que bom que todos estão bem! – comemorou, animado.

- A folga foi boa. – Ruki respondeu, com um sorriso suspeito.

Reita não se manifestou, ocupado em observar o amigo do outro lado da sala, tirando as guitarras das capas. Aoi e Uruha estavam lado a lado, comentando alguma coisa sobre os instrumentos.

- Para onde você foi, Aoi? – o baixista perguntou, de repente.

Os guitarristas se entreolharam e com calma, o moreno se virou.

- Eu passei alguns dias com a minha família. – respondeu, neutro – O resto passei com Uruha.

O olhar de espanto nos três amigos o fez se sentir um pouco temeroso. Reita se ergueu, olhando as costas do loiro, que terminou de tirar as capas e pegou a guitarra, se virando.

- Quer me perguntar alguma coisa diretamente, Reita? – o loiro perguntou, encarando o amigo.

- Achei que deviam logo saber... eu e Uruha estamos juntos – Aoi disse, segurando de leve o braço do jovem – E não vamos dizer mais do que isso ou explicar alguma coisa.

Kai empalideceu, Reita estreitou os olhos e Ruki abriu a boca, chocado. Os guitarristas ficaram quietos, esperando a explosão.

- Está seguro disso, Uruha? – o baixista perguntou, preocupado.

- Estou. – o olhar do guitarrista não se desviou.

- Isto... isto é... – o líder não sabia o que dizer e então, limpou a garganta – Se vocês dizem que está tudo bem, eu acredito. Desejo felicidades.

O moreninho se ergueu, ainda demonstrando desconforto. Ruki o imitou.

- Espero que saibam o que estão fazendo. – o vocalista disse, sombrio.

- Acho que por aqui, ninguém sabe direito o que está fazendo, Ruki. Isso não impede que façamos – Uruha respondeu, sentando-se e começando a dedilhar a guitarra, depois de ligá-la.

Aoi não se deu ao trabalho de responder, pegou a outra guitarra e ficou do outro lado, ligando-a ao equipamento. As notas das duas guitarras soaram em harmonia, fazendo Kai sorrir. A rotina era totalmente nova e cheia de energia, como uma renovação.

- Isso foi... – o líder ficou maravilhado, olhando de um para o outro depois que terminou.

- Composição do Uruha. – Aoi explicou, satisfeito.

- Com a sua contribuição. – o jovem acrescentou.

Eles trocaram um sorriso e Reita percebeu que não havia dúvidas. Diante daquilo, não podia haver. A música nunca se completaria se existissem.

- Acho que tenho a letra... mas falta... – Ruki murmurou, segurando o cabelo com agonia.

- Tem algumas frases que Uruha fez... talvez ajudem. – o moreno ofereceu, tirando a guitarra do colo.

Uruha chegou a abrir a boca para reclamar, mas Aoi lhe lançou um olhar intenso e elevou uma sobrancelha. O loiro ergueu as mãos, rendendo-se.

O moreno anotou as frases no bloco de Ruki, com o vocalista quase deitado por cima de seu ombro.

- Isso soa triste. – comentou, baixo.

- E é para ser. – Aoi explicou. Olhando para o pequeno amigo, sorriu de leve – Mas a tristeza, às vezes, pode ser bem bonita. Principalmente se for reconhecida e aceita.

Ruki o encarou e então, respirou fundo.

- Acrescenta isso também.

O trabalho recomeçou e Ruki preparou as novas canções. Aoi, sempre o mais perfeccionista, acabou ficando responsável pela produção final da música e do trabalho. Mesmo com todos aqueles problemas, a banda não deixou a qualidade do trabalho cair. No fim daquele mês,  Kai anunciou uma pequena turnê pela Europa.

Foi complicado, mas extremamente gratificante. Os músicos se animaram ao perceber que, mesmo sem terem tido qualquer intenção, a música deles saiu do Japão e foi a grandes distâncias. Ruki reclamou um pouco por não conseguir tempo para rodar as cidades e fazer compras, mas acabou aceitando que não podia ser. Uruha se contentou com a paisagem do lado de fora da van e se aventurou num passeio noturno com Aoi, vestidos de forma comum. Kai não deixou que fossem sozinhos e um staff que falava inglês se prontificou a ir com eles.

O site da banda, agora também em inglês, era sempre muito visitado e as mensagens deixadas por fãs eram um incentivo a mais para a dedicação dos rapazes.

De volta, fotos, entrevistas e shows absorveram todo o tempo livre. Aoi e Uruha não reclamavam muito da falta de tempo para namorar, mas Ruki se estressou. Com esforço, Kai conseguiu dois dias, mas não adiantou muito. O vocalista não perdia uma chance de alfinetar o líder e quem mais estivesse por perto.

- Não preciso de água. – o pequeno afirmou com calma – É só recarregar a bateria ou então esperar o download...

- Ruki, sei que está cansado, mas... – Kai o interrompeu, cansado das reclamações.

- Tudo bem, sou uma máquina de escrever letras e voz. Quem liga? – o vocalista tornou, erguendo os ombros em desalento.

Uruha olhou para o lado, disfarçando o riso e Aoi se aproximou dele.

- Pelo jeito, outra crise está vindo... – o moreno comentou, colocando a guitarra ao lado do corpo.

O loiro ajeitou a tira suporte no peito do amante.

- Ele está certo. – com um olhar distraído, ajeitou o botão da camisa do mais velho que se abriu durante o ensaio – Estou subindo pelas paredes.

Aoi lhe lançou um olhar compreensivo. – Mas isso era o que queríamos, não? – perguntou, elevando uma sobrancelha.

- Música é minha vida, mas não que minha vida se resuma a música. – o loiro encarou o outro com um meio sorriso exausto – Estou com saudade.

O moreno acariciou de leve o rosto delicado e Uruha descansou o rosto na palma da mão dele. O gesto atraiu a atenção de Ruki.

- Ei! Se eu não posso, vocês também não! Cadê a solidariedade de amigos? – perguntou, com um bico enorme.

- Deve ter caído e rolado para debaixo da cama e eu não notei. Desculpe, vou procurar assim que chegar em casa. – Uruha respondeu, observando com frustração Aoi se afastar – Olha só o que fez! Perdi meu carinho diário... vou morrer de abstinência....

Kai não agüentou a expressão desolada do jovem e caiu na risada. Reita e Aoi sorriram e Ruki cruzou os braços, tentando não rir.

- Está vendo, Kai? É culpa sua que estamos morrendo faminto e sedentos... se eu morrer, eu volto e te assombro pelo resto da vida! – o ruivo reclamou, bufando – Vou fazer pior do que a Kayako.²

- E eu ajudo. – o loiro acrescentou – Nunca mais vai dormir na vida.

Kai ergueu os braços, ainda rindo.

- Eu imploro misericórdia! – pediu e então, olhou para Aoi e Reita, parados – Não vão me ajudar, não?

- E acha que estamos em situação melhor por que? – Reita perguntou, elevando uma sobrancelha.

- Também quero te matar. – Aoi comentou, encarando as unhas pintadas de preto com um interesse totalmente falso – E com requintes de crueldade.

- Não antes de uma tortura lenta. – Ruki esticou as pernas e encarou o moreninho.

Kai encarou os amigos e encolheu os ombros.

- Vou ver o que consigo. – diante das expressões, ergueu as mãos – Não comemorem antes do tempo! Pode ser que não consiga! Vou tentar!

Apesar de todas as reclamações, os músicos cumpriram fielmente a agenda lotada de entrevistas, fotos e gravações. As novas canções estavam fazendo um sucesso quase inacreditável e quando tentaram surpreender os fãs no metrô, quase causaram um tumulto. Tocaram apenas duas músicas e tiveram que parar, por causa do público inesperado.

Já dentro da van, apesar do susto por causa da confusão, os músicos se entreolharam e riram, divertidos e satisfeitos. Aoi entrelaçou os dedos nos de Uruha, feliz.

- Achei que não sairíamos. – comentou, apertando a mão do amante de leve.

Kai terminou a conversa ao telefone e encarou os amigos.

- Pelo jeito, não podemos mesmo terminar o show. Motivos de segurança. – ele explicou, fechando o aparelho. Inclinou-se e pediu ao motorista para voltar ao estúdio.

- Não consigo achar ruim. Eu não esperava tanta gente... – o baixista comentou, olhando para fora – Foi um pouco assustador...

- Também fiquei preocupado, com elas e conosco. – o moreno passou os braços em torno de Uruha, puxando-o para si.

O loiro se acomodou, escondendo o rosto dentro da camisa aberta do amante. O som baixo da conversa o embalou, mas o corpo despertou com a carícia suave e instigante que ganhou no pescoço. Ia protestar mas então, notou o coração do moreno batendo acelerado debaixo da pele quente.

- Podemos ir para casa e encerrar por hoje? – Ruki perguntou, demonstrando um pouco de frustração.

Kai suspirou e passou a mão pelo cabelo.

- Eu também queria tocar até o fim, Ruki. – acrescentou, baixo – Mas é simplesmente impossível.

- Ei, não fique assim! Podemos pensar em alguma coisa depois. – Reita tentou consolar o amante.

- Acho que nada como isso de novo. – o guitarrista moreno comentou, desanimado – Pena, estava divertido.

O motorista deixou os músicos no estúdio e Kai organizou a retirada dos instrumentos e falou com o staff responsável por trazer a bateria e o resto do equipamento para o prédio.

- Vocês podem ir, eu fico e confiro tudo. – ele ofereceu, solícito.

- Não, Kai. Você também merece uma folga. Eu e Aoi podemos ficar. – Uruha ofereceu, compreensivo.

O moreno arregalou os olhos ao ouvir o amante, mas não conseguiu recusar depois de receber um olhar assassino. Reita lhe lançou um olhar divertido e guiou Ruki para o carro estacionado.

- Até mais! Kai, passa a agenda para a gente mais tarde. – o baixista pediu, acenando de leve.

Depois das despedidas, o moreninho olhou encabulado para os guitarristas.

- Não precisam... eu posso... – começou, sem jeito.

- Tudo bem, Kai. Não vai nos matar e além do mais, ele precisa esfriar um pouco. – o loiro comentou, afastando-se das mãos do amante.

- Ei! – o mais velho protestou, ultrajado.

O líder olhou de um para o outro e então, pegou a bolsa com as coisas pessoais. Com um sorriso tímido, atravessou o estacionamento e entrou em seu carro.

- Belo trabalho, Uruha! – o moreno reclamou, cruzando os braços e recostando-se no carro – Agora vamos ficar aqui uma eternidade, quando podíamos estar fazendo coisa melhor em outro lugar.

- Não reclama! – o jovem rebateu, tirando a franja da testa – Kai não tem vida pessoal e vive no meio de dois casais. Já notou que ele não fala sobre uma amante ou... – parou, sem jeito – outra coisa.

Aoi notou o jeito do namorado e estreitou os olhos.

- Do que você sabe? – perguntou, suave.

Uruha arregalou os olhos, avermelhando o rosto. O guitarrista não conseguiu sustentar o olhar intenso do amante e engoliu seco, afastando-se mais.

- Ah! Não! – o moreno se desencostou do carro e segurou o outro pelo braço – Me conta! O que você sabe?

- Eu... eu não sei de nada, Aoi. Nada. Nada mesmo. – o jovem sacudiu a cabeça com tanto vigor que desmanchou o penteado.

- Nem vem! Você não sabe mentir e além do mais, se ousar eu te beijo até que se arrependa de ter tentado. – o tom do guitarrista moreno soou terno demais para uma ameaça.

- É sério, eu não... – Uruha parou ao ver o olhar do outro sobre si – Não faz isso... é só uma impressão... eu não posso afirmar nada...

- O quê? – Aoi perguntou, soltando o namorado.

- Acho que vou arriscar mentir.  – o loiro se abraçou e sorriu, tentando pensar em alguma coisa.

- Não vai adiantar nada. – o mais velho elevou uma sobrancelha, sem tirar os olhos do namorado – Assim que eu terminar com você, vou perguntar de novo e duvido que consiga mentir.

O jovem fechou os olhos, tentando não pensar nas implicações daquela frase. Ainda podia sentir a tensão sexual que os envolveu na van, mas acima disso, dava para ver que o outro não desistiria.

- Está bem – o jovem suspirou – É só uma impressão, como eu disse... – hesitou, olhando em volta e notando alguns staff´s ainda esperando, fumando a uma certa distância.

Notando o namorado tentando ganhar tempo, Aoi pressionou um pouco mais.

- Uruha...

- Miyavi não consegue ficar longe dele por muito tempo. – o loiro disse, de uma vez.

Aoi franziu a testa.

- Mas isso não diz nada, dizem que não consegue ficar mais de uma hora sem abraçar ninguém. – comentou, tentando se lembrar de algo suspeito.

- Mas ele nunca se recusou a sair para uma gravação sem o abraço de uma determinada pessoa, não é? – Uruha encolheu os ombros, eloqüente.

O moreno o encarou, abismado.

- Miyavi e Kai?!?! – o espanto se espalhou pelo rosto do mais velho – Não acredito!

Uruha o segurou pelo braço.

- Ei, eu disse que é só uma impressão. São detalhes aqui e ali... – o jovem engoliu seco diante do olhar do namorado.

- Que detalhes? Onde eu estava que não vi isso? – o mais velho se recriminou, colocando a mão na testa – Eu não podia ter perdido isso por nada!

- Teve aquele beijo no rosto... o sorriso do Kai é... – o outro fez um gesto com as mãos, incapaz de explicar – E também tem o fato de que Miyavi não começa a trabalhar sem abraçá-lo primeiro.

O moreno o escutou, pasmo.

- Eu não acredito! Kai pareceu sempre o mais hétero de nós! Ele nunca... – parou, franzindo a testa – Bem, ele tem um jeitinho... não tanto quanto você e Ruki, mas...

- Ei! – dessa vez, o loiro protestou.

- Não se ofenda, loirinho. – o mais velho abriu um sorriso, mas quando ia puxar o músico, foi fulminado por seu olhar.

- Não estamos sozinhos. – o outro constatou, sério.

Aoi olhou de lado para o pessoal do staff que estava do outro lado. Nessa hora, o caminhão com o resto dos instrumentos chegou e ambos respiraram, aliviados. A hora seguinte foi de trabalho para os dois guitarristas, que conferiram o material e assinaram o recebimento.

Depois, os dois ainda foram com o pessoal até a sala do estúdio. O moreno fez questão de acompanhar cada passo.

“Ainda bem que o pessoal sabe que é perfeccionismo e não falta de confiança.” Uruha pensou, trocando um olhar e um sorriso disfarçado com o ajudante.

 ***

- Ainda estou chocado! – o moreno murmurou, deixando a bolsa sobre o sofá.

- Por favor, não vai pegar no pé dele por causa disso... – o jovem pediu, sabendo perfeitamente que era inútil.

- Mas percebe o que significa? – Aoi insistiu, com um sorriso.

O mais velho parou ao ver a expressão pesada do amante.

- Uruha, eu nunca faria nada para machucar o Kai. – garantiu, sério.

- Mas sei também que não vai deixar simplesmente passar. – o loiro suspirou – Eu não devia ter falado nada.

Quando o jovem ia passar para o quarto, Aoi o abraçou por trás.

- Está bem, eu não vou dizer nada. Prometo. – garantiu, mergulhando o rosto no cabelo macio – Você tem um cheiro bom...

Uruha se virou no abraço e o moreno não vacilou. Tomou a boca macia num beijo faminto e esperado. O loiro se segurou no amante, entregando-se. As carícias começaram tímidas, como sempre entre eles, mas não permaneceram assim, também como sempre. Aoi ainda se surpreendia com a fome que podia sentir pelo outro. Tudo no namorado o excitava muito e nunca parecia ser o suficiente. Nunca teria o suficiente de Uruha.

****

- Aoi, pode vir aqui um momento? – Kai chamou, colocando a cabeça para dentro da sala de ensaio.

O moreno franziu um pouco a testa e então, deixou a guitarra de lado e se levantou. Uruha e Ruki acompanharam com o olhar enquanto o moreno deixava a sala.

- O que será que aconteceu? – o vocalista perguntou, curioso.

Uruha encolheu os ombros, sacudindo levemente a cabeça.

- Não faço a menor idéia.

Dentro de outra sala, o guitarrista moreno se levantou de um pulo.

- Mas isso é impossível! Não mesmo! – protestou, indignado.

- Infelizmente, Shiroyama-san, é que está acontecendo. – Nadao-san explicou, com uma expressão séria – Eu não dei atenção de início, mas acabou a história acabou crescendo e agora, estão comentando.

- Kai, isso é mentira! – o mais velho se virou para o líder, inconformado – Eu nunca faria isso!

- Eu acredito em você, Aoi, mas temos que saber mais sobre isso. Onde essa história começou? – o líder perguntou ao outro homem, segurando o braço do amigo levemente, passando confiança.

- Eu não sei ao certo, mas parece que uma amiga de infância... – o homem parou, constrangido.

O rosto de Aoi ficou lívido.

- Akaya não seria louca o bastante. – o moreno cuspiu, entredentes.

- Bem, de qualquer forma, o assunto está girando como forma de fofoca, e é apenas citado levemente. Ninguém afirmou nada, mas se crescer demais... – a pausa foi eloqüente e Aoi sentiu o chão desaparecer sob seus pés.

 - Vamos dar um jeito, Nadao-san – Kai afirmou, puxando o guitarrista para perto dele.

- Yutaka-san, sabe que a vida pessoal dos músicos não é da minha responsabilidade, e é exatamente por isso que estou preocupado. – o empresário afirmou, sério – Esse tipo de coisa pode manchar a reputação da banda toda, e não conseguiremos consertar a menos que Shiroyama-san faça o correto ou prove que não é o responsável.

- Vamos cuidar disso. – o líder reafirmou, tão sério e seco quanto o outro.

Com um cumprimento, o homem deixou os dois músicos sozinhos. Kai soltou Aoi, que se encostou a uma mesa.

- Aoi... – começou, sem saber como pedir mais explicações.

- Não é meu filho, Kai. – o moreno ergueu a cabeça, com os olhos flamejantes de raiva e ultraje – Se essa criança realmente existe, não é meu filho.

- Temos que saber com certeza de é com Akaya, ou com outra pessoa. – o moreninho passou a mão pelo cabelo, sem saber o que fazer.

- Não posso perder nada por causa dessa mentira... – o mais velho se desesperou, colocando a mão no rosto.

- Não vai perder. Vamos dar um jeito nisso! – o baterista garantiu, segurando o outro e o puxando para si – Vamos resolver.

Ruki e Reita encararam o moreno com o olhar pesado, mas Aoi não notou. Toda a atenção dele estava focada em Uruha. O loiro respirou fundo, sentou-se e acendeu um cigarro.

- Você acredita em mim quando digo que não é meu, não é? – o mais velho perguntou, num fio de voz.

O guitarrista loiro não respondeu, encarando o cigarro aceso entre os dedos esguios. Depois de um silêncio esmagador, ergueu a cabeça e encarou o amante agoniado. Mais alguns minutos se passaram e então Uruha se ergueu e pegou o celular que estava sobre a mesa. Discou alguns números e esperou. Aoi não queria gritar de frustração, mas a reação do namorado não estava sendo a esperada. Podia esperar gritos e recriminações, mas não aquilo. Kai colocou a mão em seu ombro, mas o moreno não se virou, com os olhos presos no loiro.

- Pai? – a voz rouca e profunda soou na sala de ensaio, firme – Está tudo bem, mas preciso de sua ajuda.

Com assombro, Aoi escutou Uruha explicar o que aconteceu de forma breve para o pai e pedir a ajuda dele para impedir que o assunto crescesse. Com os olhos arregalados, viu o namorado atravessar a sala e lhe estender o aparelho.

- Eu acredito em você quando diz que não é verdade, então... – Uruha fez uma pausa significativa e seus olhos cintilaram – Não vai se importar em colocar esta história a limpo, não é? Independente de quem for, fará o que for preciso para que isso pare, não é?

Aoi sentiu o chão sumir de debaixo de si. Olhou do amante para o telefone na mão dele e engoliu seco. O desafio foi sutil demais, mas impossível de ser ignorado. Se Akaya estava por trás daquelas fofocas, e ele tinha quase certeza absoluta de que estava, sua família devia estar apoiando de alguma maneira, já que ela nunca teria coragem de se expor se não tivesse. Mas se isso fosse verdade, e aceitasse a oferta de Uruha para terminar com aquilo, não teria como afastar seus pais antes que os advogados da família do namorado expusessem todo mundo.

- Uruha... – murmurou, dividido.

O olhar do namorado se tornou gelado. O loiro se afastou e colocou o telefone no ouvido.

- Pai, esquece. Sinto muito por te incomodar. – Aoi se levantou, mas Uruha recuou e o congelou com o olhar – Eu ligo depois.

O rosto do loiro pareceu esculpido em pedra, mas ele simplesmente fechou o aparelho e se virou, guardando-o na bolsa. Com cuidado, deu um último trago no cigarro e se sentou calmamente, apagando-o.

- Uruha, me deixa explicar... Eu acho que... – o moreno começou, incerto.

- Eu não tenho nada a ver com isso, Aoi-san. – a expressão do jovem não transpareceu nada – Eu não devia ter me metido e peço desculpas por ter feito.

Ninguém disse nada por longos minutos e Kai respirou fundo.

- Vamos parar por hoje e mais tarde eu mando uma mensagem avisando sobre o horário de amanhã. Aoi, você fica.

- Não, Kai. Vamos pensar juntos em uma maneira de resolver isso! – o baixista rebateu, erguendo-se – Aoi, você não aceitou a ajuda de Uruha porque acha que sua família está envolvida?

O moreno empalideceu um pouco e então, desviou os olhos.

- Eu vou ligar para Kanako. Sinto muito por tudo isso. – ele murmurou, constrangido.

Sem esperar resposta, pegou a bolsa e saiu, quase correndo. Os músicos observaram em silêncio e então, Ruki se virou para o guitarrista loiro.

- Você o pressionou demais, Uruha. – observou, ácido.

- Mesmo? – o outro rebateu, erguendo uma sobrancelha.

O pequeno mordeu o lábio para não responder e Uruha se recostou no sofá, encarando-o.

- Podia pelo menos ter sido mais compreensivo. – Ruki concedeu, recuando.

- Me ofereci para ajudar, o que mais esperava? – o loiro perguntou, calmo.

- Você o ameaçou! Deu um ultimato! – o ruivo abriu os braços, irritado – Podia... sei lá...

- Eu acho que Uruha agiu certo. – Reita comentou, encostado à parede – Ele tentou ajudar e Aoi não quis. Mesmo que fosse a família, se estivesse tão preocupado em se inocentar, teria aceito a proposta.

- Mas aí teria que fatalmente expor os pais dele. – Kai complementou, preocupado – Acho que ele não quis fazer isso... quero dizer... – hesitou – Na hipótese de Akaya realmente mentir com a ajuda dos pais dele.

- Eu conheço os pais de Uruha, Kai. Apesar de não aprovar nossa profissão, Takashima-san nunca usaria isso contra nós e nunca exporia ninguém a um processo, se puder evitar. Ele é da velha guarda e não acredita em escândalos e coisas assim. Não acredita e nem aceita.

- Deve ser complicado para ele... Além do mais, não entendi porque isso aconteceu agora, depois de tanto tempo... – o líder murmurou, penalizado.

****

Aoi se fechou e não comentou mais o assunto. Cumpriu a agenda normalmente, mas dava para sentir que estava tenso. Os erros começaram a aparecer e o humor, mudou drasticamente. Começou com pequenas piadas e frases soltas, ácidas e provocativas, todas tendo Uruha como alvo. Os músicos chegaram a rir de algumas piadas e acompanhar Aoi em algumas brincadeiras, mas a maldade e malícia acabaram fazendo Uruha se retrair a ponto de se afastar totalmente. Reita percebeu e Kai também, aflito. Ambos pediram desculpas e trataram de tentar frear o moreno, mas então, o mais velho simplesmente mudou de tática. Começou a alfinetar o guitarrista loiro nas entrevistas, fazendo piadas dúbias ou comentários constrangedores.

Ruki não viu a maldade no início, mas percebeu também e por mais amigo que fosse de Aoi, acabou tendo de admitir que ele não estava lidando bem com os problemas.

O ponto culminante foi uma entrevista que Aoi deu, dizendo se sentir abandonado e culpando Uruha indiretamente por sua solidão.

- Não devia ter feito isso, Aoi! Foi injusto com ele! – pela primeira vez em muito tempo, Kai estava perdendo a paciência.

O moreno engoliu seco, envergonhado.

- Eu não sei por que fiz isso... – murmurou, constrangido – Vou me desculpar.

- Não resolve nada! – Reita cuspiu, raivoso – Você não é cego nem burro, então percebeu que ele está sendo hostilizado por todo o nosso staff. De modo sutil e bem mais cruel, e tudo porque você parece um garoto que não sabe o que fazer diante de um problema! – o tom de voz do baixista subiu – Já leu o tom das mensagens que as fãs deixaram no nosso site? Já notou o que estão falando dele?

O moreno teve a decência de corar e baixar a cabeça, totalmente sem jeito.

- Por mais que eu queira entender, Aoi, não dá. – o líder comentou, passando a mão nervosamente pelo cabelo – Eu achei que tinha entendido que ele não tem culpa das coisas que acontecem com você. Por que partir para cima dele desse jeito? Eu pensei que o amava...

Aoi passou a mão pelo rosto, consternado.

- Eu não sei... eu sabia que estava fazendo algo errado, sabia que ele não tem culpa de nada, nem mesmo por ficar com raiva de mim nessa história toda... eu sabia disso... Não sei o que me passou pela cabeça... mas queria machucar tanto quanto eu estava machucado...

- Mas ele não fez nada além de te oferecer ajuda! Foi você que recusou e achou melhor proteger sua família. – o baixista tornou a falar, ainda nervoso – Foi você que começou com essa palhaçada de provocar e humilhar!

- Mas eu não queria a ajuda dele! – o moreno rebateu, erguendo-se – Eu queria...

- O que você queria, Aoi? – Ruki perguntou, falando pela primeira vez – O que você queria que ele fizesse? Que ignorasse tudo e continuasse como se não houvesse nada? Porque era mais cômodo para você ter Uruha do seu lado, sem perguntas, sem cobranças, não é? Falar com o pai dele implicaria num compromisso que não queria, não é?

O moreno empalideceu, sentando-se novamente. Ruki tragou o cigarro, sem tirar os olhos do amigo.

- Eu sempre fiz merda tentando te proteger, mas agora você foi longe demais. Depois de tudo, quando vocês estavam bem e juntos... Por que fez isso, Aoi? Porque se sabotar desse jeito?

- Ele disse alguma coisa? – depois de algum tempo, a voz do guitarrista soou baixa.

- Ele chega mais cedo por que sabe que não vai ter ajuda para se arrumar, se o trabalho for com o staff daqui. Ele mesmo se maquia e se veste, e sem dizer nada. Não reclama, não pede... Ajeita sempre tudo o que vai precisar e tenta antecipar qualquer imprevisto, porque sabe que não vai ter apoio. – o líder mordeu o lábio, contrariado – Isso não é certo, ainda mais porque ele não tem culpa dos seus surtos.

Kai se afastou, como se não pudesse mais olhar para o moreno. Reita e ele foram esperar Uruha lá fora e Ruki, depois de encarar o amigo longamente, os seguiu. Aoi não teve tempo para pensar porque logo, os músicos voltaram e se prepararam para uma nova sessão de fotos. O moreno observou Uruha com cuidado, notando a expressão exausta do amante, se é que ainda podia chamá-lo assim.

Reita ajudou o guitarrista loiro com a maquiagem e Ruki, com a roupa. De um jeito sem paciência, o vocalista mandou os staff´s se afastarem do músico, já que não queriam mesmo ajudá-lo. Reita se afastou para que a maquiadora fizesse o trabalho nos olhos de Uruha, mas antes que se virasse, o grito agoniado do amigo o fez voar para seu lado.

- MEUS OLHOS! AI! AI! – o guitarrista loiro gritou, com as mãos no rosto.

O baixista o segurou e tentou afastar as mãos, arregalando os olhos.

- Mas... Meu Deus, Kai! – chamou, desesperado.

Os olhos de Uruha estavam vermelhos e algo como sangue estava escorrendo nos cantos. Juntando toda a coragem que tinha, Reita o segurou e impediu que tentasse limpar, ignorando os gritos desesperados de dor. Ruki tentou ajudar, segurando a cabeça do loiro.

Aoi ficou parado, congelado a uma certa distância. Kai gritou com alguém e logo, uma equipe dos socorristas da agência entrou e Uruha foi levado para a enfermaria. Reita perdeu totalmente o estilo sério e distante e simplesmente cuspiu que nunca mais trabalharia com aquela equipe de staff´s. Antes de ir atrás do amigo, encarou o moreno ainda parado com malevolência.

- Depois de tudo, não dava para ser diferente, não é Shiroyama? – o mais velho se encolheu diante da violência e Ruki tentou puxar o amante.

- Vem, Reita... eu quero... – a preocupação e o desespero engasgaram o pequeno vocalista, que simplesmente continuou a puxar o baixista, sem sucesso – O Uruha... meu Deus! Vem!

- Acho que já disse isso antes, mas reforço. Você é desprezível. – o baixista voltou a dizer, a voz baixa cheia de desprezo.

O loiro simplesmente pegou a mão de Ruki, sem se importar em que mais de uma dúzia de pessoas tivessem presenciado a explosão e puxou-o para fora, amparando-o.

Tudo foi meio confuso e rápido demais. Aoi soube que a maquiadora usou um spray nos olhos de Uruha, mas como não pediu a ele que os fechasse e nem o avisou, acabou por machucar seriamente o guitarrista loiro. Nadao-san interferiu e trocou a equipe, certificando-se de primeiro esclarecer que estava em busca de profissionais, e estes não davam ouvidos a fofocas e notícias publicadas que podiam ser distorcidas de acordo com a vontade do repórter. A maquiadora foi sumariamente demitida e Aoi se sentiu culpado, mais do que já se sentia.

Mais tarde naquele dia, juntou a pequena equipe que sempre trabalhava com eles e explicou que foi mal interpretado pela revista, e que realmente não quis dizer aquilo. Envergonhado, pediu desculpas à equipe, xingando-se mentalmente por ter exposto o namorado à hostilidade sem sentido, simplesmente porque estava irritado. Para poder se explicar, inventou uma razão qualquer para suas palavras, sentindo-se uma fraude. Apesar de sua tentativa, o empresário não aceitou voltar a equipe antiga e reforçou que não toleraria que impressões pessoais prejudicassem o trabalho.


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