Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 84
Retribuindo o mimo.




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#16/03#

— Tem certeza que não quer que eu te leve pra casa, Cast? — perguntou Maitê quando o rapaz informou que ia embora. Na verdade ele não queria voltar para casa, mas não podia ficar ali, enrolando, pois já passava das 22h00. — Eu não me incomodo em fazer isso, você sabe!

— Não precisa, dona Maitê. Eu vou de ônibus. Há esta hora tem poucos passageiros e chego rapidinho.

— Dona Maitê? — questionou, cruzando os braços, fingindo chateação.

— Desculpe, Maitê, mas é que eu não me sinto a vontade chamando-a apenas pelo nome estando perto da Sol. Ela é cheia de mimimis. — falou baixinho olhando par a porta do banheiro, pois Sol estava tomando banho para poder se deitar.

— Eu entendo. A Emília é mesmo cheia de neuras. É bem capaz dela ter uma crise de ciúme. — concordou, rindo.

Castiel se despediu de Emília através da porta do banheiro e saiu. Maitê o acompanhou até a portaria, pois a porta já estava trancada com chave. Ela se ofereceu para levá-lo em casa, pois o ponto de ônibus que passava a linha até a casa dele não ficava perto e ele teria que caminhar uns 5 minutos a pé, até a Promenade, para pegar o ônibus certo. Mas ele não aceitou; não queria incomodar.

Uns 20 minutos depois, enquanto Sol penteava o cabelo, olhando para a copa das árvores do parque pela janela, ela viu seu amigo ruivo, que ainda não tinha ido embora, conversando com duas garotas. Ela sabia que uma delas era universitária porque ela trabalhava na farmácia do bairro e vivia estudando no balcão. Elas pareciam bem animadinhas e ele todo sorridente. 5 minutos depois ele tomou o caminho que dava para a Avenue Du Mont Alban e elas seguiram em direção a Avenue Blanco. Depois que os perdeu de vista, tendo em mente que o amigo estava assanhadinho demais com as garotas mais velhas, fechou a janela.

Por sorte, assim que Cast chegou na Promenade o ônibus passou e era o último do dia. Ele não estava a fim de ir embora a pé. Ele foi para casa rindo sozinho dentro do coletivo praticamente vazio, lembrando do tio e sua pequena amiga, que na certa já devia ter sido levada por alguém a pedido do tio. "Lá se foi minha grana!", pensou, pois sem aranha, sem dinheiro de volta.

Ao chegar no condomínio, Cast ficou na portaria fazendo companhia para o Donatelo por quase uma hora. Já passava da meia noite e ele precisava arrumar um jeito de entrar sem o tio o ver, pois se isso acontecesse, certamente levaria uns sopapos.

Se ele optasse por usar a porta dos fundos teria que ir para o quintal. O problema era que este tinha uma porta que o separava do corredor externo e da garagem. Kage podia muito bem estar esperando por ele naquele espaço e o pegar antes mesmo de entrar em casa.

— Enfer[1]! — resmungou, cogitando a ideia de dormir na garagem, desistindo porque não ia dormir no chão duro e gelado.

O jeito era encarar a porta da frente. Mas antes de se arriscar, ele se enfiou no meio das plantas do jardinzinho da mãe, tentando ver dentro da casa por algum dos três janelões na sala, que além de trancados estavam fechados com a cortina. Por sorte ele conseguiu ver um pedaço do sofá. Seu tio estava deitado nele e pela posição, provavelmente estava dormindo.

O coração dele acelerou. Era muita adrenalina. Ele tinha que ser rápido e silencioso, pois um vacilo e já era sua integridade física. Seu tio ia enchê-lo de porrada.

Antes de se arriscar a abrir a fechadura ele espiou pelo pequeno orifício e ao ver que a barra estava limpa colocou a chave e destrancou a porta, torcendo para não estar no trinco. Se bem que Kage não ia passar o trinco, pois isso não o ajudaria a pegá-lo. Antes de entrar ele espiou novamente e sentindo-se seguro entrou sorrateiramente, como um gatuno.

Ele fechou a porta devagar e...

— Já de volta em casa, garoto. Eu pensei que fosse demorar mais pra chegar! — ironizou Kage encostado na parede da sala, pertinho da porta, de braços cruzados e cabelo solto, pois não conseguia nem mesmo cochilar com ele preso, trajado apenas com uma calça de malha verde musgo e seu par de braceletes de couro no pulso. Cast teria estranhado ele estar com os braceletes, visto que já estava vestido para dormir, mas como estava mais preocupado com sua integridade física nem reparou.

Cast se virou e encarou o tio. Ele precisava pensar numa forma de sair dali, mas nada vinha a sua cabeça. O olhar sádico do tio, somado ao seu sorriso igualmente sádico para ele o fez perder a concentração.

Vagarosamente ele foi deslizando os pés para trás para manter uma distância segura, sem tirar os olhos do tio e ao mesmo tempo, analisando o ambiente.

— Você acha mesmo que vai conseguir passar por mim? — perguntou Kage, olhando para o ruivo com cara de predador diante da presa indefesa, desencostando da parede, louco pra dar o bote naquele moleque filho da puta. Castiel não pensou, só correu, mas na direção da mesa de jantar, pois não tinha como ir na direção da escada.

— Uma hora você vai ter que sair detrás desta mesa. E nem pense em correr para aquela porta — apontou para a porta dos fundos. — Esta trancada na chave e nos trincos. Te pego antes de conseguir girar a maçaneta. — Cast só ria. Por mais que estivesse com medo do tio, toda aquela situação era no mínimo engraçada.

— Não adianta rir e me olhar com essa cara de "alivia só desta vez", garoto. Você pegou pesado, muito pesado!

— Mas a culpa foi sua! Você me sacaneou primeiro, e de propósito! — ralhou, tentando se justificar. — Você mentiu pra mim e depois ficou zoando com a minha cara!

— Minha culpa? Você não segue as orientações do seu médico, não toma a medicação direito, troca socos com um colega na escola e fode esse corte que já estava inflamado, e a culpa é minha? — indagou retoricamente, aproximando-me da mesa, ameaçando contorná-la, fazendo Castiel de bobinho. — Se eu te falasse o que provavelmente ia acontecer, você não teria ido ao médico e esta merda de corte na sua testa há esta hora já estaria podre!

— Mas...

— Mas um caralho, Cassy! — ralhou, interrompendo o sobrinho que não tinha argumento para aquilo, pois sabia que Kage estava certo. — Você não parou para pensar que uma infecção mais séria nisso ai pode afetar inclusive a sua visão?

Castiel não tinha parado para pensar naquilo, na verdade ele não costumava pensar nas consequências dos seus atos. A expressão em seu rosto começou a mudar e como se quisesse se esconder fitou o chão e levou a mão à frente dos olhos.

— Ei, garoto. Não é pra tanto. Para de chorar! — pediu Kage, compadecido do choro sentido do sobrinho, que pelo visto ainda estava com medo de ter algum problema mais sério com aquele corte e com isso ter que encarar novas agulhas, abraçando-o. — Eu sei que ontem foi estressante, mas já acabou. — Cast olhou para ele de canto de olho e continuou a chorar. — E quer saber, vamos esquecer o que aconteceu hoje, até porque, já foi e eu to inteiro. — o choro do ruivo pareceu mudar de tom, como se ele se convertesse num riso choroso.

— Boa noite tio Kage! — disse-lhe, empurrando-o, afastando-se dele, correndo na direção da escada louco para chegar à segurança de seu quarto. — Durma bem e sonhe com a Tata! — zombou do meio da escada, subindo-a a passos largos, de 2 em 2 degraus, rindo debochadamente dando fim ao seu choro fingido. Ele queria passar pelo tio sem levar uns safanões e conseguiu.

O tio correu atrás dele, mas Cast chegou ao quarto antes de ser alcançado, girando a maçaneta da porta tão rápido para entrar e fechá-la antes do tio se aproximar que não conseguiu evitar acertar o nariz na porta. Ela estava trancada!

— Ai, caralho! — foi sua única frase, pensando "morri!", quando sentiu a pegada do tio no seu cabelo, puxando-o para trás, derrubando-o no chão.

— De uma coisa você pode ter certeza, Cassy, eu vou dormir muito bem hoje, ah se vou! — comentou rindo, cheio de sarcasmo, torcendo os braços do garoto para trás, sentado sobre sua lombrar.

— Ei. O que você está fazendo? — questionou, sentindo seu coração tão acelerado que parecia brinquedo de corda, apavorado, sem saber o que o tio ia lhe aprontar, sentindo ele prender seus pulsos com alguma coisa. — Que porra é essa?

— Qual o problema, Cast. É só um bracelete de couro. — informou, tirando dois mosquetões niquelados grandes do bolso e um pequeno pedaço de corrente espessa. — Que viram algemas. — prendendo os braceletes na corrente pelos mosquetões, aproximando o rosto da face dele, lambendo-a de forma libidinosa.

— EEEII. Sai para lá com seus fetiches! — ralhou, mas Kage não estava nem ai para suas reclamações.

— Você devia experimentar às vezes. As garotas adoram, sabia. — falou ao pé do ouvido, fazendo Cast virar o rosto. Kage riu e se levantou.

Calmamente, enquanto Cast tentava se virar, visto que estava com os punhos atados para trás, Kage colocou a mão no bolso e tirou um molho de chaves, abrindo a porta do quarto do garoto. "É claro, as chaves reservas." pensou ao ver o chaveiro na mão do tio, que deve ter procurado até encontrá-lo na gaveta do rack da sala.

— Sabe o que eu mais adoro nas garotas, Cast? — perguntou levantando o sobrinho do chão, levando-o para o banheiro social. — Elas são criativas! — sentando-o sobre a tampa do vaso sanitário.

— O q-que é isso tudo? — perguntou o ruivo ao ver um pequeno aparato sobre a pia.

— Ah, isso. É só uma coisinha que aprendi com uma das minhas affairs. — contou, pegando cada item para mostrar:

— Luvas de látex, — vestiu as luvas — pente plástico e pincel. — Castiel conhecia bem aquele kit, era dele.

— Eu sei o que é isso! — ralhou, nervoso. — E-Eu quero saber o que você vai fazer? — indagou com medo da sua desconfiança estar certa.

— Eu vou te ensinar a economizar uma graninha. — disse espremendo um pouco de creme hidratante de cabelo em três potes plásticos. — está vendo isso aqui. — mostrou-lhe três pequenos potinhos que pareciam de glitter. — Custa baratinho e você compra em lojas de artesanato, mas às vezes consegue achar em mercadinhos que tambem vendem artigos de papelaria, como o que fica aqui pertinho. — levando o ruivo a arregalar os olhos. Castiel teve a quem puxar!

Ele tentou levantar e correr dali, mas não conseguiu. Os braços presos para trás tiraram sua agilidade, fora que o tio era igualmente ou mais ágil que ele. Sendo assim tentou mantê-lo longe dele, ou melhor, do seu cabelo o mais que pôde, empurrando-o com os pés. Para Kage tudo aquilo estava divertidíssimo, tanto que se deixava empurrar.

— P-Porra, tio. V-Vamos negociar!

— Tem certos prazeres na vida que são inegociáveis, Cassy. E este é um deles! — comentou com um brilho a mais no olhar. Castiel soube, havia chegado o momento de finalizar aquele combate, e ele havia perdido.

Depois das pinceladas, em meio a puxões de cabelo, cabeçadas, xingos, palavrões, risos e choramingos, Cast dormiu trancado no quarto. Kage dormiu como um "anjo" na sala – nada o faria entrar no quarto de hospedes naquela noite. Ele sabia que ela não estava mais lá, mas a mente pregava peças, então, ele não quis se arriscar.

— Acorda, princesa. Você tem que ir para o colégio! — debochou logo pela manhã, acordando o sobrinho.

— AHHHHHHHHH! BRENO SEU FILHO DA PUTA! — Cast se olhou no espelho; seu grito ecoou pela casa e seu banho durou mais de uma hora. Ele foi para o S.A. de touca.

 

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Notas finais do capítulo

[1] Enfer: Inferno; diminutivo para puta que o pariu!



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