Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 52
Sms




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#12/03#

Os trovões já não faziam tanto barulho e Haoqi dormia sobre o tapetinho de beira de cama do seu dono temporário, que cansado de estudar, relaxava a mente lendo um romance policial que há dias ensaiava para ler, sentado com os pés sobre a cama e as costas apoiada num encosto triangular próprio para leito. Sua concentração era tanta que não ouviu o vibrar do celular, seguido de um assovio baixo, indicando que um SMS havia chegado.

 

Toc, toc, toc! — ouviu alguém bater na sua porta, dando um pulo da cama. Era sua mãe e se visse Haoqi ambos estariam encrencados.

— Merda! — murmurou baixinho, desarrumando a cama e cobrindo a gatinha com jeito, para que não despertasse e miasse. — Só um minuto, mãe! Estou me trocando! — mentiu para ganhar tempo. A felina nem se mexeu.

— Nathaniel, filho! Eu não tenho a noite toda! — disse do lado de fora e Nath, com medo dela entrar, saiu, ajeitando a camiseta, como se tivesse acabado de vesti-la, camiseta que ele devia ter trocado. — Finalmente! — disse sorrindo. Ela, ao contrário do esposo, sabia ser carinhosa com ele.

— Desculpe, mãe! Eu estava muito "à vontade". — disse, valendo-se de sua mãe não gostar de vê-lo andando pela casa de cueca, por conta das empregadas, embora elas tivessem idade para ser mãe dele. — O que eu posso fazer pela senhora? — perguntou fechando a porta atrás dele, tentando disfarçar sua tensão.

— Por favor, filho. Eu preciso de ajuda com o seu laptop.

— O que a senhora fez desta vez, mãe? — perguntou conduzindo-a disfarçadamente, para longe da frente do seu quarto. Ele não queria se arriscar a ela sentir o cheiro da gatinha e começar a espirrar.

— Não se preocupe, eu não quebrei o seu computador. — referiu, puxando-o pela mão até o escritório do esposo no piso térreo. — Eu sei que quebrei o meu esta semana, mas foi sem querer! — mencionou.

— Qual o problema com o laptop, mãe? Qual a sua dificuldade? — perguntou, tirando o copo de suco da mesa e colocando-o sobre o micro bar que tinha no escritório. Ele não queria que a mãe, sem querer, afogasse o seu laptop como afogara o dela.

— Eu fechei meu documento sem querer e agora não consigo encontrá-lo. Eu preciso terminar a pauta da reunião da Associação. — contou preocupada, pois no dia seguinte, pela manhã, seria a reunião da Associação Feminina do Valstis Club. Elas discutiriam sobre os eventos da primavera e sobre a Páscoa, que já estava se aproximando.

— A senhora o salvou antes? — perguntou, sentando diante do equipamento, com toda a paciência do mundo, pois sabia que por seu laptop ser mais avançado e atualizado que o da mãe era natural ela se perder em alguns comandos. — Aiiii, mãe! — recebendo como resposta um puxão de orelha, seguido de uma confirmação e um sorriso.

Nath e a mãe se davam bem. Ela era carinhosa com ele na maior parte do tempo. Nem quando se zangava com ele, geralmente por causa da irmã, conseguia ser autoritária. Por sorte Nathaniel, diferente da irmã, a obedecia, mesmo não concordando. Até porque, as raras vezes que ele a confrontou quando mais novo, na sua fase rebelde, por ela não conseguir ser mais enérgica, o pai interveio e ele acabou apanhando por não obedecer a mãe e de certa forma, ter agido de forma desrespeitosa com ela. Mas embora ele tenha ficado chateado com o pai por ter lhe batido naquelas ocasiões, se não fossem as chineladas e a ordem de se desculpar com a mãe, ele não teria percebido o quão quente eram os braços dela quando o abraçam depois dele pisar na bola de alguma forma. Se o pai não o tivesse mandado se desculpar com a mãe todas as vezes que a magoou, talvez ele nunca tivesse feito isso e em contrapartida, ela não o teria pego no colo todas as vezes e dito que não importava o que ele fizesse de errado, ela sempre o perdoaria, porque o amava.

A Sra. Chevalier era uma mulher de aparência jovem e muito bonita, assim como Ambre. Seus cabelos loiros, lisos e longos realçavam o tom claro da sua pele, fazendo com que o verde acastanhado dos seus olhos fossem percebidos de longe. Quando nova era popular, mas não era dada aos estudos. Ela até tentou melhorar muitas vezes, mas nunca conseguiu ficar acima da média. Seus pais e professores a achavam limitada, mas na verdade ela estava sempre triste demais para se concentrar nos estudos, embora sorrisse e fosse gentil o tempo todo, afinal, ela não conseguir lidar com seus problemas familiares "era um problema só dela".

Quando criança Nicole se ocupava com sua casa de bonecas e sua família perfeita feita de plástico, mas na adolescência, para fugir das suas amarguras ela se tornou o estereótipo de patricinha e passou a focar sua atenção em coisas que o pai chamava de futilidades femininas, como passeios em lojas de grife, compras desnecessárias, telefone e a equipe de Majoretes da escola, cujos bastões de luz ela carregava para todo canto, aproveitando qualquer brechinha de tempo para treinar, o que irritava os pais, pois ela não mostrava o mesmo interesse quando se tratava de ajudar nos eventos do clube ou estudar. Mas o seu desejo de ter uma família perfeita, como a da sua casa de bonecas, a fez se aproximar dos rapazes já aos 14 anos e na sua inocente busca pelo príncipe encantado ela acabou se envolvendo com os garotos errados, o que só piorou a relação dela com o pai, um homem autoritário e conservador, principalmente depois que seu nome passou a correr pelas bocas maldosas de algumas pessoas, na escola e no clube, e tudo por ela ter cometido o "pecado" de, aos 16 anos, se deixar iludir pelo veterano errado, que não se contentou apenas em tirar sua virgindade, precisou espalhar a notícia, com riqueza de detalhes, para eternizar seu feito. Até o fim do Ensino Médio ela carregou o estigma de bonitinha e fácil, mesmo não sendo. Nicole foi apenas uma garota tola e vaidosa que sonhou com um amor perfeito, buscando-o em garotos imperfeitos.

Quando concluiu o Ensino Médio, maior de idade e dona do próprio nariz, sem interesse em ir para a faculdade, Nicole continuou sua vidinha de patricinha; quando não estava gastando em alguma loja de grife, estava no Spa ou em algum espaço vip das praias de Sanremo com as amigas ou algum namorado novo, bem longe de Nice e dos olhares curiosos das fofoqueiras do clube. Até que um dia, seu pai, cansado daquele comportamento, cancelou seus cartões e a obrigou a frequentar as reuniões das senhoras do Vasltis Club junto com sua mãe - era isso ou sua independência definitiva dos pais -, que a colocou para trabalhar na organização dos eventos sociais que o grupo promovia. No começo ela odiou, mas com o tempo aprendeu a gostar e descobriu mais que uma vocação, uma paixão, organizar eventos para pessoas carentes. Nicole amadureceu como pessoa e como mulher, aprendeu a ser responsável e a se comportar como uma dama da sociedade, conquistando o respeito das outras mulheres. E foi num dos tantos eventos do clube que ela acabou se aproximando do Jhonatan, na época um jovem Universitário recém formado e cobiçado, cujos olhos dourados contrastavam com o negro dos cabelos, e que assim como ela, sonhava com uma família perfeita, apaixonando-se, trocando alianças em menos de um ano. Eles já haviam se visto algumas vezes, mas ele estava focado demais nos estudos para se entregar ao encantamento que já tinha por ela, ainda uma adolescente confusa

— Não precisa se preocupar, mãe. Acho que já sei o que é. — referiu Nathaniel, lembrando que às vezes o Sistema Operacional do seu computador ocultava os arquivos, devido um bug. E era isso mesmo. Assim que ele abriu os arquivos ocultos o documento da mãe apareceu. E ela ficou tão feliz que o abraçou.

— Atchin! — espirrou. Nath tinha pelos da pequenina nele. — Atchin!

— Você esteve no meio daqueles gatos de novo, não é? — perguntou e Nath apenas deu um sorriso amarelo. Se ele falasse alguma coisa ia ter que mentir de novo e não queria fazer isso. — Atch! Tch! — tamponou o nariz tentando controlar os espirros. — Que droga, Nathaniel! Você sabe que sou alérgica a pelos de gato! — repreendeu-o. — Eu não ligo de você cuidar dos gatos que vê pela rua e nem de você se enfiar naquele pet, mas sabe que tem que ir direto para o banho quando vem para casa. — falou fanhosa pela mão pressionando as narinas que começavam a avermelhar. Nath se desculpou e saiu de perto, voltando para seu quarto a passos largos, prometendo que ia direto para o chuveiro.

— E não saia debaixo d'água até estes pelos sumirem da sua pele! — ordenou vendo-o subir a escada correndo. — Não quero ficar espirrando na mesa de jantar. Você sabe como seu pai é. — tentando manter-se séria, pois ao mesmo tempo em que se zangava com o garoto toda vez que se aproximava dela cheio de pelos de gato, achava fofo da parte dele aquela dedicação aos felinos de rua. Se não fosse sua alergia ela mesma daria o mais lindo dos gatinhos para ele.

Depois de tomar um pouco d'água e controlar os espirros ela voltou para o computador, deixando o copo bem longe do laptop, com medo de derrubá-lo sobre o eletrônico, igual fizera com o dela.

— Hmm... Quem será esta garota? — perguntou-se baixinho enquanto vasculhava as pastas de música, em busca de algo para ouvir enquanto trabalhava na sua pauta. Nath, devido os espirros da mãe, distraiu-se e esqueceu de acionar a opção de manter as pastas ocultadas, tornando visível uma determinada pasta que ele mantinha oculta por um motivo bem simples: Privacidade. — Por que tem tantas fotos dela nesta pasta?

Ela ouviu pedacinhos de algumas músicas que estavam dentro da pasta e sentiu um bichinho lhe morder ao ouvir todo aquele romantismo musical. Seu rosto apoiado sobre o punho fechado já demonstrava de quem Ambre puxara a personalidade ciumenta.

— 91225519. — leu o nome da pasta, deduzindo ser um número de celular, anotando em sua agenda. — Nath não penava apenas com o ciúme da irmã, o da mãe era muito maior.

De volta ao seu quarto, enquanto Haoqi dormia escolhidinha sob o tapetinho e Nath se preparava para tomar outro banho, o celular vibrou e assoviou novamente, indicando o recebimento de outro SMS, e daquela vez ele ouviu.

< Nath, esqueci os relatórios de estágio do Dajan e do Jade na sua gaveta. Desculpe-me. Você terá que ir a escola amanhã cedo para pegar e entregar para a diretora assinar. Eles precisam levar para a Universidade amanhã mesmo. Eu faria isso, mas não tenho as chaves das suas gavetas. Sinto muito mesmo! >

Nathaniel sabia que uma vez colocando os pés na escola e estando diante da Sra. Shermansky, ele não ia mais conseguir sair, e isso o irritou.

— Droga! Lá se vai minha 4ª feira de descanso. — reclamou para si mesmo — Eu não sei por que ainda deixo você usar as minhas gavetas, Melody! — enquanto via as mensagens anteriores. — Depois desta vou te arrumar um arqu... — calando-se ao ver uma imagem, sentindo o sangue mudar o tom de sua pele, que de clara ficou vermelha. Ele nunca sentiu nada como aquilo antes. Se existia nele alguma dúvida que estava apaixonado por Emília, findou naquele instante, pois somente estando apaixonado para ele ter aquele sentimento corroendo seu peito por conta de uma foto.

Largando a toalha no chão ele deu zoom na imagem, desejando estar vendo demais. Sua respiração ofegante e seu semblante fechado denunciavam sua ansiedade, seu ciúme. Ele sofreria, mas aceitaria ver Emília nos braços de qualquer um, exceto Castiel, isso ele não suportaria, porque acreditava que se o ruivo viesse a ficar com ela seria por vingança e não por estar apaixonado.

Ele não estava vendo demais, o rosto de Emília estava colado no peito do ruivo e suas mãos se tocavam. Nath não via mais nada a sua frente, nem mesmo aquela imagem que Ambre lhe enviou. Foi como se a tempestade que aproximou aqueles dois turvasse sua vista e seus pensamentos. Seu coração estava tomado por uma raiva gigantesca, sentimento que ele nunca havia sentido; e aquele ciúme misturado com um instinto protetor estava difícil de suportar... Castiel não tinha o direito de usar Emília para atingi-lo.

— Filho da puta! — xingou, possesso, atirando seu Smartphone de uma linha cara e com uma semana de uso contra a parede, saindo em seguida, batendo a porta do quarto, sem nem mesmo ver o estrago do aparelho. O vermelho da sua pele já havia chegado aos seus olhos. Sua mãe, que estava indo falar com ele, no intuito de sondar sobre a garota das fotos o viu sair, preocupando-se ao ver a expressão de seu rosto. Expressão que ela não via há muito tempo, desde que ele mudou de comportamento, deixando seu lado arredio na pra trás.

— Nathaniel! Filho! — chamou-o, sem resposta. Ele estava cego e surdo por causa daquele sentimento confuso. — O que você tem? — perguntou, agoniando-se, pois conhecia bem o filho e sabia o quanto ele podia ser arredio quando perdia o controle de si. — NATHANIEL! — chamou-o novamente, gritando do rol da escada, ouvindo apenas o bater da porta da sala. Nath saiu de casa sem olhar para trás, e do jeito que estava nem mesmo a chuva gelada ia conseguir esfriar sua cabeça.

A Sra. Chevalier sentiu o coração apertar, pois pressentiu que aquilo ainda ia gerar um mal estar dentro daquela casa novamente. Se Nathaniel voltasse a ter um comportamento inadequado seu pai não ia ser complacente. Se ele se perdesse novamente ia desapontar o pai e perder a pouca confiança que havia conquistado a muito custo, e ainda corria o risco de ser enviado para um internato, e ela não suportaria ficar longe dele, o seu "bebê".

 

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Notas finais do capítulo

[1] Vasltisianos: Integrantes do Vasltis Club, Associação fictícia de empresários locais (tipo Rotary), de médio e grande porte, que o pai de Nath faz parte. A palavra Vasltis significa unidos, em macedônico. Foi escolhida através do Google tradutor. Este grupo não existe, pelo menos eu acho que não.