Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 18
Economia doméstica. Tudo junto e misturado.


Notas iniciais do capítulo

Essa foi a forma que encontrei para juntar os amigos na mesma sala tendo eu dado idades diferentes a eles.

Os textos em itálico e colocados entre colchetes correspondem aos registros da Emília no diário.

REVISADO E EDITADO - 17/08/17



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#08/03#

Pela primeira vez as páginas do diário de Emília serviram para o fim que se destinavam. Ela pouco escrevia nele, pois sua dificuldade em expor o que lhe feria ainda era grande. Mas daquela vez, a saudade que sentia da mãe e a sensação de não ser amada por ela, mais os problemas que estava vivendo na escola não a deixariam dormir. Ela teria conversado com suas amigas, mas Mila, na TPM, não seria sensata nos seus conselhos e Ana estava vivendo seus próprios conflitos.

Sua mente estava confusa e seu coração parecia compartilhar daquela confusão. Como se não bastasse a distância da mãe, tinha o seu rendimento insuficiente para manter a bolsa na S.A., as agressões veladas da Ambre e das amigas dela e as provocações do Castiel. Ela quis tanto que as coisas fossem diferentes que acabou tendo seu desejo atendido, só que para pior. Antes, bem ou mal, mesmo não sendo a mais atenciosa do mundo, a mãe estava por perto, ela conseguia dar conta dos estudos e ninguém a maltratava na escola. Pelo menos o Lys, sempre educado e gentil, e suas novas amigas, Vio e Iris, deixavam o seu dia um pouco melhor, e até a Rosa com seu jeito espevitado de ser a alegrava um pouco.

[... Se pelo menos o Nath ]

Ahhh. Por que ela tinha que pensar nele? Seu diário ganhou sua primeira rasura, sua primeira frase inacabada e rabiscada e seu primeiro registro quebrado, pois lembrar daquele garoto fez todos os outros pensamentos sumirem e a caneta mudar de assunto.

Ela não queria pensar nele, mas não conseguia evitar. Por que um simples abraço não saía da sua mente? E por que lembrar daquele momento dava a ela uma estranha sensação de felicidade e ao mesmo tempo a incomodava?

[ Nath ]

[ Nathaniel ]

[ Nath ]

[ Nath ]

[ Nathaniel... ]

Quando ela deu por si a página do diário estava coberta pelo nome do rapaz, escrito em letras pequenas e grandes, de forma e cursiva, enfeitadas e sem enfeites... Rapaz este que ela achou que a beijaria e que por culpa de uma flor não sabia se o beijo realmente teria acontecido ou se ela havia se equivocado e confundido as intenções dele, afinal, ao que tudo indicava, ele tinha uma namorada, ou affaire[1], não importava... Ou será que importava?

Por que pensar naquilo mudou a sensação que fazia seus lábios sorrirem e sua caneta escrever repetidamente aquele nome num caderno de folhas cor de rosa com uma linda fada no canto inferior? Por que aquilo a preocupava? E por que aquela aflição ela não conseguia registrar naquele caderno? Por que naquele instante pensar naquele garoto fez nascer nela a sensação de que estava fazendo algo de errado se minutos antes a lembrança do abraço dele alegrava seu coração?

Emília podia ser inexperiente e não saber nada sobre o amor, mas não era tão ingênua ao ponto de não entender o que estava sentindo. Ela teria roído todas as unhas, de arder a ponta dos dedos, se não fosse sua fadruxa. Ela até queria renegar totalmente aquela bruxa de pano que um dia fora uma linda fada, mas por mais que tentasse, a boneca ainda acalmava seu coração e afugentava seus medos e suas dúvidas, mesmo que só enquanto dormia agarrada a ela.

O perfume de uva da caneta gel até pode ter perfumado as folhas do diário, mas não adocicou as palavras que ela escreveu...

Melody e ela podiam não ser super amigas, mas se davam bem e ela gostava da colega, que além de ser gentil com ela, foi sua tutora nos estudos quando chegou a escola.

[ ... Que tipo de garota se interessa por um garoto comprometido, Emília Solles? E pior, comprometido com uma colega? O tipo de garota que nem mesmo você ia querer ter como amiga...]

Depois de escrever tal pensamento, fechou seu diário; e sentindo-se desconfortável levou sua boneca consigo para a cama, adormecendo sentindo o cheiro do nanquim que tingiu de preto a lã rosa do cabelo da fada por agarrar-se a ela. Foi uma noite silenciosa.

Na manhã seguinte a boneca foi colocada dentro do guarda-roupa, pois olhar para ela ainda a fazia lembrar daquele que a abandonou.

Depois de tomar uma ducha rápida Emília foi tomar café com a tia, deliciando-se com sua tão saborosa baguete com nutella, depois voltou ao seu quarto para se trocar. Ao abrir o guarda-roupa e dar de cara com sua fadruxa, olhando para ela, sentiu-se nostálgica, pois a lembrança de um rosto que há anos não via, a não ser por meia dúzia de fotos antigas e remendadas, foi à mente dela, o que a levou a fechar a porta e pegar o Jeans do mancebo e que havia usado no dia anterior. Ela não queria lembrar de quem a havia esquecido. Mas ao pegar seu diário para guardá-lo na gaveta sentiu o coração apertar. A ponta do marcador de páginas que Nathaniel havia lhe dado pareceu chamar sua mão, que não resistiu ao chamado e o puxou para fora do caderno. O perfume da caneta o havia impregnado.

Antes de sair de casa o diário dela ganhou a gaveta e a boneca a cômoda.

Pelo menos o sol se fez presente e ela não precisou pegar o ônibus para ir ao S.A.

Assim que chegou, Sol guardou suas coisas no armário e depois foi para a sala, ou melhor, para a cozinha Experimental, local onde seria ministrada a aula de Economia Doméstica daquele dia, levando consigo seu fichário, estojo e calculadora, ferramenta muito útil nas aulas da professora Nancy, que adorava fazer os alunos calcularem cada centavo a ser gasto e economizado. Seu coração batia de forma diferente naquele dia e ela sabia o porquê.

Apesar de não ser uma das matérias mais divertidas da grade optativa do currículo escolar do Sweet Amoris, Economia Doméstica era uma das poucas disciplinas mistas que alunos do último ano do collège podiam assistir com os calouros do lycée. Até o dia anterior ela queria que a tia tivesse escolhido Audiovisual ou Natação, que além de mistas com o lycée, eram mais interessantes, mas daquele dia em diante não teria aula que ela desejasse mais que aquela.

Assim que ela entrou na sala a primeira pessoa que seus olhos buscaram foi o Nathaniel, mas vê-lo não lhe causou uma sensação agradável. Melody estava ao seu lado, ele lendo mais um dos livros de romance policial que havia na biblioteca e ela apenas a observá-lo. Era impossível não perceber nos olhos daquela garota o quanto ela gostava dele.

Sol não queria sentir ciúme, mas sentiu.

O melhor era olhar para os lados e buscar seus amigos.

Lysandre sempre tão gentil a cumprimentou com um sorriso e um aceno, ajeitando o pequeno fone no ouvido esquerdo. Ao seu lado estava Castiel, com o outro fone no ouvido, devorando um muffin enquanto selecionava uma música no celular para o amigo ouvir junto com ele. Leigh, o irmão mais velho do Lys foi quem escolheu aquela disciplina, pois achou que seria interessante, por morarem sozinhos. Já Castiel, não aguentava mais Economia Doméstica, tendo-a cursado no ano anterior. Por morar sozinho, a mãe o inscreveu, novamente, na aula, achando que ele ainda tinha muito que aprender. Kim e Charlotte também cursavam ECDO[2] por uma escolha dos pais, mas elas não se incomodavam, pois o que aprendiam na aula lhes dava mais independência. Já Ambre odiava e só cursava por causa do Castiel. Ela faria natação com ele, mas nada a tiraria da cama mais cedo todo sábado, nem mesmo sua paixão de cabelos vermelhos. Nathaniel, embora não adorasse, achava útil. Um dia, não muito distante, ele viveria num campus Universitário e precisaria daquele conhecimento. Da turma da Sol, Melody cursava pela mesma razão que Nathaniel, se preparar para viver num campus Universitário. Já Violette foi inscrita na disciplina pelo pai, pois com a morte da esposa achou que seria bom para a filha. Iris optou pela disciplina por querer ajudar a mãe em casa, entendendo que não era fácil para sua genitora cuidar sozinha de dois filhos. Li, assim como outros alunos, estava cursando porque os pais queriam. Rosa parecia ser uma das poucas que realmente adorava aquela matéria. Ela dizia que graças às aulas da prof. Nancy ela conseguia ajudar o namorado na hora de comprar os tecidos e outros materiais.

— Oi Sol. Bom dia! — desde a atividade em grupo que Emília sentava ao lado da Rosa, pois Lys sempre sentava ao lado do amigo ruivo e Iris e Violette com a Kim. — Conseguiu se inscrever em algum clube?

— Bom dia, Rosa.  Consegui sim. Graças a Deus o Dejan é super legal e entendeu que eu estava confusa e queria tomar a decisão certa. — respondeu, revelando que havia se inscrito no clube de basquete.

— Clube de basquete? — indagou Rosa, sem entender a escolha da amiga. — Você não tem cara de quem curte basquete! — mas Sol não quis expor os motivos da sua escolha, dizendo apenas que ela não tinha jeito para jardinagem.

— Pelo menos o clube de basquete deve ser mais agitado! — disse, tentando não olhar para o Nathaniel, que estava no final do balcão da mesma fileira que elas, estando Melody na ponta, separada dela apenas por um estreito corredor entre os balcões. Se ela ousasse olhá-lo notaria que ele, por diversos momentos, discretamente a observou, querendo entender o que havia acontecido naquela arquibancada e o porquê.

— Confesso que eu pensei que você fosse escolher o clube de jardinagem, Sol. — comentou Lysandre, que estava sentado atrás dela. Castiel não se pronunciou, preferindo dar atenção as suas músicas.

— Por que achou isso, Lys? — perguntou a moça, virando-se na banqueta para poder olhar para ele.

— É que eu te acho... delicada. Pra mim você combina com as flores. — respondeu ele, balançando a caneta entre os dedos, mania que tinha e que fazia sempre que estava tenso ou preocupado, mesmo que só um pouco, geralmente por conta de estar com algum bloqueio criativo, o que surpreendeu Castiel, pois Lysandre não estava nem um pouco bloqueado naquela manhã, muito pelo contrário. Embora raramente alguém, além do irmão, conseguisse decifrar seus olhares e sorrisos, o ruivo conhecia bem algumas reações do amigo diante algumas situações, embora este fosse o mistério em pessoa, e não era comum ele, sempre tão discreto e reservado, tecer elogios às colegas de escola.

Emília corou e sorriu, levando Rosa a imaginar coisas, novamente.

“Pronto, bastou um elogio pra ela se abrir toda!”, pensou Castiel, enquanto assistia a cena, de braços cruzados e cara fechada, como era característico dele, tanto que ninguém se arriscava a afirmar que seu mau humor era por motivo A ou B, pois podia ser o C, D e se duvidar, NDA.

— Então, Lys-fofo. Quando você e a Sol pretendem “estudar Geografia”, juntos? — perguntou, maliciosamente, fazendo ambos corarem.

PLAFTH!

Ouviu-se o barulho de algo batendo no chão, desviando a atenção de Emília para aquele que estava na outra ponta daquele balcão. Nath havia batido o cotovelo na prancheta e a derrubado. Sem graça, não por ter derrubado o objeto, mas por "se pegar" prestando atenção na conversa alheia, ele se curvou na banqueta e o pegou do chão, incomodando-se por ter quebrado.

— Essas pranchetas de acrílico são uma porcaria mesmo.

— Verdade. Só são bonitas. — comentou Mel, totalmente alheia ao que se passava na mente do garoto dos seus sonhos. — Quer usar a minha até trocar a sua? É rosa, mas está inteira.

— Não, Mel, mas obrigado. — sorriu. — Ainda dá pra usar. E depois eu pego outra no grêmio.

Ele tinha um sorriso tão lindo. Pena que não era para ela que ele sorria.

— Sol... Sol.

— S-Sim, Rosa. — voltou o olhar para a amiga.

— Eu perguntei quando você e o Lys vão estudar juntos? Ele disse que pode ser quando você quiser. Então...

— Ah... N-Não sei...

Por sorte a professora Nancy entrou na sala, levando todos eles a ficarem quietos, pois Emília havia se perdido entre sua conversa com os amigos e sua vontade de prestar atenção no presidente do grêmio.

As aulas de Economia Doméstica só aconteciam às 6ª feiras e sempre nas duas primeiras aulas do dia. Os temas das aulas eram escolhidos de acordo com as necessidades que Nancy percebia em cada aluno, desde ferver o leite a apertar um parafuso. E a cada mês era trabalhado um tema diferente e naquele era “praticidade na cozinha”, pois percebeu que muitos alunos reclamavam dos pais terem pouco tempo para cozinhar para eles.

Apesar de Economia Doméstica não ser interessante, Nancy era uma excelente professora e conseguia prender a atenção dos alunos. As únicas que não prestavam atenção nas aulas dela eram Ambre e Li. Charlotte até se deixava envolver nas fofocas das amigas, mas de acordo com o tema do mês, ela prestava atenção. Mas a loira não se continha de ansiedade. Ela não conseguiu esperar o intervalo para contar a novidade.

— Então meninas, ele é simplesmente fabuloso! — gabou-se, referindo-se ao garoto que havia conhecido no shopping e que a levaria ao cinema naquela noite. — Ele estuda naquela escola tecnológica gigantesca perto do Museu de Artes!

Ambre não parava de falar. Li, outra que vivia trocando de paqueras, lhe dava toda a atenção, empolgadíssima com o flerte da amiga. Já Charlotte se manteve quieta, fazia que ouvia, mas estava mais ligada na aula, pois seus pais trabalhavam demais na loja e a comida congelada era comum sobre a sua mesa de jantar.

— Senhoritas Ambre e Li! Mais uma interrupção e vocês ficarão depois da aula! — avisou Nancy, irritada. Ela não admitia conversas paralelas na sua aula, principalmente quando estava orientando a turma.

A dupla de patricinhas fechou a boca por alguns minutos, mas logo estavam conversando novamente. A professora ficou uma arara, mas não as repreendeu mais, fez-se de surda. Na verdade ela soltou a linha, para depois puxar, como um garoto empinando pipa.

Nancy continuou explanando sobre o tema do mês.

— Como eu ia dizendo, com a rotina corrida dos tempos de hoje, é muito difícil dedicar horas do dia cozinhando, e depois a limpar o espaço e os materiais utilizados para preparar, servir e degustar os alimentos... — falava calmamente, observando de canto de olho a loira e sua amiga filha de imigrantes chineses.

Os alunos conheciam a personalidade da professora e estranharam ela não pedir que Ambre e as amigas saíssem da sala, pois conversavam tão alto que para se fazer ouvir, Nancy tinha que elevar a voz.

— Isso não é um bom sinal! — murmurou Rosa, temendo o semblante calmo que a professora manteve durante toda a aula.

— O que foi Rosalya? — perguntou Sol, baixinho, querendo ser ouvida pela amiga, mas não pela professora. — Que cara é essa?

— A prof.ª Nancy nunca foi tão tolerante assim com conversas paralelas, ainda mais elas falando alto deste jeito. — comentou, sem olhar para o lado, tão baixo que Sol quase não a ouviu. — Alguma coisa está errada!

— Quem sabe ela vai punir as garotas depois da aula! — comentou Sol, que apesar de já ter aula com aquela professora há dois meses, nunca a viu perder as estribeiras ou punir um aluno de forma mais severa.

— Assim espero, porque se ela fizer o que estou pensando, eu mato a Ambre! — disse, como se estivesse prevendo a última meia hora de aula. Sol não entendeu nada.

Faltando pouco mais de 30 minutos para encerrar a aula, Nancy pegou um giz e escreveu na lousa, com letras garrafais:

“ATIVIDADE PARA NOTA, EM DUPLA – COM OS CUMPRIMENTOS DAS ALUNAS AMBRE E LI!”

Todos os alunos da sala olharam para as duas, inclusive Charlotte, que se sentiram fuziladas. As atividades extras da professora Nancy eram super trabalhosas de fazer. Nunca era apenas uma pesquisa de internet ou livros, eles tinham que pesquisar no comércio local, fazer cálculos, tabelas, planilhas, e para completar, ainda tinham que produzir alguma coisa. Eles podiam dizer adeus àquele final de semana, às tardes depois do colégio e à 4ª feira, por no mínimo uma semana.

— Bom, como agora eu “finalmente” tenho a atenção de “to-dos” da sala, vou dizer o que terão que fazer, para a próxima aula, mas apenas uma vez, então espero que nenhum aluno ou “alunas” resolvam sequer espirrar enquanto eu estiver falando! — ironizou, caminhando calmamente pela sala, entre os alunos, com as mãos nos bolsos do guarda-pó, olhando diretamente para Ambre e sua amiga.

— Como nada melhor que a prática para aprendermos algumas coisas, vocês vão se reunir em duplas, ouviram bem, du-plas, e para quem acha que dupla se faz entre três pessoas, já aviso logo, a nota também será dividida por três; três zeros. — disse, ela. Desta vez seu semblante não estava tão calmo, mas também não estava com cara de irritada, na verdade, ela estava irônica.

— Continuando. Vocês terão que, juntos, preparar um prato da escolha de vocês, seja doce ou salgado, porém, algo prático, rápido, que não exija muitos utensílios, nem muitos ingredientes. Algo que alguém que tenha pouquíssimas horas livres por dia possa fazer sem lhe ocupar muito tempo. — explicou, retornando para frente da sala. — Mas como vocês sabem, nem todo mundo tem o armário abastecido com todo tipo de especiarias, ou dinheiro para comprar tudo o que precisar. Sendo assim, todos vocês terão que trabalhar em cima de um mesmo valor, até € 15,00 e nenhum centavo a mais.

— Mas só isso? O que eu compro com isso? — questionou Ambre, que só via a marca das coisas, mesmo nos alimentos.

— Pergunte a sua empregada! — respondeu Sol, sem pensar, nervosa por conta da atividade, pois era uma negação da cozinha. — Na certa ela vai te indicar muitos produtos! — Ambre cerrou os dentes de raiva, mas antes que tivesse a chance de retrucar, a professora mandou as duas se calarem ou não explicaria mais nada e eles teriam que se virar sozinhos.

— Chhhiiiiiu.... — ecoou na sala inteira, em coro. Todos os alunos as queriam caladas.

— Como eu estava explicando, o valor é igual para todos, e já que tem “alunos” na sala que não sabem onde encontrar produtos a preços baixos — disse com um sorriso nos lábios que fizeram principalmente os garotos se arrepiarem. — vocês terão que pesquisar os preços em pelo menos três estabelecimentos antes de comprar.

É sabido que garotos odeiam, salvo uma minoria, fazer compras de mercado, quanto mais ficarem entrando em vários estabelecimentos para fazer pesquisa de preço.

— E antes que me perguntem, mesmo que tenham os produtos em casa terão que fazer a pesquisa, pois eu quero tudo isso anotado. Vocês farão uma planilha de custos com todos os produtos utilizados, com preços, quantidade, marca e tudo mais que se faz necessário. Eu também quero uma planilha com os preços de todos os locais em que forem, com a diferença convertida em porcentagem. — comunicou, mostrando em seguida o modelo de planilha que queria e que ficaria exposta no quadro de avisos da sala.

A cada palavra dita pela professora os alunos ficavam mais possessos com a Ambre e Li. Mas Sol só conseguia pensar no seu espaguete grudento.

— Além da planilha, eu quero a receita detalhada do prato, com foto e passos do preparo, que por sinal, será feito “aqui”, na escola! — disse, gerando murmurinhos entre os alunos. — Quero ter a certeza que o alimento foi preparado pela dupla e não por outra pessoa! — disse, revelando em seguida a parte boa da atividade.

— Para não dizerem que eu sou carrasca, serei boazinha e premiarei uma dupla, então não pode haver dúvidas sobre quem preparou o prato e nem sobre o processo de preparo.

Os alunos ficaram ouriçados. A atividade havia se transformado num concurso de culinária e como a maioria deles apreciava uma boa competição, se sentiram estimulados.

— E qual é o prêmio professora? — perguntou uma aluna, do canto da sala. — Tem que valer a pena!

— Bom, além da nota, a dupla vencedora ganhará um jantar “com-ple-to” no “Alcidamo”... — contou, gerando euforia entre as alunas. Alcidamo era o melhor restaurante italiano da cidade, além de ser o mais badalado. Para conseguir uma reserva era muito difícil, e ainda assim, tinha data específica para ligar, com agenda sempre pro mês seguinte.

Ambre enlouqueceu. Ela estava perturbando os pais havia meses para a levarem no Alcidamo, mas eles ainda não haviam conseguido uma reserva.

— Isso é impossível! Meus pais estão tentando uma reserva há meses, sem sucesso. — retrucou, questionando a veracidade da premiação. — Como a senhora vai conseguir isso, e para a semana que vem?

— Fica quieta, Ambre! — ralhou Nath com a irmã, morrendo de vergonha. — Você já falou demais por hoje! — fazendo-a cruzar os braços e se emburrar.

— Eu não vou, Srta. Ambre. — disse Nancy, com a cara fechada. Ela odiava ter sua palavra questionada, mas manteve a pose, indo até a aluna, parando diante dela, revelando com um largo sorriso, satisfazendo-se da cara da patricinha. — Eu “já” consegui! — retornando para sua mesa. — A mesa para duas pessoas está reservada para a noite do 1º domingo de abril, e com todas as despesas cobertas. E a nível de curiosidade, as reservas são minhas, mas como minha companhia não poderá mais me acompanhar, estarei cedendo a vocês, ou melhor, premiando dois de vocês. 

Os alunos ficaram empolgadíssimos com a atividade. Todos queriam ganhar. Salvo Castiel que via naquilo uma tremenda bobagem. Ele só participaria se fosse obrigado.

Como eles tinham que realizar a atividade daquele dia, que era aprender a fazer bifes de hamburguer e almôndegas caseira, Nancy avisou que todos os detalhes da atividade seriam fixados no quadro de avisos do corredor principal, perto da escadaria, assim que terminasse o 1º período, junto com a lista em que eles deveriam colocar os nomes das duplas, até o final do dia, e depois pediu que alguns alunos ajudassem a distribuir os ingredientes para os colegas. Enquanto uns pegaram a carne moída, já separadas em poções de 1/2 kg para cada aluno da turma, outros pegavam os temperos.

Finalmente uma coisa que Castiel apreciava. Hambúrguer. Desde que havia aprendido a fazê-los, no ano anterior, nunca mais comprou os industriais. Além de economizar uma graninha, pois era mais barato fazer, comia carne de verdade. E como ele já sabia fazer hambúrgueres, Nancy o colocou como ajudante. Ele não gostou muito, mas não era idiota de recusar. Pelo menos ele ganharia um pontinho extra por ajudar.

— O Lysandre pode me ajudar, professora? Ele sabe fazer hambúrgueres, e muito bem, por sinal. — e é claro que ele não ia bancar o assistente de chief sozinho.

O platinado apenas olhou para o amigo com cara de quem, silenciosamente, gentil e educadamente, o chamou de filho da puta, dando um suspiro longo e colocando a tábua de carne sobre o balcão.

A aula fluiu como sempre, com uns reclamando do trabalho que dava fazer tal coisa e outros achando bem fácil, uns errando no tempero e outros acertando... Nada incomum nas aulas da professora Nancy. Quando não estavam salgando a comida, estavam martelando os dedos ou manchando alguma peça de roupa com água sanitária. Por Sorte Emília teve uma rápida, porém atenciosa ajuda do amigo de cabelos nevados, para alegria da Rosalya, cuja cabecinha já pensava em alguns estratagemas para juntar aqueles dois.

 

 

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Notas finais do capítulo

[1] Affaire: expressão que significa caso amoroso ou romance escandaloso, que pode ser público ou mantido em segredo. Affair em português e inglês.

[2] ECDO: abreviação para Economia Doméstica. (Accueil Économie)

Todas as disciplinas citadas nesta fic fazem parte do currículo escolar francês.