Priston Tale escrita por Yokichan


Capítulo 11
Capítulo 10




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Shellby POV On.

 

 

         Meu coração chorava, e eu mal sabia o motivo daquilo. Era incrível como um simples - e caloroso - toque de Alec podia mexer comigo, de uma forma que eu há tempos não experimentava. A última vez em que meu coração tentou negar o veredicto de minha mente, fora na noite em que eu decidira abandonar o dom da premonição. Ver o futuro geralmente me machucava, de uma forma que apenas eu sabia como doía. Era como não pertencer àquele mundo, e sentir a solidão que ele me proporcionava. As trevas me envolviam, a confusão de minha mente na busca do certo e do errado, na busca da paz, principalmente. Fora naquela noite que meu coração chorou, e eu prometi que jamais usaria meu dom outra vez. Infelizmente, eu havia quebrado aquela promessa.

 

 

         "Fora horrendo quando meus olhos viram aquele futuro catastrófico. Eu era apenas uma criança, mas uma criança madura o bastante para compreender que aquelas visões me perturbavam profundamente. Nas cartas, que tão cedo preencheram e intensificaram a minha solidão, eu vira a morte de meus pais. Os corpos sem vida estirados ao chão, cobertos por um frio manto rubro de sangue. Seus olhos fechados assombraram meus pensamentos, e eu senti que algo havia perfurado o meu coração. Naquela noite, a premonição virou realidade, e não só meus olhos como também minha mãos puderam sentir o frio mórbido daqueles cadáveres que tanto eu amara. Eu era apenas uma criança, uma órfã que não sabia controlar o dom que tinha, e pensava que um monstro crescia dentro do coração. Um monstro assassino, que havia planejado a morte dos próprios pais. Mal sabia eu - e levaria muito tempo para saber e compreender - que nenhum monstro vivia dentro de mim, assombrando-me, mas sim um poderoso dom que me permitia prever um breve futuro. Eu não pude fazer nada para impedir a morte de minha família, e sangue foi derramado diante de meus olhos chorosos. Naquela noite, eu me senti realmente sozinha, completamente abandonada. Fora o momento em que decidi que jamais abriria meus olhos daquela forma novamente, e que a premonição estaria esquecida em mim daquele dia em diante. Jamais usaria meu dom, mesmo que eu pudesse prever coisas boas. Eu jamais sofreria outra vez, jamais veria algo que não pudesse impedir, um vida que não pudesse salvar. Verkan encontrou-me perdida na escuridão, e fez de mim uma pessoa boa e justa. Mesmo que todo tempo do mundo passasse, eu não esqueceria das palavras que ele me dissera quando acolheu-me como sua aprendiz. 'Certas vezes, o coração prevê muito além do que qualquer dom de premonição.' Eu decidi usar meu coração, e apenas ele para aprender a caminhar sozinha. Eu confiaria em mim, e deixaria aquela criança tristonha em um passado esquecido dentro de minha alma."

 

 

         Na escuridão fria do Battle Castle, eu me sentia mais segura. Certamente, uma sensação estranha, mas era assim que eu tinha me acostumado a viver. Era madrugada feita, e nuvens acinzentadas cobriam os céus do BC, levemente deixando que a claridade da lua transpassasse entre elas. Não haviam muitos guerreiros lutando naquele momento, talvez uns cinco ou seis, importunados com a insônia cruel. Adentrei apressadamente minha barraca, escondendo-me na penumbra daquele abrigo. Ali, ninguém ousaria tirar o chapéu de minha cabeça, descobrindo o sentimento que eu tentava esconder nas sombras daquele gorro, para que ninguém lembrasse de quem eu realmente era. A criança que havia previsto a morte dos próprios pais, e que fora tão fraca ao ponto de deixar que aquilo realmente acontecesse. Eu não queria ser olhada novamente por aqueles rostos assustados, inexpressivos. Eu apenas desejava ser a Shellby do Battle Castle, a reclusa e misteriosa Shellby. Por que eu simplesmente não conseguia? Por que havia alguém que insistia em lembrar-me daquele passado horrendo? Era assombrosamente difícil continuar sendo quem eu era, a mulher do gorro púrpuro que jamais mostrava seu rosto.

         Acendi uma vela sobre minha pequena mesa redonda, mas a claridade do fogo mostrou algo que eu não queria ver, pelo menos naquele momento.

 

 

Shellby POV Off. Alec POV On.

 

 

         Eu queria aquela resposta, mais que tudo naquela madrugada. Por que eu me importava tanto com Shellby?

         Sem discrição alguma, em passos largos e desesperados, não hesitei em adentrar aquela barraca. A escuridão era quebrada por uma vela acesa sobre a mesa, e a pequena chama dançava no ar, delicadamente. Ela, tristemente melancólica, estava atrás da vela, escondendo o rosto com as mãos trêmulas. Seu chapéu estava caído ao chão, do lado da mesa. Eu havia a magoado.

         Sentindo-me estúpido e inoportuno, aproximei-me lentamente da mesa, agachando-me e resgatando o chapéu do chão. Coloquei-o sobre a mesa, olhando para o mesmo. Meus olhos não tinham um pingo de coragem para encarar o rosto doloroso daquela mulher. Eu precisava aliviar aquela dor, pois meu coração sentia-se culpado por causá-la. Era verdade que eu não sabia nem um pouco do que acontecera no passado de Shellby, mas eu estava disposto a livrá-la daquele tormento, seja qual fosse ele.

 

- Me desculpe. - pedi em um murmúrio, fitando o rosto dela coberto pelas mãos aflitas e molhadas pelas lágrimas

 

         Ela nada disse, e imaginei que aquilo era aceitável devido a situação. Agachei-me ao seu lado, fitando aquele rosto cheio de lamentos. Não importava o quanto eu me arrependesse do que fizera, aquilo não iria amenizar o sofrimento que aquela mulher tinha no peito. Ela enfim baixou as mãos, deixando-as cair sobre as pernas vacilantes. Seu rosto era muito mais triste do que eu imaginava, muito mais pesaroso. Que terror era aquele? Que dor imensa era aquela que Shellby sentia?

 

- Por favor, me desculpe. - supliquei muito delicadamente - Não sei o que deu em mim... Eu não queria deixá-la assim. - murmurei

 

- Quem você pensa que é, Alec? - ela perguntou com pesar, encarando as próprias mãos - Quem você pensa que é para dizer o que pensa sobre mim? - seu corpo inteiro parecia tremer

 

- Eu apenas pensei que... - não imagino que desculpa eu lhe daria, mas fora assombrosamente interrompido pelos gritos dela

 

- Você não sabe nada sobre mim! - ela despejou em prantos desesperados - Você não sabe como é ser chamada de monstro! Você não sabe como é se sentir culpada pela vida das pessoas que você mais amou na sua vida! - gritou ela, sôfrega e dolorosa

 

- Shellby... - murmurei pasmo, sem saber o que estava acontecendo

 

- Como você ousa descobrir o meu rosto?! - urrou ela, tão frágil e nostálgica - Como ousa lembrar o que eu mais desejo esconder?! Você não sabe como é doloroso, Alec! Você não sabe como é viver debaixo de uma sombra, tentando esquecer um passado que ainda te traz sofrimento! Você não sabe como é temer ser olhada tão friamente pelas pessoas, imaginando ser a pior das criaturas do mundo! Não, você não sabe! Você nunca entenderá o quão triste é me manter dessa forma, todos os dias! - seus olhos não paravam de derramar lágrimas, molhando todo seu rosto em traços de dor

 

- Não, eu não sei. - baixei o rosto, murmurando melancolicamente, então ergui os olhos para ela - Mas eu prometo que entenderei, e que lhe protegerei com esses punhos... - ergui as mãos para ela, encarando-a com firmeza - Caso alguém lhe chame de monstro outra vez. - prometi, veemente de minhas palavras

 

- Você... - ela mirou seus olhos injetados para mim, assustada - Me protegerá..? - repetiu ela, incrédula e pasma

 

- Não sei o que aconteceu com você, e não precisa me contar se não quiser, mas tenha certeza de que se permitir que eu a proteja, não deixarei que chore novamente. - afirmei, fitando-a com profundidade - Não importa o passado que você teve, ninguém lhe chamará de monstro na minha frente, porque você não é um monstro, você é uma mulher que eu admiro, Shellby. - disse sério

 

- Mas... - ela tremia por completo - Por quê? - seus olhos inundados de lágrimas brilhavam na direção de meu rosto

 

- Todos nós temos os nossos motivos, e você certamente teve os seus. Não questionarei o que aconteceu, apenas deixe que eu lhe mostre um novo caminho. - propus, tomando suas mãos nas minhas - Deixe que eu lhe mostre como existem coisas boas. - abri um suave sorriso, insistindo naquele doce convite

 

- Coisas boas? - repetiu ela, atônita diante de mim

 

- Não se preocupe, eu estarei com você. - sorri confortável, apertando levemente as mãos dela entre as minhas

 

- Alec... - sibilou ela, enfim cessando o pranto

 

- Não chore mais, está proibida de chorar de agora em diante. - ergui-me, puxando-a pelas mãos e fazendo-a levantar-se também, e então sorri satisfeito, secando o rosto úmido dela com uma de minhas mãos

 

- Se é assim, não terei medo. - ela prometeu, abrindo um singelo sorriso quando seu corpo praticamente vacilou ao se aproximar do meu, atirando-se em um abraço caloroso

 

         Foi naquele momento, que eu entendi o verdadeiro sentido da resposta que eu buscava. Foi ali, com meus braços envoltos carinhosamente no corpo de Shellby, que eu entendi o meu motivo, a minha força. Eu a amava. Eu a amava, mesmo que de uma maneira principiante e delicada, mas a amava ternamente. Aquela mulher, revelando-se tão frágil em meus braços, aceitara a minha promessa de que a protegeria, de que ficaria ao seu lado, e daquele momento em diante, ela não sofreria mais. Eu quis, mais do que tudo, arrancar aquela dor de seu coração, roubando-a para mim, para que pudesse suportar o peso em seu lugar, mas como eu ainda não podia provar meu sentimento daquela forma, apenas prometi que ficaria ali, que a acolheria. Logo, não haveria mais espaço para a solidão em seu coração, apenas para o amor que eu alimentava por ela.

        

- Espere por mim. O amanhã não tardará, e quando ele chegar, eu certamente estarei aqui. - prometi, recebendo o tênue calor do corpo dela junto do meu

 

         Oh, doce calor. Jamais pensei que aquele calor seria tão agradável, tão delicado. E quando saí pela porta de sua barraca, meu corpo vibrou em sincronia com meu coração para que as horas passassem rápidas como o vento, e logo eu pudesse estar de volta, para abraçá-la mais uma vez. 


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