Elétrica escrita por Tenebris


Capítulo 1
Miami




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/443451/chapter/1

Uma hora e meia de avião. Tudo bem, parece que não é tanto tempo, mas você não tem um irmão super chato te atormentando a viagem inteira.

Mas calma, Bran. Calma. Logo você estará no conforto da nova casa de seu pai que, ao que tudo indicava, deveria ser bem legal.

– Brandon! Você pegou meus chicletes! - Scott chacoalhava uma caixinha rosada, na inútil esperança de que um novo chiclete de tutti-frutti caísse de lá de dentro.

– Não, Scott, não peguei não. Você comeu tudo nos primeiros cinco minutos de viagem. Agora por favor, será que pode ficar quieto para que eu consiga ouvir pelo menos uma música inteira até a gente chegar em Miami?

– Tá, tá. Babaca. - ele revira os olhos.

Scott tinha catorze, enquanto eu tinha dezesseis. Ele era o típico irmão mais novo que saiu muito mais bonito e mais alto do que você, o mais velho. Ele tinha cabelos enrolados castanho-escuros, que no sol costumavam atingir um tom acaju. Tinha olhos verdes, sorriso branco, bronzeado moderado e media 1,80, ou perto disso.

... Enquanto eu era o esquisito. Cabelos ruivos também encaracolados, e não do tipo bonito, como o de Scott. Era um ruivo laranja, meio... meio água de salsicha. Eu sei, é uma comparação meio desagradável, mas realista. Meus olhos eram cor de âmbar, e eu era branco feito um fantasma. Pra piorar, eu era pelo menos uns sete centímetros mais baixo que meu irmão e meu rosto era repleto de sardas.

Eu realmente me sentia em "Todo mundo odeia o Chris". Mas pelo menos eu era mais maduro que Scott. Quer dizer, eu podia não ser totalmente adulto, mas também não sacudia a caixinha de chicletes de tutti-frutti no meio do avião acusando meu irmão em voz alta de tê-los roubado.

E finalmente, ele calou a boca. Fazia tipo, uns quarenta minutos que ele me interropia toda hora para alguma inutilidade. Se eu estivesse ouvindo Led Zeppelin, não teria conseguido ouvir nem uma música completa. Mas eu não estava. Sei lá, Led Zeppelin é legal, mas eu prefiro outras bandas.

Fecho os olhos e afundo na cadeira, ouvindo a voz de Dio cantar "Children Of The Sea" em meus fones enquanto masco alguns chicletes de tutti frutti até o avião pousar no nosso destino, mais ou menos cinquenta minutos depois.

–-------------

– Caralho pai, mas que casa. - Scott exclama ao passar pelas portas grandes da frente.

Realmente, concordei com ele. Era uma casa bem bonita, com grandes janelas de vidro, poucos móveis, mas esses poucos eram sofisticadamente simples. Era reconfortante, mas a melhor parte era o quintal.

Meu Deus, aquilo deveria ser do tamanho de um campo de futebol; não, com certeza era maior. Cara, a casa da mamãe em Gainesville também era bem espaçosa e confortável, e nós nunca passamos necessidade de nada, nem nunca demos falta de dinheiro, mas aquela casa era... absurda. Olhei para Scott e a primeira coisa que fomos correndo para pegar foi a bola branca e preta de futebol que se encontrava do outro lado do quintal. Enquanto apostávamos corrida como duas crianças bobocas, meu pai entrou na casa anunciando que iria preparar a janta - ou melhor, ligar para a janta, porque meu pai podia ser muito legal, mas não sabia nem fritar um ovo.

Acho que esqueci de explicar. Meus pais se separaram há dois meses, e só agora eu consegui visitar meu pai, porque ele insistia que a casa ficasse totalmente pronta antes que eu e meu irmão viéssemos visitá-lo.

Sei lá, não encarei a separação deles como algo ruim. Se meus pais não estavam mais felizes juntos, porque continuarem? Se eu pudesse continuar vendo os dois, estaria tudo bem.

– Vamos, Bran! - Scott chegou antes de mim na bola, e também eu já esperava. Ele era muito mais atlético que eu. Ele chuta a bola e eu pulo para cabeceá-la no ar, enquanto começamos simplesmente a fazer passes e correr pela grama com Johnny - o Golden Retrivier que meu pai fizera questão de trazer com ele quando se mudou - em nosso encalço.

Ok, aquele quintal era gigantescamente gigante, mas, de algum jeito que ninguém nunca vai conseguir entender, meu irmão realmente conseguiu chutar a bola por cima do muro.

Sério. Scott era tão babaca que eu simplesmente não podia acreditar.

– Ih... - ele murmurou coçando a cabeça com uma das mãos. - ...Bran ... o muro não tem cerca elétrica nem arame farpado, então...

– Sério que sou eu quem vou pular o muro? Qual é, você é o atleta.

– E você é o mais velho. E sabe escalar melhor que eu. Sabe disso.

– Porque simplesmente não vamos até a frente da casa, batemos na porta e pedimos para quem quer que esteja morando aí pegue para nós? - revirei os olhos.

– Porque - ele fez uma careta vesga mostrando a língua - Dãã, isso seria criancisse. "Tia, pega a bola pra mim?" - ele distorceu a voz numa falha tentativa de imitar uma criancinha. - Patético. Além disso, pode não ter ninguém na casa. Vai, Bran.

Suspirei audivelmente. Bom, eu também não queria perder meus minutos de diversão no quintal imenso daquela casa. Saí correndo e comecei a escalar o muro, o que não era difícil, pois ele ainda era bruto.

Mas era alto. Me apoiei em cima e comecei a escalar descendo para o outro lado. Quando meus pés tocaram o chão, eu estaquei e não conseguia me mover.

Cara, se a casa do papai era imensa, aquela deveria ser tipo um hotel de luxo. Eu nunca tinha estado numa casa tão grande.

Claro que eu não a vi por dentro, estava no quintal, que deveria ser pelo menos do tamanho de uns... de uns três do da casa do meu pai. Sério.

Tinha duas piscinas: uma gigante com um trampolim e outra menor, mas ainda grande, parecendo uma hidromassagem, e eu logo presumi que fosse aquecida. Tinha um espaço com churrasqueira, fogão a lenha e todas essas coisas. Uma grande televisão de tela plana e caixas de som enormes estavam próximas de uma mesa de madeira com pelo menos dez lugares. Espalhados pelo lugar havia várias outras mesinhas com guarda-sóis abertos e algumas esteiras próximas às piscinas. O chão era de pedra polida, mas eu imaginei que era desse jeito pela área se der piscina, assim as pessoas não corriam perigo de escorregar quando saíam, ou sei lá. Olhei em volta procurando minha bola; tinha ficado tão encantado com o lugar que até me esqueci o que estava fazendo ali. Estava perto de uma porta, alguns metros à frente afastados daquilo que parecia um típico clube de verão para adolescentes.

Corri para pegar a bola e joguei-a por cima do muro. Quando já estava me virando para sair, uma voz claramente feminina, porém não aguda e doce, era meio grave e rouca, soou atrás de mim. E então eu cometi o erro de me virar para olhá-la. Nosso primeiro encontro não poderia ter sido pior. Eu estava sem camisa, mas isso não deveria ser nada atraente, magrelo do jeito que eu era. Meus cabelos estavam desgrenhados, eu estava coberto de suor e eu tinha certeza que ela estava conseguindo enxergar meus órgãos dentro do meu corpo, de tanta palidez, mas...

– Não sabe que é errado invadir a casa dos outros?

... ela estava linda. Ela era brutalmente perfeita. Era claramente perceptível que ela se vestia de maneira bem casual, mas aquela casualidade só a deixava mais encantadora. Seus olhos eram de um azul elétrico, os cabelos negros parte presos e alguns fios caíam sobre seu rosto que com certeza não tinha maquiagem alguma. Sua pele era pálida, seu queixo era fino e os traços de seu rosto eram perfeitamente desenhados. Vestia uma camiseta vermelha e preta meio desbotada dos Ramones, um short de piscina preto e...

Bom, em outras ocasiões e em outras pessoa isso poderia parecer estranho, mas não naquela. E nem nela. Ela calçava botas Converse de cano alto. Naquele calor, com uma casa com piscina.

– Ah, eu... eu só vim pegar a bola. Achei que não tinha ninguém na casa. Desculpe. - abaixei a cabeça, e eu com certeza estava vermelho como um pimentão. Eu conseguia sentir o rubor aquecer minha face violentamente.

– Bom, acho que um jeito de saber se tem alguém ou não é tocando a campainha. - ela cruzou os braços e armou uma carranca na face.

– Desculpe. Meu irmão, ele...

– Não se desculpe. - ela balançou a mão me dispensando, e fechou os olhos por breve segundos. - Da próxima vez, venha pedir na minha porta, porque eu sou o tipo de vizinha que costuma furar bolas de criancinhas com a faca. Capische?

– Certo. Me desculpe mais uma vez, ahn... qual é o seu nome?

– E te interessa? - ela apoiou as mãos nos quadris, aquele azul intenso de seus olhos me perfurava.

– Eu... só queria te pedir desculpas te chamando pelo seu nome. Só isso. Não que eu esteja, ahn... dando cem cima de você nem nada.

Ela riu com escárnio.

– Não estava pensando nisso, foguinho - ela pronunciou a palavra com certa satisfação, como se quisesse ter dito isso à alguém a vida toda. - mas agora estou, já que você basicamente admitiu. Mas, bem, eu deveria ter percebido, já que você ficou mais vermelho que um tomate.

Ela sorriu de canto, um sorriso maldoso. E eu não sei porque, mas eu adorei. Ficava tão lindo nela.

– Certo, eu... me desculpe. De novo. - comecei a escalar o muro antes que eu conseguisse ser mais idiota do que fui. Quando já estava no topo dele, a voz dela soou novamente:

– Ariana. - ela arqueou uma sobrancelha e virou-se para entrar na casa, enquanto eu simplesmente caía como um pacote de batatas para o lado da casa do meu pai do muro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Elétrica" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.