Além da morte escrita por Williane Silva


Capítulo 5
Reencontro


Notas iniciais do capítulo

espero que gostem, e desculpem a demora.



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“pare com isso” ordenei a mim mesma.

Tentei afastar aqueles pensamentos da cabeça. Não havia mais o céu azul da África em cima de minha cabeça, não havia mar, não havia palmeiras balançando ao sabor do vento.

Não havia nada. A não ser a neve que continuava a cair e a enorme solidão que se tornou minha companheira.

Eu deixei a Nigéria em junho de ano anterior e Edward morreu em agosto. Havia longos dezesseis meses. Por que será então que ultimamente podia imagina-lo com uma clareza tão impressionante, que chegava a machucar?

Jessica tinha razão. E Lewis também. Eu precisava parar de viver no passado. Mas como, quando o passado parecia mais real e vibrante do que o próprio presente?

O psiquiatra estava certíssimo. Atravessar aquele período seria muito difícil e eu iria precisar de ajuda. Ainda bem que já marquei uma outra consulta com ele.

O telefone começou a tocar. Eu estende a mão para atender.

– Alô?

– Bella?

Era Aro e ele parecia ansioso.

– Oi, Aro. Tudo bem?

– Você saiu mais cedo da universidade hoje. Passei pela sua sala e você já tinha ido embora. Aconteceu alguma coisa?

Eu fechei os olhos. Podia até visualizar o rosto preocupado do meu amigo do outro lado da linha. Aliás, a preocupação era uma de suas marcas registradas. Estava sempre franzindo a testa, que, aliás, já estava cheia de rugas. E seus olhos então. Viviam apertados, como se uma grande tragédia estivesse sempre prestes a acontecer. Senti um pouco de culpa por ser tão critica em relação a ele. Era o seu jeito.

– Não, não aconteceu nada. Eu tive um compromisso, só isso.

Aro pareceu aliviado.

– Que bom. Eu estou ligando para confirmar nosso jantar de sexta-feira. Eu estive pensando no Taylor’s. Eles servem um fritada de frutos do mar que é uma maravilha. Que tal?

A culpa aumentou ainda mais. Eu vinha saindo com Aro todas as sextas-feiras à noite durante os últimos seis meses. Porém, quando marquei um encontro com Marcus Martinson para sexta-feira seguinte, Aro nem me passou pela cabeça.

– Eu sinto muito.- eu acabei dizendo. Por fim, com um pouco de relutância.- É que já tenho feito outros planos para sexta à noite e...

– Mas na semana passada você me disse que...

– Aro, eu me esqueci do que disse na semana passada. Realmente sinto muito. Não quero magoar você, mas...

– Nós estamos saindo juntos as sextas-feiras há um tempão.- sua voz estava cheia de mágoa.- Há mais de seis meses!

“ Que coisa desagradável. tentei ser gentil com ele, mas isso serviu apenas para encoraja-lo. Acho melhor acabar com isso antes que o negócio fique ainda mais complicado.”

Aro interpretou mal o meu silêncio e começou a achar que tinha ficado brava com ele.

– Sinto muito Bella. Eu pensei que as coisas estivesse mais ou menos resolvidas entre nós. Não tenho esse direito. Me perdoe, por favor.

Eu respirei fundo. Sabia que a parada ia ser muito dura.

– Aro, gostaria que me ouvisse com atenção.- eu falei de maneira mais suave que consegue.- Nós estamos saindo juntos há um certo tempo, mas é um relacionamento que não está levando a nada. Talvez seja melhor pararmos aqui mesmo e....

– Pararmos aqui mesmo?- ele quase gritou.- Bella, mas nós ainda nem começamos!

– Não há nada para começar. Entenda, por favor. Nós éramos amigos. Ainda somos. E espero que sejamos para sempre. Mas, quanto a alguma coisa além disso, eu...

– O que foi?- ele me interrompeu.- Um outro homem? Você encontrou outro homem, Bella?

Agora ele parecia agressivo. Eu comecei a ficar irritada.

– Não. Não encontrei ninguém.

– Você vai sair com outro homem na sexta-feira, não vai? Vamos, fale a verdade!

Ele levantei a mão à testa. Me sentia cansada e frustrada.

– Vou. Mas não estou envolvida com ele. E duvido que algum dia acabe me envolvendo com quem quer que seja.

– Então, se não é outro homem, o problema ainda é seu marido, não é?

Não havia motivo porque mentir.

– É.

Ele fez uma pausa longa. E quando falou, sua voz soou surpreendentemente agressiva.

– Bella, como é que eu posso competir com um homem morto? Com um fantasma? Responda.

A parada esta sendo mais difícil do que imaginei a principio.

– Ninguém está competindo com ninguém, Aro. Não é esse o ponto. Tentei sentir alguma coisa a mais por você, mas não consegui. Eu...

– Você construiu um muro à sua volta. E eu esperei que ele caísse. Só que não vai cair sozinho. Alguém terá que derrubar e...

– Pare com isso.- eu insistir.- Gostaria que você conhecesse outra garota, alguém que pudesse ama-lo e...

– Mas eu amo você, Bella! Só Deus sabe o quanto fui paciente! Só Deus sabe o quanto tentei não ser inconveniente e insistente!

– Eu sei. Eu sei que você foi muito gentil, mas...

– Bella, você não acha que eu mereço um pouco de consideração? Depois desse tempo todo? Será que pelo menos poderíamos conversar pessoalmente? Não acha que eu mereço pelos menos isso?

– Não há nada mais a ser dito.- eu insistir.- E acho que não seria bom se...

– Você está enganada! Há um mundo de coisas que eu gostaria de lhe dizer. Pessoalmente, se possível. Posso ir até ai? Estou lhe implorando como um cachorrinho abandonado!

– Aro.- eu responde em desespero.- Por favor, não fale assim. Só que não vai fazer a mínima diferença e...

– Então já estou indo. Chegou a hora de sermos honestos um com o outro, Bella.

Ele desligou, antes que eu pudesse falar mais alguma coisa. Eu fiquei ouvindo o som de ocupado na linha e então, me senti exausta e doente, recoloquei o fone no gancho.

Pobre Aro. Tenho muita pena. O coitado era louco por mim. Todo mundo sabia disso. O problema era que não sinto nada por ele. E só agora descobri uma outra coisa. Além de não ter graça nenhuma, ele ainda era um homem bem aborrecido.

Levantei do sofá fui até a cozinha, coloquei a xícara de café na maquina de lavar louças e, como não tinha mais nada a fazer até que Aro chegasse, resolve procurar o gato. Não o tinha visto desde que cheguei em casa, uma hora atrás.

Subi a escadaria e acende a luz do corredor. Estava vazio. Entrei nos quartos e no sótão. Nem sinal de sombra.

Ele deve estar dando um dos seus passeios misteriosos. Quando quiser, aparecerá de novo.

Tentei tirar o gato da cabeça. Tenho problemas demais. A visita de Aro, sabia que um grande aborrecimento me espera. Por que será que aquele homem insistia tanto em complicar as coisas?

Foi aí então que ouvi um ruído vindo do quarto de casal, o único onde não entrei. Teria sido uma impressão?

Claro que Lewis tinha razão. Essa casa esta mexendo com a minha cabeça. Para o bem de minha sanidade mental, preciso sair daqui. Era exatamente o que irei fazer. Ligarei amanhã para o corretor e abaixarei o preço da casa. Então, comprarei um lindo apartamento com vista para o lago de Michigan, onde começarei uma nova vida.

Agora, a melhor coisa que eu tinha a fazer era trocar de roupa, dar uma ajeitada nos cabelos e esperar Aro. E tratar de faze-lo sumir da minha vida de uma vez por todas.

Porém ao me dar conta, estava em frente ao quarto de casal, a mão na maçaneta da porta.

Vou dar uma ultima olhada, nesse quarto. E ver de uma vez por todas que não existe luz azul alguma embaixo da cama.

Abri a porta devagar.

E soltei um grito, que ecoou pela casa deserta.

A luz azul brilhava bem no centro do quarto, no lugar onde ficava a cama. E, naquele momento, eu tenho certeza absoluta de que aquilo não era fruto da minha imaginação. Era real.

Foquei olhando para aquela claridade, como se eu estivesse hipnotizada. Então, um pontinho preto surgiu ali no meio e começou a crescer, até tomar uma forma familiar de orelhas pontudas e emergir da luz. Sombra estava de volta.

Aproximou-se de mim em silêncio. Depois, como se tivesse mudado de ideia, voltou à claridade e desapareceu. Quase que imediatamente, apareceu de novo e tornou a desaparecer. Era como se estivesse brincando comigo.

Mais tarde, eu iria me perguntar porque não tinha virado as costas e saído correndo. Iria tentar adivinhar porque não gritei, porque não senti medo.

Mas não fiz nada daquilo. Eu estava tomada por uma intuição tão forte, que sobrepujava todos os meus outros instintos.

O gato continuou a entrar e a sair da luz.

Ele está me mostrando como se faz. Ele quer que eu entre também.

Sombra reapareceu e voltou a desaparecer. E então, não apareceu mais. Chegou a hora de ir atrás dele.

Parte de minha mente estava paralisada pela enormidade do absurdo que estava acontecendo. Mas a outra até que estava se divertindo.

O que eu tenho a perder? Nada, com certeza. Se isso for apenas minha imaginação quer dizer que fiquei de miolo mole. Alice seguiu o coelho branco até o País das Maravilhas. E eu, Isabella, vou seguir meu gato preto até a Terra das Sombras.

Era uma total insanidade achar que aquela luz era real. Então, se ela fosse mesmo falsa, não irá me fazer mal algum.

Respirando fundo, dei dois passos à frente e entrei.

Uma vez dentro da luz, eu podia ouvir o gato, mas não pude vê-lo. Ele parecia estar por perto, ainda assim longe ao mesmo tempo. Pela primeira vez, eu comecei a sentir medo.

Pude ver minhas mãos e a parte inferior de meu corpo. Eu estava banhada pela luz azul e parecia estar pisando em absolutamente nada.

O medo começou a aumentar. Eu sabia que tinha acabado de entrar na luz, de modo que o quarto devia estar e apenas poucos metros atrás de mim.

Se eu continuasse a andar, talvez jamais eu encontre o cominho de volta.

O gato miou de novo. Daquela vez, o som parecia vir de muito perto e então eu senti algo macio tocar minhas pernas. Olhei para baixo, assustada. O gato havia se materializado do nada e esfregava-se em mim com carinho. Depois, afastou-se e começou a andar. Virou a cabeça, para ver se eu o seguia.

Como eu continuei exatamente no mesmo lugar, aproximou-se novamente, esfregou-se uma vez em minhas pernas e tornou a se afastar. Era um sinal para que eu o seguisse.

E foi o que eu fiz.

Um pouco depois, eu voltei a parar. E levei a mão à boca, a fim de não soltar um grito.

Mas adiante, pude ver o vulto de um homem. Não de qualquer homem. De Edward. Meu coração disparou e eu pensei que fosse desmaiar.

O gato continuava ali, a seu lado, mas eu não prestava mais atenção nele. Só tinha olhos para Edward, para meu Edward, para o homem que tinha sido arrancado de minha vida de forma tão brutal.

Comecei a correr em sua direção. Mas parei, de súbito, ao ouvir a voz dele.

– Não, Bella! Não se aproxime!

O choque de ouvir a Voz de Edward, uma voz que jamais pensei ouvir de novo, me deixou paralisada. Ele também parecia surpreso.

– Edward?- eu chamei, lagrimas apareciam em meus olhos. Dei mais um passo à frente.- Edward, meu amor...

– Não!- ele gritou de novo.

Eu parei imediatamente.

– Não sei o que acontecera a você!- ele avisou.- Por favor, eu, não se aproxime mais!

– Então venha até aqui!- eu pedi, em desespero.

– Eu vou- respondeu ele, com certa relutância.- Mas não de mova! Entendeu?

– Entendi!- eu responde, secando as lágrimas com a palma da mão. Edward vinha se aproximando com passos rápidos.

Sombra correu ao encontro dele, então se virou e começou a andar a seu lado. Homem e gato se moviam através da luz azul, as pernas tocando o ar brilhante.

Eu senti um nó na garganta e mais lágrimas surgiram em meus olhos. Agora, pude ver o rosto de Edward perfeitamente. Uma sensação incrivelmente agradável tomou conta de mim.

Enato ele estava na minha frente, a apenas dois passos de distancia. Olhou pra mim, um tanto preocupado.

Eu fiz menção de me jogar em seus braços, mas ele estendeu a mão, como se quisesse me impedir.

– Não faça isso, meu amor! Não sei o que vai acontecer, se nos tocarmos!

– Mas, se eu não o tocar, como vou saber se você é mesmo real?

– Eu sou real, pode acreditar. Mas talvez, se nos tocarmos, você não poderá mais ir embora.

– Mas o gato tocou você. E você o tocou. Foi você quem colocou a pulseira no seu pescoço, não foi?

Ele deu um sorriso.

– Foi.

Eu senti um friozinho na barriga. Como ele era bonito! E estava tão lindo como naquele fim de semana em Golwanda.

– Você tocou no gato e ele pode ir e vir sem problemas. Por que não eu?

Edward usava jeans, camiseta, seu cinto favorito que continha uma fivela de prata e um par de tênis. E estava de aliança.

De súbito, eu percebe que não me importava a mínima o fato de nunca mais poder voltar ao mundo. E me atirei em seus braços, antes que ele pudesse abrir a boca para protestar.

Segundos depois nos beijávamos com desespero, os braços e Edward me apertaram com força, e eram braços de carne e sangue, braços verdadeiros que me deixavam tonta de prazer.

Então, eu deitei a minha cabeça em seus ombros e percebe que minhas lágrimas molhavam a sua camiseta. Pude sentir as batidas de seu coração.

– Você está vivo, meu amor?- eu perguntei por fim, entre um soluço e outro.

– Estou, nesse lugar. Mas não lá adiante, onde você está. Ah, Bella, como eu sinto ter te deixado... eu te amo tanto...

Eu o apertei com mais força ainda.

– Mas você voltou. Você disse que não deixaria que ninguém, nem nada, nos afastaria! Ah, Edward, como eu te amo.

Ele tocou meu rosto de leve, levantando-o gentilmente. Me encarou durante um longo momento, dor e arrependimento estampados em seus olhos.

– Eu não voltei exatamente, meu amor. Não posso passar daqui.

– Mas o que é aqui? Onde estamos?

– Eu não sei.

Eu coloquei a mão no coração dele e o senti bater.

– Disseram-me que seu corpo havia sido cremado, que sua cinzas foram jogadas na água...

–É verdade. Eu virei cinzas. Naquele mundo.

– Mas como é que você pode estar vivo aqui?

– Eu não sei.- ele respondeu novamente.

– Será que isso é o que se chama de vida após a vida?

– Não. É outra coisa.

– Algo como o purgatório?

Ele balançou a cabeça.

– Também não. E não é permanente. Não posso ficar aqui por muito tempo.

Meus olhos voltaram a ficar cheios de lágrimas.

– Não pode ficar aqui? Como assim?

– Não chore, mau amor. É como se estivéssemos numa encruzilhada. Não sei o que vai acontecer depois.

– Edward, eu não estou entendendo nada... por favor...

Ele encostou um dedo nos meus lábios.

– Eu também não entendo. Mas eles me disseram que aqui, talvez eu pudesse vê-la de novo. Que não era certo, mas havia uma possibilidade.

– Eles?- eu perguntei, assustada.- Mas quem são eles?

Edward começou a acariciar meu rosto.

– Também não sei. Só tenho certeza de uma coisa. Eles têm poderes. E me abriram um portão.

Eu pisquei os olhos.

– Um portão? Edward, pelo amor de Deus, o que está acontecendo? Não estou entendendo nada!

Edward começou a acariciar meus cabelos.

– Eu pensei que nunca mais fosse tocar neles, meu amor... como senti saudades... estava num lugar onde eu devia estar feliz, mas não estava. E aí, eles me deixaram vir até aqui, para que eu pudesse vê-la. Mas agora vou ter de partir novamente.

– Não!- eu gritei.- Eu acabei de encontrar você e não vou deixa-lo ir de novo!
– Por favor, Bella. Eles estão me dizendo para voltar ao lugar de onde vim. Mas nós nos veremos ainda. E então, você terá de fazer uma escolha. Se preferir ficar aqui, não haverá mais como voltar. Agora, vá. Antes que eles me levem para sempre.

Nós dois nos abraçamos, então eu virei as costas e corri, antes que mudasse de ideia e ficasse ali para sempre.

Quando me dei conta, eu estava no meio do quarto, o gato a meus pés, lambendo-se tranquilamente. A luz azul tinha desaparecido.

Mas uma outra luz , a luz do sol, entrava em cheio pelas frestas da janela. Já não era mais noite.

Era dia.


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Notas finais do capítulo

bom vai demorar um pouco antes de postar outro capitulo. mais assim que eu puder postarei outro beijus.



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