B o n d s escrita por Return To Zero


Capítulo 2
Quarto Branco




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A sensação era um branco total.
Apenas isso, apenas branco.
Um lugar branco.
Um cheiro branco.
Um som branco.
Uma sala esterilizada onde meu corpo descansava e flutuava.
Quando abri os olhos, tudo veio de uma vez e fiquei confuso.
Alguns panos abaixo de mim, molhados de suor um cheiro gelado. Um teto branco. Estava frio.
Sentei-me tocando o peito coberto por tiras de gaze. Nao era o tempo, eu estava frio.
"Eu morri?" Perguntei-me, analisando os braços e pulsos palidos "Eu estou vivo?"
"Os dois." Uma voz sarcastica se fez presente. Por algum motivo, aquela voz me irritou completamente. Levantei os olhos e descobri uma mulher palida, envolta em panos de seda rosados. Os cabelos eram vermelhos e lhe escorriam pela cintura, com duas pequenas elevações na cabeça, imitando as orelhas de algum animal. Os olhos rasgados, e igualmente vermelhos, me miravam, não com curiosidade, mas com certo orgulho. "Como se sente, Stark?"
"Gelado" respondi sem pensar muito "Como sabe meu nome?"
"Eu sei de muitas coisas." Ela fez uma pausa exibindo os dentes em um sorriso "Você morreu em guerra. Creio que devia ser da Infantaria, morreu muito novo. Você vai ficar assim para sempre, espero que não se importe."
Me importar? Ela me estendeu um espelho redondo, o qual usei para me mirar. Meu rosto era branco feito porcelana, acompanhados de cabelos quase tão brancos e de um tom azul-alice. Pelo que sei, todos somos assim.
A Sociedade me pediu para tomar conta de você" dessa vez ela me estendeu a mão e eu aceitei "Vamos."
Senti como se cada pedaço do meu corpo foi arrancado e, quando eu estava pronto para berrar de dor, tudo acabou. Me vi em um extenso corredor de cores neutras, e por ironia, estava recheado de pessoas com vestimentas estranhas e chapeus de todos os tipoe.
A ruiva se aproximou de uma em particular. A pele era igualmente palida, com os mesmos olhos rasgados, porém de cor cinza, e cabelos negros e longos. Vestia uma roupa estranha composta por preto, branco e marrom e algumas penas castanhas e sinos que pendiam de se vestido e chapéu.
"Yo, Tsuki-san."
"Kirishie, genki?"
"Tottemo genki yo. Ah, ano hi no koto..."
Observei-as por alguns instantes.
Em que lingua estariam falando? As duas riram em determinado momento e se voltaram para mim "Essa aqui é uma amiga, Amano Tsuki." A ruiva dise, e a morena me deu a mão para apertar.
"L-Light Star..." eu dise, um pouco espantado ao perceber que ela também era gelada.
"E eu sou Kirishie Sunao. Vou cuidar de você por um tempo, então espero que a gente se dê bem."
Tsuki se despediu e seguiu seu caminho e nós fizemos o mesmo.
"Que lingua estavam falando?" Perguntei, meio envergonhado
"Japonês." Respondeu de forma simples, abrindo a porta que estava a nossa frente.
"Quem está aí?" Alguem berrou de dentro da sala
"Watashi da, watashi." Kirishie respondeu, sem se assustar "Ele está aqui. Acordou bem, até. Acho que não será preciso amansá-lo."
"Me amansar?"
"Parece que ele encontrou um recipiente bem cooperativo. Não houve brigas ou rejeições, nem nada do tipo."
"Recipiente?"
A ruiva revirou os olhos, me olhando com certa ironia
"Esse corpo não é seu. Voce entrou nele assim que o dono se foi. Eu te encontrei, cuidei de você até você acordar, agora vou te observar até descobrir o que você faz."
Se eu dissesse que me sentia como uma pequena experiencia, eu não estaria mentindo.
Kirishie trocou mais algumas palabras com a senhora que se encontrva na sala e sem aviso algum grudou em meu braço e antes que eu pudese berrar de dor, tudo havia acabado.
Eu estava em uma sala simples. Sofás, cadeiras, mesas, um radio que tocava uma música calma e embaladora.
Kirishie afrouxou o cinti que prendia suas vestes, retirando-as com muito esmero. Parecia complicado.
"Isso é um quimono. Uma roupa tradicional do meu país." Apontou para o cinto que, pude perceber, ser roxo e ter, muito finamente, flores amarelas pintadas por toda a extensão
"Isso é um obi. Parece um pouco complicado, mas com o tempo pegamos o jeito."
Quando eu percebi que ela não se importaria em ficar nua em minha frente, virei-me e tapei os olhos.
"Se lembra de algo do seu país?"
"Tudo era branco. Coberto de neve. Frio e branco. As comidas eram quentes e os lagos ficavam sempre congelados."
Ela murmurou algo inaldivel e, quando me virei, ela estava usando algo mais leve. Talvez duas camadas de seda envolviam seu corpo.
"O seu quarto fica à esquerda. Vou esquentar a água do seu banho."
Obedeci pois eu realmente queria um banho.
O comodo em que eu me encontrava era amplo, e aparentava ser frio. As paredes, assoalho e teto eram feitis de madeira. Uma cama de casal e cortinas de cores neutras. Pela janela, escorria um fino feixe de luz que fazia reluzir o metal dourado da banheira que estava ali.
Logo Kirishie chegou carregando dois baldes d'água. Assim que entrou, varios outros baldes a seguiram para dentro do quarto, flutuando. Senti meus olhos saltarem das orbitas em admiração.
Ela sorriu de forma discreta e me pediu que tirasse a roupa e entrasse na banheira. Assim o fiz.
Logo senti uma água deliciosamente morna descer por minhas costas e se empoçar no fundo da banheira. Senti uma esponja fofa ser esfregada por meue braços com certa força, mas eu podia detectar a gentileza de seus dedos.
Esse ritual se seguiu de forma lenta. Quando o sol já estava se pondo, eu ainda estava na banheira, e Kirishie observava, sentada em uma cadeira, o esfregão que, misteriosamente, esfregava minhas costas sozinho.
"Como você faz isso?" perguntei, brincando com a espuma na água
"Magica. Eu sou uma bruxa."
"Bruxa? O que é isso?"
"São seres especiais, com poderes." ela se levantou e caminhou um pouco "Me diga algo que você queira."
"Roupas." respondi de imediato
"Suas roupas estão em cima da cama, junto da toalha. Proximo."
Pensei meio a esmo, juntando a espuma para perto de meu corpo. Respondi sem mirá-la "Quero tintas."
Notei pelo silencio que ela havia se espantado. Sorriu para mim, estalou os dedos e ali, naquele mesmo lugar, um cavalete apareceu, junto de uma tela branca. Tintas e pincéis variados surgiram em cima da comoda. Não pude conter o sorriso.
Levantei-me, fazendo a água respingar pelo assoalho. Olhei ao redor, maravilhado. Eu parecia uma criança.
Kirishie me olhou, não com censura ou desaprovação.
"Vamos cobrir isso aí primeiro."
***
Delicadamente, Kirishie deslizou a toalha por meu corpo. Eu já não me sentia envergonhado. Naqueles poucos momentos, pareciamos ter criado uma ligação eterna. Uma conectividade que nunca se apagaria.
Ela me vestiu com as mesmas vestes de seda, porėm na cor branca. Pediu para que eu me divertisse com as tintas, e saiu. E eu a obedeci.
Toquei os pincéis e senti uma forte nostalgia. Mas não parecia ser a minha nostalgia. Era a nostalgia roubada de alguém. Meu estomago revirou ao lembrar o que Kirishie havia dito sobre eu ser um recipiente. Ignorei e fui checar as tintas.
As cores eram basicas. "Tudo o que eu preciso." pensei comigo. Mas, novamente, não era um pensamento meu.
Examinei as gavetas da comoda e lá havia ainda mais tinta, e outros instrumentos de pintura. Alguns eu nem sabia como usar.
Um enorme sorriso surgiu em meus labios. Eu me sentia em casa.


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