Katie estava com medo.
Ela não fazia ideia de como pôde se afastartantodo acampamento. Já fazia 3 meses que morava ali e muita coisa havia mudado. Além de estar em seu próprio chalé, descobriu que era filha de Deméter e que tinha primos muito chatos. Terrivelmente chatos. Insuportavelmente chatos.Stollmentechatos.
A questão é que depois do jantar ela tentou fugir de um de seus irmãos, já que, por acidente, havia rasgado o livro de botânica dele e estava com medo de ser castigada. Mas tudo deu errado, já que Katie teve abrilhante ideia de fugir para a floresta e não é como se ela conhecesse aquele lugar tão bem quanto conhecia os campos de morangos.
Agora estava perdida, assustada e ouvindo sons do que poderiam ser apenas corujas e esquilos, mas que para ela pareciam enormes monstros selvagens que queriam palitar os dentes com seus bracinhos finos.
Katie parou de caminhar e olhou para os lados, mas tudo que viu foi árvores, árvores, e mais árvores. Ela era nova demais para morrer de fome numa floresta.
Deu mais alguns passos quando percebeu que o som de suas pisadas não acompanhavam seu movimento. Caminhou mais um pouco e então notou, outro par de pés pisava junto com ela, apenas com segundos de diferença.
- Olá? - Gritou para a escuridão. - Tem alguém aí? - Silencio. - Eu me perdi, pode me ajudar? - Então movimentos na mata à sua direita chamaram sua atenção.
- Hey Gardner. - Cachos cacheados sacudiram quando um garoto saiu do meio das árvores.
- Graças aos deuses, Travis! - Katie não percebera que estava chorando até o momento que correu abraçou o garoto como se ele fosse o ar e ela precisasse urgentemente respirar. O mais velho dos Stolls hesitou antes de passar os braços pela
cintura da garota e apertá-la contra si.
- Oh, Gardner, acalme-se... Sei que sou incrível, mas não precisa chorar por isso. - O garoto esperava um tapa, mas a menina riu e enxugou o que restava do choro.
- Você pode me levar pro chalé? Eu não sei voltar. - Ela olhou-o com aqueles olhos verdes e brilhosos e o pequeno filho de Hermes coçou a nuca, desconfortável.
- Eu bem que gostaria, mas eu te segui e... Bem, estou tão perdido quanto você. - Ele deu de ombros.
- Você... Stoll! - Ela estava furiosa com a irresponsabilidade do menino.
- Ei, você não estava me chamando de Travis? - Ele tentava se defender dos tapas, que mesmo não doendo incomodavam.
- Isso foi porque pensei que você finalmente tinha feito algo útil na vida e veio me salvar feito um príncipe! - Ele olhou para ela surpreso e ela logo se surpreendeu também com o que disse. Sua sorte é que a escuridão impedia-o de ver suas bochechas coradas.
- Você queria que fosse seu príncipe? - Ela podia saber que ele estava com aquele sorriso zombeteiro no rosto mesmo não enxergando-o.
- Não seja estúpido, eu aceitaria até mesmo um sátiro como príncipe se ele soubesse me ajudar a voltar para o acampamento, alias, até mesmo um sátiro seria mais útil que você nesse momento! - Travis se enfureceu.
- Eu posso ser um príncipe! - O garotinho estava bravo, não era pelo fato de ter sido comparado a um sátiro e sim porelapreferir um sátiro a ele. Isso era uma ofensa!
- Um príncipe perdido, era o que me faltava! - Ela foi pega por baixo dos joelhos e pelos ombros e levantada nos braços do garoto, gritou, mas mesmo pequeno Travis era forte.
- Vamos achar o caminho de volta, Princesa Chorona.
Não demorou muito para que ele cansasse de carregá-la e colocasse-a no chão. Katie não se afastou, na verdade, se aconchegou tanto a ele que o garoto passou o seu braço pelos ombros da menina. Travis se sentia estranhamente bem sendo o príncipe-salvador-da-pátria.
- Pensei que filhos de Hermes tivessem um bom senso de direção. - Ela comentou certo momento.
- Eu... Hum... Não sou muito dotado de dons olimpianos ainda... - Katie percebeu que ele queria dizer que não havia sido reclamado, mesmo sendo obvio para todos que ele era filho de Hermes.
- E seu irmão?
- Ele sim. Foi reclamado logo que chegamos, mas eu... Bem, acho que Hermes não pensou que seria necessário reclamar nós dois. - Katie olhou para Travis, mas ele não encarou-a de volta.
- As rosas não gostam de mim. Nem margaridas. - Suspirou e chutou uma pedrinha que estava em seu caminho. - Na verdade, odeio dizer isso, mas flores não são muito minhas fãs, quero dizer, elas não me tratam como uma filha de Deméter, sou como qualquer outra pessoa.
- Mas você ao menos tem alguns talentos, sempre vejo maçãs aparecerem por aí quando você passa. - Ela olhou para ele e sorriu.
- E você consegue pregar uma peça melhor que qualquer outro, e nem foi reclamado. - Um sorriso mínimo apareceu no rosto do garoto. - Talvez, se você pedisse, ele nos ajudasse. Travis fechou os olhos com força por um momento e os abriu, um brilho diferente estava em suas íris castanhas.
- Por aqui. - Travis indicou as árvores a sua esquerda e saiu arrastando-a pelo braço.
Demorou algum tempo, mas os dois finalmente chegaram no riacho e o acompanharam até finalmente estarem no acampamento.
Os olhos de Katie brilharam.
- Travis, você conseguiu! - Katie abraçou o pescoço do garoto e encostou sua cabeça em seu ombro. Travis colocou suas mãos em volta dela também.
- Eu disse que podia ser um príncipe, e você me chamou de Travis. - Ela riu e ele apertou-a mais contra si, rindo também. Então algo brilhou sobre sua cabeça.
- Olhe Travis, você foi reclamado! - O garoto olhou pra cima e fitou o caduceu cinzento que reluzia no ar. - Parabéns, mas agora temos que entrar, as harpias virão a qualquer instante. - Travis assentiu, mas não soltou-a nem deixou de fitar o sinal do seu pai, tinha gostado de ideia de ser o príncipe que resgata a princesa em apuros. - Vamos, Stoll, leve-me até meu chalé. - Katie pegou na mão do garoto livrando-se de seus braços e arrastou em direção ao chalé com grama no teto. Já na porta do chalé eles se encararam sem saber o que fazer.
- Então... Eu... Boa noite, Katie.
- Sim... Claro, boa noite Travis. - Ela virou-se para entrar e ele, com as mãos nos bolsos, começou a ir em direção ao seu chalé. - Travis! - O garoto virou a cabeça e a menina correu em sua direção e levantou-se na ponta dos pés para beijá-lo na bochecha. - Obrigada por me salvar, você é um príncipe melhor que um sátiro. - Então, corada, sorriu e entrou, jogando-se em sua cama. Travis ainda ficou um tempo encarando o lugar onde a menina estivera, até que sorriu e tocou sua bochecha, ainda com um pouco de umidade dos lábios quentes da filha de Deméter.
No seu chalé a menina olhava para o beliche em cima do seu tocando seus lábios. Ela pensava que Travis provavelmente tinha limpado o rosto e ido se lavar depois de receber seu beijo, mas ele ficou tocando em sua face e sorrindo pelo resto da noite, sequer lavou o rosto na manhã seguinte.
Foi o primeiro beijo que ele recebera de uma menina que não fosse sua irmã ou alguma bebê babona, e esse foi o primeiro beijo que Katie dera em um garoto que não estivesse de aniversário.
Mas ficou somente entre os dois, um beijo nunca mais comentado, uma noite nunca mais citada nem mesmo entre os dois, mas que nunca seria esquecido.