A Feiticeira escrita por rkaoril


Capítulo 25
Bons sonhos e lindos pesadelos




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XXV

ELIZABETH

ELIZABETH NÃO PLANEJAVA ir tão longe. Felizmente não foram parar na China ou no Azerbaijão, mas não esperava chegar no Utah tão cedo. De cima das montanhas onde estava, ela conseguia ver a catedral e algumas luzes de Salt Lake City lá longe. Tinha sido uma péssima noite. Elizabeth tinha tomado o cuidado de levar Johnathan com ela, o que foi o pior erro que já cometeu em sua vida.

Em primeiro lugar, ela havia ficado extremamente exausta depois da viajem nas sombras – embora tenha sido realmente divertido com o vento gelado que parecia prestes a arrancar seu rosto, os barulhos na escuridão e Johnathan gritando agarrado em seu braço. Ela não sabia exatamente como funcionava, mas podia ver pontos luminosos na escuridão como estrelas, que pareciam conter cada uma alguma localização diferente. Ela felizmente chegou no Utah, não em Nova York.

Assim que caíram nas montanhas enevoadas, Elizabeth cambaleou e se debruçou sobre uma pedra. Suas pálpebras estavam pesadas como o pedregulho que o deus das montanhas tinha jogado nela, e seu corpo parecia feito de chumbo. Era uma sensação similar, embora pouco mais fraca à de quando tinha lutado com o dragão.

Elizabeth se sentou na neve com a pedra de encosto e fechou seus olhos, deslizando para longe da própria pele e caindo em sono profundo.

Teve um sonho tão bom que estava certa de que não queria acordar. Sonhara que estava deslizando em uma floresta de pinheiros enevoados com um manto preto grego e uma espécie de capuz, que dançava com sapatilhas pela neve e que estava ligeiramente contente. Havia uma música de fundo que parecia guiar seus paços, e seu cabelo estava definitivamente maior do que era na realidade – uma coisa longa e sedosa preta, caindo em tranças estilo grego por suas costas. Lembrava-se de estar deslizando pela neve e não sentir nenhum frio, até que fora embrulhada por braços fortes e envolvida em um cheiro calmante de lenha e baunilha.

Quando o dono dos braços finalmente se afastou, Elizabeth reconheceu Evan. Ele usava roupas gregas como ela, assim como capa para o frio. Suas roupas eram escuras como o céu de noite acima deles. Ele deu a ela um sorriso torto, que fez seu coração (mesmo em um sonho) parar. Ela se sentia envolvida em uma espécie de bolha onde estava embriagada e entorpecida – a sensação comum de quando estava perto de Evan.
– Você parece muito bem quando decide parecer como uma garota. – comentou Evan. Ela não sabia se considerava um elogio ou uma ofensa.
– Obrigada, eu acho. – ele então sorriu.
– Você parece aflita, o que está acontecendo?
– Não faço ideia – admitiu ela – é como se o mundo conspirasse contra mim. Acho que posso compreender por que, sendo filha de Hades e tudo mais. Eu não esperaria por uma vida longa e feliz.
– Você não precisa ser tão pessimista. – insistiu ele.
– Eu falo por experiência própria.
– Teimosa. – ele resmungou. Ela sorriu para ela, sentindo as bochechas esquentarem enquanto olhava para seu rosto. Deuses, só podia ser castigo mandar um cara tão bonito assim para ficar ao redor dela.
– Srta. Elizabeth Roxanne Lalonde – ele disse – me daria a honra de uma dança?
– Você não precisa falar todo cheio de elegância – disse ela, mas mesmo assim tomou sua mão e deslizou com ele lentamente pela névoa. Felizmente, ele dançava bem o suficiente para não ter que arrastar ela pela neve. Ela se sentia como se tivesse comido muito açúcar: feliz e hiperativa.

Evan a puxou mais para perto. Era legal como ele tinha a altura perfeita para fazer uma coisa daquelas com ela – seu rosto dava perfeitamente abaixo do pescoço dele. Ele então a olhou, de um jeito que fez com que ela estremecesse. Passara anos vendo seu pai olhar assim para a mãe dela – como se fosse a coisa mais preciosa e importante do mundo para ele – e não via a hora de ter alguém olhando assim para ela, alguém que ela poderia retribuir o sentimento diferente da história de seus pais. Evan se aproximou lentamente, e quando finalmente tocou os lábios dele nos dela ela estava caindo em um outro sonho completamente diferente.

Certo, outro sonho diferente e horrível. Elizabeth disparava em direção a terra, caindo do céu com nuvens tempestuosas cujos trovões retumbavam e deixavam o céu cinza escuro. Ela passou por nuvens de escuridão, sentiu o vento em seus cabelos e rosto e apertou os lábios, girando na direção do chão. Quando colapsou contra o mesmo, ele não a abraçou como ela esperava – o ar saiu de seus pulmões, a deixando sufocada nas próprias costelas. Ela arregalou os olhos, procurando inutilmente por alguma coisa útil no borrão cinza que o mundo se tornava. Então rápido como um ataque rápido do Pikachu ela voltou a respirar, sua visão melhorou.

Se viu no que parecia uma catedral de pedra negra, mas completamente diferente de seu último sonho. Esta catedral parecia ter milhares anos de idade. O chão era liso com mármore preto, as paredes ilustravam cenas do que pareciam todo o tipo de mortes – Elizabeth reconheceu sua sósia, Elizabeth Bathory tomando banho em uma banheira de sangue, o Drácula empalando pessoas em estacas de madeira, uma bomba atômica explodindo em uma cidade, milhares sendo levados por um mar de gelo, as torres gêmeas sendo atacadas. Ás suas costas, ouvia o que parecia o barulho de correntes batendo, ou de alguém constantemente batendo um martelo em um lugar duro – como em obras de construção. O teto era feito de estalactites apontadas para ela e envolvidas por uma névoa negra. Ela sentia que o lugar exercia algum poder sobre ela, como se seu coração batesse na frequência radioativa do lugar.

Ela então ouviu uma voz.
– Elizabeth. – ela olhou na direção da voz, e viu um trono negro feito do que parecia ferro estígio e ossos ao lado de um trono de prata adornado com pinturas de folhas e flores. O trono prata estava vazio, o negro ocupado com o dono da voz.
– P...pai?

Elizabeth reconheceu Hades de sua infância. A última vez que tinha visto ele fora cerca de seis anos antes. Ela reconheceu o cabelo preto azeviche até os ombros, a carranca enfezada que ela geralmente via quando se olhava no espelho e a pele tão branca quanto a de um albino que era esperto o bastante para não sair no sol. Ele deveria ter cerca de seis metros até onde Elizabeth sabia dos deuses pelo modo como se representavam, mas parecia ter a altura normal de um ser humano (um ser humano alto magro e forte de 1,90m). Ele era realmente magro, como ela, mas não parecia de modo algum fraco. Parecia mais com uma pantera negra, como se fosse elegante e perigoso e alguém a quem ela definitivamente não deveria ser mal-educada.

Elizabeth não sabia o que dizer. Geralmente ficar sem palavras não acontecia com ela: ela sempre tinha uma resposta esperta e desrespeitosa, talvez até um comentário para fazer. Não naquela hora. Quando viu Hades apoiando a cabeça nas mãos apoiadas nos cotovelos nos braços do trono de ossos e ferro fundido ela só conseguia se lembrar do homem que fizera de tudo para agradar sua mãe que nunca tivera o suficiente. Também se lembrava do homem com quem tinha gritado quando sua mãe morreu, de quem tinha fugido e nunca mais voltado para pedir desculpas por que a culpa não era dele. Ela sentiu as mãos tremerem e então esfregou os olhos, decidida a não chorar – sua mãe ficava muito brava quando ela chorava.
– Onde você esteve – ela disse enquanto esfregava os olhos sentada em seus calcanhares no chão – esse tempo todo?
– Elizabeth...
– Não me venha com essa! – ela disse – Onde você esteve?! Praticamente me criou com ela, estando lá todo o dia e quando ela morre e eu preciso mais de você, você nunca aparece! – ela apertou os punhos, sentindo as unhas se cravarem em suas palmas – Eu sabia que você podia aparecer a qualquer momento, sabia que você podia me achar com um estalar de dedos e sabia que você podia cuidar de mim! – ela disse, finalmente olhando para ele – Mas você nunca veio!
– Eu não podia.
– Não me venha com essa – ela resmungou – pôde por dez anos. Por que não podia por seis mais? – Hades parecia ligeiramente irritado.
– Eu havia me esquecido de quão teimosa você era, além de rebelde.
– Me desculpe – ela cuspiu – quando seu pai te abandona e sua mãe se mata, você não se torna exatamente gentil. – ele pareceu realmente bravo dessa vez. Elizabeth se sentiu como se devesse se arrastar no chão e pedir desculpas, mas obviamente não o fez. A parte de Déficit de Atenção do cérebro dela reconheceu que se ela parecia assim quando estava brava havia uma razão para nenhum menino se aproximar dela por 15 anos.
– Você vai tomar juízo e me ouvir – disse Hades por fim – ou vai ficar reclamando? – ela se sentiu tentada a pedir um copo de nescau ao invés de juízo, mas sabia quando passava dos limites.
– O que você tem pra me dizer? – ela perguntou.
– Você está morrendo. – ele disse – Entre a vida e a morte. – Elizabeth levantou as sobrancelhas.
– Você quer dizer... agora?
– Sim – Hades parecia desconfortável – a montanha que você está vai ter uma avalanche. Os deuses dessa montanha também não irão ajudar, eles tem problemas contra meus filhos, dizem que vocês dão golpes baixos.
– Ah.
– Você não precisa se preocupar com Zeus enquanto estiver com o filho dele – disse Hades – os raios dele não exatamente miram em apenas uma pessoa, ele não arriscaria mata-lo. Por outro lado, nesse momento está morrendo de hipotermia. – ela engoliu em seco, abraçando seu quadril com os próprios braços. Não se sentia com frio, mas seria isso por que estava sonhando?
– O que eu devo fazer, quando eu acordar?
– Procure um abrigo – ele disse como se fosse algo óbvio – e então espere a avalanche passar. Mais uma coisa, tenha cuidado com os ventos. – ele disse a última palavra como se tivesse um significado importante.
– Ahm... okay? – ele assentiu. Então meio que sorriu, embora ela soubesse que era uma coisa muito rara. Não era um sorriso de alegria ou algo do tipo, era mais como um sorriso de não morra, sua idiota.
– Tome cuidado – ele disse – principalmente nos seus sonhos. – Elizabeth sentiu o rosto ferver.
– Você não... tipo... viu... ah meu deus. – Hades alargou o sorriso, dessa vez parecendo controlar uma risada.
– Acorde e tente não morrer. – ele disse por fim, ainda sorrindo como se dissesse “ha! Te peguei!”. Então ela acordou.


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