Troubled Love escrita por Mah Nunes


Capítulo 3
Ouvidos que só ouvem o passado.


Notas iniciais do capítulo

Ponto de Vista da Alice



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Não era fugir. Não era como estar realmente desistindo. Ao menos não quando já não há solução cabível. Era a minha chance de recomeço, afinal não se começa um novo capítulo sem ter encerrado o anterior.

Nunca soube realmente definir amor, mas o que sinto por ele é algo forte que me faz sentir estar sendo destruída quando estou longe dele e ser reconstruída e melhorada quando estou junto a ele.

Creio que justamente por isso eu estaria tomando uma ótima decisão em terminar. Eu poderia me reconstruir sozinha, por mais que doesse, por mais que demorasse. É. Certamente eu não poderia ser o motivo de uma imensa mancha na carreira quase perfeita dele. Eu não me importaria se fosse com qualquer outra pessoa, mas não ele.

Sentir as mãos dele segurarem meu rosto daquele jeito, ouvir a voz dele. Ele, ali, tão próximo a mim parecia algo tão... certo. Ainda assim tudo o que eu sentia por ele era como amar as estrelas e não poder sair para observá-las. Um sentimento tão pesado por causa de uma coisa tão simples, um aro dourado no dedo.

Eram raras as vezes que eu não lembrava que ele tinha alguém esperando por ele, na casa dele, no quarto dele. Por mais que estivesse tudo praticamente perfeito entre nós. Por mais que estivéssemos tão aconchegados nos braços um do outro, sempre havia aquela pontada aguda que eu sentia forte em meu diafragma que me roubava o fôlego por um tempo. Ele já tinha alguém. O que eu estava fazendo? Por que me intrometer em algo tão importante?

-- Eu quero você, sempre, comigo! – a voz dele me despertou e aquelas palavras enevoaram todo o meu raciocínio, roubando a minha certeza.

-- Eu também quero isso, mas... – eu mal percebera a umidade percorrendo meu rosto, até que ele docemente a limpasse de minhas bochechas. Não havia ar suficiente para tomar mais fôlego, não com ele tão perto. Tomei coragem e tentei terminar – assim não vai dar certo. Se até a coordenadora já percebeu. Vai saber quanto tempo até alguém da reitoria ficar sabendo.

-- A Carla não percebeu nada. Ela só ouviu os boatos e fez algumas perguntas à pessoas que não sabem e nem tem nada haver – ele tentou amenizar, mas ele não entende. Há boatos sobre nós há meses, se ela veio questionar só agora é porque alguma coisa fez com que deixasse de ser apenas boatos e fofocas.

-- Eu tenho a ver, ela perguntou pra mim. Ela... ela... – agora eu sentia melhor as lágrimas rolando, meu coração apertava com o medo. Ele se endireitou como se um choque estivesse percorrendo o corpo dele. A expressão dele fechou, as mãos dele desceram até a minha nuca.

-- O que ela disse pra você? – a voz dele soava tão séria. Como naquela vez que a mulher dele suspeitava demais e ameaçou vir até mim, eu não tinha medo dela. Eu não tenho medo dela, tenho vergonha. Na época ele praticamente me repreendeu de enfrenta-la, com esse mesmo tom de voz. Depois disso eu evitava tocar no assunto da esposa. – Alice. O que ela disse?

Levei minha mão até o rosto dele e tentei sorrir, mas algo parecia conter meus músculos de fazê-lo.

-- Não se preocupe, ela... – ele pegou minha mão e a segurou firme sem nem ao menos desviar ou desfazer o olhar compenetrado dos meus olhos.

Não conseguiria, teria que dizer. Inspirei fundo e procurei pelo copo de água. Ele relaxou um pouco os ombros e olhou para o relógio em cima da geladeira. Tentei me acalmar para contar a ele toda a conversa. E mais uma vez tomando coragem comecei.

-- Ela apenas disse que haveria consequências para um comportamento como esse dos boatos. Que se a aluna confessasse algo ou terminasse com o motivo das fofocas, não passaria de uma suspensão. Caso contrário, ela não teria outra escolha a não ser processar o professor e demiti-lo.

A expressão dele pulou de tensão para, o que eu diria, confusão.

-- Vaca – ele praguejou baixo

-- De qualquer forma... – ambos nos assustamos com o toque do celular dele. Eu já imaginava quem era.

-- É... eu vou ter que atender. Prometo que não vai demorar. – apenas assenti com a cabeça para que ele seguisse para a varanda atender.

Claro que não iria demorar. Ele é um publicitário, sabe como utilizar as palavras da melhor forma para obter o melhor resultado. O único problema é que ela é advogada, ela sabe como achar brechas nas palavras para obter alguma vantagem. Eu recolhi a garrafa de vinho da sala e levei de volta a geladeira, deixei a taça na pia e deixei o meu livro sobre a cama. Quando voltei à bancada da cozinha ele estava voltando com a típica expressão de “continuaremos isso depois” no rosto.

-- Eu tenho que ir – ele não precisava dizer, eu já sabia que ele teria que ir embora no momento em que ela ligou. Ele me abraçou e escondeu o rosto em meu pescoço – Desculpe. Eu volto amanhã, prometo.

-- Andrew – sussurrei e ele murmurou em resposta – Não precisa voltar. – ele me olhou sério, quase descrente com o que eu dissera – Não precisa voltar mais – repeti

Ele suspirou alto e pousou a cabeça em meu ombro

-- Desculpe por tudo o que te fiz passar – soava meio rouca e abafada. Controlei-me para não abraça-lo forte ali, mandando tudo para o inferno e jogando ele na minha cama. – Se precisar de qualquer coisa, mesmo, pode contar comigo – ele levantou um olhar meio choroso e acariciou meu rosto. – Qualquer coisa.

Parecia que meu bom senso havia dado um nó em minhas cordas vocais para que eu não voltasse atrás com a decisão. Sem como responder eu apenas assenti. E depois de um ultimo beijo ele se foi, fechando a porta atrás de si.

Fui até meu quarto e fiquei olhando pela janela até ver o carro dele sumir pelas ruas. E foi nesse momento em que o buraco negro do meu coração me envolveu. Os “tic-tacs” do relógio já não eram audíveis no silêncio quase mórbido do apartamento, não para ouvidos só ouviam conversas e risadas passadas. Não houve nenhuma diferença entre o breu do quarto e o negro que “vemos” com os olhos fechados. Não tenho ideia de como acabei dormindo. Nem porque sentia que não devesse ter acordado, na manhã seguinte.


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