Silêncio em três partes escrita por Eileen Vongola


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Sempre gostei da forma como o autor descrevia o silêncio quando iniciava e encerrava os capítulos dos livros. Achei que ficaria interessante usar isso em uma fanfic também. Espero que gostem :D



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Era noite. Uma noite particularmente fria. No entanto, o céu estava incrível para aqueles que gostavam de admirar. Parecia um enorme manto escuro feito de veludo, revestido com pequenos diamantes. Era também uma noite de luar. A lua estava cheia e imponente no meio daquele mar de estrelas. Mas o que mais impressionava não era o frio, ou o céu estrelado, ou a lua. Era o silêncio. Um silêncio em três partes.

O primeiro silêncio era fácil de notar. Do lado de fora da Marco do Percurso era apenas quietude e escuridão. Os animais e pequenos insetos pareciam estar desanimados em fazer qualquer barulho. Não se ouvia nem mesmo o leve farfalhar das folhas das árvores, pois até o vento parecia estar com preguiça demais para aparecer naquela noite.

Por dentro da hospedaria a calmaria era a mesma. Não havia hóspedes nos quartos roncando ou se revirando nas camas fazendo os estrados rangerem. Eram apenas o jovem ruivo hospedeiro e seu ajudante que ali faziam presença.

Por horas, Bast lutava com sua própria mente, tentando aquietá-la para conseguir dormir – e talvez fosse o único lugar não silencioso dali. Até que, por fim, deu-se por vencido e ficou apenas deitado na cama, fitando o teto do quarto. Remexeu-se um pouco, procurando uma posição mais confortável, mas era impossível quando se estava dividindo uma cama pequena com outra pessoa.

– Bast! – exclamou Kvothe – Pare de ficar se mexendo e me deixe dormir.

– Desculpe Reshi.

Por dentro, Bast era apenas euforia. Era a segunda noite seguida que passava ao lado de seu amado Reshi. No entanto, era difícil para ele expressar em palavras tudo o que estava sentindo e pensando naquele momento.

Ele abria a boca para dizer algo, mas assim que fitava aqueles olhos verdes, fechava-a logo em seguida. Até mesmo em sua imaginação era um tanto difícil pensar em algo para dizer. E então, depois de uma noite juntos, apenas decidiam que era melhor tentarem dormir, cada um em seu canto da cama.

E era por isso que ali, naquele quarto, jazia o segundo silêncio. Um silêncio estranho, quase perturbador. Como quando você sente vontade de gritar e não é permitido. Bast suspirou, ele precisava fazer algo. Não gostava de se sentir daquela maneira. Inquieto, eufórico. Como se algo estivesse faltando.

Então teve uma ideia. Não conseguia expressar o que sentia em palavras, mas poderia expressar através de gestos. Virou-se para fitar Kvothe. Estava de olhos fechados, parecia tão sereno. A luz da lua invadia o quarto e tocava a pele do Arcano, fazendo-a parecer mais alva do que já era. Bast se aproximou e delicadamente afastou algumas mechas ruivas do rosto do hospedeiro. Tão lindo, ele pensou, e acariciou de leve o rosto de Kvothe.

Kvothe abriu os olhos. Estavam numa tonalidade diferente. Eram de um verde tão límpido, como as folhas das árvores na primavera. E como o Fae amava aqueles olhos.

– O que está fazendo, Bast? – Kvothe perguntou, um pouco sonolento.

– Nada demais, Reshi.

Então Bast apoiou seu corpo por cima do de Kvothe e o beijou. Kvothe, é claro, não reclamou. Correspondeu o doce beijo de seu aluno, e passou a mão pela cintura, costas, e depois parou na nuca, para segurar o Encantado mais firme.

– Acho que não estou mais com sono. – Kvothe disse, um pouco ofegante.

Inverteu a posição, ficando por cima de Bast. Agora o luar iluminava suas costas e suas cicatrizes se destacavam. Algumas maiores do que as outras. E outras não passavam apenas de marcas prateadas. Bast beijou cada cicatriz do corpo do hospedeiro.

No peito, nos ombros, no pescoço. Kvothe se arrepiava quando os lábios do Fae tocavam sua pele. Passou sua mão por toda a extensão do corpo de Bast. Era como tocar uma bela melodia em seu alaúde. A melodia mais bela que já tocara. Mais bela que aquelas que ouvia quando criança, ao lado de seus pais e sua trupe itinerante. Mais bela do que as melodias cantadas por Feluriana.

Ouvir os suspiros de Bast, aquilo sim era música para seus ouvidos.

Bast encarou novamente os olhos de Kvothe. Não eram mais claros como folhas de primavera. Eles estavam escuros e profundos. Um tipo perigoso de verde. Qualquer um que visse aqueles olhos sentiria medo. Mas Bast não. O que ele sentia... Bem, ele não sabia explicar. Mas era algo bom. Algo que o aquecia por dentro. Fazia seu coração se acalmar. Kvothe não precisava ser um arcanista para exercer tal poder sobre Bast. Apenas fitá-lo com seus olhos verdes e acariciá-lo, já fazia com que ele se sentisse submisso ao poder de Kvothe.

Quando pensava melhor naquilo, se sentia até um pouco envergonhado, pelo fato de pertencer ao Reino dos Encantados. Mas o que poderia fazer? Até mesmo a própria Feluriana havia se rendido ao charme de Kvothe, o Arcano.

A cada beijo e a cada toque, Bast suspirava. Ele fechou os olhos, pedindo à Tehlu que aquilo não fosse apenas um sonho. E desejou que mais noites fossem como aquela. Aproximou-se do ouvido de Kvothe, e disse:

– Eu amo você, Reshi.

Kvothe parou por alguns instantes. Apenas fitou as orbes azuis de Bast enquanto processava o que acabara de ouvir. As coisas estavam um pouco diferentes da noite anterior. Kvothe não sabia explicar o que estava sentindo. Era como se seu coração estivesse mais leve. Como se tudo pelo que havia passado não importasse mais. Não importava mais quem ele era, seja o Matador do Rei, o Arcano, o Sem Sangue ou o Nomeador do Vento. Não importava se era Kote ou Kvothe. Naquele momento ele queria ser apenas Reshi. Queria apenas beijar os lábios macios de Bast e abraçá-lo. Queria dizer que também o amava. Mas por quê não conseguia? Por toda sua vida, as palavras nunca foram um problema, mas agora simplesmente não fluíam.

– Algo errado, Reshi? – Bast perguntou, parecia apreensivo. Achava que talvez tivesse se apressado demais ao dizer o que sentia. Kvothe deu um pequeno sorriso.

– Não Bast, não há nada errado – Beijou os lábios do aluno mais uma vez. Passou a mão por seus cabelos negros e beijou levemente sua testa. Saiu de cima de Bast, e deitou-se em seu lado da cama, fechando os olhos. Bast se ajeitou do outro lado, quieto e um pouco envergonhado.

Não disseram mais nada pelo resto da noite.

Bast acordou com os primeiros raios da manhã em seu rosto. Não havia dormido direito durante a noite, e achava que não conseguiria dormir mais do que aquilo. Esticou o braço, o outro lado da cama estava vazio. Relembrou-se da noite anterior, de tudo o que havia feito e dito. Não sabia se o que estava sentindo era felicidade ou tristeza. Talvez os dois ao mesmo tempo. Kvothe poderia não ter dito nada, e também poderia ter dito tudo.

E naquele momento, Bast estava sozinho no quarto. E no quarto pairava uma espécie de silêncio no ar. Era um silêncio diferente. O terceiro silêncio. O mais difícil de se notar. E o silêncio possuía um mensageiro, era um som. O som do último crepitar do fogo na lareira, som do uivo do vento, som de flor colhida? Bast sabia. Era o som da dúvida. Ansiou por palavras e não as ouviu naquela noite. Mas ele não desistiria. Continuaria dizendo o que sentia até obter uma resposta satisfatória.

Não importava quantas noites de silêncio fossem precisas.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a todos que leram (Se é que alguém leu -q). E um beijo pra mamacita Kori, que me ajudou ajudou bastante ♥