Era como uma densa neblina cinzenta. Ela se sentia confortável se movendo por ali. Confortável, aquecida e até mesmo como se estivesse sendo mimada. Mas... era um tanto estranho.
     Era muito estranho na verdade.
     Onde estava? E porque se sentia como se estivesse voando? E porque se incomodava com isso? Por que deveria se incomodar?
     Não sabia. Não sabia mesmo. Só sabia que era tranqüilo e gostoso estar ali, naquela névoa cinza, embalada por braços quentes que não podia ver nem sentir, mas ainda assim, estava embalada.
     Ficou assim por um longo tempo. Pelo menos, achava que o tempo estava passando por ali. Mas estando este passando ou não, o fato é que uma silhueta se formou no meio da névoa. Uma silhueta enorme! Gigantesca mesmo. Parecia ser um tipo de construção ou talvez uma pequena escarpa.
     Curiosa, ela tentou se mover em direção a esta. Mas era como caminhar no meio de dúzias e dúzias de cobertores. Era com se a névoa pudesse segura-la, e até mesmo impedir o seu avanço. Mas a mesma não desistiu, forçando a passagem por entre a névoa acinzentada, até que se deparou com aquilo.
     Mas.. aquilo... aquilo era o mesmo templo que tinha visto na excursão... onde... onde havia uma estátua de sailor Terra no interior...
     As mesmas cores... o mesmo desenho... a porta de entrada estava idêntica. Que estranho...
     Mesmo impressionada, ela não chega a questionar o que via. Apenas decidiu entrar dentro desta e.. lá estavam as quatro portas de novo. Uma do lado da outra. Só que... agora elas estavam... abertas?
     - Interessante...
     Ela se vira para o seu lado e não acredita no que vê. Serena? Mas o que ela estava fazendo ali?
     - Serena?
     - Oi Joynah! O que está fazendo no meu sonho?
     - Seu sonho? - bem que achava familiar as coisas. As cores, o calor... - este sonho é meu!
     - Que seu nada! Até nisso vai querer competir comigo?
     - Ah princesa... não começa. Pode sair do meu sonho. Este é o meu templo, e eu sou a senshi da Terra.
     - Senshi honorária...
     - Que seja - bufou - pode derreter ou desaparecer... ou sei lá o que faz para sair do meu sonho. Anda!
     - Olha aqui nervozinha, eu...
     Princesas...
     - O... que? - murmuraram ambas ou ouvirem aquele som. O mesmo som que tinham ouvido antes quando estavam na pequena área arborizada quando viram o templo no meio do sítio arqueológico.
     Princesas...
     - Quem?
     O som invade o recinto, como se fosse um sussurro ao vento, e logo uma forma translúcida aparece diante de uma das portas. Uma forma esbranquiçada e claramente feminina. Só que era estranha.. era transparente.. e parecia estar sendo toda hora sendo formada por poeira se mexendo por uma brisa... na verdade, não estavam vendo uma forma, mas uma imagem delimitada por poeira sendo movida pelo vendo...
     - Ar.. - murmurou Joynah impressionada - é o elemental do ar!
     Princesas...
     As duas olharam na direção da nova voz. Esta parecia ser formada por água de uma praia, como ondas ininterruptas que se quebram mansamente em uma areia fina. Diante da segunda porta, uma forma - também feminina - se formava. Mas esta era mais fácil de se ver - e de se compreender também. Era um corpo formado por água. Água corrente, azulada e pura.
     - Hã... porque eles estão falando no plural? - perguntou Serena curiosa...
     Precisamos falar convosco.
     Olharam na direção da terceira voz. Esta era como se fossem rochas se esfregando uma na outra, e, no piso da terceira porta, uma coluna de rocha e terra se ergueu, assumindo uma textura esverdeada como se fosse grama e até com um cabelo feito de flores. Também era feminina e era na verdade linda.
     - Nossa! - exclamou Joynah olhando impressionada para a nova figura - escuta.. que papo é esse de...
     Princesas...
     Quanto eco!
     Desta vez, o som era como o crepitar do fogo. Elas não chegaram a ter uma surpresa quando viram chamas surgindo diante da última porta, mas ficaram impressionadas com a imagem final que se formou, feita de chamas. Os quatro elementos estavam ali, diante delas. Cada qual diante de uma porta, e todas as portas estavam dentro do templo de Gaia, e este templo estava encerrado em uma densa névoa, que por sua vez estava dentro de um sonho...
     Talvez elas tenham abusado dos refrigerantes na festa...
     - Está faltando alguém? - perguntou Serena levemente divertida - não? Então que tal falarem logo o que querem?
     - Serena!
     - Ora Joynah... é um sonho, certo?
     - Tem certeza?
     - Bom, chamaram você de princesa, portanto.. AI! ESSE BELISCÃO DOEU, VIU?
     - Dor em um sonho princesa? - ela sorriu divertida.
     - Bem... errr.. gulp olha pessoal... aquilo que eu falei se faltava alguém... bom...
     Princesas... prestem atenção...
     - Eu sou uma princesa também?
     É importante que fiquem atentas as nossas palavras...
     - Eu sou ou não sou?
     Não temos muito tempo...
     - Hã... Joynah.. que tal ouvirmos?
     Nossa escolha deve ser feita...
     Mas é preciso que a escolhida aceite a incumbência...
     Não haverá volta...
     Não haverá alívio no caso de arrependimento...
     - Estou achando que não vou gostar muito disso - comentou Joynah olhando para o chão.
     A sucessora de Gaia deve ser selecionada...
     E cabe a nós a selecionarmos...
     - E o que isso tem a ver conosco?
     Princesas... ambas tem em sua ascendência a qualificação necessária...
     Mas só uma pode ser escolhida...
     E já fizemos nossa escolha...
     - Já fizeram? - se era assim, porque as trouxeram até ali? E, pensando bem, onde era este ali?
     Mas é preciso compreender...
     - O que?
     O poder de Gaia deve ser conquistado...
     Com sacrifício...
     - Não estou entendendo nada - murmurou Serena.
     Com pureza...
     Com vontade...
     - Hã... dá para falaram de forma menos misteriosa?
     Ambas já possuem ascensão própria, com seus próprios direitos...
     Não podemos impor nossa seleção em detrimento ao que já possuem...
     Para isso, teriam que abandonar o que já herdaram...
     E isso, não seria justo...
     - Já temos heranças?
     - Deve ser por eu ser a sailor Moon e você a quase sailor Terra..
     - Quase é? Obrigada...
     - Ei! É a verdade. Talvez seja você quem deva receber o poder de Gaia.
     Devido a isso, devem escolher...
     - Escolher o que?
     Quem deveria ter a honra...
     Quem deve ser posto a prova...
     Quem receberá o poder de Gaia...
     Tem de ser alguém escolhido por uma princesa da Terra.
     E ambas são princesas da Terra.
     - Da Terra é? Eu sou da Lua!
     - Não está se esquecendo de seu pai? Ele é o protetor da Terra.
     - É mesmo.. - ela ficou encabulada - puxa... eu sou mesmo princesa da Terra... e nem sabia. Mas.. espera ai! E você? Sua mãe é a senshi de Júpiter, e seu pai... bom... ele... hã... O que ele é?
     - Ele é meu pai, oras. Não é senshi de nada - ela olha para as quatro figuras que as observavam agora em silêncio e fica pensativa - ou será que é?
     Assim sendo, devem sugerir uma pessoa para ser testada...
     - Testada? Escuta aqui.. Joynah já estava achando tudo isso muito esquisito - primeiro dizem que fomos escolhidas para receber o poder de Gaia, depois falam que não podemos receber. Dizem que precisamos escolher alguém para ficar no nosso lugar e que esse alguém deve ser testado, pois nós não podemos assumir isso porque somos escolhidas mas já temos outras tarefas...
     Exatamente...
     - Exatamente? MAS EU NEM SEI DO QUE ESTOU FALANDO!
     - Joynah... acho melhor não queimarmos muito a cabeça com isto... afinal, isso aqui é um sonho meio doido, certo?
     Princesas...
     Não queremos obriga-las a decidir nada...
     Apenas queremos saber o que fazer...
     Fizemos nossa escolha...
     Mas a escolhida ainda não se manifestou...
     - E quem é a escolhida?
     Não houve resposta. Os elementais apenas permaneceram observando-as, como se fossem fantasmas feitos de material etéreo, dando um visual alucinante conforme os elementos que representavam dançavam constantemente para dar uma forma próxima a humana para seus.. "corpos".
     - Será que é um jogo de adivinhação?
     - Talvez, Serena... talvez... mas eu acho que tem mais coisa envolvida nisto, não é? - ela se dirigiu as eles - porque me chamam de princesa? Minha mãe não é uma rainha. Nem meu pai um rei.
     Ainda em silencio.
     - Se importam de dizer o que realmente querem?
     Queremos servir a sucessora de Gaia...
     E apoia-la incondicionalmente...
     Para isso, ela deve assumir o seu manto...
     Deve aceitar seu destino...
     Deve rejeitar sua origem verdadeira...
     Deve se tornar... a sailor Terra.
     As duas arregalam os olhos, impressionadas com o que ouviram. Joynah abriu a boca para dizer que ela era a sailor Terra, mas nenhum som saiu desta. Ela continuou a tentar e a tentar. Mas não conseguia. Logo, tudo começou a escurecer e ela própria não conseguia se localizar, sem nem entender o que estava havendo.
     - Acorda Joynah! Temos treino!
     - O que? - murmurou ela assustada - ALLETE? MAS..
     Ela olha ao redor e percebe que estava no seu quarto.
     - Temos treino, dorminhoca. Mamãe vai nos treinar, lembra? Vamos indo. Pelo jeito, você abusou muito ontem na festa.
     Ela se levanta e fica sentada na cama, pensativa a respeito do que sentia. Pegou o seu broche no criado mudo ao lado da cama e ficou olhando-o, tentando se lembrar de alguma coisa.
     Era ridículo! Na hora em que viu Allete, tinha certeza de que se lembrava do que tinha sonhado e que a perturbava tanto. Agora, minutos depois disto, já não se lembrava de mais nada.
     Olhou para cima e apertou os lábios. Bom, se fosse importante. Ela se lembraria. Ela saiu da cama e correu para o banheiro tomar uma ducha rápida. Sua mãe já estaria esperando-as no dojo que antigamente freqüentavam.