Metal contra as Nuvens escrita por giveluvbadname


Capítulo 2
Aproximação




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"Às vezes parecia
que de tanto acreditar
em tudo o que achávamos tão certo
Teríamos o mundo inteiro
e até um pouco mais
Faríamos floresta no deserto
E diamantes de pedaços de vidro...

Mas percebo agora
que o teu sorriso
vem diferente
Quase parecendo te ferir..."

Mu sorriu da cena que via ao longe, no caminho de pedras. Quase se esqueceu de que aquela trilha tão acidentada por onde seus companheiros caminhavam havia sido, ha pouco tempo atrás, uma escadaria bastante bem talhada. Estavam trabalhando bastante depressa para reconstruir o santuário, mas haviam pontos que jamais poderiam ser restaurados, como aquela enorme cratera que havia em frente a seu templo. Dohko contou-lhe, rindo, que aquilo fora obra dele e de Shion. Nem conseguia calcular quantos caminhões de pedra e terra seriam necessários para planar aquele buraco enorme.

Não querendo ficar remoendo o horror que passou, Mu voltou seus pensamentos para a cena que via ao longe. Milo e Camus estavam sentados, juntos, depois de uma aparente discussão e um beijo que, se os outros tivessem visto, provavelmente aplaudiriam de pé. De novo um sorriso apareceu em seu rosto, e então o cavaleiro decidiu que era hora de voltar para dentro do templo e se concentrar no conserto da última armadura dourada que faltava entregar.

O dono da armadura estava ali mesmo no templo, mas não se fez notar. Queria apenas ficar olhando o ferreiro trabalhar, não sabia se teria assunto caso se mostrasse. Era tão estranho ficar perto dele agora que voltaram a viver... De pé atrás de uma das pilastras, o cosmo devidamente escondido, Shaka lembrou-se da última vez em que estiveram a sós e tentaram um diálogo normal.

--- flashback ---

"Eu vim buscar a sua armadura..." - Mu tinha as duas mãos unidas atrás de si, e parecia totalmente desconfortável dentro da casa de Virgem.

"Venha, Mu." - Shaka se levantou e Mu o acompanhou até o quarto contíguo - "Aqui está."

Shaka ficou observando enquanto Mu encaixava as alças da caixa que continha o que sobrou da armadura de Virgem. Tinha tanto a dizer a ele, mas não via jeito. Mu estava muito distante, como quase todos estavam. Parecia que o mundo se quebraria se alguém respirasse mais forte, ou se ele de repente dissesse qualquer coisa impensada.

"Eu o avisarei quando estiver pronta." - Mu chamou-lhe de volta para a realidade.

"Não se preocupe, Shaka, sua armadura voltará a ter vida. Você é um... cavaleiro muito poderoso, sabe disso. Sua armadura é reflexo do seu poder." - Mu falou antes de sair.

Shaka apenas assistiu a silhueta de Mu distanciar-se mais e mais, saindo de seu templo. Não conseguira nem mesmo conversar com ele. E Mu, totalmente introspectivo e distante, não se parecia em nada com aquele cavaleiro que desde sempre era um dos primeiros a se aproximar das pessoas. Aquele que, em sociabilidade, perdia apenas para Aldebaran.

--- fim do flashback ---

Em nenhum momento, mesmo perdido nas lembranças, Shaka deixou de apreciar o que via no templo de Aries. Lá estava o agora muito tímido Mu, totalmente absorto na tarefa de restaurar a armadura de Virgem. Ele estava inclinado sobre ela, tratando provavelmente de detalhes. Tinha aquele pó brilhante em uma das mãos e o derramava em alguns pontos com cuidado. Os cabelos já estavam meio soltos, a franja estava meio grudada na testa por causa do suor. Já havia se livrado da túnica há tempos, estava muito calor naquele meio de tarde. Não dava para não reparar na pele clara dele, perolada por causa do suor, as linhas dos músculos bem trabalhados, mas suaves. Ele parecia ter terminado com o pó, e se levantou, batendo as mãos na calça folgada que usava. Mu endireitou-se, já de pé, e preparava-se para emanar cosmo sobre a armadura. Shaka não soube de onde lhe vinha a idéia, mas sentiu ali a chance de se reaproximar do amigo. Caminhou até onde ele estava sem fazer barulho, mas sem esconder sua presença.

Mu havia acabado de começar a emanar seu cosmo sobre a armadura quando sentiu um outro cosmo se juntar ao seu. Não interrompeu a tarefa, conhecia bem aquela energia e sabia quem estava agora a seu lado. Felizmente aquela parte do trabalho permitia a participação de terceiros, e naquele caso era ninguém menos que o dono da armadura. Ficaram assim por alguns minutos, apenas emanando energia na mesma direção, e aquilo pareceu estranhamente confortável para ele. Era boa a energia de Shaka, era morna e tranqüila, dava vontade de prolongar a tarefa apenas para não perder o contato com ela. Mas estava terminado, a quantidade de cosmos que a armadura havia recebido já era mais que suficiente para restaurá-la completamente.

E ali estava, a armadura de Virgem, brilhando como há muito não se via. Estava quente como se nela corresse sangue humano, como se ela mesma fosse um ser que acabava de nascer. E os dois cavaleiros a ficaram contemplando por mais alguns momentos. Até que resolveram olhar um para o outro.

Mu foi o primeiro a se acovardar, assim que se lembrou que estava à vontade demais para um cavaleiro de ouro em serviço. Isso, mais a súbita vergonha que sentiu de estar daquele jeito na frente de Shaka, adicionado ao modo como o outro o olhava fez com que ele abaixasse a cabeça, vermelho como um pimentão. Mu já não tinha uma impressão muito boa das raríssimas vezes em que Shaka abria os olhos, mas daquela vez o olhar azul o estava deixando completamente sem graça. O dono dos olhos azuis percebeu o constrangimento do amigo e quase achou graça quando viu que ele procurava desesperado por sua túnica pelo chão do templo.

"Mu... que é isso, está com vergonha de mim?" - Shaka tinha um meio sorriso nos lábios.

"Não, é que..." - Mu evitava a todo custo encarar Shaka nos olhos novamente - "...eu não estou nada apresentável, você veio buscar a sua armadura e eu te recebo assim..."

Mu, que já começava a vestir a túnica escura que acabou encontrando sobre a caixa da armadura que consertava, se viu impedido de continuar pelas mãos de Shaka, que fez com que seus olhos se encontrassem novamente.

"Não foi por isso que vim até aqui, Mu. Eu vim te ver."

Um par de olhos verdes muito abertos e surpresos em uma face corada, foi o que Shaka viu em seguida. Mas o ariano não se afastou de seu toque, nem tentou se desvencilhar de suas mãos. Apenas deixou que a túnica que ia vestir deslizasse de suas mãos e fosse parar no chão. Viu os olhos azuis do amigo prenderem os seus, mas não abaixou mais a cabeça.

"E por que está fazendo isso, Shaka?" - Mu arriscou.

"Me responde uma pergunta primeiro?" - Shaka aguardou e Mu assentiu - "Por que não conversamos mais? Desde que voltamos nós mal nos falamos. Foi... alguma coisa que eu fiz que te desagradou?" - Shaka franziu a testa, já sabendo o que iria ouvir.

"Me desagradou muito sim saber que você iria morrer e, por ordem sua, não poder fazer nada para impedir." - Mu estreitou levemente os olhos, traindo um pouco a serenidade de costume - "Mas sei dos seus motivos, e o respeito como respeitei naquele dia."

"E está agindo dessa forma comigo por causa disso? Ressente-se daquele dia?" - Shaka insistiu.

"Não me ressinto de você Shaka, eu..." - Mu sentiu de novo as faces corarem - "Droga, como acha que eu me sentí vendo meu amigo ir para a morte por vontade própria daquele jeito?"

"Todos nós estávamos prestes a morrer, e isso era terrível, muito doloroso. Mas isso que você disse... Mu, eu preciso saber, era comigo que você se preocupava? Era a minha morte que você temia?" - Shaka chegou mais perto de Mu, os olhos azuis ansiosos dentro dos verdes.

Mu abaixou o olhar, antes de responder a pergunta. Sabia que podia ser mal interpretado, apesar de ter certeza de que não era o único que se sentia daquela forma.

"A sua morte me causou uma dor tão grande que por um momento quase desistí de tudo isso." - Sem erguer a cabeça, Mu estendeu um dos braços, indicando os arredores - "Eu não sabia que sentia tanto..." - uma pausa, Shaka o olhava ansioso - "...tanto amor por quem até então era um amigo apenas. Foi como um inferno pior do que o que conhecemos, Shaka, tomar conhecimento desse amor e no instante seguinte sentir seu cosmo se despedindo daquele jeito."

Mu tinha os olhos marejados, e Shaka o abraçou forte, como se não o visse ha séculos. E pediu desculpas várias, diversas vezes, enquanto afagava os cabelos lilases do amigo.

"Não se desculpe, Shaka... eu sou o único que deve desculpas aqui... por ser tão egoísta, por só pensar em mim quando você esteve o tempo todo pensando em todos nós, no mundo inteiro..."

"Shh... não, não se culpe... somos tão jovens, tão..." - Agora era Shaka quem tinha a voz embargada pelas lágrimas contidas - "...o que pode haver de errado em sermos honestos com o que sentimos? Você não precisa fingir se conformar com algo por conveniência, esse não é você... não mude, eu te amo justamente por você ser quem é."

"Shaka..."

Mu não teve tempo de responder, Shaka tomou-lhe os lábios e o corpo num beijo que o ariano jamais imaginava que o amigo fosse capaz de dar. Era quente, confortável e excitante estar ali nos braços dele, poderia até mesmo viver dentro daquele abraço. De repente sentiu-se salvo, seguro, mesmo que as imagens ruins viessem lhe assaltar os pensamentos de vez em quando, como acontecia. Sentiu a falta do toque macio quando Shaka se separou dele, sorrindo e já de olhos fechados.

"Estou perdoado?" - Shaka tocou-lhe gentilmente a franja úmida.

"Estamos mesmo vivos?" - Mu respondeu, sorrindo.

Shaka puxou Mu para mais um beijo, querendo provar na prática que aquilo era verdade e que estavam realmente muito vivos. Não era possível saber se era por causa da luz do sol alaranjado do fim da tarde, ou se era cosmo puro e simples, mas a armadura de Virgem brilhava absoluta no templo de Aries, testemunha do segundo reencontro daquele dia, agora abençoado.

"Quero ter alguém com quem conversar
Alguém que depois
não use o que eu disse
contra mim...

Nada mais vai me ferir
é que eu já me acostumei
com a estrada errada que eu seguí
e com a minha própria lei

Tenho o que ficou
e tenho sorte até demais
como sei que tens também..."


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Notas finais do capítulo

Nesta, a música é "Andrea Doria", do disco "Dois", Legião Urbana. Acho a letra linda...
Capítulo escrito em 26/10/2005.



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