Como Se Livrar De Uma Vampira Apaixonada escrita por Rafa


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Olha eu aqui de novo. Bom, resolvi postar esse capítulo hoje porque talvez eu não consiga postar amanhã. Espero que entendam. Adoro vocês leitorasss.



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Estava escuro quando cheguei em casa, montando Bela. Havíamos seguido um caminho alternativo, atravessando milharais vazios e evitando as estradas ao máximo, quase como se eu estivesse com medo de ser seguida. Não quis pegar carona com nenhuma das pessoas que tinham oferecido, como Kitty ou os líderes do Clube da Juventude. Principalmente eles, cujas perguntas eu já tinha respondido pelo menos umas 50 vezes. Eles pegariam no meu pé e perguntariam por que nenhum dos hospitais da região parecia saber nada sobre uma garota ferida por um cavalo. E depois iam querer falar com os meus pais e então entrariam na nossa casa e descobririam Quinn Fabray quase morta – ou morta de fato – no nosso sofá, com meu pai tentando ressuscitá-la usando ervas medicinais e chá.

Esporeei Bela mais um pouco ao pensar nisso.

Será que Quinn podia mesmo estar morta? Como eu me sentiria nesse caso? Será que lamentaria? Sofreria? A culpa me mordia. Será que eu me sentiria aliviada de algum modo?

E eu estava mais preocupada com Quinn ou com o papel dos meus pais nesse desastre?

Todas as perguntas se reviravam na minha mente enquanto eu ia para casa, presa num passo de égua quando precisava de um jato. Nossa cavalgada parecia ridiculamente vagarosa. Einstein havia explicado essa sensação, não é? Relatividade. Nossa percepção do tempo depende da velocidade com que queremos que ele passe.

Tempo. Relatividade. Ciência.

Tentei me concentrar nesses conceitos em vez de me voltar para preocupações inúteis, mas a imagem do sangue da camiseta de Quinn teimava em reaparecer. O sangue que jorrava de sua boca. O sangue vermelho, vermelho.

Quando cheguei ao final da nossa estradinha, Bela estava num galope imprudente e larguei as rédeas, deslizando da sela ao ver a Kombi dos meus pais parada na frente da casa. Havia outro carro, um sedã desconhecido, mas ainda igualmente decrépito. A casa estava toda às escuras, com exceção de algumas luzes fracas lá dentro.

Abandonei a pobre Bela, apesar de saber que deveria coloca-la em sua baia, subi correndo os degraus e entrei.

- Mamãe! – berrei a plenos pulmões, batendo a porta atrás de mim.

Minha mãe surgiu, vindo da sala de jantar, pedindo silêncio com os dedos nos lábios.

- Rach, por favor. Fale baixo.

- O que aconteceu? Como ela está?

Fui em direção à sala de jantar, mas mamãe segurou meu braço.

- Não Rachel. Agora não.

Examinei o rosto dela.

- Mamãe?

- É grave, mas temos motivos para creditar que ela vai se recuperar. Está recebendo bons cuidados. Os melhores que podemos dar, com segurança – acrescentou enigmática.

- Como assim “com segurança”?- indaguei. Cuidados com segurança eram dados nos hospitais. – E de quem é aquele carro lá fora?

- Nós chamamos o Dr. Zoldo...

- Não, mamãe!

Não o Dr. Zoldo. O charlatão húngaro maluco que havia perdido a licença médica por usar controversos “remédios” tradicionais de seu país, nos EUA, onde as pessoas tinham o bom senso de acreditar na medicina de verdade. Eu deveria ter reconhecido o carro. Muito depois de o restante do condado ter boicotado o velho Zoldo, ele e meus pais continuaram amigos, juntando-se ao redor da mesa da cozinha e conversando até altas horas da noite sobre os idiotas que não confiavam em “terapias alternativas”.

- Ele vai matar a Quinn!

- O Dr. Zoldos entende Quinn e o povo dela – disse mamãe, segurando-me pelos ombros. – Ele é de confiança.

- De confiança em relação a quê?

- À discrição.

- Por quê? Por que temos que ser discretos? Você viu o sangue saindo da boca de Quinn? A perna esmagada?

- Quinn é especial – afirmou mamãe, sacudindo meus ombros um pouco, como se eu devesse ter percebido esse fato um milhão de anos antes. – Aceite isso, Rachel. Ela não estaria segura num hospital.

- E está segura aqui? Na nossa sala de jantar?

Mamãe soltou meus ombros e esfregou os olhos. Percebi que ela devia estar cansada.

- É, Rachel. Mais segura.

- Mas ela está com hemorragia. Até eu sei disso. Provavelmente precisa de sangue.

Mamãe me olhou de um jeito estranho, como se eu tivesse compreendido uma verdade importante.

- É, Rach. Ela precisa de sangue.

- Então leva Quinn para o hospital, por favor.

Mamãe me encarou por um longo momento.

- Rachel, há coisas sobre Quinn que a maioria dos médicos não entenderia. Podemos conversar sobre isso mais tarde, mas agora preciso voltar para cuidar dela. Por favor, suba e tente ser paciente. Falarei com você assim que tiver novidades sobre o estado dela.

Dando as costas para mim, mamãe abriu a porta da sala de jantar e escutei vozes fracas vindas de dentro do cômodo escuro. A voz do meu pai. Do Dr. Zoldo. Mamãe entrou para se juntar à conspiração secreta e fechou a porta.

Furiosa, apavorada e frustrada, subi correndo e esqueci a pobre Bela. Sinto vergonha de admitir que ela passou a noite toda no frio de novembro, andando em volta do estábulo, com a sela ainda no lombo. Eu estava atordoada demais pra pensar no animal que havia me ajudado a conquistar um pouco de glória havia apenas algumas horas. Em vez disso, subi na cama e olhei pela janela, tentando descobrir o que fazer.

Enquanto pensava se deveria chamar um médico, vi meu pai sair de casa e atravessar o quintal rapidamente até a garagem. A luz se acendeu no quarto de Quinn, mas só por alguns instantes. Ela se apagou de novo e, segundos mais tarde, papai voltou, caminhando de pressa pelo gramado. Pude ver, à luz do luar, que ele carregava alguma coisa. Algo mais ou menos do tamanho de uma caixa de sapatos, mas com cantos arredondados. Um embrulho.

Esperei até que os passos de papai atravessassem a casa e que a porta da sala de jantar se fechasse. Então desci, evitando todas as partes barulhentas do piso que poderiam me entregar. Fui na ponta dos pés até a porta da sala de jantar e virei a maçaneta, abrindo só uma fresta. O bastante para ver lá dentro.

O fogo na lareira estava quase apagado e a iluminação era mínima, mas eu conseguia enxergar a cena.

Quinn estava deitada na nossa grande mesa de jantar de madeira, a que usávamos para ocasiões especiais. Estava apenas com um pano cobrindo seus seios, sem as roupas sujas de sangue, e a parte de baixo do corpo fora coberta com um lençol branco. Seu rosto estava sereno. Os olhos fechados. A boca, tranquila.

Parecia um cadáver. Eu nunca tinha ido a um funeral, mas achei que ninguém poderia parecer mais morta do que Quinn naquele momento.

Ela está morta?

Olhei para seu peito, desejando que se mexesse, mas, se os pulmões funcionavam, estavam fracos demais para que eu pudesse distinguir seu movimento na sala mal iluminada. Por favor, Quinn. Respire.

Quando o peito de Quinn não deu sinal de vida, algo se abriu dentro de mim e todo meu corpo pareceu uma enorme caverna com um vento gelado, atravessando os espaços vazios. Não, ela não pode ter morrido. Não posso deixa-la ir. Lutei para me manter calma. Se Quinn tivesse morrido, não estariam cuidando dela. Parariam de tratar do seu corpo. Cobririam seu rosto.

Minha mãe andava de um lado para o outro perto da lareira, com uma das mãos na boca, olhando para o meu pai e o Dr. Zoldo, que conversavam em voz baixa junto do pacote que papai havia apanhado na garagem.

Alguma decisão devia ter sido tomada, porque o Dr. Zoldo pegou uma faca – um bisturi? – numa bolsa preta. Ele vai operar a Quinn? Na nossa mesa?

Quase me virei, horrorizada demais para olhar. Mas, não, o charlatão húngaro não cortou Quinn. Apenas rompeu o barbante que amarrava o pacote e rasgou o papel. Levantou o conteúdo, aninhando-o como se estivesse fazendo o parto de um bebê – um bebê mole, escorregadio, que quase escapou de suas mãos. Que troço era aquele?

Inclinei a cabeça um pouco mais para frente, encostando o rosto na fresta e lutando para controlar a respiração e não ser descoberta. Mas ninguém prestava atenção na porta. Mamãe, papai e o Dr. Zoldo estavam olhando aquela... coisa nas mãos do húngaro. Parecia algum tipo de bolsa, feita de um material que eu não conseguia identificar. Mas era algo maleável, porque dançava nas mãos do Dr. Zoldo, como gelatina num saco plástico.

- Deveríamos ter imaginado que ela guardaria isso – sussurrou o Dr. Zoldo, assentindo, a barba branca balançando.

- É – concordou mamãe, agora avançando na direção de Quinn. – Deveríamos ter imaginado.

Papai assentiu e os dois enfiaram os braços sob os ombros de Quinn, levantando-a com delicadeza, até deixa-la quase sentada. Quinn emitiu um som, algo entre um gemido de dor e o rugido de um leão furioso e ferido. Meus dedos úmidos escorregaram na maçaneta ao ouvir aquilo. Não era totalmente humano nem totalmente animal. Mas era arrepiante reverberava pelas paredes.

Enxuguei as mãos na calça de montaria, forçando a vista para entender a cena diante de mim.

O Dr. Zoldo se inclinou para o paciente e estendeu a bolsa como uma oferenda diante do rosto de Quinn. A luz da lareira se refletiu nos óculos do médico e ele sorriu de leve enquanto encorajava, baixinho:

- Beba, Quinn. Beba.

A paciente não reagiu. A cabeça de Quinn tombou de lado e papai mudou de posição para segurá-la, firmando-a.

O Dr. Zoldo hesitou, depois pegou o bisturi de novo, usando-o para furar a bolsa, bem embaixo do nariz de Quinn. Os olhos que eu temia terem se apagados para sempre se abriram com um tremor. Soltei um grito.

Sempre verdes, agora os olhos de Quinn estavam totalmente pretos. As pupilas pareciam ter consumido as íris e a maior parte da área branca também. Eu nunca tinha visto olhos como aqueles. Era impossível me desvencilhar deles.

Ela abriu a boca e seus dentes tinham mudado de novo.

Meus pais deviam ter escutado meu grito, mas era tarde demais. Eles também estavam hipnotizados enquanto Quinn inclinava a cabeça, cravando as presas na bolsa e bebendo com a expressão exausta, ainda que sedenta. Um pouco de líquido escorreu pelo queixo e pelo peito, liquido escuro. Líquido grosso. Eu tinha visto um líquido assim antes, havia poucas horas, manchando aquele mesmo peito.

NÃO.

Fechei os olhos, incrédula. Balançando a cabeça, tentei pensar direito, expulsar a imagem do que eu achava ter visto.

Havia um cheiro, também. Um odor pungente que eu nunca sentido. Bem, eu tinha sentido de leve antes, mas agora... agora era forte demais. E estava ficando mais forte ainda. Abri os olhos e me obriguei a olhar de novo. Eu não percebia aquele aroma com o nariz. Eu o sentia em algum lugar fundo, na boca do estômago ou nos recônditos daquela parte primitiva do cérebro que estudamos na aula de biologia. A área que controla o sexo, a agressividade e... O prazer?

Quinn se empertigou mais um pouco, sustentando-se num dos cotovelos, ainda bebendo com volúpia, como se não conseguisse se fartar. Mas logo não restava mais nada. O saco estava vazio. Quinn então tombou de volta com um gemido que, de algum modo, conseguiu revelar uma agonia crua e pura satisfação. Papai segurou seus ombros nus bem a tempo.

- Descanse, Quinn – insistiu papai.

Mamãe limpou com um pano o peito dela, onde o sangue tinha se derramado.

Sangue. Ela estava bebendo sangue.

Fechei os olhos de novo, dessa vez com mais força. Então aconteceu uma coisa estranha, porque eu estava agachada num chão sólido, de madeira, que teoricamente não podia se mexer, mas que começou a balançar e girar sob meus pés. Toda a casa oscilava ao meu redor e, mesmo quando abri os olhos, tentando me orientar, senti que eles giravam por vontade própria na direção do teto, que foi desbotando como uma tela de cinema quando o filme acaba.

Acordei mais tarde, naquela mesma noite, na minha cama, vestida com o pijama de flanela, confusa e desorientada, como se de repente me encontrasse num país estrangeiro e não no meu quarto. Ainda estava escuro. Tentei ficar o mais imóvel possível, olhos abertos, para o caso do quarto começar a dançar e o teto começar a desbotar de novo.

Mas a casa não se mexeu, mesmo quando repassei, em detalhes nítidos, tudo o que tinha visto. Tudo o que tinha sentido.

Eu tinha visto Quinn beber sangue. Tinha mesmo? Foi uma coisa turva, confusa. E aquele cheiro... Talvez o Dr. Zoldo tivesse dado a Quinn algum tipo de bebida alcoólica romena, alguma poção, ou seja lá o que. Talvez eu houvesse entendido mal, em meio ao pânico e ao medo.

Mas o que eu não podia explicar era como havia me sentido quando acreditei que Quinn estivesse morta.

Sofrimento. O maior sofrimento que eu poderia imaginar. Como se um buraco tivesse sido aberto na minha alma.

Essa foi a parte que me assustou de verdade. Fiquei tão alucinada que desci de novo no meio da noite, me esgueirando até a sala de jantar. O fogo da lareira fora atiçado e Quinn estava deitada de costas na mesa, mas agora havia um travesseiro em sua cabeça. Puseram um cobertor mais quente sobre o lençol que cobria seu corpo dos ombros aos pés. Meu pai ainda estava lá, cochilando na cadeira e balanço e roncando baixinho, mas mamãe tinha sumido, e o Dr. Zoldo também, além de sua maleta e da bolsa com a qual eu havia provavelmente sonhado...

Fui de mansinho até perto do rosto de Quinn. Não havia vestígios de nada vermelho em seus lábios, nem mancha no queixo, nenhuma sugestão de mudança em sua boca. Só um rosto pálido, ferido, agora familiar. Enquanto eu a observava, ela deve ter sentido uma presença, ou talvez sonhasse, porque se mexeu um pouco e sua mão tombou da mesa. A posição parecia desconfortável, por isso, depois de esperar um pouco para ver se ela se moveria mais uma vez, segurei seu pulso com cuidado e o coloquei de volta na mesa. Apesar do cobertor e do fogo que estalava ali perto, sua pele estava fria demais ao toque – na verdade, gelada. Ela estava sempre muito fria. Meus dedos escorregavam para baixo. Envolvendo os de Quinn, para oferecer algum conforto ou calor.

Ela estava viva.

Então comecei a chorar, o mais baixo que pude, num grande esforço para não acordar meu pai. Deixei que as lágrimas escorressem pelo rosto e pingassem em nossas mãos entrelaçadas. Quinn me deixava maluca. Ela era maluca. Mas não importava. Eu não queria ter que enfrentar de novo aquela perda. Nunca mais.

Soltei um soluço, incapaz de me conter. Ao ouvir o som, papai gemeu, a fungada forte de alguém tentando dormir numa cadeira dura, e temi que ele acordasse. Por isso, soltei a mão de Quinn, enxuguei o rosto na manga da blusa e voltei para o quarto. De qualquer modo, já estava quase amanhecendo.


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Notas finais do capítulo

E a história começa mudar. Será que Quinn cansou de correr atrás da Rachel? Será que Rachel abriu os olhos só agora?
Ahhh, Talita, acabei de apagar seu comentário, desculpa, você pode escrever de novo?



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