Pesadelo Vermelho escrita por O Raposa


Capítulo 1
Demônios me Perseguem


Notas iniciais do capítulo

Informações nas notas finais. Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/425911/chapter/1

Minha mente se tornou um caminho sinuoso. A cor vermelha e seu comando impune me perseguem. Aquela maldita, maldita voz histérica que ecoa sempre quando me deito e fecho os olhos. “Cortem-lhe, Cortem-lhe a cabeça!” Sua já tão célebre frase e que já fora repetida tantas vezes que sua boca quase a falava sozinha. Essa maldita, maldita frase ecoa em meus pensamentos sempre que me deito e fecho os olhos. Mas isso não é o pior, nunca será o pior.

Levantei-me suada, ofegante, maluca e, como já de costume, assustada. Tudo culpa dela. Maldita, maldita rainha!

Um barulho. Uma dor, meu coração está quase pulando do peito. Não, aqui não. Aqui não existem barulhos. Não existem pessoas. Não há nada que possa me assustar, nada que possa me ferir e nada que possa me fazer lembrar. Não, aqui não. Mas o barulho volta novamente. Quase inaudível, mas está lá! E eu posso ouvir. São passos, passos curtos e leves, mas rápidos, muito, muito rápidos! Parece um roedor.

Um roedor? Será... Pode ser... Ele? Ele voltou?

Não! Pare Alice, pare! Ele não voltou! Ele não vai voltar! Eu ainda me lembro. Malditas, malditas lembranças que voltam sempre a me atormentar. Mas eu ainda me lembro, lembrar é uma maldição. Eu estou vivendo aquele momento novamente. Merda! Vai acontecer tudo de novo, mas dessa vez, apenas na minha mente.

Tudo se transforma. Eu volto, volto no tempo. Na minha mente, eu volto.

Ele esta lá. Ela também. Eu também estou lá, de longe, assistindo. Sempre assistindo.

O coelho branco, duas vezes do tamanho de um coelho normal, vestindo um dos seus mais lindos ternos e seu relógio estava mais reluzente do que nunca. Seu pelo estava escovado como nunca vira antes. Estava, de fato, muito elegante, podia dizer que ele estava muito fofo, mas ele me bateria se ouvisse. Sim, certamente me bateria.
Ele dobrou os joelhos em frente aquela engenhoca que já levou consigo incontáveis almas, incontáveis vidas. Colocou a cabeça no buraco redondo da madeira, ajoelhado e com as mãos amarradas nas costas. Ele estava pronto, pronto para sua execução. Seu rosto estava duro, não havia medo, não havia arrependimentos, não havia mágoas. De longe, eu assistia, e tudo começava a ficar nublado, tudo começava a ficar embaçado, e em meu rosto se abriam diversas, incontáveis fendas que saíam diretamente dos meus olhos. Soluços baixos e as duas mãos tampando a boca, impedindo a mim mesma de gritar.

Um. Dois. Três. Aquele maldito, maldito carrasco. Quadrado. Uma carta de baralho, assim como todo o exercito da maldita, porém preto. Carta preta, sem números e sem desenhos, em sua cabeça uma espécie de véu que também era preto.
Em três segundos o machado desceu, preciso e forte. Sem piedade, sem clemência. Decepou a cabeça do Coelho. Vermelho, o lugar foi pintado de vermelho. A cabeça rolou, pulou os cinco degraus do altar de execução e parou ali, bem na minha frente, debaixo dos meus pés. Seus olhos estavam fechados, sangue ainda corria da sua cabeça, me enoja. Tem nojo de mim mesma. Tenho nojo de sentir alívio quando ninguém foi procurar a cabeça perdida e assim não me encontraram. Alívio, sim, ele estava aveludado em dor, agonia e vários sentimentos obscuros que eu não pude identificar, mas ele estava lá. Mascarado e irrisório.

Malditas, malditas memórias que me afligem e que me machucam. O próximo, o próximo é ele. Aquele que tanto amei. Não, por favor! Não voltem. Apenas dessa vez, tenham piedade de mim. Não quero reviver isso, não dessa vez! Então por favor, eu peço, deixe-me deitar e dormir. Esquecer tudo isso. Só por hoje.

Não, não deixariam. Esse era meu castigo, minha maldição. Fadada a carrega-la por ter sido tão desprezível. Esse era meu fardo. Minha punição.

Novamente voltei, estava no mesmo lugar. Algumas fendas haviam se secado no meu rosto, deixando cicatrizes. Mas novas começaram a brotar do mesmo lugar que as outras, meu rosto estava manchado de cicatrizes, totalmente irreconhecível. Naquele momento eu era um monstro. O monstro mais impotente que alguém pudera ver.

Ele não estava mais bonito, também não estava mais feio. Estava como sempre estivera antes. Com sua cartola obsoleta e surrada na cabeça. Caminhava como sempre, desengonçadamente. Mas uma coisa estava diferente.

Enquanto caminhava, seus olhos percorriam pelas laterais do campo de execução. Ele procurava no meio daquelas inúmeras pessoas, inúmeras hipócritas que assistiam aquela chacina para não serem mortos também, que fingiam concordar e amar a maldita, mas ele procurava alguma coisa. Não. Ele procurava alguém.

Ele estava me procurando.

Mas eu estava escondida.

Eu estava dentro de uma árvore oca e assistia tudo por uma fresta que nela havia e que, estranhamente, me dava ampla de visão de toda a execução. A arvore era larga, eu era magra e a única maneira de entrar e sair por lá era por outra minúscula, quase invisível fresta que ficava no final da árvore. Por sorte eu tinha um frasco de suco encolhedor, a quantidade ideal para eu sair lá de dentro. Aquele sentimento nojento novamente. Aquele alívio que até hoje me condena. Maldição!

Assim como o coelho ele se posicionou, esperando sua morte.

Mas ele me achou.

Sua cabeça virou para a direita, em direção à árvore. Ele me olhava, diretamente. Meu coração palpitou e, por um momento, eu quase estraguei o meu esconderijo e me arrisquei até lá, para salvá-lo.

Olhou pra mim e sibilou uma frase que eu entendi perfeitamente, para aumentar a tortura do inferno que se tornou minha mente e minha consciência.

“Corte-me a cabeça, Alice”.

Foi o que ele disse. Foi o que eu entendi.

O carrasco demorou e eu tive que ouvir seu grito histérico, novamente. Talvez isso seja meu castigo por ter olhado e não feito nada.

– Cortem-lhe! Cortem-lhe a cabeça! – Ela gritou de sua área vip. Ficava de frente para a vítima, uma sacada do castelo a poucos metros do chão. Ela tinha, com certeza, uma visão privilegiada das cabeças rolando da li de cima. Certamente conseguia ver pele e ossos se rompendo e se separando em dois.

Maldita, maldita rainha de copas!

Em um rompante de realidade, uma mistura de susto e medo, o carrasco desceu rapidamente o machado em direção à cabeça do meu amado. O chapeleiro. Sua cabeça assim como a outra rolou, dessa vez não para perto de mim, mas eu ainda pude vê-la quicar em três degraus e rolar no chão, até parar pouco a frente. Sua cartola não desprendeu de sua cabeça.

Típico dele.

O Dodô, a Lebre de Março, a Duquesa e a Rainha Branca. Foram as outras quatro execuções que tive que ver, exatamente nessa ordem, sem me permitir fechar os olhos em nenhum instante.

As execuções pararam. A maldita, maldita cabeçuda foi embora junto com os hipócritas egoístas, ao anoitecer eu tomei o suco encolhedor. Depois de caminhar, com rachaduras secas em meu rosto, e novas rachaduras surgindo, eu cheguei ao portal que me levaria de volta para casa.

Não havia sobrado ninguém para eu me despedir. Aquela era minha casa, e agora ela estava destruída e tinha destruído junto a minha sanidade. Levou embora, sim, levou embora tudo que eu já fui e qualquer coisa que eu pudesse ser no futuro.

Tornou-me uma louca, sim, uma doida varrida. Medrosa e perturbada, era isso que eu havia me tornado.

Se quiserem um resumo da minha vida, aqui vai um.

Fui tachada de doida e jogada em um lugar para esse tipo de gente. Trancafiada eu permaneci por mais tempo que meus dedos podem contar. Pesadelos, pesadelos, pesadelos. Essa é minha vida.

Um enorme e constante pesadelo. Sem conseguir dormir, sem conseguir dormir e nem mesmo respirar sem que algo me atormente. Sempre, um constante e incansável pesadelo. Contínuo e crescente, cada vez mais real.

Uma risada. Foi uma risada! Eu escutei-a, tenho certeza!

Está acima desse quarto, esta acima de mim, bem em cima desse teto. Maldição! Essas patas de roedor e essa risada. Essa é a risada dele! Meu amado, sim, sua risada. Nunca me esquecerei.

Parou. Por um momento, tudo parou. E então, um estrondo.

Um pedaço do teto caiu, de repente, e comecei a gritar por antecedência. Pude ver no meio dos destroços monstros se arrastando para o meu lado, me afastei deles, arrastando até a parede, fiquei encolhida, gritando, minha garganta sangrava enquanto eu abraçava, apertava, amassava minhas pernas. Encolhida na parede.

Demônios! Eram demônios!

Um corpo sem cabeça e em decomposição de um coelho se arrastava para mim, cada vez mais perto.

E aquela cabeça. Aquela cabeça sem corpo com uma cartola pregada em seu cabelo laranja rolava para mim. Pude ver seu rosto. Aquele sorriso estava lá, o mesmo sorriso daquele dia. Pude ouvir em minha cabeça uma voz “Corte-me a cabeça, Alice”. Gritava! Socorro! A voz gritava dentro da minha mente, tampava meus ouvidos mas ela ainda gritava. Sentia meu cérebro começar a sangrar!

Uma mão! Outro corpo! Aquele vestido branco, eu me lembro dele. A mão vermelha em sangue segurava meu pé, tentei chuta-la em desespero mas senti outra mão, peluda e branca, segurar meu outro pé.

Não! Por favor! Não! Vão embora, por favor! Não foi minha culpa, não foi minha culpa!

Eu não falava nada, apenas gritava, gritava como uma besta. Um grito demoníaco saía da minha garganta, nem mesmo eu o reconhecia. Aquela não era eu, não! Não era eu!

O grito se se transformou sutilmente em uma gargalhada. Aquela gargalhada, eu a reconhecia, mas não era minha. Era uma gargalhada vermelha e repleta de angustia, ódio e crueldade. Não era minha, não era minha!

Senti-me apagar, tudo se tornou um borrão. Aqueles demônios riam e me mordiam, tirando pedaços da minha pele. Doía como o inferno!

Mas antes que tudo ficasse escuro eu pude ouvir, no breu, sua voz ecoar em minha cabeça.

“Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe, cortem-lhe a cabeça! Cortem Alice em pedaços!”

A voz gritava, repetia essa mesma frase incontáveis vezes. A voz da maldita!

Eu estava louca? Eu estava morta?

Por favor.

Salvem-me.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oi Oi gente. Bom, eu fiz essa One-shot para o blog Marshmallow Revolution, que eu participo. Terminei em menos de 1 hora, por isso ficou bem curtinha.
Os personagens, como deu para ver, é de Alice no País das Maravilhas, mas o enredo é totalmente meu!
Espero que gostem, comentem e visitem o blog.

Obrigado~Obrigado~~.

Hwaiting!

—Zeul.