Do Lado De Dentro escrita por Mi Freire


Capítulo 29
Calmaria


Notas iniciais do capítulo

O capítulo está longo. Esse capítulo é muito importante. É onde finalmente a Hayley vai contar algumas verdades que nunca foram ditas.



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"Me fez feliz como ninguém, me faz triste como jamais fui."

Jesse não bebe. Mas aceitou uma taça de champanhe.

— Vou ao banheiro. Espere por mim. – ele disse entregando-me a taça vazia. Jesse se foi. Oliver se aproximou, sem Amy.

— Cadê ela? – fui logo perguntando de Amy. Essa noite minha única preocupação é ela. Minha amiga.

— Relaxa, Hayley. – Oliver beijou minha testa, sorrindo. — Amy está em boas mãos. Eu cuido dela pra você. – não sei se deveria confiar plenamente no meu próprio irmão. Algo me dizia que eu pelo menos poderia tentar. Nem que fosse só por uma noite. — Quer um cigarro?

— Não, obrigada maninho. – devolvi-lhe o sorriso, dispensando uma das suas tantas caridades da noite. — Essa noite, não.

Oliver olhou-me surpreso, como se não acreditasse que eu acabara de recusar um cigarro. Mas veja bem, eu não sou fumante. Nunca fui. É só pra curtição. Mas essa noite, em especial, algo em mim, diz que eu não preciso disso. Tenho o Jesse. Sinto que não devo e não posso aborrecê-lo, ele vem fazendo tanto por mim que não me parece justo.

— Melhor assim. – Oliver deu-me um ultimo beijinho e se foi, satisfeito comigo. Jesse voltou.

— A Amy está bem? – ele perguntou, observando meu irmão desaparecer entre os amigos.

— Pelo que tudo indica, sim. Oliver só veio aqui para oferecer mais champanhe – menti. — Você aceita mais uma taça?

Sim, ele aceitou. E confesso, meu coração batia cada vez mais acelerado. Jesse estava sendo tão mais legal do que ele geralmente é. Sem implicações, sem dramas, brigas, conflitos.

Decidi que queria sentar. Fomos os dois até a varanda de casa e sentamos ali. Em meio ao silêncio e o escuro. Os amigos de Oliver ainda estão no meio da rua se divertindo. São em media mais de dez pessoas, entre elas Amy, completamente solta, risonha e fora de si.

Desviei meu olhar. Não queria ter que me preocupar atoa. Deixaria tudo nas mãos do meu irmão. Pelo menos só por uma noite. Amy merece se divertir, mesmo que não seja exatamente do jeito dela. A bebida tem ajudado bastante, só espero que ela não acorde arrependida amanhã.

Por um momento, pensei ter visto uma estrela no céu. Mas quando fui conferir, estava enganada. Olhei para o Jesse ao meu lado, com o braço encostado no meu, e segui a direção dos seus olhos. Eles tinham um brilho diferencial. O que sempre fazia com que eu me lembrasse do Brandon.

Não posso pensar no Brandon agora. Não agora. Ou minha noite estaria arruinada. Eu sentiria saudades. Iria querer chorar. O Jesse iria querer saber os motivos e eu não estaria preparada para falar.

— Você viu aquilo também? – ele desviou os olhos do céu e olhou em minha direção com um meio sorriso. — Acho que vi uma estrela cadente. Ou estou delirando. Deve ser o champanhe.

Rimos juntos. Bobo.

— Você fez um pedido? – perguntei, voltando a olhar para o céu. Mas nada encontrei. Seja lá o que tenha acontecido, foi rápido demais.

— Não. Mas – olhávamos os dois para o céu encoberto de nuvens densas e escuras. — ainda vou pedir.

Ficamos em silencio completo. Não que isso me encodasse. De forma alguma. Só ouvi-lo respirar já era o suficiente. Jesse, por outro lado, acarinhava as costas das minhas mãos em movimentos circulares com a ponta de seus dedos longos. E pra mim, naquele momento, era a melhor sensação que eu poderia ter.

— Trinta segundos. – Jesse quebrou o silêncio, conferindo as horas no visor do celular. — Vem, Hayley. Tá na hora!

Jesse me puxou até o meio-fio. Colocou seu braço cuidadosamente sobre os meus ombros e me puxou para perto dele para me proteger do ar gelado. Jesse fez contagem regressiva e quando terminou... Os fogos de artifícios explodiram no céu enfeitando a noite.

Os fogos de artifícios anunciavam a chegada de um novo ano. E com ele as expectativas de uma vida melhor.

Estamos muito próximos. Jesse parece não se importar que todos possam ver aquela cena tão intima. Então porque eu deveria me importar? A verdade é que nunca ficamos tão pertos um do outro, assim, diante de tudo e todos. Sempre que ficamos juntos, sou só eu e ele. E ninguém mais precisa saber ou ver.

— Faça um pedido! É sua vez. – ele cochichou no meu ouvido despertando-me, fechei os olhos.

Poderia ter pedido tantas coisas, eram tão possibilidades. Mas não pensei em nada melhor do que tê-lo ao meu lado e que aquela noite fosse infinita. Uma noite só nossa. Só não tinha esperanças que seja lá quem fosse o “realizador de pedidos” fosse atender ao que eu queria. Sempre foi assim, quando eu mais precisei, ninguém me atendeu. Porque agora seria diferente? Só porque eu queria muito algo que não estava ao alcance.

— Confie. Tenha fé. – foi o que ele me disse, ainda com a boca muito próxima da minha orelha. Senti um calafrio.

Antes que eu pudesse perguntar ao Jesse se ele também havia feito um pedido para o ano-novo na esperança que ele entrasse em detalhes caso tenha feito... Amy reaparece, de repente, o arrastando de mim. Sinto como se ele tivesse me deixado nua.

Amy puxa Jesse pelas duas mãos. Ele sorri entretido, mesmo sem entender, assim como eu. Ela para com ele no meio da rua. Estão todos olhando, mesmo de longe, eu posso ver. Todos boquiaberto e com sorrisinhos estupidamente curiosos.

Volto a focar meus olhos em Amy e Jesse. Um de frente pro outro ainda no meio da rua com os fogos de artificio no fundo com um lindo papel de parede. Ela fala algo pra ele que só ambos conseguem escutar. Logo em seguida, vejo o que já deveria ter imaginado que aconteceria. Amy tira os óculos, fica na ponta dos pés e... Beija o Jesse. É como uma cena de filme romântico daqueles bem clichês.

Sinto-me zonza. As pernas ficam bambas.

— Opa. – Oliver chega a tempo de me segurar. Com seu auxilio sinto-me em equilíbrio outra vez. Jesse e Amy ainda se beijam. Não sei se sinto desprezo, raiva ou se fico contente por finalmente isso ter acontecido entre eles. Era o que ela queria afinal. — Pelo visto ela conseguiu.

Olhei para Oliver, intrigada. Ele abaixou os olhos – já que é mais alto que eu – para poder retribuir meu olhar.

— Estávamos brincando de verdade ou desafio. – Oliver começou a explicar, mesmo sem eu ter perguntado diretamente. — Não achei que ela seria capaz de... Você sabe. Ela tá muito doida.

Balancei a cabeça negativamente. Uma parte de mim queria conferir de perto se eles ainda estavam... Ficando. Outra parte de mim dizia que não valeria a pena. Não é da minha conta, afinal. Cada um por si.

— Chega por hoje. – afastei-me de Oliver. Acho que foi um pouco grosseira da minha parte. A maneira como eu estava agindo, até mesmo falando. Eu não sou assim. Mas tem coisas que a gente vai deixando de ser e nem percebe. Oliver precisa me entender. — Vou entrar.

Disse seguindo o caminho até a porta de casa. Desabotoando meu casaco aos poucos e pronta para me livrar daquelas botas.

Não queria que ninguém viesse atrás de mim. Só quero ficar sozinha por um momento. Assimilar as coisas a minha volta. Sem que ninguém pergunte nada, e apenas, me deixe em paz.

Estirei minhas pernas sobre o sofá, aproveitando o tempo sozinha sem papai ou mamãe em casa. Muito menos Oliver, curtindo lá fora o ano-novo com os amigos. O meu inicio de ano foi arruinado e por mais que eu queira não ter sido atingida tão facilmente com a cena daquele beijo, nada é como eu quero, igualmente ao pedido que fiz ao lado de Jesse durante a queima de fogos lá fora.

Comecei a me odiar por muito motivos. O principal deles é o quanto estou sento estupida em pensar, por um momento, em desmoronar toda a minha raiva pra fora através de lagrimas.

Ouço batidas na porta. É uma pena que eu não tenha trancado e apagado as luzes logo depois de entrar. Assim, ninguém notaria a minha existência. Sento sobre o sofá curiosa. Mas quem pode ser? Há três possibilidades: Oliver, Jesse ou Amy. Não quero ver nenhum dos três. O que devo fazer para evitar isso?

Mas pode ser o Jesse. O Jesse. Com alguma explicação, alguma justificativa ou qualquer coisa que me diga o que exatamente o que aconteceu lá fora entre ele e a Amy. O beijo.

Corro para ver.

— Ah. Oi Andrew. – digo secamente sem conseguir esconder meu desapontamento, dando as costas, o deixando entrar.

— Nada feliz em me ver? – ele pergunta sorrindo, sentado ao meu lado no sofá onde já me espalhei.

Fiquei em duvida se deveria responder ou não. Estou com o pavio curto, posso ser fingida ou mal-educada. De mim pode se esperar tudo.

— Desculpe incomodar. – ele se inclinou pra perto de mim. — Só passei aqui para te desejar... Feliz ano-novo!

Sem que eu esperasse, Andrew me puxou para um abraço carinhoso. Enterrando seu rosto na curvatura do meu pescoço. Eu jurava que ele estava me evitando desde o ultimo incidente com Tyler, quando socou o rosto dele por vê-lo me beijar. Mas pelo visto, as coisas mudaram, ou era só mais uma coisa da minha mente fértil.

Afinal, não sou o centro do mundo. Pelo contrário, na maior parte do tempo, o mundo parece estar contra mim.

Andrew prolongara nosso abraço por tempo demais. O que me pareceu muito estranho. Não era um abraço normal, um abraço qualquer.

Ainda muito próximo a mim, Andrew desenterrou seu rosto lentamente do meu pescoço e tocou nossas bochechas uma na outra. Senti que ele está quente e isso é muito bom. Sinto-o respirar devagar e ao mesmo tempo desacelerado. Mesmo que nenhum de nós dissesse nada, seus pensamentos são muito altos.

Ele me beijou. Porque era exatamente isso que ele queria, foi o porque dele estar ali. Não foi só por um simples “Feliz ano-novo!”

— Hayley... – e mais uma vez, assustados, eu e Andrew nos afastamos como se acabássemos de levar um choque. Jesse estava na porta com os olhos arregalados e a boca entreaberta. — Andrew?

— Ah. Oi Jesse. – Andrew sorriu, mexendo os dedos incomodado com a situação. Eu nem saberia o que dizer diante daquele constrangimento. De repente, a noite de ano-novo estava superando qualquer vontade que eu tive de que tudo desse certo. Pelo menos uma vez. Mas acho que não mereço isso. — Como vai?

— O que faz aqui? – Jesse fechou a porta atrás de si. — Eu pensei que... Ah, deixa pra lá. – ele recuou, voltando a porta. — Não queria interromper vocês. Eu sinto muito.

Jesse se foi. Tive vontade de gritar seu nome e pedir que ele ficasse. Eu tinha explicações, acho que devia a ele uma explicação. Mas meu grito ficou entalado no meio da garganta me impossibilitando de agir.

— Impressão minha ou ele não gostou do que viu? – Andrew perguntou, voltando a olhar pra mim.

— Impressão sua. – eu sorri. Ou não? Ou Andrew tinha razão? E se sim, isso era algo positivo ou negativo? — Estou com dor de cabeça, acho que vou deitar. Sei que é cedo, mas...

— Tudo bem, Hayley. Eu já entendi o recado – ele piscou graciosamente e se levantou. — Fica bem. Até outro dia. E desculpe-me por qualquer coisa. Caso você não tenha gostado. Eu gostei.

Ousado e provocante.

Em meu quarto, puxei de baixo da cama a caixa de Brandon. Não saberia definir o que estava sentindo naquele momento. Como muitas vezes eu só queria que Brandon estivesse ali mais que qualquer outra coisa no mundo. Ainda mais que o pedido que fiz aos céus na virada do ano alguns minutos atrás..

Dentro da caixa, peguei um objeto muito familiar. Era um frasco vazio de vidro do perfume que ele usava. Um cheiro amadeirado que eu poderia reconhecer de longe em meio a uma multidão. Levei o frasco até o nariz, fechei meus olhos e inalei o cheirinho que ainda permanecia ali.

Algo quente escorreu dos meus olhos. Uma lágrima.

— Hayley? Sabia que te encontraria aqui. – era o Jesse. Como sempre, entrando sem ser ao menos convidado. — queria conversar.

— Ah não. Por favor. – virei as costas, tentando esconder o frasco do perfume de Brandon. A caixa ainda estava sobre a cama, nada eu poderia fazer para arranca-la dali sem que ele percebesse que havia algo de errado. — Agora não.

— Não antes que eu me explique – senti seus dedos no meu ombro esquerdo. Virei-me devagar para olhar no fundo dos olhos dele. Ainda com o frasco pressionando contra o peito apertado. — Eu sei que parece tudo muito confuso. Mas eu só queria voltar pra casa tranquilo. A noite já não tem mais graça. Eu tentei ficar lá em baixo, com os seus amigos, tentei me divertir. Mas nada me tirava você da cabeça. – Jesse falava rápido demais, e deixando confusa a cada palavra. — Eu só quero me explicar. Quero dizer que, aquilo que aconteceu entre mim e a Amy...

— Jesse. Você não precisa se explicar.

— Como eu estava dizendo – ele me olhou firme, como se eu não tivesse acabado de interrompê-lo. Eu não queria ouvir nada daquilo, não naquele momento. Só queria por um momento poder ficar sozinha com tudo que me restara do Brandon. As lembranças, a nostalgia dos objetos. — a Amy é uma garota incrível. O tipo de garota que qualquer garoto desejaria ter como namorada. Eu não sei o que deu nela, ela chegou, me levou e me beijou ali diante de todos. Não achei que seria justo decepciona-la ou envergonha-la na frente de todas aquelas pessoas. Talvez tenha sido o efeito do álcool. Está uma loucura lá em baixo! – ele riu, coisa rápida. — Eu só, simplesmente, não conseguiria magoa-la. Não seria certo. E foi por isso que eu deixei que ela me beijasse. Não que eu realmente quisesse. Foi bom. Mas também não é justo com você. Porque um dia eu te beijo e no outro já estou me rendendo aos encantos de outras e...

— Para. Jesse. Para.

Ele me olhou assustado.

— Vamos falar sobre isso outra hora, tudo bem? – perguntei com a voz baixa. Muito fraca. Não me importei. — A Amy é minha amiga e qualquer coisa que a faça verdadeiramente feliz está bom pra mim. E você, não é qualquer garoto, você é você, e tudo bem, o beijo, ou qualquer outra coisa a mais que tenha acontecido. Tudo bem. Vocês são meus amigos!

Quem eu estava mesmo tentando convencer? A mim ou a ele?

— Vem. – peguei sua mão solta no ar. — É um ano-novo. Pode ser o começo de muitas coisas. E, pra começar, agora que eu finalmente me sinto preparada, ou acho que estou, tenho algumas coisas que eu quero te mostrar e quero você saiba, porque, de jeito nenhum, quero que aja injustiça entre nós. Eu devo isso a você. Quantas vezes você confiou a mim segredos seus? Hoje, agora, me parece um bom momento de relevar a vocês algumas coisinhas.

Sentamos os dois sobre a minha cama. Com a baixa entre nós.

— Lembra quando, no internato, eu pintei um quadro de um garoto completamente desconhecido pra você? – ele assentiu, sem respostas. Seus olhos âmbar claros eram as únicas coisas que me fazia querer continuar. Por mais tremor que eu sentia por meu corpo. — E eu disse que fora um alguém muito importante pra mim?

— Sim, eu lembro Hayley. Mas não estou entendendo. – ele parecia muito confuso. E com razões. Eu só queria começar do começo. Queria que tudo ficasse claro finalmente. — O que tem ele? É ele o tal de Brandon? Um ex-namorado? Seu amor verdadeiro? Um carinha qualquer...

— Tudo. Menos um carinha qualquer. – eu o interrompi, respirando fundo. Tomando folego. — O Brandon foi a melhor pessoa que já conheci em toda a minha vida, Jesse. A melhor. E quando eu digo a melhor pessoa, eu falo sério, porque não existe e nunca existiu alguém tão bom quanto ele.

— Hayley...

— Espera. – queria espaço. Tudo estava processando rápido demais e eu só queria que ele tivesse paciência. Eu esclareceria tudo, quando finalmente me sentisse pronta. Agora ou daqui alguns minutos. Não importa, pois, desse primeiro dia do ano não vai passar. Porque se passar, posso nunca mais ter a oportunidade ou a coragem. — o Brandon – continuei, respirando devagar. Tentando a todo custo segurar as lagrimas que já invadiam meus olhos. — o Brandon – repeti, com a voz falha. — o Brandon morreu há alguns anos atrás.

Jesse ficou perplexo. A mesma reação, ou algo muito parecido, de quando ele flagrou meu beijo com Andrew há pouco tempo atrás.

— Eu sinto muito, Hayley. Eu não sabia...

— Eu também sinto muito, Jesse. – comecei a chorar, olhando para o alto, querendo evitar. Mas não podia. Não podia. — Sinto muito a cada dia que se passa. Nunca foi fácil superar. Nunca. – Jesse mencionou a se aproximar, mas eu precisava de espaço e não permiti. — Eu sei que você não sabia. Ninguém mais sabe além da minha família. Foi um período muito difícil pra mim. Eu nunca soube bem lhe dar com isso, entende? Eu nunca superei mesmo depois de tanto tempo. E sempre que eu acho que posso finalmente seguir enfrente, estou errada, porque não posso. Não consigo!

Cobri meu rosto com as mãos.

— Eu sempre fui assim, sabe? Essa garota inconsequente, sem motivos, justificativa. A garota que age pela razão e não pela emoção. A garota retratada como sem coração, sem sentimentos. A garota revoltada que faz de tudo para irritar os pais. A que age por impulso, faz o que quer e quando quer, fala palavrão, briga, bebe e fuma, usa drogas, rouba gabaritos ou coisas piores, beija qualquer um, e basicamente dane-se a vida.

“O Brandon apareceu na minha vida em um momento muito repentino, eu nunca imaginei, que uma coisa tão bonita, como amar, aconteceria comigo. Porque eu simplesmente, nunca mereci nada parecido com essa alegria quer é ter uma pessoa e chama-la de 'sua'. Nós sempre estudamos no mesmo colégio e moramos na mesma cidade. Eu nunca parei pra olhar verdadeiramente pra ele. Pra mim ele era só mais um garoto qualquer, desses babacas que tem a vida boa e tudo em mãos. E ele nunca olhou de verdade pra mim como muitas pessoas. Mas quando isso aconteceu, eu podia jurar que era alguma brincadeira de mau gosto, uma piada. Quando ele disse que estava se apaixonando por mim eu não podia acreditar. Eu não queria acreditar. Mas bastou olhar dentro dos olhos deles pra eu ter certeza que ele nunca mentiria pra mim. Não daquela forma. Ele é o tipo raro de pessoas, como a Amy, que é bom demais para ferir as pessoas. Ele me dizia a verdade, ele me amava, e mesmo que tenha demorado tanto tempo para descobrir, era algo que ele, e eu, jamais sentimos por ninguém. Cada um com suas próprias razões, com seus próprios motivos.”

“No mesmo dia, logo após ele se declarar e eu confiar em cada palavra, começamos a namorar. E parece loucura, mas nada antes que eu tenha sentido de tão grandioso se comparava ao que eu sentia por ele que era ainda melhor que qualquer alegria que eu já conhecia. Era algo único, sabe? Daquele tipo de amor que a gente só sente uma vez na vida. E ao lado dele eu tive os melhores momentos da minha vida. Coisa que eu nunca imaginei que existia. Coisas que só acontecia com os outros, mas não comigo, porque eu não merecia. Mas o Brandon me fez acreditar que sim: eu merecia. Eu merecia ser feliz, eu merecia me apaixonar, amar e se amada também. Ele fez de mim, mesmo sem pretensões, uma pessoa melhor. E todos enxergavam isso. Todos. Jesse – a cada palavra jorrada para fora, lágrimas impulsivas escorriam de meus olhos. — o Brandon me amou com todos os meus defeitos e me amou ainda mais pelo que eu sou.

“Ele nunca chegou a me dizer o que era certo ou errado fazer. E isso era o que eu mais gostava nele. Eu não precisava, nem por um minuto, deixar de ser quem eu sempre fui. Pois mesmo eu sendo eu mesma, fazia com que ele me amasse mais e eu acreditasse cada vez mais nesse amor, porque nada era mais real do que ser aceita, completa, retribuída, admirada, desejada. Porque era exatamente o que eu precisava, dessa compreensão, desse amor. Coisa que nunca tive. Nunca ninguém me deu o que eu precisava e só o Brando conseguiu despertar em mim esse lado que eu desconhecia da minha vidinha mais ou menos. Sempre fui julgada, mal interpretada, nunca fui levada a sério, mas com ele, nada disso importava, desde que ele estivesse ao meu lado, mesmo sem precisar fazer muito, fazia com que eu me sentisse a melhor pessoa do mundo mesmo sendo toda errada. Será que dá pra entender?”

Jesse assentiu vagarosamente. E por mais que seus olhos indicassem que sim, ele poderia compreender, por mínimo que fosse. Mas jamais entenderia completamente.

— E a cada dia que se passa – levantei-me, tentando secar o máximo de lágrimas possíveis. Aparentemente, eu devia estar um caco. A maquiagem borrada, as roupas molhadas pelo choro. — sinto que o melhor de mim, que pertence a ele, está se perdendo pouco a pouco. E eu não suporto isso! Não suporto a ideia de perder o que mais amo na vida.

Soluçava, passando a ponta dos dedos sobre a minha escrivaninha onde, há alguns anos, era repleta de porta-retratos com fotos minha e do Brandon. Mas agora, não há nada além das minhas coisas. E sinto que a maior parcela de tudo, pelo esquecimento, é minha culpa. Por ter me livrado tão facilmente de tudo que eu mais gostava no mundo e que de alguma forma estava ligada ao Brandon.

Peguei um dos meus objetos e esmaguei nas mãos.

— Mas quando eu estou com você Jesse – eu não olhava pra ele, só esmagava cada vez mais, o máximo que eu podia, o objeto em mãos. — quando olho dentro dos seus olhos. Olhos perfeitamente incríveis cor de âmbar. Inevitavelmente eu me lembro do Brandon. Porque você é a única pessoa no mundo que tem os olhos dele. No começo, isso foi assustador pra mim. Eu pensei que estava delirando ainda mais. Eu delirei, eu surtei após a morte do meu único e grande amor. Mas ai você apareceu e tudo mudou.

Sentindo uma raiva incontrolável tomar conta de mim, atirei longe o objeto em mãos, fazendo-o se estraçalhar no chão. Olhei para o Jesse por um momento muito rápido, em questão de segundos, e vi no rosto dele sua expressão de espanto. Ele deve está me achando uma louca.

— Você deveria ser só mais um. Mas não é bem assim – eu sorri completamente fraca. Buscando por outra coisa, qualquer coisa que eu pudesse jogar longe para minimizar a minha fúria. — desde o começo, desde o primeiro momento em que olhei pra você, olhei dentro dos seus olhos, senti que era, de alguma forma muito doida, o Brandon. Finalmente aparecendo pra mim. Isso deveria ter sido ruim. Ruim por ter que me lembrar dele em momentos tão importunos. Mas não foi bem assim – joguei outro objeto. Quebrando-o na parede. — e a cada dia em que fui te conhecendo mais e mais, aos poucos, mesmo sem perceber, mesmo que você me lembre muito ele em muitos aspetos. De alguma forma era como poder esquecer-se dele mais rápido, mais depressa.

“Pois, basta que você esteja ao meu lado pra que eu consiga esquecer o que não deveria. E isso é muito errado. Sim, eu sei. Como é possível esquecer quem a gente ama tão facilmente? Mas então eu me dei conta que você é uma espécie de redenção. O único alguém capaz de me fazer odiar a mim mesma e ao mesmo tempo me amar. Você tem esse jeito estupido de querer cuidar da minha vida mais do que a sua própria, te tentar me desvendar, me irritar e me provocar de maneiras muito absurdas. Mas ao mesmo tempo, você tem esse dom de me acalmar, de me fazer sentir especial outra vez, de me divertir, me distrair, fazer com que tudo volte a fazer sentido como há muito tempo parece não fazer.”

“E por Deus, Jesse! Só eu sei o quanto isso é errado e correto ao mesmo tempo. Eu deveria te odiar por me fazer senti viva outra vez mesmo depois do Brandon ter levado o melhor de mim ao morrer. Mas então eu te gosto cada vez mais – cai sobre minhas próprias pernas, de joelhos no chão. Afogando meu rosto nas próprias mãos. — porque eu sei que você é especial e importante de alguma forma. E às vezes, eu me pego pensando em você mais do que deveria e eu me odeio por isso. Você faz com que eu me sinta tão vulnerável, tão pequenina e frágil. Parece tão errado. Me sinto tão culpada e traidora. Não é certo. Eu jurei. Jurei por tudo que é mais sagrado, que eu jamais amaria alguém outra vez. Mas então aconteceu e eu ainda tento entender porque você, logo você, apareceu na minha vida de uma maneira tão repentina e mudou tanto aqui dentro de mim.”

Jesse saiu de onde estava, para o meu alivio. Eu não saberia dizer exatamente o que eu estava sentindo naquele momento além de muito diminuída e chorosa. Ele se abaixou ao meu lado e colocou suas mãos em meus ombros me passando uma correte, quase elétrica, de calmaria.


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Notas finais do capítulo

Eu sinto muito se eu não soube bem explicar todas as revelações da Hayley. Espero que compreendam. E não deixem de dizer o que acharam.



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