A História da Grand Chase escrita por Thugles


Capítulo 4
A Floresta do Desafio




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A carroça chegou na borda da floresta poucas horas antes do anoitecer, um amontoado de árvores e cogumelos que cresciam abundantemente no pé de uma larga cordilheira de montanhas - a fronteira natural que dividia os territórios de Canaban e Serdin. Aquele lugar há muito era chamado de Floresta do Desafio, já que se acreditava que aqueles cogumelos roxos, vermelhos, azuis e amarelos, eram dotados de uma magia mística e selvagem, e aprendizes eram levados para treinar ali.

Desde que começou a guerra, porém, a Floresta parou de ser utilizada para estes treinos, já que Serdin agora dedicava-se a treinar seus aprendizes dentro da segurança dos muros da cidade. Mas, ao que parecia, monstros se aproveitaram disso, pois haviam relatos de movimentos e barulhos estranhos pela floresta. Provavelmente, encontrariam os primeiros servos da Rainha das Trevas por ali.

–Faz muito tempo que alguém não vêm aqui - Arme comentou, descendo da carroça.

–Eu não diria isso - Lothos, já no chão, apontou para a entrada de uma clareira. Algo muito grande e pesado forçara caminho por ali, e algumas árvores haviam sido derrubadas. Arme assentiu.

–Ih, não tinha visto isso. Então, por onde vamos começar?

–Por onde você acha? - Elesis a olhou como se a maga fosse doida - Vamos seguir a trilha, é claro!

Arme estremeceu.

–Mas é por ali que os monstros foram, você não está vendo?

–O quê? - A boca de Elesis abriu-se, os olhos se estreitaram - Maguinha, o que acha que viemos fazer aqui, acampar? Viemos matar uns monstros, e precisamos ir direto onde eles estão. Mas você pode ficar aqui na carroça, se quiser.

–Eu não disse isso - Arme respondeu hesitante - É só que... Se vamos entrar, devemos pensar em algo primeiro, não?

–Ela tem razão - Lothos afirmou - Se a magia de Cazeaje se faz presente aqui, entrar nessa floresta sem um plano é a última coisa que eu quero. Não podemos correr esse risco.

–Então o que vamos fazer? - Arme perguntou olhando de esguelha para Elesis, que parecia zangada. Lothos pôs na mão no queixo e ponderou alguns momentos antes de virar-se, repentinamente, para o condutor:

–Bjorlam, pode aguardar-nos aqui? Estaremos de volta algumas horas antes de amanhã.

–Perfeitamente - o homem disse numa voz cheia de sotaque.

–Pra onde estamos indo? - Arme perguntou preocupada, pois Lothos as empurrava delicadamente para a trilha aberta à força. Elesis bufou enquanto caminhavam.

–O que vocês acham? - quis saber a comandante, analisando a entrada da trilha: era como se algo duas vezes maior que a carroça tivesse corrido por ali. A grama estava amassada e os cogumelos, quebrados, mas o musgo que crescia ali indicava que a trilha já tinha sido aberta há algum tempo.

–Estudei sobre este musgo - Arme disse, animada - Leva algumas semanas pra crescer, e se está aí, é porque ninguém passar por esse caminho há um tempão. Foi abandonada, ao que parece.

–Bem, então vamos reinaugurá-la! - Elesis se adiantou, mas Lothos a segurou pelo colarinho, distraída.

–Hum... Não. Se esta trilha foi usada por algo grande, é certo que nos levará direto até onde a coisa parou, logo, até a base dele. Tive uma idéia - acrescentou, e olhou para as duas - Podemos pegar os monstros de surpresa. Eu sigo por esta trilha, enquanto vocês abrem uma nova - e apontou para um enorme cogumelo, a uns cem metros - por ali. Então, cercamos eles.

–Por que nós temos que abrir a trilha? - Elesis perguntou. Lothos a olhou séria.

–Porque vocês são as aprendizes, precisam aprender a lidar com situações como essa. Quero ver o que sabem fazer - disse - Perguntas? Ótimo. Assim que eu gosto.

Sem dizer mais nada, abriu caminho entre a grama que já começava a crescer por ali, tornando a abrir a trilha com as próprias mãos. Elesis virou-se para Arme, depois para Bjorlam, que fez um gesto de impotência com as mãos. A menina suspirou e virou-se para a companheira, chamando para que a seguisse.

Parecia que Lothos havia simplesmente escolhido um lugar aleatório para abrirem caminho, pois o mato perto daquele cogumelo era tão denso quanto em qualquer outro lugar. Elesis foi na frente, abrindo caminho com as mãos e os braços. Não estava sendo uma caminhada muito difícil - só precisavam enfrentar um pouco de mato e tomar cuidado para não tropeçar nas raízes das árvores, mas minutos depois chegaram num ponto onde o mato era maior do que elas, e estava cheio de galhos secos e folhas caídas. Elesis suspirou novamente.

–Maravilha - assentiu - Maravilha! Belo jeito de estrear a espada de Arthur...

–Espera, o que vai fazer? - Arme disse alerta, vendo que a companheira tirava a espada das costas. Elesis soltou a arma antes de puxá-la e grunhiu.

–Pra uma maga de Serdin, você é bem burrinha, não? O mato ali na frente é muito grosso, precisamos cortá-lo pra abrir caminho. E com o quê nós cortamos mato? Com essa sua varinha ridícula? - ela fez cara feia para o cetro a na mão de Arme - Não, com uma lâmina!

–Calma - pediu a maga - Não é preciso tanta força. Eu tenho uma idéia.

Adiantou-se, levantando o centro, olhando fixamente para a frente e respirando fundo. Seu olhar estava sério e franzido de concentração, que Elesis apenas encarou incrédula. Arme uniu as mãos numa prece e disse:

–Espíritos da terra, peço-lhes, abram caminho! Somos da Grand Chase, viemos purificar esta floresta, remover o mal que aqui reside, para sempre! Em nome de Serdin, eu lhes imploro!

Silêncio. Apenas o som de um ou outro pássaro numa árvore - depois, a alta gargalhada de Elesis. Arme fechou a mão com força.

–Acho que sua magia falhou - zombou Elesis.

–Não foi magia - Arme disse rapidamente - Espíritos da terra... Ouçam-me, por favor! Imploro-lhes, por favor... - ela soltou um grunhido frustrado - Não? Então vou ter que usar o plano B.

Ela separou os pés, inalou ar audivelmente e expirou, ao mesmo tempo em que abria as mãos erguidas à frente. O cetro, um pequeno bastão com uma esfera roxa e asas brancas na ponta, brilhou.

Duas paredes de fogo brotaram das direções dos braços da menina, numa larga faixa de fogo que seguiu mato adentro, assustando Elesis. A maga manteve os braços abertos enquanto tudo o que estava no meio das duas paredes queimava, implacável, sem permitir que o incêndio se espalhasse além.

Tão rapidamente quanto surgiram, as chamas desapareceram e Arme perdeu o equilíbrio - Elesis moveu-se rapidamente atrás dela e a segurou, impedindo que caísse.

–Upa - fez a espadachim ajudando-na a se reerguer - Isso é que é uma bela de uma magia. Você está bem?

–Sim - respondeu a menina, sorrindo de leve - Acho que ultrapassei um pouco meus limites. Manter tanto fogo aceso por tanto tempo não é meu forte.

–É esse seu corpo fraco que não aguenta a magia - riu Elesis - Obrigada, você poupou mihas forças pro verdadeiro combate.

Arme revirou os olhos, prestes a responder, mas desistiu. Agora o caminho era fácil: onde antes havia uma confusão de mato, cogumelos e galhos, havia uma faixa enegrecida no chão, reta como uma flecha e larga como uma estrada, estendendo-se muito além do que imaginavam ser possível. As duas caminharam, satisfeitas, pela nova trilha.

Mal haviam dado alguns passos e ouviram movimento de um dos lados do mato. Elesis puxou a espada e pôs o braço na frente de Arme, para que ficasse atrás de si. O barulho aumentava - era como se algo estivesse correndo, algo grande, pela quantidade de barulho...

–Ah... Ali!

Arme apontou para uma borda na trilha queimada: um animal surgiu correndo dali, quatro patas, corpo marrom peludo e cauda grossa cheia de pêlos. Havia uma listra que assemelhava-se a uma máscara nos olhos - seria um guaxinim? Não, era um texugo, como ambas logo reconheceram.

Mas havia algo errado com o animal. Ele corria, arrastando o corpo pelo chão, as patinhas movendo-se rapidamente na direção das pernas desprotegidas de Elesis - que desceu a espada com toda a força no animal, partindo-o em dois.

–Deusas! - Arme cobriu a boca com a mão, horrorizada - Elesis, como você pôde...

Outro texugo apareceu do mato, evitando a espada e subindo em Arme, que gritou, enquanto a criatura corria pelas suas roupas, mas foi expulsa com um forte tapa da mão da guerreira. O animal mal caíra no chão e já corria novamente para atacar, parando apenas quando Elesis o pegou pela cauda e jogou longe no mato.

E então mais dois texugos apareceram, depois mais dois... E de repente veio uma horda inteira deles, centenas de texugos, surgindo de todos os lados da trilha, provavelmente alertados pelo fogo - era uma quantidade tão absurda que parecia irreal.

–Corre! - Arme gritou, mas Elesis não se moveu: espada na mão, desferiu um golpe quando os texugos a alcançaram, acabando com dezenas de uma vez. O segundo golpe levou mais outros, mas os texugos continuavam avançando. Muitos alcançavam-lhe as pernas, subiam pelo corpo e a mordiam, arranhavam e tentavam sobrepujá-la pelo número.

Elesis gritava de dor e fúria enquanto os animais a devoravam viva, com os dentinhos afiados latejando e ardendo, a espada mal sendo capaz de abrir buracos na onda de corpinhos agitados. Pelo menos, não prestavam mais atenção em Arme, que teve o bom senso de procurar no bolso do vestido e tirar um pequeno saquinho cheio de um pó azul, abrindo-o a atirando-o no bolo de texugos.

–Água! - gritou, como sempre faziam em Serdin: gritar o nome era como uma prece ao espírito guardião do elemento. Assim, apontou a bastão para o pó que caía, e a água pareceu surgir do ar, molhando Elesis e os animais.

Os texugos ainda eram muito numerosos, mas pelo menos haviam parado de chegar. Levantando o cetro novamente, respirou fundo e gritou:

–Relâmpago!

–Unnnnnnnnnnnnnnngggh!

A exclamação de dor de Elesis não foi mais do que um guincho com os dentes cerrados, sem gritar, sobreposto pelo som de centenas de texugos guinchando, eletrocutados, enquanto a água conduzia a eletricidade pelos seus corpos. Arme manteve o relâmpago por dois segundos, não ousou mais do que isso, e quando parou, viu que o chão estava ainda mais preto do que antes.

–Maguinha... - começou Elesis, mas não se conteve: pôs um joelho no chão e fechou os olhos, pela expressão, era visível que seu corpo todo doía, curvado ao redor dos corpos dos texugos mortos. Os que estavam mais perto de Elesis tinham sofrido um choque tão forte que carbonizaram, mas os que estavam mais distantes ainda estavam bem discerníveis, tombados em posições moles e espalhados pelo chão.

–Você está bem? - Arme se adiantou, temendo o pior - Com esse corpão e esses seus músculos, eu sabia que você resistiria mais, ao contrário dos texugos, mas...

–Sai, eu estou bem - Elesis foi ríspida, erguendo-se de súbito - Só fui pega de surpresa. Não... Não faça isso de novo.

–Então não faça burrices de novo! - Arme ralhou recuando, e Elesis a fitou.

–Bom, os animais estão mortos, não estão? É isso que importa. Vamos em frente.

Sem dizer palavra, voltou a andar pela trilha, e Arme não teve escolha senão seguí-la. Por fim, a menina de violeta estremeceu e puxou o ombro da outra, que virou-se zangada.

–Que foi?

–Fale baixo - Arme pediu - Sinto uma presença maligna por aqui.

–Monstros? - Elesis se animou. Arme sacudiu a cabeça.

–Não sei, não me parece... Não sei, é alguma magia muito má, que me deixa desconfortável. Acho... - ela arregalou os olhos - Elesis, é por ali.

Apontou para a direita da trilha, a espadachim acompanhou a direção com o olhar e franziu a testa.

–Tem certeza, maguinha?

Arme não respondeu, olhava na direção que apontara, sentindo cada vez mais a presença contida ali. Magos de Serdin geralmente eram capazes de sentir a energia mágica em outros corpos, visto que a magia entrava profundamente em suas almas. E estava sentindo o mesmo ali, um desconforto estranho, uma sensação ruim que não a fazia exatamente mal, mas que a deixava inquieta - exatamente como seu avô lhe dissera que acontecia, quando magos iniciantes sentem a presença maligna pela primeira vez.

Hesitante, porém decidida, girou o cetro uma vez e apontou-o para um cogumelo:

–Bola de fogo!

O grito agudo veio acompanhado de um sibilar quando a esfera brotou do cetro de Arme, abrindo caminho por aquele lado da floresta e parando em algo - de onde estavam era possível ver uma massa negra avolumando-se. Elesis ergueu as sobrancelhas.

–Não pode fazer outra daquelas paredes de fogo?

–Posso, mas me consumiria muita energia para mantê-las queimando, e também para controlar e impedir que incendeiem a floresta inteira. Aquilo é magia avançada pra mim...

–É claro - Elesis assentiu, forçando passagem pelos cogumelos. A bola de fogo de Arme havia destruído parte da grama, de modo que a guerreira só precisava livrar-se de obstáculos com alguns empurrões. Finalmente, deram-se numa pequena clareira, um espaço sem árvores onde, numa das bordas, as árvores se curvavam para mostrar uma mancha da escuridão, como num túnel - ou como se ali houvesse algo absorvendo a luz, afinal.

–Rá, boa! - Elesis riu satisfeita - É agora que nós...

–Aproximem-se - interrompeu uma voz profunda e grave - Ou virem-se e corram de volta de onde vieram.

Arme não gostou muito da animação nos olhos da companheira.

–Correr? Essa é boa! Apareça, verme imundo!

Algo na escuridão riu dela, e disse:

–Você entra em meu território, mata meus nativos, e ainda exige que eu me mostre? Venha, garota, enfrente-me se tiver coragem! Ou não tem coragem de entrar em meus domínios? Aproxime-se, e eu a matarei!

–Elesis, é uma... - Arme tentou prevení-la, pensando que ela iria responder ao desafio, mas a espadachim ergueu a mão para que se calasse, sem olhar para ela.

–Eu acho que não - ela disse em voz alta - Saia você daí, e enfrente-me se for capaz! Ou eu... - hesitou - Ou minha companheira vai te tirar daí à força!

Arme não estava muito certa de que poderia usar a magia para tirar o que quer que estivesse ali, mas a criatura urrou e a escuridão pareceu ser sugada para dentro, iluminando o ser que falava. Mas antes que pudessem vê-lo, uma raiz de planta se ergueu e acertou as duas, Arme e Elesis, na barriga, jogando-as longe.

A maga caiu no mato; a espadachim, no chão duro da clareira, e o Ente da Floresta, como mais tarde descobririam que se chamava, riu, revelando-se completamente.

O corpo media uns cinco metros de altura e parecia uma árvore velha, arrancada das raízes e virada de cabeça para baixo, sem folhas. O topo alargava-se como a ponta de um cano onde alguém explodiu uma bombinha. Os braços e pernas eram grossos galhos secos entrelaçados, ainda assim finos demais em comparação ao corpo - a raiz que as atingira era na verdade um dedo longo, seco e retorcido. No tronco principal, duas rachaduras brilhavam com um amarelo que deveriam ser os olhos, e uma abertura maior abaixo devia ser por onde o som saía quando falava.

Elesis levantou-se imediatamente, Arme, nem tanto, com a mão na barriga dolorida, sem fôlego. Elesis não perdeu tempo, lançou-se numa corrida rápida que o Ente tentou parar com um tapa.

Era madeira - velha e cheirando mal - contra uma espada de aço recém-forjada com ternura e dedicação, lapidada ao extremo até ficar tão afiada que poderia partir lâminas baratas em duas. Que chance teria uma simples raiz de árvore? O Ente perdeu um dedo, de onde escorreu seiva e fez a criatura gritar. Atacou com a outra mão, porém Elesis era rápida: jogou o corpo para trás, esquivando-se e cortando mais dois dedos enraizados de uma vez.

Ela estava pronta para atacar novamente, mas da floresta, surgiram dois grandes cogumelos bizarros: pareciam uma bolha branca cortada um pouco acima da metade, que fora substituída pelo "chapéu" de um cogumelo(um era roxo e espinhudo, o outro, azul com manchas). Os olhos lembravam os do Ente: fendas amarelas brilhando com uma raiva doentia, mas sem boca, tampouco pernas ou braços - locomoviam-se pulando.

Elesis ignorou tudo isso, desceu a espada na casca dura que era o chapéu roxo do primeiro cogumelo, chutou e cortou o fungo que tinha seu tamanho. O segundo cogumelo recebeu uma cortada direto na parte branca, e funcionou como um corte num ventre humano.

O Ente viu os dois monstros murcharem com uma rapidez inesperada, e enfureceu-se ainda mais. Com a visão periférica, Elesis notou que Arme ainda se levantava. "Ridícula", pensou a garota. Mas agora ela estava em perigo, e precisava protegê-la. Mais para concentrar a atenção do monstro nela mesma, e deixar a maga escapar, Elesis tentou acertar o enorme tronco que formava o corpo do monstro.

Um erro - gravíssimo, pois assim que ela chegou perto, o Ente fechou os braços, e uma confusão de galhos e raízes espremeu Elesis com força. Pedaços de madeira espetavam-lhe o corpo como se estivesse sendo espancada por um espinheiro - felizmente, apesar do tamanho, o Ente da floresta não tinha uma força tão esmagadora nos braços envelhecidos. Mas o aperto machucava a menina, que não conseguia se soltar, mas pelo menos alguém lhe jogara água e...

"Espera... Água? AH, MER -"

Desta vez ela gritou, seu berro audível em toda a Floresta do Desafio quando sentiu a eletricidade percorrer seu corpo pela segunda vez, e ouviu o "uuuuummmm" do monstro quando este também foi atingido. Elesis caiu no chão, mas seu sangue fervia, ignorou a dor e pulou para trás para evitar qualquer tentativa de ataque do monstro.

Mas o Ente não olhava para ela, e sim para Arme, parada com o cetro erguido, pronta para disparar mais um ataque. E então o Ente rugiu:

–É você! Você queimou minha floresta, matou meus texugos... Você merece morrer!

O Ente correu, muito mais rápido do que se esperaria de uma árvore - mas mesmo assim Elesis não pôde acreditar por quê Arme ficou parada, com os olhos arregalados, ao invés de correr. Com um safanão, o Ente jogou a menina para um lado, onde ela passou direto pela trilha que seguiram até ali e caiu mais pra dentro da floresta. Arme não soube nem como terminou a queda - num segundo estava à frente da árvore monstruosa, no outro, estava deitada de lado na grama. Alguma coisa veio correndo e agarrou-a, e graças às deusas, ela pensou, aquelas mãos lisas não eram de nenhuma árvore.

–Levanta! Maguinha imbecil, como você me faz uma coisa dessas? Corre!

Quando Arme finalmente conseguiu se levantar, correu com dificuldade junto de Elesis para fora do mato, voltando à clareira onde o Ente as encarava com os olhos amarelos e raivosos. Elesis a soltou e atacou novamente, correndo para pegá-lo pelo flanco.

O Ente, contudo, era rápido, e se virou com o braço já estendido. A espada de Elesis aparou o golpe, e desta vez, havia galhos demais entrelaçados, grossos demais para a lâmina, que ficou presa por alguns momentos antes de ela conseguir soltar.

Ela agora estava bem na frente do monstro, que bateu ambos os braços para tentar capturar Elesis novamente. Ágil, ela lançou-se para a frente, cravando a espada no tronco oco e antigo do Ente.

Ela ouviu o grito bem diante de si, e enquanto tentava puxar a espada, o monstro precipitou-se de bruços, esmagando a garota com seu peso. Felizmente o tronco, há muito apodrecido e envelhecido, já não pesava tanto, mas a dor era intensa e, quando o Ente se levantou, pegou-a com mãos feitas de raízes e a jogou longe, exatamente como ela própria fizera com um texugo.

Elesis, sem a espada, caiu no chão perto de Arme, que conjurava um feitiço de cura em si mesma e tomava uma poção para amenizar as dores. Correu para Elesis, que levantou-se, os olhos irradiando fúria e dor, e a pequena maga recuou ao vê-la de pé novamente, como se nada tivesse sofrido.

A espadachim correu outra vez, cega de raiva para atacar o Ente. A criatura riu e a socou, Elesis rolou para um lado, apossando-se novamente da arma e, num grito, desceu a arma em direção a um braço. O Ente pulou para trás, desviando-se ao mesmo tempo em que usava os galhos das mãos como num arranhão.

O golpe a atingiu em cheio, e apesar de não tão forte, o golpe doía por causa das terminações e protuberâncias dos galhos, e Elesis pulou para trás novamente.

–Sai daí! - Arme gritou atrás dela. Elesis a ignorou e desviou-se de outro golpe. Ela corria e tentava ultrapassar a defesa do monstro, mas estava cega de raiva, zangada por ter uma aprendiz de Serdin para ficar lhe dizendo o que fazer. Recuar? Que tipo de garota covarde era aquela? Não, Elesis não desistiria. Mas só conseguiu mais arranhões nos braços, e Arme provavelmente sofria com ferimentos da queda, por não a ajudou mais. Finalmente, Elesis perdeu a paciência, ao ser jogada para perto de Arme.

–Sua imbecil! Não faz nada, fica aí parada...

–Estou machucada! - protestou a maga.

–Machucada? Você caiu uma vez, olha só pra mim!

O Ente, já sem alguns galhos dos braços, erguia-se e preparava para outra investida. Elesis parou de discutir e se virou, zangada, para o inimigo, mas seu corpo ardia dos arranhões, e a pequena maga observava a tudo impotente, com uma mão no braço. Então a espadachim foi tomada por uma nova onda de raiva, e quando o Ente atacou, correu novamente numa investida, parando antes de dar dois passos.

Um clarão vermelho e dourado saiu das árvores e subiu a espada contra o tronco velho do Ente, fazendo-o rugir. Comandante Lothos atacou novamente, três vezes, cada golpe acertando um lado do grande tronco. O Ente juntou as mãos como fizera com Elesis - Lothos atirou a espada pra a frente e abriu ambos os braços, ereta, cada mão segurando num galho, forçando e impedindo que o Ente fechasse as mãos sobre ela.

A espada que jogara para frente fincara-se entre os olhos da criatura - Lothos ergueu um pé e empurrou o cabo com ele, enterrando a espada ainda mais fundo. O Ente gritou e a pressão nos galhos diminuiu, então a comandante puxou a arma da madeira e, com um giro, desceu-a num golpe em diagonal que atingiu a borda do tronco grosso por cima, serrando-o, parando pouco abaixo dos olhos.

Outra sucessão de golpes diretos derrubou a árvore já enfraquecida, que caiu com um gemido cavernoso, estatelando-se no chão. Elesis permanecia parada, sem acreditar no que acabara de ver de alguém nascido em Serdin. Aquela mulher... E não apenas isso, Elesis e Arme lembraram-se de que apenas dois cogumelos haviam atacado. Certamente, a Comandante Lothos havia acabado com os outros.

Voltou-se para as meninas, uma rápida olhadela indicando-lhes o estado: Arme segurava um braço, o joelho dobrado como se tivesse dificuldade de ficar de pé, Elesis estava coberta de arranhões e as roupas exibiam alguns rasguinhos, mas fora isso, pareciam bem.

–Consegue andar? - Ela perguntou à maga, que assentiu, mas ao tentar se levantar, caiu novamente no chão. Lothos a pôs no ombro, levando-a para fora da floresta. Elesis seguiu logo atrás, e quando chegaram à carroça, Arme foi colocada na parte de trás e Elesis subiu também. Sem dizer mais palavras, Lothos subiu no banco do carona e Bjorlam pegou as rédeas, incitando os cavalos a continuar.

A comandante ainda encararia as meninas por um longo momento antes de finalmente se virar, sem dizer nada, mas ficou claro que ela se controlava contra a vontade de ralhar com elas. Arme sabia disso: quase foram pegas, e quando Lothos as encontrou, estavam discutindo, ao invés de se unirem para acabar com os monstros! Elesis talvez pensasse o mesmo, mas a menina ainda era uma carranca zangada, de braços cruzados.

Ambas ocupavam-se em olhar a Floresta do Desafio, um monte de cogumelos de cores fortes que ficava para trás com o sacolejar da carroça. Suas consciências pesavam um pouquinho - não era assim que imaginavam que terminaria: certamente esperavam algo mais heróico, mais lendário, e não que fossem simplesmente derrotar o monstro e sair, já prontas para o desafio seguinte. Elesis não ligava, pois o quanto antes partissem para o próximo inimigo, melhor. E agora, elas tinham uma vitória para lembrar, já que o primeiro passo na missão da Grand Chase acabara de ser dado.

Mas elas não sabiam que, se dependesse de Lothos, se aquilo fosse um teste da comandante, teriam sido reprovadas e enviadas de volta para seus reinos.


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