Capítulo 2: Na Floresta

Dias haviam se passado desde que parti de Serdin. O céu parecia estar sempre nublado, da mesma forma que acontecia na minha mente. Eu seguia pelo mundo sem querer me importar se Holy iria acordar ou não.

Caminhando pela Floresta Antiga, na Terra de Prata, somente eu e Grandark. Era isso que eu era, um andarilho. Era tolice a minha pensar que haveria um lugar para mim sendo que nem mesmo a minha missão eu terminei. Não havia ninguém além de mim e Grandark. Eu evitava a estrada principal para não ter de encontrar outros viajantes. Meu companheiro não queria interrupções, por mínimas que fossem, na nossa busca.

Foi então que escutei um grito. Parei e olhei na direção da estrada.

– O que foi, Zero? – Perguntou Grandark.

– Eu... Escutei um grito.

– Um grito? – Meu amigo ficou surpreso. – Eu não escutei nada.

Mesmo assim, senti que eu deveria me aproximar um pouco mais. Algo dentro de mim me dizia que algo estava errado. Decidi escutar esse instinto e vi Holy na estrada olhando para trás, enquanto a sua frente parecia haver um rapaz de cabelos prateados se preparando para atingi-la. Segurei Grandark nas costas e sem pensar suas vezes pulei entre os dois, ficando-a no chão e a usando como escudo contra o golpe que aquele rapaz iria usar na paladina.

No entanto, o som do metal se chocando nunca ecoou. Sai do modo de defesa, olhando ao redor. Tanto o rapaz quando a Holy haviam desaparecido. Será que eu vi coisas?

– O que raios você está fazendo, Zero?! – Grandark reclamou, atraindo minha atenção. – Pare de desperdiçar tempo e energia!

– De-Desculpe...

Abaixei a cabeça, diminuindo o tamanho da arma e a levando para minhas costas. Sai da estrada. O que havia de errado comigo? Por que vê-la em perigo me fez sentir... Estranho? Por que aquilo importava tanto..? Eu só precisava encontrar Duel.

Eu não precisava de mais nada.

–x-

A noite chegou e tivemos que fazer uma pausa perto da ex-morada do Leviatã da Terra de Prata. O fogo já crepitava e eu estava apoiado na árvore, enquanto Grandark vigiava os arredores, fincado no chão.

Suspirei, lembrando da última vez que encontrei Duel, pouco antes de entrar na Grand Chase. Grandark havia me impedido de segui-lo, alegando que sem o poder daquele grupo eu não conseguiria cumprir meu objetivo... Aquilo provavelmente significava que eu não era forte o suficiente... Holy já estava no grupo quando os encontrei a primeira vez, apesar dela não ter dito nada no momento que me viu... Também ter fugido logo em seguida provavelmente não ajudou na nossa comunicação. Depois teve aquela torre... E aquela garota, Rey. Eu sinto que a conhecia de algum lugar quando a encontrei, no entanto... Cruzei os braços, sem sair do lugar.

Que tipo de sensação foi aquela? Balancei a cabeça negativamente, afastando aquele pensamento. Por que quero resolver mistérios quando nem mesmo consigo cumprir o objetivo pelo qual fui criado ou salvar Holy do Pesadelo? Eu queria... Ter mais poder... Ser mais forte... Não essa figura patética que eu sou. Oz nunca iria ter orgulho de mim...

Acabei sentando no chão, sentindo um aperto estranho no peito enquanto eu olhava a lua no céu, pálida e iluminando a noite. Grandark olhou para mim, não estava muito longe apesar de estarmos separados naquele momento.

– O que foi, Zero? – Ele perguntou.

– Eu sou... Fraco? – Perguntei enquanto olhava aquele olho verde do Grandark.

– Você é forte, mas é fraco demais para enfrentar o Duel. – E imediatamente voltou a olhar os arredores depois de me responder.

Suspirei, abaixando a cabeça. Fraco, então? Aquilo era... Ruim. Definitivamente era péssimo. A única coisa que eu sabia fazer era lutar. Como eu poderia honrar minha existência e cumprir meu destino se eu não conseguia ser forte o suficiente. Apertei os olhos, passando os dedos na minha mascara, a marca de que eu era uma criatura que não deveria existir...

– Quero mais poder... – Murmurei, inconsciente do que dizia.

– Uhm? – Grandark me olhou novamente, piscando o olho. – O que disse?

– Eu quero mais poder! – Falei um pouco mais alto, olhando para aquele olho.

O silêncio se formou e achei que Grandark iria caçoar da minha cara. No entanto, escutei um riso estranho saindo da espada.

– Mais poder, é? Bem, isso é uma ambição ótima... Certo... Lhe darei mais poder, Zero Zephyrum.

Estranhei aquele tom, no entanto, antes mesmo que eu pudesse fazer algo, senti a mascara se apertando contra meu rosto, como se estivesse penetrando na minha pele e tentando perfurar meu crânio. A dor foi realmente incomparável com todas que senti até hoje. Cai no chão, levando as mãos até minha máscara. Mas, se antes eu não a tirava...

Agora, com aquela sensação, eu sentia que nunca mais iria conseguir tira-la.

Senti algo liquido percorrendo meu rosto e caindo na grama. Ofegava, sentindo aquela dor incomparável roubando minha consciência enquanto eu olhava o brilho verde do Grandark na escuridão da floresta.

–x-

Quando abri meus olhos novamente, eu estava portando a Grandark na minha frente, o clima estava meio... Morno. A dor no meu rosto havia desaparecido completamente. Olhei mais a frente no corredor, vendo um rapaz de cabelos roxos surgindo de uma mancha negra no meio do corredor, semelhante a uma habilidade daquela asmodiana Rey.

O lugar em si estava escuro, provavelmente fosse de noite e parecia ter sido construído para ser resistente, ou pelo menos resistir a ação do tempo...

– Hunf... Vocês confiam demais em pessoas em um mundo corrupto. – O rapaz de cabelos roxo disse, chamando minha atenção. - O que garante que ela não é uma enviada do Maligno para se infiltrar na base e descobrir os planos?

– Eu garanto. – Minha voz saiu um pouco mais imponente do que eu queria, como se outra pessoa estivesse falando no meu lugar. – Se ela fizer algo errado, eu tomo a responsabilidade por que fui eu quem a salvou dos escombros.

Eu estava confuso, sem entender o que tudo aquilo. Será que aquilo era um dos sonhos que a Holy tanto falava? Eu nunca entendi o que ela quis dizer, uma vez que eu não sonhava... Quando fui olhar ao redor, notei que não conseguia mexer minha cabeça livremente, apesar de conseguir movimentar os olhos e ver que a minha direita, encostada na parede, estava uma figura pequena de pele branca, cabelos esverdeados soltos caindo pelos ombros e usando uma espécie de vestido branco felpudo. Não importava o que era aquele vestido...

Aquela era Holy.

– Certo. – A voz do rapaz me chamou a atenção novamente, mas quando o olhei, já havia virado no corredor.

Escutei Holy soltar um suspiro aliviado e recolhi Grandark, encaixando-a nas costas para então olhar para a pequena encolhida contra a parede. Meu coração estava quente, parecendo pular dentro do meu peito mesmo que eu não entendesse o que raios havia acontecido.

– Você está bem? – Notei então que eu estava em pleno controle do meu corpo novamente, desde que guardei a espada nas costas.

Holy me olhou meio surpresa, mas ela sorriu para mim de qualquer forma.

– Sim, estou bem. Obrigada por aparecer. Mas, por que não está dormindo?

Me surpreendi com a pergunta. Lembro-me que ela me questionou a mesma coisa quando saímos na nossa primeira missão. Talvez ela tivesse se esquecido?

– Eu não sinto sono.

Não sabia mais o que falar depois daquilo. Eu só conseguia pensar que... Holy estava ali, na minha frente, ao meu alcance. Aqueles olhos que outro dia vi bem fechados estavam abertos, mostrando seu brilho azul único. Queria realmente poder dizer algo, mas sentia uma espécie de força maior dentro de mim mesmo me impedindo de falar. O que era aquilo que eu estava sentindo?

Estava tão concentrado que quando Holy fez barulho, acabei me assustando, tentei disfaçar levando a mão para a nuca num gesto que ela costumava fazer com certa frequência.

– Bem, melhor ir dormir então, certo? – Eu disse, tentando quebrar aquele silêncio.

Fiquei um pouco inseguro com o silêncio que veio a seguir, olhando para Holy que me fitava com seus olhos azuis, parecendo incerta ou surpresa. Talvez tivesse falado ou feito algo errado? Já ia tentar ajeitar o que havia dito quando a garota acabou dando um sorriso, falando logo em seguida:

– Sim.- Seguido de um breve aceno com a cabeça.

Ela começou a andar e eu acompanhei com a cabeça, notando somente ao mover a cabeça o sorriso que se formou nos meus lábios. Imediatamente ajeitei minha postura. Por que meu coração estava batendo tão forte? Aquilo tudo não fazia o mínimo sentido para que eu estivesse sentindo. Continuei a fita-la andar pelo corredor, sem me mexer. E então, repentinamente, Holy se virou para mim, parecendo surpresa de alguma forma.

– Algum problema, Grandark?

Senti meu coração parar por um momento ao ouvir aquelas palavras. “Grandark”? Ela não me reconhecia mais por acaso? Será que eu era tão inferior ao ponto do meu companheiro parecer melhor do que eu? Não, aquilo não fazia sentido. Apertei meus pulsos, sentindo o sangue fluir pelo meu corpo rapidamente conforme eu andava na direção da pequena. Parei a sua frente, olhando-a diretamente nos olhos através daquela lente amarela estranha.

– O-o que foi? – Ela me perguntou, notavelmente incerta.

– Meu nome... É Zero.

Ficamos em silêncio. Holy parecia estar extremamente surpresa a minha frente, mas, pela primeira vez fora de batalha, eu me sentia seguro... Até notar que ela estava demorando demais para esboçar alguma reação. Estava começando a me arrepender por ter agido daquela forma novamente, mas enfim Holy sorriu para mim.

– Que bom te ver, Zero.

Não soube o que pensar instantaneamente. Eu era uma máquina de guerra, criado para destruir tudo em nome do meu destino, que era destruir a Eclipse e derrotar o Duel. Mas... Senti como se meu corpo se movesse sozinho, a envolvendo com meus braços e a puxando para perto, guiando minha mão direita para sua cabeça, acariciando aqueles cabelos macios pela primeira vez. Sem que eu notasse, um sorriso acabou surgindo dos meus lábios, sentindo meu coração bater forte no meu peito, e eu podia também sentir o coração da Holy batendo.

Por que aquela sensação me deixava feliz?

– Digo o mesmo, Holy.

Fiquei simplesmente parado naquele momento, sentindo o cheiro dos cabelos azuis-esverdeados da pequena em meus braços, o toque tímido, porém gentil do abraço dela nas minhas costas. Fechei os olhos por um instante, sentindo uma ponta de sono repentina tomando conta de mim.

Antes que eu percebesse, eu senti perder o chão por um instante, perder a sensação do calor e o cheiro da Holy em meus braços.

–x-

Quando abri os olhos, eu estava no chão e o sol já brilhava alto no céu. Grandark me encarava indiferente, no entanto... Eu sentia que a máscara em meu rosto havia mudado, assim como minha visão parecia haver mudado. Continuava no mesmo amarelo de antes, no entanto, parecia estar se estendendo numa espécie de linha...

– O que... Aconteceu? – Disse atordoado, sentindo minha cabeça pulsando enquanto me levantava.

– Lhe dei mais poder. – Grandark me respondeu de forma indiferente. – Vamos, não quero mais perder tempo.

Fiquei quieto um pouco, sentindo meu coração se apertar novamente em meu peito. Aquilo tudo... Foi tão real... Talvez foi apenas um sonho? Ou será que eu estava tendo algum tipo de problema? Suspirei.

De qualquer forma, Grandark tinha razão. Precisávamos terminar a busca pelo Duel e a Eclipse. Arranquei a espada do chão, e ao encaixa-la nas costas, notei que minhas vestes também haviam mudado, minhas pernas e meus braços pareciam estar sendo cobertos por um tecido maleável, apesar de aparentar serem escamas. Sentia que agora estava usando uma capa também, encaixada no meu cinto. Olhei para Grandark.

– O que é isso?

– Achei que seria mais interessante você ter um visual novo, já que você agora é um peregrino pelo poder. Hehe...