People With Problems escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 10
Nola




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-Hora de acordar. -Chris grita, na soleira da porta. Alguém me enterra. -Eu disse -pausa- hora de acordar. -Ele grita mais alto e sou obrigada a sair da cama. Hoje é um bom dia pra morrer. Motivo? Calor demais e eu estou menstruada. O que quer dizer que não posso ir mergulhar no rio (que é o que provavelmente eles vão fazer mais tarde) e tenho que andar como um robô. Sem contar a sensação de quanto você está menstruada. Como eu disse: hoje é um bom dia pra morrer. 

Quando saio do quarto, pra tomar café, o cheiro de café me invade e meu estômago ronca, e eu sento na mesa sem dizer uma palavra, atacando as bolachas. 

-Bom dia, Emerson. -A senhora Kowki diz. Do meu lado, está Kristin, e na ponta, Perry. Os outros não estão aqui, nem Chris. 

-Bom dia. -Embora seja impossível ter um. Permanecemos em silêncio até eu terminei, então saio para a cozinha e depois para fora, onde estão Rose e Danny. Dou um "olá", depois Chris aparece e eu olho de cara feia pra ele por ter me acordado, mas ele finge que não vê. O sol está quente e eu queria muito mesmo entrar no rio. Quando Kristin e Perry aparecem, conversando sem muita animação, Chris diz:

-Vamos fazer uma atividade legal agora. Vamos nos separar em dois grupos e explorar por aí. Quero que cada um dos integrantes traga alguma coisa que chamou a atenção deles. -O que tem pra se chamar atenção por aqui? Folhas de árvore rosa?

-Quais os grupos? 

-Kristin, Danny, Emerson. -O.K.

-Perry, Rose, Dover e eu. -O encaro, confusa. 

-Você?

-Vou fazer parte também. -Não comento mais nada e a gente se separa. Kristin aparece meio tímida, mas resolvo deixar o que aconteceu de lado e puxo conversa.

-Como você está? -Ela parece surpresa. 

-Bem, e você?

-Bem. 

-Por onde a gente vai? -Danny pergunta. Ele parece pensativo hoje. Olho para as três trilhas do lado esquerdo do campo onde estamos. Chris e outros já foram pelo caminho oposto. 

-A do meio. -Digo, porque foi a mesma em que vim no primeiro dia. Porém, naquele dia, eu estava tão desesperada e chorando que não consegui prestar atenção direito, então agora posso ter uma boa ideia de como é todo o caminho que percorri. Eles concordam e começamos a andar. Dá pra ouvir os grilos, os pássaros e outros barulhinhos animais, assim como o barulho dos nossos pés no chão. Não perguntamos pra onde exatamente vamos: só continuamos a andar. É um bom lugar pra divagar nos seus próprios pensamentos. É tão...livre. Você pode correr pra qualquer lugar e ao mesmo tempo, nunca sair do mesmo lugar. 

-Meri, cuidado. -Danny diz, e eu paro, antes de tropeçar em um tronco. 

-Obrigada. -Passamos pelo tronco e continuamos, olhando a trilha um pouco mais aparente agora. 

-Uh, Emerson, por que está aqui? -Percebo que Kristin não sabe nada sobre mim e decido ser honesta.

-Dei um soco no meu pai. 

-Sinto muito -diz Danny -mas não acho que você veio por causa do soco. -Olho pra ele de cara feia, mas tenho que admitir que é verdade. Resolto citar a ficha médica de Chris. 

-Era provável que eu desenvolvesse algum tipo de depressão. E tenho problemas de raiva. -É tão... estranho. Dizer isso em voz alta. 

-Ah, legal. -Ela diz, casual, como se isso fosse a coisa mais normal do mundo. Isso me lembra que eu não sei exatamente porque ela está aqui.

-E você? -Kristin dá de ombros. 

-Depressão, embora esteja melhorando agora. 

-Mas o que aconteceu?

-Minha mãe costumada, uh, me bater. Isso não fez bem pra minha cabeça. 

-Sinto muito. -Danny diz.

-Eu também. -Ela o responde.

-Há quanto tempo você está aqui?

-Dois anos.

-Mas me disseram que o máximo é seis meses. 

-Não sei. Eles simplesmente renovam meu contrato a cada seis meses.

-Que... estranho. 

-É bom pra mim. Não sei se estou preparada pra voltar pro mundo real. -Não posso deixar de concordar, por um breve segundo. As coisas parecem distantes aqui. Paramos para desviar de uma poça de água e eu escuto o barulho de água.

-Ei, me sigam. -Aviso,  e vou pela frente, tentando desmembrar algumas árvores e suas folhas pra poder abrir caminho em direção a ponte Nola. Aquela que vi no primeiro dia. Isso me faz pensar no quanto nós andamos e parece bem menos tempo. 

-Onde a gente vai? -Kristin pergunta, bem mais relaxada agora. 

-Pra ponte. 

-Não sei se é uma boa ideia... -Danny diz, cauteloso, mas é tarde demais. Já chegamos. Paro no meio da ponte. A vista é linda.

-Será que podemos trazer eles até aqui e dizer que isso chamou minha atenção? 

-Melhor não. -Danny tenta fugir do assunto. 

-Qual é o seu problema? -O questiono. 

-Duas garotas morreram aqui. -Ele diz e eu estaco no lugar. Kristin também. 

-O-o quê? 

-Nora e Lorena. Eles deram o nome delas pra esse ponte. Juntaram os nomes. -Escutamos barulhos. Os outros chegam aonde nós estamos,  mas não consigo me virar pra encarar Chris e os outros. Olho pra frente. A alguns metros, na grama ao lado do rio violento, há uma bandeira amarela escrito "Nola" assim como a placa. 

Não. Chore. 

-Onde vocês estavam?! -Chris pergunta.

-Ficamos aqui, eu estava contando pra Emerson... 

-Como elas morreram? -Meus olhos ardem e eu finalmente deixo as lágrimas caírem. Viro. Chris parece triste. 

-Se mataram. -Merda. Ainda tinha esperanças de ter sido apenas um acidente. 

-Quando? -Rose olha para o horizonte, Perry olha para mim. Reconheço o olhar. É o de "pare-de-chorar-bebezinha" e eu mostro o dedo do meio pra ele, desviando os olhos. Chris respira fundo. 

-Sentem-se. 

-Aqui?  -Estamos no meio da ponte, e por mais que ela seja segura, dá um frio na barriga. Mas sento, assim como os outros. Chris tem que aumentar o tom de voz pra falar, por causa do barulho da água lá embaixo. 

-Antes de você e Perry chegarem, Emerson. Os outros já estavam aqui. Infelizmente, nós não conseguimos ajudá-las. 

-Como você sabe que não foi um acidente? -Pergunto, engolindo seco.

-Porque elas escreveram uma carta. -Merda dupla. -Mas foi bom você ter tocado no assunto, Emerson. Porque quero conversar com vocês sobre isso. 

-Sobre o quê? 

-Morte. O que cada um acha sobre isso. 

-Todo mundo vai morrer. -Dover diz. 

-E suicídio? -Olho para Perry, rápida, lembrando da nossa conversa. Ele também me olha, e por um segundo, reconhecemos nossos olhares, depois voltamos a olhar para Dover.

-Cada um faz o que quer. 

-Acho que isso é uma coisa meio egoísta, se matar. Tipo: e seus pais?

-Essa pergunta não vale quando se é eu. -Kristin replica.

-Acho que as pessoas fazem isso pra chamar a atenção pra algum problemas que elas não conseguem expressar. Acho que não querem se matar. -Digo, sem porque. 

-Concordo. -Danny diz.

-Está certa. Infelizmente. Nós só fizemos uma homenagem a elas depois que morreram, apesar de termos sim prestado atenção nas duas. Acho que temos que tomar consciência da nossa vida. Modigliani, um grande pintor, uma vez disse que a vida é um dom, daqueles que tem e não sabem até aqueles que não tem e não sabem. Precisamos reconhecer isso.

-Mas a vida é uma merda. -Comento.

-Tira a merda do Shopenhauer da sua cabeça. -Perry diz, acido. 

-Falou a pessoa que tem que fazer sexo pra esquecer que a vida é uma merda. -A expressão dele muda e eu me arrependo na hora. Ele está furioso. -Me desculpe. Me desculpe. -Solto. 

-Acalmem-se. -Chris manda. Perry me olha fixamente.

-Pelo menos eu tento aproveitar. Você só sabe chorar e se fazer de vítima. 

-Não há o que aproveitar. E não estou afim de dormir com alguém pra provar o contrário. 

-Se mate. -Ele replica, grosso e todo mundo suspira de surpresa.

-PERRY. -Chris diz. Perry nem o olha, só levanta e vai embora. Fico estática, no lugar. Depois volto a consciência, levanto e corro o mais rápido que eu posso na direção oposta, tentando fazer com que o vento tire as lágrimas do meu rosto. 

Perry estava certo. Eu só sei chorar. 


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