Fiquei paralisada diante do notebook. É claro que eu gostaria de conhecê-lo também, no entanto, eu tinha medo de que todo aquele encanto que eu sentira por ele acabasse. O encanto que nós sentíamos um pelo outro, aliás. E eu estava entre duas pessoas naquele momento.

“Não sei se estou preparada para isso”, respondi.

“Eu entendo. Vou deixar você pensar nisso, ok?”

“Tá, tudo bem.”

Após isso, ele tentou cobrir a tensão com assuntos aleatórios que duraram algumas horas. Às vezes, eu era obrigada a dizer um “já volto” para tomar alguns dos remédios ou tomar as terríveis sopas que, depois de minutos, entravam pelo ralo da pia.

No dia seguinte, estávamos todos no pátio da escola, enquanto acontecia uma briga entre dois amigos do Trevor. Algumas pessoas os pressionavam pedindo por mais socos e chutes; outras aproveitavam o tempo para conversar com os amigos em algum canto. Contudo, tudo acabou quando meu tio os separou, os levou até à diretoria e reapareceu, dizendo:

– Cada um para as suas salas!

No entanto, ninguém obedeceu à sua ordem. As conversas paralelas e absurdamente altas recomeçaram, e alguns dos principais assuntos era, claro, a briga entre dois dos caras mais gatos da escola, segundo a Jéssica.

– A gente tem que ir para a sala – Cindy disse, de braços cruzados e olhando para todos os lados, preocupada.

– Ninguém está indo, então vamos ficar aqui, oras – retrucou Natalie, milagrosamente distante do namorado. – Ah, esqueci que ele é o papai da nossa querida Anne e que ela vai contar a ele sobre tudo o que estamos falando e fazendo.

– A Anne não vai fazer isso – retrucou Jéssica.

– O quê? – saí da distração. – Ah, não, claro que não! Eu não falo direito com o meu pai...

Segundos depois, todos viraram-se para a caixa de som que apitara em cima do pequeno palco. E, também, as demais pessoas começaram a me encarar após ouvirem as primeiras palavras de uma tal gravação.

“– O que você acha do Brandon?

– Eu tinha vontade de me tornar amiga dele e, agora, depois de pensar muito, não mais. A mania de se achar o tal, querer chamar a atenção de todos... é ridícula. E eu não gosto dele”, eu disse.

Brandon, que estava a alguns metros distante de mim, me fitava, e seu olhar expressava angústia e raiva, que iam aumentando cada vez mais de acordo com a gravação.

“– É falso. Completamente falso. Quero mais é que ele se ferre, não estou nem aí”, completei.

Minhas pernas tremiam e os meus olhos se enchiam de lágrimas. Eu nunca dissera aquilo na vida, mas é claro que ninguém acreditaria, pois era a minha voz. Era a minha voz. E tudo aquilo não passava de uma montagem idiota que estava me diminuindo cada vez mais, na frente de todos.

Brandon olhou rapidamente para mim, e então, passou por entre as poucas pessoas que estavam atrás dele, sumindo após atravessar o corredor e entrar no meu – ou nosso – lugar de sossego. Aliás, fazia um tempo que algum de nós não ia lá.

Olhei ao redor e vi que Natalie, Cindy e Jéssica estavam com os olhos arregalados, me encarando, assim com a maioria das outras pessoas; algumas cochichavam sobre eu ser falsa, traíra e que não devia ter feito isso, mesmo com um garoto como o Brandon. Ao ouvir tudo isso, me desviei das pessoas e fui atrás dele.

Ele estava encostado na parede, com as mãos no bolso da calça, mirando o nada. Entretanto, ao perceber a minha presença, suspirou e ficou de frente para mim, com os braços colados ao corpo. Seu olhar representava ódio puro, naquele instante, e era capaz de colocar medo em qualquer um.

– Por favor, Brandon, me escute... – implorei.

– Eu já ouvi tudo o que era para ter ouvido, Anne. – Ele respirou fundo, tentando, ao menos, engolir a raiva. – Trevor, o cara que eu sempre odiei, estava certo, olha que engraçado! – Bateu a palma das mãos na lateral das pernas, intensificando a ironia.

Franzi o cenho, confusa.

– Trevor? O que ele fala sobre mim?

– Tudo o que eu não tinha enxergado antes – respondeu. – Quer dizer que você decidiu virar minha “amiga” só para fazer da minha vida um inferno? – Ele formou aspas com os dedos ao pronunciar a palavra “amiga”. – Isso é totalmente ridículo e infantil da sua parte, Anne.

– Dá para me escutar, caramba? – exclamei. – Eu não disse nada daquilo! – Mas aí eu lembrei do meu encontro com David. Sim, eu tinha dito aquilo, porém não sobre Brandon. – Quer dizer, eu disse, mas não foi d...

– Ah, então você confirma? – Riu sarcasticamente. – Além de tudo, é cara de pau. Quer saber de uma coisa? Eu cansei de ver você se fazer de santinha. Cansei de tentar ser uma pessoa que eu não sou para te agradar. Eu cansei de você. E quero que esqueça tudo o que aconteceu há alguns dias.

Eu estava prestes a chorar a partir daí, mas não cedi. Brandon não me faria chorar para me humilhar. Se ele se considerasse meu amigo, confiaria em mim e acreditaria que tudo era um plano fajuto de alguém imaturo.

– Você não confia em mim, mesmo? – perguntei, mas ele continuou quieto. – David deve ter gravado e feito a montagem, pois eu estava com ele no dia!

– Está tentando jogar a culpa nele, agora? Que atitude lastimável.

– Não, não é isso, eu... eu não sei quem fez isso, mas vou descobrir. – Pausei. – Trevor. Trevor deve ter nos seguido e gravado. É claro!

Ele rolou os olhos.

– Tenho pena de você. Sinceramente, eu me sentia um otário por ter te odiado por tanto tempo, mas agora eu vi o quão burro eu fui em me tornar seu amigo. Mas, olha, isso vai ter volta, tá bom? – E passou por mim, saindo do local.

Eu só pude ficar parada ali, tentando absorver aquelas palavras e pensando por que alguém teria coragem de fazer algo assim, justo nesse momento. Todavia, ninguém daquela escola confiaria em mim novamente. E o pior de tudo, eu tinha acabado de ser rebaixada e desprezada pela pessoa por quem estava me apaixonando.