Inexplicável escrita por Pear Phone


Capítulo 23
Fim - parte I


Notas iniciais do capítulo

Bom, eu li e reli "A Culpa É Das Estrelas" em um dia, antes do início das minhas aulas... isso me deu inspiração. Resolvi postar logo hoje e espero que gostem.

OBS: O fim será mesmo divido em duas partes, portanto, essa é a primeira. Agradeço aos leitores de coração



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"A pior parte da vida, para aquele que vive, não é a existência da morte. A pior parte da vida, para aquele que vive, é saber que está morrendo."

Uma semana passou-se.

Em um café localizado em alguma redondeza de Seattle, um homem loiro e alto contemplava o cardápio decidido a ficar ali por horas, sem mais nada a fazer. Ligeiramente, ele tirava os olhos do cardápio e direcionava ao fluxo de pessoas que passavam em frente ao estabelecimento. E quantas pessoas — ele pensava. Quantas pessoas por ali passavam. Estavam enfrentando a vida enquanto ele mal tinha coragem de se levantar de uma cadeira.

E, naquele mesmo lugar, ele estava, uma hora atrás, conversando com seu ex possível novo amor. Carlotta o contava sobre seus futuros planos e desculpava-se por suas recentes atitudes, explicando cada fato e uma triste deixa. Ela voltaria para New Jersey, com Rachel.

Possível. Novo. Amor.

A força daquelas palavras o pegava de surpresa. Para um cara bem próximo dos trinta anos, Carly deveria de ser um sonho; era viúva com uma aparência incrível. E sim, ele estava sonhando acordado com todo aquele romance que o deslumbrava, e o deslumbrou mais uma vez... Talvez a última vez em que veria os misteriosos e sedutores cabelos negros e lisos. Os olhos que pulavam para fora a cada emoção, o toque de suas pálidas mãos e sua fina voz. Eles o deixariam tanta, tanta saudade. A aflição de jamais poder senti-la como sua amada novamente era o que mais lhe angustiava. Por dentro e por fora. Saber que ela era cúmplice de um bandido suicida de quinta categoria o revoltava ao máximo. E aquele bilhete que ela havia deixado: um sublime pedaço de papel anunciando sua despedida. Mas para onde iria? — ele pensava. Aquela vingança o deixava tão mal.

E Harold quase não percebeu quando, de repente, uma figura feminina de cabelos loiros entrou chorando e sentou-se em uma das mesas, aflita. Ele poderia reconhecer aquela mulher até de muito longe. Havia mais de um motivo para que ele retirasse suas atenções do cardápio novamente, andasse até a mesa onde ela estava e reconfortasse-lhe serenamente. Ela estava tão confusa e frenética em sua própria mágoa que mal pôde limpar suas lágrimas e encarar a face do rapaz que a apreciava, um tanto confuso.

— Sam? – ele disse a olhando curioso. — Samantha Puckett não chora!

— Já conversamos sobre isso — ela disse enxugando as lágrimas desajeitadamente, frente a frente com o amigo.

— Eu queria me desculpar.

— Se desculpar?

— Por tudo. Por aquele dia em que eu disse todas aquelas besteiras no telefone sem que houvesse uma razão. Se eu magoei você, me desculpe.

— Eu entendo tudo que você sentia e já havia esquecido de tudo isso. — Ela forçou um sorriso.

— Eu sei, mas... como andam as coisas com o Benson?

— Você ainda é psicólogo?

— Parece que sim. Por quê?

— Acho que, dessa vez, preciso de sua ajuda.

— Para quê exatamente, Puckett? — Harold indagou. — Se for mais uma daquelas discussões bobas com aquele seu marido, eu juro que...

— Calma. Você não me parece um psicólogo falando dele assim. Dessa vez eu acho que o problema não é ele.

— Diga-me o que tanto passa por sua mente, Sammy.

— Não tem o direito de apelidos.

— Estou fazendo uma consulta, num café, de graça. Por favor, Samantha, eu tenho todo o direito de apelidos! — exclamou cada palavra, fanzendo-a assentir. — De quê se trata o apoio?

— Meus pensamentos são estrelas que eu não consigo arrumar em constelações.¹

–Não culpe o destino, senhorita — ele disse antes de uma contínua risada sarcástica.

— Está rindo de quê, senhor? — pronunciou confusa.

— Você acabou de dizer-me a frase de Augustus, do livro "A Culpa é Das Estrelas", um tipo de "trocadilho" com uma obra de Shakespeare que definia a palavra "estrelas" como destino.

Ela sorriu fracamente e fitou seus pés.

— É que... Eu e Freddie sempre fomos tão improváveis. Improváveis no sentido de impossíveis. No sentido de incontroláveis, também. No sentido de inconsequentes. No sentido de inpacientes. Em todos os sentidos, por fim.

— Prossiga — ele afirmou, mostrando que sua descrição deixou a desejar.

–Nós sempre fomos tão... Nós não somos bem um... casal. Nós somos feitos para viver separados, bem longe um do outro. Somo feitos para discutir o tempo todo e nunca achar uma solução para os problemas que nos envolvem. E, sabe, não há solução para nós dois. — Ela deu uma pausa no diálogo. — E agora, cá estou eu, possivelmente com uma maldita doença. E a pior parte é que eu mal sei o nome dela. Eu sei que em pouquíssimos instantes tudo o que vivi ao lado dele será apenas uma lembrança... para ele. E eu não sei onde estarei, Harold. A cidade inteira sabe que estou cara a cara com a morte, mas eu ainda não descobri o que tudo isso ao nosso redor significa. E eu não pretendo morrer sem saber o porquê de eu o amar assim, não prentendo morrer sem saber o porquê de eu o amar tanto. É tudo que eu quero antes de deixá-lo.

— Como assim morrer? Como assim morrer, Sam? Se com toda a cidade descarta a mim, concordo com a afirmação. Mas... desde quando morrer?

— É uma longa, bem longa história — explicava-o com uma lágrima escondida no fundo de seu olhar, que logo escorreria pela vermelhidão de sua face.

[...]

O moreno entretinha-se com algum programa fútil de televisão, com alguns aguardentes ao seu lado. Os ingeria sem piedade enquanto alguns pensamentos colocavam-o em uma profunda colisão mental. Só ele mesmo sabia o quanto havia sido difícil meter-se em tal situação, quão difícil seria acabá-la. De todo jeito, era um homem e pretendia achar uma forma de pôr um fim em tudo aquilo. Um tempo... O que seria um tempo? Quanto tempo um tempo duraria?

Tudo foi mal resolvido — ele pensou. E jamais garantia-se tão certo. Ele sabia, tudo aquilo o confundia quase com a mesma intensidade que a confundia. Mas ele a amava e tinha a certeza de que a amaria, acima de tudo. Entendê-la era um dos passos para entender o seu verdadeiro e tão incerto sentimento... Sentimento quase impossível de ser compreendido.

E foi quando, quase que por um equívoco, um som o tirou de seus devaneios. Ele alterou sua posição sobre a cama, retirando o celular que apitava ao fundo dos travesseiros. Uma ligação em espera. No visor, o nome Joe Terry aparecera mediante seus olhos. Raiva, insegurança, repulsa, nojo, dúvida, ira, ódio. Mas não o tipo de ódio mal expressado, o tipo de ódio real. Nunca pensou que odiaria tanto ver o nome de quem considerava um amigo telefonar.

— Freddie? — dizia sempre insinuante.

— Sim, Joe.

— Queria lhe convidar, ou melhor, exigir que você apareça aqui, no lugar de sempre.

— Com lugar de sempre, você quer dizer seu apartamento? Não mesmo! Em troca de quê apareceria em sua porta, em tais horas?

— Em troca de vida, Benson. De vida, apenas.

— O que está fazendo, Terry? — O tom de sua voz condenava um pouco o seu medo.

— Pergunte à sua mulher, Freddie. Onde será que ela está agora?

— Ela está aí? — ele perguntou, apavorado.

Um silêncio surgiu mas era possível ouvir os ruídos na linha.

— Sam? — ele disse rápido, ainda perplexo.

A ligação foi encerrada.

Ele não pensou duas vezes antes de sair ao seu encontro o mais rápido possível.

[...]

A mulher de pele alva como a neve, olhos azuis como o mar e cabelos tão loiros quanto a luz do Sol, andava de uma maneira descontraída dentre a populosa Seattle. Acabara de saber, através de Harold, que Carly havia deixado a cidade mais uma vez e finalmente sairia de sua vida, para sempre. Ela nem ao menos teve a oportunidade de mudá-la, de trazer sua antiga amiga de volta, de entender o que passava-se na cabeça importunada daquele indivíduo tão sigiloso. E, de certa forma, sabia que nunca mais teria a chance de revê-la ou de dizê-la tudo que lhe estava em planos. Planos esses que desfaliram-se desde o momento em que a descoberta foi feita. Ela estava a traindo de todas as formas, zelando pelo fim trágico de seu casamento junto a um homem desfigurado de boas intenções, dadas as circunstâncias. Mas, qual seria a importância de tal diálogo com Carly? De qualquer forma, seu ser já não mais pertenceria ao mundo dentro de um mês, segundo sua própria consciência.

Seus passos sobre a lateral daquele asfalto quase congelado, suas mãos que de certa forma iam de encontro com a leve neblina. As pessoas, com feições estampadas em seus rostos, fossem elas compostas de sorrisos ou de lágrimas. Ambas as sensações penetravam no interior de Samantha, em tal momento. O que ela era capaz de nutrir em um mero segundo encantaria a todos se suas expressões fossem claramente livres.

Ela fechou os olhos e permitiu-se sentir cada uma daquelas emoções aumentarem de tamanho dentro de si, calmamente. Permitiu-se liberar seus sentimentos por completo e lhes dar a própria vida. Deixou que cada uma das coisas que sentia criasse uma maneira de locomover-se e trilhar um caminho, traçar uma nova estrada. A estrada que a levava ao único destino, o destino proveniente dos sinais de seu coração cicatrizado.

O céu escuro estava cada vez mais visível, e as estrelas poderiam estar à mostra se não fosse escondidas por carregadas nuvens. Para quê esconder algo tão belo – ela pensou. A mesma pergunta que deveria fazer-se todos os dias, em relação ao seu interior.

"Talvez aquele pesadelo fosse apenas uma lição. Uma lição que, se devidamente aprendida, poderia levar até um verdadeiro sonho."

Caminhava com o propósito de despejar suas palavras guardadas quando retornasse à mansão.

[...]

Aproximou-se da velha estrutura que constituía o prédio e adentrou cada corredor utilizando apenas escadas, pela ausência de elevadores no local. O fato daquele imóvel encontrar-se em Seattle chegava a ser aterrorizantemente estranho, pois parecia deserto, distante de tudo. Ele sabia que tudo aquilo era fruto de um devido propósito.

— Fredward Karl Benson. — Ouviu seu nome ser dito assim que adentrou o cômodo. Lá estava Joe, o esperando.

— O que pretende comigo, bandido amador de merda? — pronunciou com a voz lucidamente alterada.

— Nada além de dizer-lhe a mais indesejada verdade, meu caro.

— Vá direto ao ponto. Não pense que acreditarei em mais alguma de suas mentiras!

— Se pensa que vou contar-lhe mentiras está redondamente enganado, Benson. Mentiras são a última coisa que irei lhe contar.

Logo as luzes apagaram-se e ruídos ecoavam-se entre as paredes, os mesmos ruídos que Freddie ouvia enquanto falavam-se ao telefone.

Nas imagens, um estranho exame fotografado pelas câmeras ultra secretas de Joe. O outro moreno arregalou os olhos, de sobressalto.

— Não pode ser verdade... Não pode.

— Esse exame comprova que sua mulher é estéril, Freddie. E algo me diz que você é o último a saber disso.

— Me diga de onde tira todas essas calúnias, Terry!

— Não me deixo enganar como você, caro Benson — ele afirmou seguro de sua opinião, com um sorriso desenhado milimetricamente na face.

— Não pode ser possível — o moreno indagou percebendo-se sozinho naquele lugar. Por algum tempo ficou ali, estático.

— Não discuta comigo, apenas tire as dúvidas com sua mulher. — Ouviu a voz do homem dizer, distante.

Tentou assimilar cada uma de suas possíveis conclusões e quase teve a certeza de que tudo aquilo era apenas mais uma invenção de seu ex-funcionário atrevidamente imbecil, que achava-se o dono de tudo, inclusive de seu casamento e empresa.

Depois de alguns segundos, percebeu um bilhete bem próximo de onde assentava-se. Estava ali como se caísse do bolso de alguém ou fosse jogado pela pequena janela que encontrava-se em uma distância pequena do piso sujo e mal-cuidado.

Ele atreveu-se a abri-lo e até mesmo a ler cada palavra ali escrita:

Querido Joe, joguei este bilhete pela janela. Você deve imaginar quem eu sou, ou talvez não faça mínima ideia, por sua incapacidade de pensar demais. Esse sempre foi um de seus problemas, admito. E eu me revelei sempre como sua cúmplice, não é mesmo? Parece que você acreditou em cada palavra que lhe disse ou em cada ato que me permiti mostrar. Sentimentos por você? Em mim não existem. Quer dizer, nada além de repulsa e um descontrolável nojo.

A outra parte do bilhete estava rasgada, mas o remetente parecia-lhe óbvio.

[...]


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Notas finais do capítulo

¹ Foi uma frase realmente tirada do livro "A Culpa É Das Estrelas" de John Green.

Pois é... falta só mais a parte dois.