Antítese escrita por Kiri Huo Ziv


Capítulo 1
Capítulo 01: Desfocado




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“When you walked in the room, (…) our bodies came to a halt, (…) turned into light. Well, I don't know about you, but I want it tonight”*

O lugar onde eu moro não é exatamente uma casa, o que é um pouco estranho. Na verdade, todos dizem que eu tenho uma residência no segundo andar da biblioteca, mas eu não me sinto como pertencente ao lugar, pois nunca gostei muito de livros.

Então, aquela garota que diz ser minha amiga, Ruby, falou que eu poderia ficar na pequena hospedaria que pertence à sua avó e aceitei, porque não havia mais nada que pudesse fazer – fora morar em cima de uma biblioteca.

Tenho certeza que Ruby é uma das pessoas mais interessantes que já conheci em toda a minha vida. Não sei muito bem porque eu penso assim, já que nunca a conheci muito bem, até porque ela evita até mesmo me encarar nos olhos, acho que se sente desconfortável à minha presença, provavelmente porque eu me pareço tanto com a verdadeira amiga dela, Belle.

Na verdade, embora eu tenha me lembrado de que sou Lacey, ninguém parece acreditar muito em mim. Como se eles pudessem dizer quem sou melhor do que eu! Isso me deixa tão furiosa que preciso parar o que estiver fazendo para beber alguma coisa e, assim, não agredir ninguém.

Certa noite, um homem estranho me abordou na rua dizendo que eu era filha dele. Eu nunca vira aquele homem em toda a minha vida e disse isso a ele, mas tudo o que ele fez foi continuar implorando que eu o perdoasse por seu erro. Eu sequer sabia do que aquele homem estava dizendo.

Passado o momento de surpresa, eu fiquei furiosa por estarem novamente me confundindo com aquela garota, Belle, mas, pela primeira vez, eu compreendi algo a respeito dessa garota, eu também ficaria furiosa com um homem que me colocasse um nome tão estúpido.

De todo modo, eu mandei o velho fazer algo anatomicamente impossível e saí para beber no “The Rabbit Hole”, o bar mais movimentado daquela cidadezinha, antes que eu fizesse se tornar possível o que eu o mandara fazer.

Após alguns minutos bebendo – não, provavelmente foram horas, pois o dia já estava clareando –, eu resolvi voltar para a hospedaria.

Eu não sentia direito o chão debaixo dos meus pés e minha vista estava muito embaçada, mas de algum modo eu consegui me arrastar até os jardins da casa que era a hospedaria. Entretanto, quando estava quase alcançando a porta, o mundo virou de cabeça para baixo e eu já estava no chão antes mesmo de perceber que havia de fato um chão.

Alguma coisa naquela situação – não me recordo bem o que – deve ter me parecido extremamente engraçada, porque comecei a rir. Provavelmente, eu estava fazendo bastante barulho, porque, quando dei por mim, mãos gentis tocaram as minhas e um par de olhos verdes entrou em foco.

Ruby!!, meu cérebro gritou. Eu parei de rir, pois minha cabeça começou a doer: pare de gritar, cérebro masoquista!

Acho que ele estava gritando muito alto, pois, embora visse os lábios de Ruby se mexendo, não conseguia ouvir sequer uma palavra. Depois, ela se levantou, saindo de foco, e me puxou, entrando em foco de novo , o que foi suficientemente engraçado para que eu voltasse a rir descontroladamente.

Senti Ruby suspirar enquanto me arrastava para dentro da hospedaria, o que é bastante estranho, levando em conta que eu sequer sentia o chão debaixo dos meus pés.

A próxima coisa da qual eu me lembro é de Ruby me sentar em uma cadeira, já em meu quarto. A expressão no rosto dela era um misto de preocupação e censura. Não me lembro muito bem de quando parei de rir, porque só reparei que não estava mais rindo quando tive que fazer força para não retomar as gargalhadas quando Ruby se afastou e saiu de foco novamente.

- Você não vai conseguir tomar banho e se trocar sozinha.

Não era uma pergunta, embora eu tenha respondido, com uma voz muito rouca, que não precisava fazer isso agora, poderia dormir antes. Ruby não achou a resposta satisfatória; parecendo muito irritada – e igualmente preocupada –, ela foi até o meu armário e pegou uma das minhas camisolas, depois foi ao banheiro e ligou a torneira para deixar a água esquentar.

Quando retornou, ajudou-me a tirar a roupa e me colocou no chuveiro. Então, tudo pareceu entrar em foco: percebi que Ruby ainda estava usando camisola e não penteara os cabelos, eu provavelmente a acordara com minhas risadas e ela correra para ver o que estava acontecendo.

Eu fiz a única coisa que poderia ser feita naquela situação: desculpei-me por ter causado um incômodo. Ela pareceu um pouco surpresa, mas assentiu, esforçando-se bastante para não me encarar. Foi então que notei o quanto seu rosto estava enrubescido, o que é engraçado, porque ela nunca me parecera uma pessoa tímida.

Então, tudo fez sentindo – o que provavelmente era apenas o álcool brincando com a lógica das coisas –, Ruby gostava de Belle. Não como amiga, ela a queria o corpo da garota com a qual sempre sou confundida, por isso estava tão envergonhada. Hoje, eu percebo que essa linha de pensamento era um pouco estranha, pois existem garotas que não gostam de ver as outras nuas.

De todo modo, eu resolvi dar um prêmio a Ruby por ter me ajudado: puxei-a para junto de mim e a beijei. Acho que pensei que ela poderia fingir que eu era a garota dela, mas não estou muito certa: as minhas memórias sempre ficam um pouco estranhas quando eu bebo.

Ruby pareceu se esquecer de que eu não era Belle – ou talvez ela apenas fosse uma daquelas pessoas idiotas que não acreditam que eu sou Lacey –, que estávamos debaixo de um chuveiro e ela estava vestida, pois retribuiu o beijo com muita paixão, abraçando-me pela cintura. Aquilo era prova de que eu estava certa sobre ela gostar da amiga dela.

Não me recordo do que aconteceu a seguir em termos práticos, apenas sei que os lábios dela eram muito macios e seu beijo, embora provido de certa urgência, era muito doce. Ou talvez ela tenha escovado os dentes antes de ir me ajudar, embora eu ache improvável levando em conta o estado dos cabelos dela.

Algumas palavras ficaram gravadas na minha memória: doçura, água, chão, olhos, maciez, mãos, céu e, principalmente, Ruby. Houve também uma enxurrada de sentimentos que até hoje não entendo muito bem ou sei se eram meus ou dela.

A próxima coisa concreta da qual me lembro é de acordar em minha cama, vestida com a minha camisola. Tentei recordar do que havia acontecido na noite anterior, mas as minhas memórias estavam muito confusas – apenas depois consegui juntar os pedaços para formar a história que estou contando agora.

Eu me recordava de Ruby – o que é um pouco estranho levando em conta que essa é agora a parte mais confusa das minhas memórias – e, embora me sentisse um pouco envergonhada por tudo, não me arrependia nem um pouco.  

Ruby não me encarou quando entrei no restaurante da avó dela para almoçar, ela parecia amedrontada, e eu percebi que me revelara algo muito secreto. Talvez, Belle não fosse a garota dela; talvez ela fosse daquele cara, o Gold.

Resolvi, então, fazer algo por ela: perguntei a ela se sabia como eu chegara na hospedaria mais cedo, porque a última coisa da qual eu me recordava era de estar bebendo no “The Rabbit Hole”. Ruby pareceu muito aliviada e eu fiquei feliz por retribuir o favor que ela me fizera ao me levar para o quarto e cuidar de mim.

Ainda me pergunto a quem pertenciam os sentimentos com os quais eu acordei: seriam meus, de Ruby ou de nós duas?

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*“Quando você entrou na sala, (...) os nossos corpos chegaram a um impasse, (...) se transformaram em luz. Bem, eu não sei quanto a você, mas eu quero isso esta noite” (Trecho da música “Our Hearts Will Beat As One”, David Fonseca).


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Notas finais do capítulo

Essa fanfiction foi um pedido feito no grupo "Fanfictions OUAT". Ela terá apenas mais um capítulo, que deverá sair até o final da semana.

Espero que tenham apreciado a leitura, mas, positiva ou negativamente, façam comentários. Desde já agradeço!



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