Jogos Meio-sangrentos escrita por Lord Camaleão


Capítulo 21
Capítulo 21 - Serpente de gelo


Notas iniciais do capítulo

OOOOOOOIIIIII!!!

Hoje teremos POVs super desproporcionais, mas em compensação vocês conhecerão as alianças e terão uma surpresinha nas notas finais. Se não tiver gostado dos aliados de seus personagens, só lamento por você. Mas podem ter certeza que algumas alianças não durarão para sempre: membros irão se perder, fugir, matar um ao outro, etc.

E lembrando que se seu personagem não teve um POV até agora desde o baile dos Patrocinadores, ele terá nos próximos quatro capítulos antes da Arena.



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John Bryan – 11

Pôr em prática uma vingança era uma ótima forma de iniciar a manhã.

Em parte, John estava zangado por seus próprios mentores o prejudicarem. Travis e Connor Stoll colocaram Açúcar de Hipnos em seu café pela manhã. O resultado foi um treino com longas pausas para cochilar e uma morte rápida na Simulação. Uma ação inconsequente gerou um prejuízo enorme ao filho de Hermes.

Mas agora estava tudo pago. Travis tomava café ao seu lado, ainda usando o batom azul “48 horas” de Olavia. Ele tentara tirá-lo da boca, mas não conseguiu nada além de uma mancha ainda maior. Connor ainda tentava sair do banheiro, mas a maçaneta eletrificada o impedia.

– Leah e Autólico já desceram para seus treinos. Vocês permanecem nessa infantilidade, como se você não estivesse prestes a morrer John – disse a voz de Salmacis dentro do corpo de Hermafrodito. Havia apenas ela além de John e Travis na mesa. Olavia deveria estar ajustando as roupas que seus tributos usariam nas Entrevistas.

– Tenho quase certeza de que vou morrer, Salmacis. Estou protegendo Leah da garota de Ares e sua aliança. Além disso, vejo que há semideuses mais fortes do que eu, como meus próprios aliados Reyna e Jason. Então não vejo mal em ao menos me divertir.

– Leah tem quinze anos, não nove. Lute suas batalhas e deixe-a lutar as dela – a palavra dura deveria vir da ninfa, mas agora Hermafrodito dizia, o olho azul brilhando mais do que o dourado.

– Por favor, cara, não se subestime – Travis comia um pedaço de bolo de chocolate com seus lábios azuis – Consegue ver Connor? Não? Porque ele está preso em uma armadilha sua. A habilidade de Hermes não é apenas pregar peças e rir. Prejudique, roube, capture. Atinja alguém com uma lança antes que esta pessoa se dê conta... Agora termine esse leite antes que eu ponha mais Açúcar de Hipnos.

– Você não vai se importar que os outros mentores riam de seu sorriso azul? – disse John, mudando de assunto.

– Me importaria com Connor, mas ele parece bem ocupado tentando sair do banheiro sem ser eletrocutado. Então vai ficar tudo bem.

Assim que chegou, viu Jason e Reyna travando uma intensa luta corpo-a-corpo. Eles pareciam sussurrar algo um ao outro, como se estivessem dando instruções a si mesmos ou falando sobre o café da manhã. Poderia ser qualquer uma das duas coisas.

Leah estava escalando uma rocha falsa. Hoje ela iria participar da Simulação de Sobrevivência sozinha, já que seus aliados optaram por competir na de Combate. John nunca entraria naquele deserto se não estivesse dormindo na hora da inscrição.

Pensou em ir ajudá-la, mas lembrou-se das palavras do deus de dois sexos. Talvez treinando sozinha, Leah se tornasse uma guerreira mais forte, capaz de enfrentar Hannah e outros inimigos.

Dirigiu-se ao Centro de Atividade Manuais. Queria trabalhar mais com sua habilidade para armadilhas. Em uma mesa, uma filha de Dioniso ensinava seu aliado do chalé de Afrodite a preparar veneno. Em outra lotada de placas de metal e parafusos, os dois filhos de Hefesto criavam cada um sua engenhoca.

A mesa que John queria era ocupada apenas por um garoto de mais ou menos catorze anos. Ele mexia com alguns tubos de madeira e parafusos.

– Desculpe não ter notado antes, mas – John sentou-se ao lado do garoto e puxou assunto – de qual chalé você é mesmo?

– Chalé 1. Brandon York. Sou irmão de Reyna, sua aliada. Provavelmente eu deveria estar me exibindo com uma espada e lançando raios pelo centro de treinamento, mas acredito que meu dia será mais produtivo se eu conseguir fazer uma zarabatana automática.

– Você não quis entrar na aliança?

– Vocês são guerreiros ágeis, lutam com lanças e arcos. Não acompanharia o ritmo de vocês. Estou com os irmãos do 4, a garota de Afrodite e o garoto de Dioniso. Acho que sobrevivo mais tempo com eles do que com vocês. Mas que Fortuna abençoe a todos.

– Fortuna?

– Tique. Eu confundo alguns nomes. A hora da simulação está chegando, então gostaria de terminar meu trabalho e não conversar mais sobre alianças e nomes de deusas. Espero que compreenda.

Brandon voltou-se para seus tubos, contraindo as sobrancelhas grossas. John compreendeu-o.

Para começar, o filho de Hermes pensou em fazer o mesmo feito do banheiro de Connor, mas talvez com algo maior do que uma maçaneta. Correu para a mesa onde se encontravam os filhos de Hefesto, buscando fios, baterias e ideias.

Callista Hastings – 13

Callista andara analisando todos os tributos que participariam da Simulação de Sobrevivência com ela. Claro, ela passara o dia tecendo redes, treinando seus golpes com faca ou recebendo conselhos de algum espírito que ousava falar com ela. Ela parecia sozinha, mas os mortos sempre sussurravam em seu ouvido, fazendo companhia.

Em partes aquela habilidade era útil quanto a receber bons conselhos de pessoas que morreram há anos. Mas em algumas vezes era difícil se concentrar em sua luta com facas quando eles falavam do “garoto ao lado que parece um bagre lutando fora d’água”.

Quando eventualmente Callista fala sobre seus poderes, algumas pessoas se penalizam pela difícil e atormentada vida que ela tem. Mas isso não é verdade. A filha de Hades aprendeu aos poucos a conversar cordialmente com alguns e a calar a boca dos mais inconvenientes.

O dia de treino havia acabado e os doze semideuses que participaram da Simulação de Combate no dia anterior subiram para seus andares. Sobraram apenas ela e mais onze, os quais tentava se lembrar quem era quem.

Dália comentara com ela que uma aliança formada pelos chalés de Poseidon, Ares e uma garota de Atena estava sendo chamada de Carreirista. Callista perguntou o porquê do nome, mas a mentora apenas supôs que se deve ao fato de os cinco terem mais afinidade com a carreira de assassinos. Fazia sentido, mas era esquisito. Nenhum deles estava na Sobrevivência, os cinco eram máquinas de matar, não de coletar frutas. Pareciam intimidadores, mas Callista pensou nas noites de frio e fome que poderiam enfrentar e não terem nada para comer a não ser a si mesmos. Era um pensamento grotesco, mas engraçado.

A aliança com mais membros, junto aos Carreiristas era composta também por cinco semideuses, com apenas três presentes. David, do doze e Elena do quatro participaram ontem da Simulação de Combate. A garota fora a primeira a morrer, enquanto o garoto ficara em terceiro lugar. Na fila da Sobrevivência encontrava-se o angelical e tímido irmão de Elena, a garota ruiva e extrovertida de Afrodite e o filho de Zeus. Os dois meninos pareciam quietos diante da voz alta e empolgante de Valentina.

Um garoto conversava com uma Caçadora enquanto simulava um desenho no chão com um dedo. Era o filho de Atena, George e a garota era Rosalya, filha de alguma deusa menor. Além dos dois, ainda havia a filha de Apolo, que participara da simulação anterior. Era uma aliança pequena, mas bem estruturada. A Caçadora sabia sobreviver em praticamente qualquer ambiente devido a seus séculos de aprendizado; o menino parecia inteligente, afinal era um filho de Atena; a filha de Apolo parecia ser excelente com o arco, além de uma manipuladora em potencial. Callista deveria tomar cuidado com eles.

Olhou para a filha de Hermes que se encontrava sozinha e tentou lembrar quem eram seus aliados. A resposta se encontrava em três nomes: John, Reyna e Jason. Leah e John eram irmãos, enquanto o filho de Apolo e a filha de Zeus pareciam um casal ou quase isso. Não sabia muito sobre eles, além da briga de Leah com a garota de Ares na cerimônia no Acampamento Meio-sangue antes do embarque.

A menor aliança era formada pela filha de Dioniso e o filho de Atena apenas. Os dois não pareciam namorados, apenas parceiros. Eles se mostravam capazes de derrotar um inimigo forte, sobreviver sozinhos ou conseguir Patrocinadores. Ambos eram bonitos e astutos.

Por fim, o próprio grupo de Callista. Macária dissera que os Patrocinadores os chamavam de Caveira em Chamas, por se tratar de uma aliança entre os chalés de Hades e Hefesto. O nome era ridículo, levando em conta que era formado por dois garotos tímidos e delicados e duas garotas reclusas.

Philipe e Damon vivam juntos, rindo e ajudando um ao outro. Se ela se importasse, sentiria ciúmes do irmão mais novo. Mas a relação entre os dois não parecia ser de amizade ou irmandade. Callista não entendia bem, mas preferia não se meter. Mayline – ou Mac, como mais gostava de ser chamada – era silenciosa e se preocupava mais em construir armadilhas e armas, não puxar assunto como uma típica garota fofoqueira. Isso era muito bom, já que Callista também não se interessava em jogar conversa fora, apenas sobreviver. Não queria fazer amizades para que não tivesse que chorar mortes depois.

Sua conta deu vinte e três tributos. Um não se aliara a ninguém. Logo pensou em Annye, a Caçadora de Ártemis que sempre andava de cara fechada. Talvez ela não visse sentido em proteger ou depender de outras pessoas, ou simplesmente não conseguira fazer amizades. De acordo com Caronte, ela era filha de Éris, deusa da discórdia que vivia no Tártaro com Nix. Era justo pensar nela como uma garota fechada e incapaz de concordar com alguém.

A Instrutora Chefe chamou os tributos para uma sala que continha doze poltronas com computadores ao lado.

– Tributos, vocês lutarão na Simulação de Sobrevivência. Ao contrário da simulação do dia anterior não haverá armas comuns ao seu alcance, dificultando suas chances de matar outros tributos. Suas habilidades a serem testadas envolverão fuga, caça e... fuga de monstros. Vocês poderão matá-los se encontrarem um meio para isso. Cada um deve ter seus aliados presentes, portanto trabalhem em equipe, isso é essencial. A simulação corta os poderes divinos de vocês, então não contem com fogo, água ou plantas a seu favor.

“Uma última coisa, antes de chamá-los para suas devidas poltronas: quando surgirem na Simulação, aparecerão em seus braços um bracelete que cobrirá todo seu antebraço. Nesse bracelete haverá um medidor de energia, com uma barra que diminui com ataques sofridos e esforços gastos por vocês. Vocês devem descansar ou comer para que a barra cresça. Uma luz azul piscará na frequência em que a energia está diminuindo. Além do medidor, haverá dois mostradores: um para indicar possíveis ameaças próximas e outro para exibir os tributos mortos na simulação. Apenas um deverá sobreviver ao final da simulação, não espere conservar sua aliança por muito tempo.”

Callista ouviu às instruções atenta. O fato de sua aliança inteira ter ido para a Simulação de Sobrevivência trouxe certa vantagem, principalmente em relação a Leah que estava sozinha. Mas em certo tempo deveria separar-se de seus aliados, assim como planejava para a Arena real. A lista de chamada começou com Brandon, do Chalé 1, seguindo para Josh e os demais. Ela era a penúltima. Sentou-se ao lado de Alamanda, filha de Dioniso. A garota desejou-lhe sorte.

A enorme ciclope conferiu os computadores e logo depois ordenou seus assistentes a porem máscaras nos tributos. Três segundos após respirar o gás, Callista adormeceu.

Respirou o ar frio, enquanto sentiu os músculos rígidos. Seus pés eram blocos de gelo em processo de descongelamento. A um metro da sua direita estava o garoto de Atena, à sua esquerda Leah, do onze.

Notou o ambiente à sua volta. Uma montanha de gelo, com uma maior ao lado. Os doze tributos formavam um imenso círculo ao redor de uma mesa de pedra que continha mochilas e casacos de pele. Callista logo notou que ainda usava a camiseta do treino e seus ombros tremiam. Acima da mesa, um cubo brilhante flutuava com o número dez gravado. Parecia uma contagem regressiva.

Procurou seus aliados. Haviam os distribuído o mais longe possível. Se pudesse imaginar uma rosa dos ventos, Philipe seria o norte, Damon leste, Mac oeste e Callista no sul. Esperava que os três corressem para a mesa, assim como todos os outros – era o mais lógico a se fazer, mas causaria um grande tumulto.

A contagem começou.

O frio ajudava a diminuir seu nível de energia, mas corria o risco de desgastar-se e não conseguir nada. Confiaria nos aliados, no que eles poderiam conseguir. Tentaria atrapalhar os adversários. Leah estava sozinha, morreria logo. Mas George tinha sua aliada, eles dependiam um do outro.

Quando a contagem zerou, todos os tributos correram para a mesa. Callista também, mas seu objetivo era outro. Pulou sobre o pescoço de George, derrubando-o de cara no chão. Afundou sua cabeça na neve e ouviu um bip acelerado vindo de seu bracelete. Mas o garoto logo se recompôs, como ela imaginava, virando-se. Callista acertou um soco em seu olho.

Logo sua aliada, Roslaya, surgiu. Ela trazia consigo um casaco de pele marrom e uma caixa de metal, que voou na direção da testa da filha de Hades. Callista agora estava em desvantagem: dois contra um. Ela tocou na testa que deveria estar ensanguentada, mas encontrou uma rachadura gelada no lugar de sangue.

Antes que se perguntasse se estava virando um boneco de neve, seus aliados chegaram. Mac chutou o rosto de George, enquanto Philipe e Damon atingiram a Caçadora com pedras de gelo.

– Levante-se, Callista – disse a filha de Hefesto – vamos correr antes que nos peguem.

Callista pensou que a garota estava falando sobre Rosalya e George, mas viu que, descendo a montanha mais alta vinha uma alcateia de lobisomens brancos. Alguns corriam sobre duas patas, empunhando lanças, outros à frente vinham de quatro, as presas bem amareladas em relação ao pelo alvo.

Os quatro desceram a colina, adentrando uma floresta de pinheiros.

– Não podermos correr muito, devemos prestar atenção ao medidor de energia – disse Philipe. Eles conseguiram apenas três casacos, e o filho de Hefesto renunciara o seu a Callista. O garoto era magro e sua pele branca tremia. Suas bochechas estavam mais coradas do que o habitual.

– Tem razão, Phil – Damon parou. Estavam a uma distância aceitável do pico. A descida ajudava – Vamos abrir as mochilas.

– Bacon, dois bolinhos de arroz e uma banana – Philipe disse, conferindo a sacola preta que carregava.

– Água e uma corda. Não como cordas – Mac disse com um rosto desapontado.

– Eu e Damon comemos os bolinhos – disse Callista, já tomando a decisão pelo irmão – Não sei se os alimentos têm uma certa pontuação, mas você foi a que mais fez até agora Mac. Philipe, o frio está prejudicando você, então fique com o pacote de bacon. Vamos arranjar um jeito de nos escondermos nas árvores.

– Callista, eu não sei escalar – disse Damon.

– Aprenda. Quando nós dois chegarmos ao topo, amarro você em algum galho, para que não caia. Só não podemos ficar no chão, os lobos chegarão logo.

– Vamos nos dividir em duas árvores, para que nosso cheiro seja menos perceptível – Mayline mordeu sua banana – Philipe e eu vamos para uma, vocês para outra. Pegue minha mochila.

– Mas... – Damon protestou.

– Quieto, Damon. Deixe-os ir.

Ao subir em um pinheiro, o bracelete de Callista piscou com a imagem de Rosalya, logo depois a de George. Os lobisomens os haviam pego. Quando chegaram a uma altura desejada, e Callista passou a unir o tronco de Damon ao da árvore, seu bracelete piscou novamente, dessa vez com a imagem de Josh, filho de Deméter, e Leah. Levando em conta que os dois últimos desceram o monte, os lobisomens estavam perto.

– Agora cale a boca e tente não ficar cansado. Coma um bolinho.

Callista parecia a mãe de Damon, mesmo sendo mais velha apenas por um ano ou dois. O garoto não era infantil, mas por muitas vezes parecia com medo e depender dela.

A imagem de Brandon surgiu no bracelete. Agora Valentina. Uma aliança havia sido destruída pelos lobos.

Ela ouviu um uivo, depois vários. Olhou para a árvore onde se encontravam Mac e Philipe. A filha de Hefesto parecia querer dizer algo.

– O quê? Não estou ouvindo – Callista sussurrou – Ba... ba... bacon? Bacon!

Olhou para baixo, onde uma fatia avermelhada destacava-se na neve branca. O cheiro também deveria chamar atenção. Ao longe, ouvia passos abafados e latidos. Logo depois era possível ver os lobos que os produziam.

Eles não pareciam vir pelo bacon, pensar isso seria tolice. Bastava apenas torcer para que eles não percebessem a gordurosa fatia de carne de porco frita e ressecada.

Eles passaram por debaixo das duas árvores, e quando Callista pensou que estariam a salvo, um maldito lobo bípede parou. Ele cheirou o pedaço de carne e o comeu.

Já encheu sua barriga, agora vá embora maldito, pensou Callista. Mas o lobo ergueu o focinho, aspirando o ar gelado à sua volta e soltando uma baforada de vapor. Ele percebeu. O lobo uivou, chamando a atenção da alcateia. Com sua pata livre, apontou para a árvore onde se encontravam os filhos de Hefesto.

– Phi... – protestou Damon, mas Callista cobriu sua boca com a mão.

Não seja estúpido. Deixe eu desamarrar você. Vamos fugir.

– Eles são nossos aliados!

Fale baixo, caramba!

Eles são nossos aliados.

Não podemos nos arriscar. Eu também entenderia se fizessem o mesmo – Callista começou a desamarrar a corda.

Os lobos eram grandes demais para escalarem, mas aquilo não era problema. Com a força de três deles, a árvore foi ao chão. Mac e Philipe gritaram de dor, mas quando os lobisomens os atacaram, gritavam de desespero. Callista esperou por longos e dolorosos minutos, mas ambos gritaram apenas uma vez e suas imagens apareceram no bracelete da semideusa.

Os lobisomens uivavam uma canção de vitória.

Agora é de extrema importância que você pare de choramingar e mantenha a calma, para que eles não sintam seu cheiro. Mantenha-se coberto, para que seu calor não saia do seu corpo.

Callista pensou que Damon fosse uma criança aflita e desobediente, mas o garoto manteve a calma e fechou os olhos. A pele branca e a respiração lenta o fazia parecer quase irreal, um boneco de porcelana. Esperou até que a mancha branca que era a alcateia fosse perdida de vista.

– Vamos descer.

Ela terminou de desamarrá-lo e os dois desceram.

– Para onde vamos agora? – o garoto perguntou.

– Restam apenas dois. Vamos encontrá-los e acabar com eles.

A subida até o topo da colina enevoada era bem mais complicada que a descida. Como se não bastasse o esforço físico maior, o vento agora soprava em seus rostos, atrapalhando a visão. Eles não tinham mais comida, então teriam que torcer para que seus níveis de energia aguentassem até o final. Ao chegarem não notaram absolutamente nada.

– Eles devem ter fugido dos lobos. Mas se ousarem voltar nós o veremos.

– Mas o mataremos com o quê? – perguntou o menino – Temos apenas uma corda.

– Vou fazer uma armadilha – Callista sentou-se na neve, enquanto o irmão permaneceu de pé. Procurou por algum elemento mortífero à sua volta, sem sucesso – Damon, veja se... Damon?

– Callista, acho que algo me atingiu – o filho de Hades passava a mão pela nuca.

Ela se levantou e logo descobriu. Um dardo com veneno. O filho de Afrodite e a garota de Dioniso conseguiram enganá-los.

– Malditos – disse ela – Deixe-me ver. E-está... congelando

Uma camada de gelo cobria o pescoço de Damon, e crescia a cada segundo. Sua respiração estava pesada.

– Ca-callista. Eu acho que... – ele não completou a frase. Sua garganta era agora uma pedra transparente de gelo, seu rosto imóvel era também transformado no sólido. Com um baque surdo, sua cabeça caiu na neve despertando um grito da garota.

Ela se afastou do corpo dividido do irmão, lançando-se no chão. Viu que assim como sua cabeça, suas mãos inertes também se tornavam gelo.

– Esse veneno é muito bom, é uma pena que reste apenas um dardo – disse uma voz em meio à neve.

– Sei disso, eu mesma o fiz.

As imagens dos dois semideuses ficou nítida apenas quando estavam a um metro da filha de Hades. O filho de Afrodite segurava um pequeno galho oco, enquanto a filha de Dioniso cruzava os braços e formava um rosto travesso em seus lábios.

– Vamos acabar logo com ela, depois nos resolvemos – disse o garoto, que logo soprou um dardo na direção de Callista, atingindo-a no pescoço.

Callista tentou gritar, mas sua garganta já trincava. Retirou o dardo e levantou-se. A imagem dos outros dois tributos tornava-se enevoada. Pegou a corda que antes seria uma armadilha. Isso ainda pode me ajudar a matá-los.

Pulou sobre o filho de Afrodite. A corda verde agora envolvia seu pescoço moreno. O pescoço moreno agora adquiria um tom de azul, e o azul enrijecia-se, como gelo. Logo o garoto estava morto.

Callista supôs que ainda estava viva porque o sangue estava sendo bombeando mais rápido e o veneno corria rapidamente por todo seu corpo, impedindo que uma área congelasse imediatamente. Mas ela ainda tinha a sensação de estar virando uma estátua de gelo.

Assim que percebeu que seu companheiro morrera, a garota de Dioniso atacou a de Hades, lançando-se na neve, sobre ela. Callista teve certeza de que iria morrer. Seus ossos estavam rígidos, e seu sangue parecia açúcar cristalizado.

– Morra logo, morta-viva! – disse a tributo do doze, entredentes – Estou exausta e não tenho muita energia.

Callista olhou para o antebraço da garota. A barra que media o nível de energia da garota era quase invisível a luz azul piscava como se estivesse prestes a explodir. Ela precisa me bater só um pouco. Segurou a corda nas mãos e soltou a semideusa que estava sobre ela. Fechou os olhos. Sentiu um soco trincar sua pele. Estava congelando mais rápido. Me bata mais, estúpida. Mais um soco.

Abriu os olhos. A filha de Dioniso levantava a mão em punho para esbofeteá-la mais uma vez, mas ela estava congelada. Callista sorriu e tentou sair debaixo da estátua de gelo, mas seus membros não estavam em um estado melhor. Ouviu uma voz antes de congelar por completo.

A vencedora da Simulação de Sobrevivência é Callista Hastings, do Chalé 13.

George Blacksmith – 6

O bom de ser um dos primeiros mortos na Simulação é que se poderia ir jantar mais cedo.

Toda aquela neve, todos aqueles lobos, deixaram o garoto com fome. Subiu com Erictônio nos elevadores. Pensara que o mentor iria aconselhá-lo a não ser tão babaca e morrer tão cedo, além de falar sobre as malditas peças de xadrez, como de costume. Mas o homem apenas ficou quieto e limpou seu óculos com o cachecol até chegarem ao sexto andar.

Antes das portas se abrirem, George ouviu a voz de Gabrielle esbravejando:

– Vou repetir mais uma vez! Não toque em mim, não entre no meu quarto e não me dirija a palavra!

Os dois entraram e viram a semideusa e a Medusa frente a frente. A garota fitava o monstro com seus olhos azuis determinados.

– Gabrielle, você não sabe o quanto está equivocada. Estou aqui para protegê-los, você e seu irmão. Quero fazer o máximo para que ao menos vocês se sintam confortáveis!

– Confortáveis enfeitando seu jardim, é o que você quer, monstro! Está vendo esta faca? Bronze celestial. Vou matá-la com ela agora.

– Gabrielle, pare! – gritou George. Sua voz falhou e ele soou como uma garotinha, mas conseguiu o que queria.

– Vai defender a Medusa, George? O monstro que odeia nossa mãe e a todos nós que vivemos neste andar! – a garota avançou com a faca, mas George correu e segurou-a – Me solte!

– Não! – ele tomou a faca.

Gabrielle caiu no chão, chorando. Seu rosto estava junto ao carpete, coberto pelos cachos dourados.

– Estou cansada! Cansada de aguentar tudo isso George! Eu não quero morrer, não quero! E tudo parece indicar que não sairei viva desses Jogos!

– Gabrielle – George sentou-se junto a ela, segurando suas mãos. Achara aquela atitude estranha para alguém com o coração de pedra como a irmã – Não vou deixar ninguém machucar você. Junte-se a mim, Elizabeth e Rosalya.

– Não quero acordar na Arena com um sorriso insuportável da sua amiga filha de Apolo. Estarei melhor com pessoas que não confio do que com você. Eu não quero amá-lo, não sabendo que terei que ver você morto.

Ela se levantou, os olhos azuis com as córneas avermelhadas. Não parecia ter quase matado a Medusa, pois passou por ela sem notá-la. Foi dormir. George permaneceu no chão.

– Vá comer, querido – disse a górgona, ainda no mesmo lugar desde que Gabrielle a ameaçara.

– Não quero – George levantou-se, a faca ainda em suas mãos e andou até seu quarto. Pôs o talher sobre o criado-mudo.

Ele tinha um chuveiro sofisticado ao seu dispor e uma série de pijamas confortáveis em seu guarda-roupa. Mas George deitou-se imediatamente com sua roupa de treinamento que vestira de manhã e logo dormiu. Se existia uma deusa da higiene, ela com certeza punira George com pesadelos.

O chão do refeitório do orfanato era composto por ladrilhos brancos e pretos. Eles eram quase uma ilusão de ótica. As paredes estavam em chamas, provavelmente causadas pela explosão. À frente de George, uma enorme peça de xadrez, um bispo branco. A peça virou-se, tomando a forma de Irmã Clementine, a freira menos favorita dele. Sua sobrancelha mais levantada que a outra ressaltava a enorme verruga na testa.

– Explodir o orfanato, Sr. Blacksmith... Está aliando-se a Belzebu? Deve rogar a Nossa Senhora para que purifique sua alma. Reze!

Mais e mais bispos com rostos das freiras que George conhecia muito bem aproximavam-se, rezando incessantes Ave Marias.

– Reze, Blacksmith! – com a ordem de Irmã Clementine, o refeitório girou, lançando mesas, freiras e entulho contra as paredes em chamas. Ele tentava procurar uma saída, mas a fumaça, os tijolos e as preces pareciam prendê-lo.

George acordou ofegante e com a mão apertando o cabo da faca. Saiu do quarto, procurando uma dríade que pudesse servi-lo comida. A porta do quarto de Gabrielle estava aberta. Na soleira, a máscara de metal da Medusa. Ouviu sibilos de serpentes.

– Talvez eu seja punida por esse ato garota. Será uma pena que o Chalé 6 não ofereça mais tributos para participarem dos Jogos, nem mentores... O que houve Gabrielle Charbonett? Medo de olhar nos olhos de sua Representante? Deixe-me ver se seus olhos azuis são tão bonitos quanto ouvi serem.

– Medusa, pare com isso – Gabrielle pediu. George entrou no quarto e viu que a irmã estava sentada sobre a cama, um travesseiro sobre o rosto. A górgona estava de costas para ele, as duas mãos sobre o edredom.

– Acabou seu tempo de ser educada comigo. Você apenas provou que Atena e toda a sua prole não passam de arrogantes, superficiais e ignorantes! Agora sinta...

George interrompeu o discurso da górgona cravando a faca de bronze em sua nuca. Medusa arquejou e uma de suas víboras mordeu a mão do filho da Sabedoria. Ele recuou-a, mas atacou novamente, derrubando o monstro no chão.

Medusa não disse nada. As únicas que pareciam rebelar-se contra o ataque eram suas víboras verdes. Todo o corpo da górgona se dissolveu em pó, exceto por algumas serpentes que se debatiam como peixes fora d’água. Gabrielle se levantou e olhou para a mordida na mão de George, que sangrava.

– Oh droga, George. Vou chamar os mentores.

As Portas da Morte provavelmente ainda não haviam sido fechadas pelos Sete, então o garoto receava que a Representante voltasse à vida. Mas nada aconteceu, nada enquanto ele permaneceu acordado.

Erictônio chegou e pegou no pulso do garoto, ajudando-o a levantar. Mas George já cambaleava, prestes a desmaiar. A faca de metal reluzia como o orfanato em chamas e as serpentes pareciam sibilar em uníssono apenas uma frase:

Reze, Blacksmith!


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Notas finais do capítulo

E a surpresa é: O PRIMEIRO QUIZ VALENDO UM PARA-QUEDAS NA ARENA!!!!!!

É claro que não vou entregar tudo de mão beijada com um simples "quem comentar primeiro leva". E vocês poderão pedir qualquer dádiva que não seja uma arma grande (ou seja, faquinhas, flechas: essas coisas são permitidas) e escolher o deus menor que irá patrocinar um tributo a sua escolha (claro que todos vão escolher o próprio personagem, mas podem fazer um agrado a um outro se optarem por isso). Mas esses para-quedas não serão os únicos nos Jogos. Pretendo entregar por minha conta alguns presentes, que serão decisivos no rumo que a história irá tomar (então não fiquem com ciúmes). Sem mais delongas, a questão que vocês devem responder corretamente é:

*Justifiquem a ordem em que apresentarei os nomes dos seguintes deuses (ou seja, digam porque deus tal está em primeiro e assim por diante):


Afrodite - Ares - Hefesto - Poseidon - Zeus - Hermes - Ártemis - Atena - Deméter - Apolo - Dionísio - Hades


A primeira resposta correta vencerá. Divulgarei o vencedor apenas no próximo capítulo, se houver. Se ninguém acertar, o que apresentar uma melhor justificativa ganhará um presente surpresa. Não responderei em nenhum review se sua resposta está certa ou errada. Ou seja, responderei apenas o que vocês falarem SOBRE O CAPÍTULO (que por sinal fiz muito bonitinho pra vocês). Beijos e boa sorte!