Um Conto De Fadas Em Miami - Fic Interativa escrita por Words of a stupid girl


Capítulo 14
Capítulo 13 - O Grupo de Estudo: parte I


Notas iniciais do capítulo

oi, só passei para dizer que estou viva :)
como começo essas notas? primeiramente, eu quero agradecer muitíssimo à recomendação da Isa Starck, a segunda da fic. E que venham muitas mais!!!!!
sim, eu demorei. De novo. E eu tenho completa consciência disso. E isso dói o coração, porque eu tento. Mas tem dias que eu passo na frente do pc, tentando escrever algo que preste, e simplesmente nada sai. E aí sobe aquela aflição, pq eu sei que estou desapontando vcs, meus leitores lindos. AAAAAAAAAAAA EU TO COM RAIVA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! Desculpem, sério. Mas desculpem mesmo!! Eu continuo desapontando vcs, e isso me deixa louca. Tenho que recuperar meu ânimo para escrever essa fic, e rápido. Senão, acho que vcs podem acabar perdendo a paciência.
tem horas que eu realmente penso em apagar minha conta do Nyah! e tirar essa história da existência. Mas aí eu penso em vcs, em todos as coisas que eu ainda não tive a chance de escrever, as aventuras que ainda não narrei. E é isso que me motiva a sentar a bunda na cadeira e escrever, mesmo que não saia nada de bom. desde que saia, tá ótimo. Eu praticamente tive que espremer esse capítulo de mim.
eu sei que não posso acabar com a fic logo agr, que já to no meio dela. Tomara que isso seja só uma crise louca minha, e que passe logo.
respondendo a pergunta do começo do mês: meu encontro favorito é o da ariel com o eric, pq tem umas das minhas musicas e momentos favoritos de toda a historia da Disney

não tenho mais oq falar. Espero que gostem.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/393710/chapter/14

–Você vai gostar deles, sabe? São gente boa. E, além do mais, você meio que é naturalmente obrigada a gostar. -Matt apontou pela décima vez, pensativo. Com sua cara otimista genérica, era visível que ele estava tentando animar Lisa. E ele era muito fofo por se dispor àquilo. No entanto, todas as caras otimistas do mundo não seriam capazes de mudar o que ela sentia, andando ao seu lado. Enquanto ele passava a mão delicadamente por um chumaço cacheadinho de cabelo, tudo o que ela conseguia pensar era que não conhecia direito aquela parte da cidade (na verdade, desconhecia quase toda a cidade), e entrava cada vez mais nas ruas desconhecidas, não sabendo mais para onde estava levando-a. Poderia ser qualquer lugar.

O sol de ouro da Flórida expressava bem o começo de uma típica tarde quente nas redondezas. Lisa notou, com preocupação, que já não havia o mesmo número de cidadãos ocupados varando a calçada cinzenta e emanadora de calor na qual confiavam seus passos, e muito menos em comparação com o resto das ruas praieiras que visitou. Eles já deixavam o cenário turístico e entravam num bairro predominantemente residencial.

Era uma verdadeira ironia. A vida. Lisa tinha se convencido dessa teoria. E, além de irônica, tinha uma atração inexplicável por armar brincadeirinhas doentias com sua cabeça. Realmente, era a única explicação plausível para o fato de que a pessoa a lhe oferecer ajuda também seria aquela que sofria mais do problema do qual ela estava tentando fugir. Não exatamente fugir, mas... bem, você entendeu. E era por causa disso que ela mantinha um pé atrás, enquanto ele corria na frente, carregado de animação.

–Do que está falando? -ela perguntou, fingindo que prestava alguma mínima atenção às palavras que saíam daqueles lábios sensacionais.

–Ah, é! Esqueci. Você não sabe nada sobre renascidos. -Ele pareceu lembrar que ela estava lá atrás, e voltou até uma distância na qual pudesse ser ouvido. -Bem, eu não consigo explicar muito bem isso, mas nós temos uma certa tendência a nos encontrar. É como se fôssemos atraídos uns pelos outros. O conselho acha que é porque todos viemos do mesmo universo, e estamos todos presos em um mundo estranho. No fim, somos todos iguais: desesperados para encontrar nosso lugar. Por isso, nos entendemos bem.

Aquilo não podia estar acontecendo. Não com ela.

Por quê?

–Mesmo universo? Conselho? -Lisa tentou acompanhar, seu diário espremido entre seu braço esquerdo e seu peito. Ela verificou ligeiramente, por baixo da blusa, se a faca curta ainda estava em sua cintura. Só por precaução.

–É. Eu vou explicar melhor. Só me dê um minuto.

Na verdade, ele não precisava explicar nada. Ela sabia exatamente do que ele falava. Tivera muito mais experiência do que gostaria com aquela história de renascidos. MUITO mais. Mas o fato era que tivera experiência. E, no entanto, continuava a mentir, não sabia por que. Talvez não conseguisse suportar a ideia de dizer aquilo em voz alta.

Suas mãos grandes voaram aos bolsos da calça jeans, e logo depois veio o já famoso olhar de cachorrinho, olhando diretamente para as feições desconcertadas de Lisa. Sim, Matt continuava lindo. Tão lindo que ela queria se jogar aos seus braços e cavalgar num cavalo branco em direção ao alvorecer, por mais brega que isso soasse. E isso era o que fazia tudo ser mais trágico. Porque não conseguia mais pôr os olhos nele sem pensar que estava seguindo um lunático.

–E quando você descobriu que era um desses... -não acreditava que estava indagando isso. -... renascidos de quem fala?

A resposta veio entre suspiros, como se a memória lhe doesse ao pensar:

–Já faz uns meses. Um pouco mais de seis. Eu tive que me mudar para cá.

–Mas se você mora aqui, por que estava... por que estava...

–Eu sei que você vai ficar assustada se eu falar... mas eu entrei naquele ônibus para te seguir. -ele disse com um desconforto preocupante na voz. Se perguntou se ele esperava que se conformasse com aquilo. De alguma forma, ele lembrava um pouco seu pai, mas não quis nem remotamente pensar assim. -Você só precisa entender que eu fiz isso por um bom motivo. Nós dois somos pessoas muito especiais, Lisa. E quando eu te vi, eu soube que nós éramos iguais. Isso é outro fato engraçado sobre renascidos: com o tempo, conseguimos distinguir nossos semelhantes do resto. Requer muito estudo, mas não é impossível. Como eu disse, somos todos iguais.

–Iguais... -ela não conseguiu evitar direcionar seu olhar para baixo. -Podia me explicar melhor.

Então, ele desandou a falar. Lisa não se concentrava muito no rumo que seu monólogo tomava, embora tivesse, sim, notado uma certa repetição em suas frases, como se já as tivesse enfiadas bem fundo em seu cérebro, depois de tanto decorá-las. De qualquer forma, precisava dele distraído para mergulhar sossegada em seus pensamentos. Ela pôde ouvir algumas palavras perdidas, distinguidas no meio das outras pelo simples acaso, tais como "renascido" e "príncipe". Ele não a olhava mais, e sim a guiava pelas ruas vazias, e ela estranhamente o deixou fazê-lo.

Príncipe...

Lisa abriu seu diário e, verificando se o garoto não a olhava (ele continuava no monólogo), tirou o livrinho azul de lá às pressas, folheando-o em busca de algo que pudesse conter algum tipo de identificação para Matt. Afinal, ele não era nenhum louco, certo? Nem ela.

Certo?

Ela passou as páginas com cuidado, prestando atenção nas imagens que cada história exibia. Passou por um menino loiro, uma garota de cabelos encaracolados fofinha, Bruce (esse a arrancou um ruído surpreso) e Alison. A página seguinte tinha uma história particularmente grande, com letrinhas miúdas e redondinhas, e o título de "A Bela Adormecida".

E por que era curiosa? Porque a imagem não era da Bela Adormecida, muito menos de uma menina. Era uma foto quadrada de Matt, usando um chapeuzinho muito ridículo para esconder seus cabelos castanhos e uma capa vermelha. Não sorria aquele seu sorrisinho de covinhas; pelo contrário! Tinha uma cara séria e determinada e brandia uma espada e um escudo, que leu no texto embaixo alguma coisa a respeito. Algo como "espada da verdade" e "escudo da virtude".

Ficou um tempo desligada do mundo, apenas andando e observando o jeito que a luz do sol insidia naquela foto tão verdadeira, tão precisa, e tão descaradamente falsa. Matt estava lindo nela, e não deixava Lisa parar de pensar em se ele tivesse, de verdade, um cavalo branco. O Príncipe Felipe tinha um.

Quando recobrou o juízo, fechou o livrinho com tanta rapidez que poderia jurar tê-lo ouvido estalar, mesmo sabendo que era leve demais para fazer um barulho muito grande.

Mas o que ela estava fazendo? Não podia se deixar levar por um par de olhinhos bonitos e um sorrisinho fofo! Renascidos não existiam. E convencer-se de qualquer outra ideia por causa de atributos físicos alheios -e, a verdade deve ser dita, atraentes- seria admitir que ela era tão doida quanto Matt. Se convencer do contrário, não importa o motivo, era abraçar sua própria loucura. Além de admitir para si mesma que Rider estava certo.

E ela não queria fazer isso.

Não, ela não iria pensar naquilo. Você não encontra príncipes andando por Miami na vida real. Apenas em livros e filmes extremamente ruins. E ali era a vida real, onde dragões, ogros ou o que quer que seja não existiam. Ela teria de viver com as consequências disso. Não podia deixar-se enlouquecer como o resto da sua família. Não podia...

Foi quando sentiu uma coisa quente em sua mão direita. No início, não notou muito, pois estava ocupada se preocupando com a sua vida, mas ela tomou um pequeno susto ao senti-la sendo apertada, em câmera lenta, por uma superfície fofa e aquecedora. Ela olhou para cima, e Matt, de repente, havia parado de falar. Ele sorria bobamente enquanto segurava sua mão na dela.

Ele perguntou:

–Você está bem?

–s-s-sim? -ela conseguiu gaguejar, e, separando suas mãos rapidamente, guardou o livrinho dentro do diário num microssegundo.

E, não sabia como, tudo parecia menor. Por algum motivo, ele realmente merecia o título de príncipe, como mais! Era inevitável para ela se sentir como uma princesa, ao seu lado. E não existia sensação melhor.

–Tudo bem. É demais para absorver, eu sei. Mas você está indo bem. -ele apertou novamente a mão contra a dela. -Vamos, estamos quase chegando.

A casa para onde ele a guiava estava bem no meio de uma das três ruas arborizadas que margeavam um pequeno parque, com playground, pista de cooper e tudo o mais. Naquela rua, as construções eram todas semelhantes: de classe média alta, dois andares, paredes brancas e luxuosas. Matt a levou até uma delas, uma particularmente grande e bonita, com um telhado escuro simples. Mas, ao invés de seguir até a porta da frente, ele arrodeou-a e, depois de um tempinho, foi bater na porta dos fundos.

O quintal de trás dava para um terraço ensolarado com piscina, rodeado por árvores em todos os lados. Tinha até um pequena e robusta palmeira perto da espreguiçadeira (detalhe: era a primeira palmeira que Lisa via na vida). Um pouco mais à frente, o piso de madeira ia dar em uma porta humilde, na qual Matt bateu de um jeito engraçado: duas batidas lentas, uma rápida, uma lenta, uma lenta e, por último, mais uma lenta.

Lisa não havia lido muito sobre o assunto, e com certeza não podia se considerar uma expert, mas lembrava, no fundo de sua memória, algumas informações sobre o que era o código Morse. Ela sabia que duas batidas lentas significavam a letra "M", mas era só. Não conseguiu decifrar o resto.

Matt a olhou, entusiasmado, e respondeu à sua pergunta como se lesse seus pensamentos:

–É como se soletra "Matt" em código Morse. É assim que nos comunicamos, por aqui.

Ela rezou com toda a sua força para que esse não fosse o caso. Porque, se o fosse, ele saberia o que ela pensava sobre a imagem encantadora do sol da tarde batendo em seu rosto.

Quem atendeu a porta foi uma garota com cara de madura, que mantinha uma expressão de raiva para Matt. Era branca e de cabelos negros, amarrados em uma trancinha lateral muito bem feita, com uma singular mecha azul-clara se misturando ao resto da imensidão escura. Ela era mais alta que Lisa, mas não o suficiente para não ser considerada uma baixinha por Matt. Usava um shortinho jeans e uma camiseta cinza surrada por baixo da jaqueta de couro preta.

Ela cruzou os braços:

–Matthew Sikes! Onde você pensa que estava? -perguntou, mas não com voz de chata. Parecia genuinamente preocupada. Então, ela olhou para Lisa: seus olhos castanhos confusos brilhavam. -Quem é ela?

–Lisa, essa é a minha amiga Lucy. Lucy Zimmer. -Matt apresentou-as. Depois, dirigiu-se especialmente à outra. -Encontrei ela na rodoviária.

Ela arqueou uma das sobrancelhas negras para Matt, mas um surto de surpresa a atingiu quando percebeu do que ele falava.

–Mais uma? -ela perguntou, sendo confirmada pelo garoto. -Ah!! Esses renascidos resolveram cair de paraquedas aqui, esses dias. Não me entenda mal, Lisa. Não tenho problema nenhum com você, mas é que as coisas não têm ido muito bem. -falou, fazendo um gesto com a mão para eles a seguirem casa adentro. A porta dos fundos dava para uma cozinha toda enfeitada com azulejos brancos. Em cima do fogão, uma frigideira vermelha assava uma omelete. -E o que diabos você estava fazendo na rodoviária, Matt? Marcamos uma reunião hoje. Para tomar nota do que está acontecendo.

Lisa ficou calada diante da conversa daqueles dois. Em parte porque não fazia ideia do que eles estavam falando, e do porquê de precisarem tomar nota de qualquer coisa que seja. Ela só sabia que não fazia sentido ela estar ali. Tinha que ir embora.

Mas não foi.

–Vão caber todos na casa da árvore? -Matt indagou, olhando atentamente para a omelete recheada que Lucy acabava de tirar do fogo e colocar em um prato de plástico rosa com desenho de corações.

Ela virou-se abruptamente para ele, o que o fez desviar o olhar da comida.

–Não é questão "será que vão caber". Eles vão ter que caber. -ela disse, fazendo uma cara de nojo para o prato. -Eca. Detesto rosa.

Lisa riu o mais discretamente que conseguiu, com o comentário. Tinha que admitir: o garoto podia ser o louco que fosse, mas sabia escolher bem as amizades. Lucy parecia tudo o que ela não conseguia ser: falava alto, ria alto, não tinha medo dizer o que pensava. Mesmo que fosse algo estúpido como “Detesto rosa”. Tinha atitude e, notou ela, era autêntica. Quando ela repreendera Matt, tinha a sensação de que o fazia por achar ser mesmo o certo a se fazer. E Lisa admirou isso no primeiro segundo em que a viu.

–Se importa? -Matt apontou para a omelete.

–Hmmm... –ela sorriu. -Minha mãe tinha me "pedido" para fazer o almoço dela. Mas sou rebelde.

Disse isso e entregou-a para ele.

Matt apoiou a comida na mesa de madeira da cozinha, assim, sem cerimônias, como se já fosse de casa. Antes de puxar uma cadeira, porém, andou até o outro lado do móvel e sinalizou a cadeira à frente da que estava prestes a se sentar, olhando para Lisa com uma expressão que dizia algo como "damas primeiro!". Ela recusou a pedido, mas ele insistiu tanto que teve que se sentar. E provar um pedacinho.

A omelete estava uma delícia. Talvez porque fazia muito tempo desde que ela comera, de fato, alguma coisa. Mas era evidente que Lucy tinha talento para a culinária. O recheio era de queijo e presunto, mas ela não pensaria duas vezes antes de chutar que era ambrosia.

Lucy, percebeu ela, também tinha uma certa inquietação. Ao menos no momento. Ela andava frenética de um lado para o outro da cozinha, checando as panelas sujas na pia, a toalha de mesa, o pano de prato. Abriu o lixeiro uma ou duas vezes para jogar as cascas dos ovos que usara, e continuava cruzando o cômodo com pressa. Sua trança remexia-se de um lado para o outro enquanto ela organizava cada simples coisa no balcão de granito, localizado à direita da mesa.

–Então, por falar em não caber... -Matt comentou, interrompendo a corrida impulsiva de Lucy. Lisa achou fofo o fato de ele ter esperado engolir o pedaço de que mastigava antes de falar. Diferente de Rider, que cuspiria migalhas de comida a cada palavra. -Lisa não tem para onde ir.

Ela não tinha certeza de como ele sabia disso. Achou que ele devia ter deduzido, devido ao fato de que ela estava indo embora da cidade quando se encontraram. E não ia negar que tinha, sim, um pouquinho de cara de estrangeira. Ainda assim, estranhou Matt por dizer aquilo com tanta certeza.

No final das contas, não protestou. Aquela era a verdade.

–Mas as casas estão todas lotadas! -Lucy rebateu, com um tom mais alto do que o normal. Imediatamente, puxou seu celular do bolso e começou a digitar um número.

–Eu sei! -em um pulo, Matt saiu da sua cadeira e tirou o celular da sua mão. -Eu estava pensando se ela não poderia ficar... bem, aqui.

Ela pareceu finalmente se acalmar assim que ele o fez.

–Oh. Tá. -a garota recuou, apontando para a porta que dava acesso à sala. -Eu... vou ver se tem lugar lá atrás.

Com o passo em falso, saiu da sala às pressas, enfiando o celular novamente no bolso do short jeans. A porta da cozinha bateu com um grande estrondo.

Lisa apoiou a cabeça em uma das mãos, preocupada. Passado um tempo, notou a portinhola, uma pequenina passagem para animais na parte de baixo da porta.

Aquilo, por mais que não quisesse, a lembrou de Mike. Imaginou ele se apertando para passar pelo espaço diminuto, como um bichinho de estimação faria. Uma cena hilária. Ela sentiria falta do grandalhão. Assim como sentiria falta dos outros.

Mas ela não podia pensar nisso agora. Apenas precisava achar um jeito de sobreviver sozinha.

Enquanto ela encarava a passagem, saiu de lá um cachorrinho schnauzer cinzento, de pernas curtas que moviam-se com rapidez. Ele foi se alojar animadamente no pé da mesa, bem próximo a Lisa.

–Desculpa por isso. Ela só está acostumada a ter que resolver todos os problemas sozinha. -disse Matt, de volta ao assento. Espetava um pedaço suculento de omelete com o garfo. -Lucy é uma de nossas conselheiras. Ela é a Chapeuzinho Vermelho.

Lisa lançou-o um olhar confuso.

–Tá. É melhor eu explicitar o que o "nós" significa. Sabe, Lisa, há uns dois ou três anos, um grupo de três renascidos vivia aqui.

–Aqui? -ela perguntou, a testa franzida.

–Não, não aqui, nessa casa. Em Coral Way. -ele explicou, sem tirar o sorriso maravilhoso da cara. -Um dia, eles encontraram uma coisa voando por entre as árvores. Uma coisa que mudaria suas vidas para sempre. Eles foram atrás da coisa, e foi assim que eles descobriram que eles não eram simplesmente eles. Mas sim reencarnações de antigos personagens de contos de fadas. -ele parou, já esperando a confirmação de Lisa com a cabeça. -Lucy era uma desses três. Eles começaram a se encontrar praticamente todo dia, para conversar e, sei lá, tentar descobrir mais sobre essa gigante bola de neve em que estavam metidos. E sabiam que deviam encobrir tudo, especialmente quando os pais se perguntavam o porquê dos encontros. Então, eles criaram a desculpa de estarem se encontrando para estudar com uma espécie de clube para superdotados, o "grupo de estudo". Funcionou, já que eles moram no mesmo bairro e, consequentemente, estudam na mesma escola, e ainda rendeu um nome bem legal para nós.

Lisa poderia ter ficado boa parte do dia, se não o dia inteiro, apenas sentada ali, ouvindo Matt falar. De alguma forma, ele fazia tudo parecer bem mais simples. Mais fácil. Como se toda aquela bagunça fosse uma história épica de aventura, onde tudo rumava para um grande "final feliz".

Nesse caso, ele seria o bravo herói com uma armadura brilhante.

–Ai, Vagabundo! Sai da frente! -Lucy, de repente, invadiu a cozinha rapidamente, tropeçando no cachorrinho no processo. Só então Lisa percebeu que era assim que ele se chamava. -Esse cachorro só serve para comer, dormir e me atropelar, nunca vi. Por que eu tenho que te amar tanto, seu imprestável?

Ela agachou-se para fazer carinho no animal, que retribuiu o gracejo pulando, excitado, em sua dona. Logo depois se juntou a Lisa e Matt, encostando em uma das paredes de azulejos.

–Olha, tem uma cama velha guardada no porão. Não é a mais bem conservada, mas com um colchão fofinho, quem sabe... o que você acha, Lisa? -ela lançou um olhar sugestivo para Matt. -Concordo que um certo egoísta bem que podia dividir a casa de rico dele com alguém, né?

Lisa acompanhou seu olhar, confusa. Casa de rico?

Matt engoliu um pedaço de omelete, deixando o último educadamente para Lisa. Ele virou-se na cadeira para fitar os olhos castanhos da garota e disse:

–Você sabe que o meu pai a encheria com todo aquele entusiasmo de "Meu Deus, você trouxe uma garota!" e tudo o mais. Coitada.

Lisa não achou aquela ideia tão ruim assim. Se bem que não aguentaria de vergonha, conviver com um pai constrangedor em tempo integral. Não era difícil para ela ficar constrangida.

Lucy tinha o olhar baixo.

–Bom, uma coisa eu posso garantir: -disse, os braços cruzados em sintonia com a expressão de tristeza. -Meus pais não vão nem notar sua existência, aqui. Nem que esfregássemos na cara deles.

Ela pôs-se a mexer nos fios soltos da trança, o nariz afilado apontando para o chão, feito de granito, assim como o balcão.

Aquilo era mais um lamento que uma informação.

Vendo os dois amigos discutirem sobre o lugar em que Lisa deveria ficar, ela não pôde deixar de se sentir um tanto desconfortável. Não queria ser motivo de briga ou de sofrimento para nenhum dos dois. Sem dúvida, haviam tocado em um assunto delicado para Lucy, que, então, tentava esconder ao máximo sua expressão triste dos outros dois na sala. Logo Lucy, garota que, à primeira vista, parecia tão segura de si, cheia de vida e forte (caramba, qualquer um que conseguisse olhar nos olhos de Matt e o repreender merecia um prêmio!).

Ela se sentia culpada. Não queria trazer aqueles sentimentos à tona para ninguém. Ela mesma já o havia experimentado o bastante. Não exigiria demais dos dois, que já estavam sendo gentis com ela, de graça.

–Aqui está ótimo. -falou baixinho, sem querer chamar muita atenção. Isso claramente não funcionou, uma vez o simples fato de ela estar falando alguma coisa já arrancou suspiros surpresos de seus dois novos conhecidos.

A atmosfera ficou meio estranha ao redor deles, com os dois olhando para ela sem saber o dizer. E se tinha uma coisa que Lisa odiava, era que ficassem encarando-a. Ela já se arrependia de ter dito aquilo, e já sentia seu rosto ficar vermelho, um calor chato tomando conta do seu corpo. Mas Matt, ao perceber isso, tratou logo de cortar a estranheza.

–Eu estava contando para ela justamente a história do nosso grupo. –ele apoiou a cabeça em seus braços cruzados sobre a mesa, totalmente à vontade.

–Fofoqueiro! Não consegue ficar sem mostrar os dentes impressionantes que você tem para as pessoas! -iluminou-se Lucy, parecendo recuperar-se rapidamente da onda de tristeza sofrida. Ou talvez só estava tentando disfarçar seu sofrimento. Seja o que fosse, Lisa a admirava por isso. -Então, Lisa? Quer conhecê-la?

Lisa surpreendeu-se ao ver que os olhares estavam novamente em cima dela. Ela não sabia que resposta dar para eles. Afinal, quem era essa que ela devia conhecer? Olhou institivamente para Matt, buscando uma resposta.

–Quando ela diz conhecê-la, ela quer dizer a coisa que eles acharam voando por entre as árvores. –ele disse, adivinhando, de novo, o que se passava por sua cabeça. Pena que não foi muito eficiente em esclarecer as coisas.

Lucy começou a abrir uma gaveta atrás da outra, procurar nas prateleira e na despensa a suposta coisa que Lisa deveria conhecer.

–Deve estar em algum lugar... Aqui! –ela gritou, puxando um pote de vidro de uma das gavetas mais escondidas, no fundo da cozinha. -É linda, não é?

Quando Lucy colocou o pote em cima da mesa e tirou a mão dele, o queixo de Lisa precisou fazer um certo esforço para não cair.

Claro, não tinha nada a ver com o pote. Este era de vidro liso comum, com uma tampa comum, daqueles de guardar pepino em conserva. Mas o que estava dentro dele, isso sim, era algo incomum. Lisa teria chutado que se tratava um vagalume (embora não soubesse o que de tão teria um inseto, que ela precisava conhecer), com todo o brilho amarelo que se movimentava de um lado para o outro no recipiente, por vezes batendo no vidro e caindo no fundo. Depois, ela percebeu que alguns mini brilhinhos se acumulavam nesse fundo, bem como em outras partes do pote, como grãos de pólen brilhantes. Pó, talvez.

E foi então que o vagalume se apagou, revelando o que não imaginaria nem se tentasse: um ser pequeno e alado, brilhante e loiro, usando um vestidinho verde-claro curto, feito de folhas. Seu cabelinho estava preso alto em um coque bagunçado loiro; os sapatos, também verdes, tinham pompons nas pontas que mais pareciam pedacinhos de algodão. Ela tinha uma varinha entre os dedos e, de braços cruzados, a cara emburrada, agitava a cabecinha para lá e para cá, reclamando com Lisa. Ela emitia um barulhinho de sino no lugar da voz, e soltava o pozinho brilhante que se acumulava por todo canto que passava.

–Velho truque. Quando você ajuda uma fada, ela é obrigada a lhe ajudar, em retorno. E isso inclui tirá-la de uma prisão. Digamos, de um pote. Óbvio que a regra não diz nada sobre tirá-la de uma prisão que você mesmo proporcionou. É assim que conseguimos nossa magia. –adiantou-se Matt em explicar. -Sininho é pequena, então não consegue fazer mágicas muito significantes, mas ela pode te dar o poder de fazer armas desaparecerem e aparecerem quando bem entender.

Ela precisava de um tempo para processar aquilo.

Olhava boquiaberta para o serzinho mágico do pote. Estava ali. Tantas horas intermináveis de negação, de resistência de repente não importavam mais. Porque ela estava, sim, ali. Uma fada sólida, ao vivo e a cores, dentro de um pote, em uma casa simplória de Miami. Era confusão demais para ela aguentar.

Lisa levantou o olhar, bem a tempo de espiar os dois rostos sorridentes de Matt e Lucy, encarando a criaturinha tilintante. E, pela primeira vez, ela sentiu que poderia encontrar amigos naqueles dois.

–Uau! -exclamou uma quarta voz no cômodo.

Todos imediatamente procuraram pelo dono da animada voz desconhecida, até que, na mesma porta pela qual entraram Lisa e Matt, aberta por algum motivo, surgiu um garotinho simpático, de cabelos pretos e um sorriso excitado de orelha a orelha. Lisa calculou que ele não deveria ter mais que uns dez anos.

–Te conheço, garoto? –Lucy perguntou, enquanto tirava da mesa o prato de omelete. Assim mesmo, sem um “oi” ou “tudo bem?”. O que Lisa deveria ter achado falta de educação, mas na hora, achou muito engraçado.

O menininho tinha um brilho diferente em seus olhos verdes vivos. Usava uma camiseta folgada com um símbolo enorme do Super Homem e bermudas jeans.

–Não, senhora! Dan Stoorey se apresentando, senhora! –o garoto assumiu posição de sentido. -Trago mensagens de Vincent e Paige, que aprovam a reunião e já estão contatando os outros! E essa é a coisa mais maneira que eu já vi na vida!!!

Lisa não entendeu a natureza daquela frase, mas Lucy, sim.

–Tá legal. Dispensado, soldado! –a garota disse, rindo-se do jeito intrigado que o garotinho encarava a fada ao sair de fininho pelos fundos. Quando ele já estava fora de vista, ela jogou um amontoado de pratos na pia ao lado do fogão. -Ai ai, mais um. Não vai caber todo mundo na casa da árvore. Lisa, se você quiser, posso te oferecer meu banheiro. Para acabar com essa...

–SIM, POR FAVOR! –Lisa gritou, em um desespero aliviado. Ela nunca saberia, na verdade, o fim daquela frase. Porém, estava disposta a deixar os bons modos de lado por um banheiro. Um verdadeiro, com chuveiro e água quente. Parecia até um sonho! E, aparentemente, sua atitude exaltada também fez Lucy e Matt rirem um pouco. Normalmente, ela teria ficado com vergonha disso, mas se sentia otimista. Finalmente, sentia que tinha alguém com quem contar naquela cidade estranha. Loucos? Talvez... mas eles demonstravam se importarem com sua segurança. Além do mais, se eles quisessem matá-la, ou algo do gênero, já o teriam feito.

Certo?

Matt chegou por trás dela e pôs a mão em seu ombro amigavelmente, os olhos fixados nos seus.

–Mas vá logo. Não podemos nos atrasar para a reunião.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

bom, acho que eu não tenho perguntas para hoje, só o que vcs acharam do cap, mesmo. Postarei a segunda parte, com o resto dos personagens, quando eu puder. quem quiser, faz alguma pergunta no comentários!! Ficarei feliz em responder