A Lágrima Escarlate escrita por SorahKetsu


Capítulo 18
Suspeitas e Intrigas




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No dia seguinte, o corredor da sétima série, durante o intervalo estava tão lotado quanto no dia anterior, sem grandes mudanças, como já se esperava. Só não se esperava que fosse tão difícil abrir espaço para o mural onde ficava a tabela de atividades da Ed. Física. Foi preciso muito esforço para que todos conseguissem ter uma boa visão das modalidades e horários. E quando finalmente conseguiram, tiveram de escolher sobre pressão, devido ao curto espaço de tempo para se decidir. Era óbvio que tanto Sorah quanto Dart entrariam para as aulas de Karatê. Nicka se interessara por saber o que era vôlei. Hebel a seguira, apenas para dar apoio. Enquanto Sabrina e Mirian entraram para a Capoeira. Somente esta e Karatê seriam naquela terça-feira, uma vez que era o mesmo professor para ambas. Uma hora e meia para cada atividade, sendo a primeira, de Sabrina e Mirian às duas horas daquele mesmo dia.

O sinal tocou assim que entregaram os papéis de inscrição na diretoria. A aula seguinte era Matemática. E pode-se dizer que a reação de Viviane foi a mais estranha dentre todas ao rever as alunas. Apenas ela tinha tido alguma mudança brusca na aparência física, pois pintara (ou deixara de pintar) o cabelo. Estava quase tão ruiva quanto Sabrina, o que já era bem difícil. No dia estava com uma saia branca na altura dos joelhos e uma blusinha rosa-bebê cheia de bordados. Sempre foi bem delicada. Cumprimentou Sabrina com um abraço apertado. O mesmo fez com Mirian, como se soubesse por tudo que passaram. E a mesma reação de Sorah com relação a Roberto também foi atribuída a ela. Um olhar estranho, curioso. Talvez desconfiado. E tão irritado quanto. Já Dart se preocupava mais em ficar de olho em Sorah, para que não cometesse nenhuma besteira. Mas nada dessa preocupação parecia merecida à gentileza em pessoa que era Viviane.

Além da mesma desconfiança, Sorah também não falou nem comentou nada com ninguém, como havia feito antes. Mas a conversa que tivera com Dart se repetira naquela tarde, enquanto todos almoçavam e os dois lifings já haviam acabado de comer. Sabrina deu um jeito de seguí-lo e quase a mesma conversa se desenrolara ali. Com destaque para o fato de que o humano a que se referiam agora era na verdade “humana”. As pessoas de seu mundo talvez sejam estranhas aos olhos e sentidos dos lifings, como pensara Sabrina. Mas apenas esses professores foram alvos de suspeita para eles e também à Belthor, como se recordou. Eles podiam ter realmente alguma coisa com tudo aquilo?

Logo o relógio anunciara faltar apenas alguns minutos para o início da aula de Capoeira. Sabrina saiu apressada sem muito tempo para se trocar. Os demais a seguiram, para aprender mais alguma coisa sobre o modo de vida naquele mundo. E também para não se arriscarem a quebrar alguma coisa enquanto Lia saía de casa para levá-la.

Encontrou Mirian já pronta, com um quimono caro, como já se esperava dela. Tinha alguns emblemas bordados. Todo especial para praticar aquele tipo de luta. Enquanto Sabrina se contentava com a roupa da escola mesmo, e uma camiseta regata branca.

Claro que só perceberam que estavam muito mais fortes que os demais alunos, inclusive os veteranos, quando quase quebraram o nariz de um deles. Mesmo assim, a aula foi muito mais decepcionante do que esperavam. Tinham a força e a habilidade de luta. Mas nenhum conhecimento sobre aquele tipo em especial. Não podiam acertar de verdade o adversário e tudo parecia mais uma dança amistosa. Ainda assim, a agilidade e a ginga que adquiririam seria de grande utilidade incrementadas à força e habilidade que já possuíam. Portanto não desistiriam fácil. Ainda mais agora, que eram uma das pouquíssimas meninas que a praticavam. Claro que bateu um arrependimento por não terem se inscrito em Karatê, mas isso logo passou quando se lembraram que Sorah e Dart estavam nesta aula. Estes assistiram com bastante sono cada tombo que Sabrina acabava sempre levando, tentando impressionar o lifing. Sentiram como se o tempo tivesse parado e sua hora de lutar nunca chegasse. Para o bem dos alunos capoeiristas, finalmente o tempo se esgotou e os alunos karatecas começaram a entrar. Aliás, “alunos” não é um modo de generalizar. Realmente só entraram homens. Houve apenas uma menina, atrasada, que entrou amarrando a faixa marrom na cintura. Usava rabo de cavalo e tinha uma expressão quase tão intimidadora quanto a de Sorah. Talvez a lifing só ganhasse por ter olhos amarelos e caninos maiores que o normal, o que lhe dava uma grande vantagem quando se tratava de intimidação.

No entanto, a maior surpresa do dia foi a entrada calma entre os demais alunos da pessoa que menos esperavam estar ali. Era Roberto, usando uma faixa verde, que lhe dava experiência razoável na luta.

Dart preocupou-se com o tipo de reação de Sorah. Mas ela apenas deu um sorriso curto, satisfeita. Aliás, era exatamente esse tipo de reação que Dart temia.

Ambos os lifings imitaram os demais alunos ao curvar-se perante a bandeira japonesa suspenda no centro da parede da sala bem iluminada antes de entrarem no tatame. O professor era negro, alto e forte, de cabeça raspada. Mantinha-se de braços cruzados enquanto as pessoas se arrumavam em cinco filas de quatro pessoas cada, ao longo do tatame, com um espaço de quase um metro e meio entre elas. Dart e Sorah se incluíram numa das fileiras, sem tirar os olhos um único segundo de Roberto.

O mestre passou por todos, ainda parando para perguntar o nome dos dois novos alunos. Ao fazer isso, voltou para o centro, à frente das pessoas e começou a falar, de peito estufado:

- Nós podemos ser apenas uma matéria do currículo escolar, mas este grupo de lutadores que tenho aqui é um dos melhores das academias da cidade. E queremos manter o título. Portanto, não tolero atrasos ou corpo mole. Não posso dar muita atenção a faixas brancas esse semestre, uma vez que o torneio se aproxima. Pretendo treinar aqueles que estiverem acima da faixa verde em especial, pois apenas estes poderão lutar no campeonato. Hoje vou testar a habilidades de cada um de vocês. Após correrem vinte voltas rotineiras em volta do tatame, façam duplas para lutarem aleatoriamente. Em posso querer interferir nas duplas. Comecem!

Se a intenção do treinador era assustar os dois novos alunos, passou bem longe. Os desapontou, na verdade. O treinamento extra não serviria de nada afinal, já que como aquecimento tinham apenas que correr um pouco em volta do tatame. Poderiam concluir a tarefa em no máximo cinco minutos caso usassem um pouco de velocidade real. Mas se controlaram, a pedido de Mirian. Como ela havia dito, alunos que acabaram de entrar na aula não ultrapassam os veteranos, muito menos terminam a prova sem derramar uma gota de suor.

Quando todos já haviam completado o aquecimento, incluindo uns pequenos faixas brancas da quinta série talvez, Sorah tentou pegar como dupla de luta o professor Roberto, mas o mestre de luta interferiu na escolha, colocando outro de nível mais avançado para enfrentar o faixa verde. O que deixou a lifing irritadíssima. Principalmente quando o professor de história lhe sorriu em tom de deboche, murmurando “cresce primeiro”. O que na verdade significava para se tornar mais forte, uma vez que Sorah era alguns centímetros mais alta que ele.

Sempre que tentava enfrentar alguém que não fosse do mesmo nível que ela, aparecia o professor para impedir a luta. No fim ela tinha apenas que se defender. E só podia fazer isso mesmo. Igualmente o que acontecia com Dart, que já havia desistido de enfrentar alguém mais forte. “Escolha alguém do seu tamanho. É melhor para ambos”, dizia o mestre, cada vez mais irritado sempre que via Sorah pronta para lutar contra um faixa marrom.

Enquanto defendia sem muito entusiasmo os ataques frenéticos e sem habilidade dos pequenos, a lifing notou que o professor treinava a prática com nuntchacos. Sabia usá-los muito bem. Aprenderam aos quarenta anos, o que representaria apenas quatro. Usaria isso para ganhar o direito de lutar contra adversários melhores.

Parou no meio de uma luta sem a menor graça e caminhou até o mestre, com a mesma expressão de desdém. Dart se desligara do próprio adversário para prestar atenção nos movimentos da lifing, com medo de que ela atacasse o humano.

- Olha, eu quero lutar contra níveis mais elevados. Eu sei que eu posso. Mas sei que você também acha que eu não consigo. Então fazemos o seguinte: Eu mostro o que sei fazer com nuntchacos, e provo que tenho tanta ou mais habilidade que esses seus alunos idiotas de quem tanto se orgulha. E você faz a sua parte deixando eu bater neles. O que acha?

- Você vai se machucar, garota. É nova e inexperiente demais para brincar com isso.

“Sou quase tão velha quanto a sua mãe”, pensou Sorah sem se preocupar em esconder sua raiva.

- Deixe-me tentar. A responsabilidade é minha.

O mestre olhou nos olhos amarelos de Sorah (certo de que eram lentes estranhas) e respirou fundo, ainda a encarando, tentado a recusar por puro orgulho, mas entregou a arma a ela, que se afastou e começou a fazer os movimentos.

A atenção de absolutamente todos os que estavam dentro daquela sala se desviaram até Sorah. A velocidade com que controlava o nuntchaco era impressionante, se pensar que era uma faixa branca quem os manuseava. E a habilidade empregada em cada difícil e perfeito movimento era muito maior do que a que o professor um dia sonhara em ter. Ela parecia profissional com a arma. Era tão impressionante, que para que os alunos não pensassem que seu professor era pior que uma simples iniciante em seu primeiro dia de aula, ele logo a parou, permitindo que lutasse com quem quisesse.

Enfrentou todos de níveis superiores que havia ali. Inclusive um faixa preta. Estavam todos impressionados com as habilidades da nova aluna. E conforme escolhia seus adversários, notava que alguns faixa azul e marrom se distanciavam dela, como se fugissem. Afinal, todos que a enfrentavam, acabavam no chão.

O último escolhido era Roberto. Sorah fez questão de lançar olhares a ele a cada vitória conquistada, como forma de intimidação. Deixara um garoto chorando no chão em sua última luta antes do confronto contra o professor. O apontara e murmurara “você é o próximo”, enquanto caminhava em sua direção. Ele, em seu quimono impecavelmente branco, estralou os dedos e o pescoço ao mesmo tempo, olhando-a de cima.

- Na sala eu sou seu professor. Aqui, sou seu adversário. Pode vir com tudo. – permitiu Roberto.

Era a oportunidade perfeita de descobrir o verdadeiro poder do humano. No dia anterior, fracassou em analisar a energia total de Roberto. Isso a intrigara e martelara durante muito tempo. Como um simples humano poderia esconder sua força tão perfeitamente se ela mesma teve de treinar décadas para ocultar com perfeição a sua? Além de treinar para descobrir a do adversário, mesmo que este use o mesmo truque que ela, diminuindo sua força aos sentidos das pessoas ao redor, dando a falsa impressão de que ela é na verdade muito fraca. E era uma das melhores nesse assunto. Humano nenhum deveria ser capaz de esconder a própria força de Sorah. E este já era o segundo só neste mundo. Viviane fizera o mesmo.

Maneirara no início, defendendo todos os ataques recebidos. Mas se surpreendeu muito quando todos os golpes que dava eram interceptados sem grande dificuldade por Roberto, que mantinha um sorriso irritante no rosto. Sua força empregada teve de ser aumentada gradativamente. Não podia usar as garras na frente de todos. Mas não adiantava o que fazia, ele se defendia e revidava. E mesmo assim, Sorah não conseguia identificar a força verdadeira do humano. Não podia acreditar no trabalho que aquela simples criatura estava dando-lhe. Estava suando! Quando fora a última vez que chegara a suar enquanto lutava contra um humano? Bem, na maioria das vezes não há luta, já que ela costumava os matar com um corte na jugular e os assistir sangrando. Mas não podia usar as garras e sua energia era cada vez mais necessária, e cada vez mais empregada. Não deixaria seu professor de história ganhar. Nem que fosse preciso matá-lo na frente de todos. No entanto, até mesmo isso parecia distante. Sentia-se como se fosse fraca demais para vencer. Fraca demais para vencer uma criatura daquela raça? Jamais! E assim, mais de sua energia antes oculta era empregada para ajudá-la a vencer. Os golpes estavam rápidos demais, e aumentavam a velocidade a cada segundo em que liberava mais energia para lutar. Mas as defesas dele não se abriam e ficavam mais rápidas continuamente, conforme Sorah o fazia com seus ataques. Sem nem mesmo perceber ou se importar, todos os demais alunos os observavam incrédulos.

Foi quando um pensamento lhe veio a mente. Da mesma forma com que ela estava lutando para descobrir a verdadeira força dele, ao mesmo tempo, Roberto poderia estar fazendo a mesma coisa com ela. E Sorah estava entregando de bandeja cada vez mais sua verdadeira força. Nesse exato momento, sua boca ficara seca. Parara imediatamente de fazer crescer sua energia. Tentaria usar apenas habilidade. O que não foi muito fácil. Ele continuava aumentando a potencia dos ataques e os reflexos. Com o decorrer da luta, ela passou a realmente precisar aumentar a força. Mas conteve-se. Seu corpo parecia implorar por mais energia. E era insuportavelmente doloroso forçar-se a utilizar mais poder do que se limitava. Fazia mais coisas do que a atual condição permitia. Cada soco parecia estar sendo recebido, ao invés de dado. Tudo isso simplesmente para que Roberto não descobrisse seu total poder. O que mais irritava era que ele fazia tudo isso sempre mantendo o mesmo nível. É claro que era impossível lutar como ele estava lutando com a força que parecia ter. E cada vez mais, forçava Sorah a aumentar sua força. Apesar de não o fazer, estava absolutamente decidida a ganhar. Virara caso de honra.

Começara a se cansar. Tornara-se tão doloroso que sua visão se embaraçara. Tudo começou a escurecer ao seu redor. Perderia os sentidos em breve. Tinha pouco tempo.

Felizmente e para grande sorte da lifing, uma de suas maiores qualidades era a velocidade. Sem se preocupar com os humanos que assistiam, utilizara toda que pôde num único e último ataque. Acertara a têmpora do professor de história, que caiu desmaiado instantaneamente. Após confirmar a própria vitória, Sorah sentiu uma dor aguda no estômago, resultado de um golpe muito forte na região. Fora todas as dores insuportáveis que pareciam tomar cada centímetro de seu corpo por ter se esforçado mais do que se limitou poder. A visão já prejudicada escureceu-se de vez, antes que se chocasse num som seco contra o tatame. Foi a última dor que sentiu antes de desmaiar.

Os sentidos voltaram de uma só vez. Foi quase como dormir. Afinal, só acordara algumas horas depois na casa de Lia, por mais que todos insistissem em levarem-na ao hospital. Lá fariam muitas perguntas que não teriam como responder. Como por exemplo, por que a lente de seus olhos não saía. Um caso a parte. O fato é que Sorah logo se deparou com um bando de humanos observando-a ao redor. Comentando o fato de ter acordado e perguntar-lhe o que havia acontecido. Precisou se esforçar para lembrar. Mas assim que o fez, desejou esquecer. Fechou os punhos com muita força e franziu o cenho. Respirava pesadamente. Poucas vezes estivera tão nervosa quanto agora aparentava. Sentou-se de olhos fechados, até tentando se acalmar, sem sucesso algum. Bateu na própria perna com tanta força que Hebel teve certeza de que se fosse na dele, a teria quebrado. Estava rosnando como um cachorro furioso. E o único no quarto de visitas da casa de Lia que não parecia surpreso era Dart.

- Afinal, o que aconteceu?

Sorah não parecia em condições de responder a pergunta de Nicka. Seus dentes estavam cerrados e não davam menção de se abrirem para falar. Foi Dart quem deu alguns passos à frente para responder.

- Ela usou mais força do que considera justo contra um humano. Isso a deixa frustrada. Nada de mais.

- Mas ela ganhou como era esperado, não ganhou? – quis saber Mirian, sem se tocar com a gravidade da situação. Após ter resposta afirmativa de Dart, continuou – Então, por que está assim? Seria ruim se perdesse… Mas ela ganhou… então… pra que todo esse escândalo?

Antes que qualquer um pudesse dar um palpite, Sorah se irritou mais ainda, alterando-se e gritando com os presentes:

- VOCÊS NÃO ENTENDEM? Era um humano! Um humano! E deixou a mim, uma lifing altamente treinada desmaiada por quase cinco horas! DEU PRA ENTENDER? E se querem saber… ele me deixou vencer. Ele poderia ter me matado a hora que quisesse. Mas queria saber qual era minha força total. Roberto percebeu que eu morreria antes de mostrá-la a ele. No meu último golpe… ele o interceptou instintivamente, mas tirou a mão para levar o golpe de propósito. SERÁ QUE VOCÊS ENTENDERAM AGORA? ELE NÃO PODE SER UM HUMANO COMUM! ISSO É TÃO IMPOSSÍVEL NESSE MUNDO QUANTO NA ILHA EID!

Um silêncio longo tomou conta do lugar, interrompido somente pela respiração alta e forçada de Sorah. Dart sabia bem de tudo isso, pois presenciara e tirara suas próprias conclusões. Apenas não sabia se deveria contar. Se Sorah não se irritaria quando ele dissesse aos humanos que ela enfrentara e praticamente perdera para um humano que também era seu professor de história.

- Então… o que fazemos agora? – Hebel interrompeu o silêncio apenas por fazê-lo.

- Deveríamos falar com Belthor. – sugeriu Mirian. – Ele estava desconfiado de Roberto, lembram-se?

- E de que iría ajudar? Não passava de desconfiança, mas não sabia nada sobre ele. Acho que Belthor sabe tanto sobre o professor quanto qualquer um de nós. – declarou Nicka.

- Tem uma idéia melhor?

- Acho que deveríamos investigá-lo. Sabe… podíamos chegar mais cedo na escola, ver o que acontece. Amanhã tem História. Ele vai estar lá para a primeira aula. – supôs Sabrina.

- Viviane também. – comentou Sorah olhando para o lençol simplesmente para não encarar os demais humanos.

- O que tem ela?

- Também é suspeita. Ela… é mais forte do que aparenta.

- Amanhã também tem Matemática, mas não acho que ela chegue no primeiro horário. Só dá uma aula e é a última, na sétima série. Pra que chegaria tão cedo?

- Então nos basearemos em estudar Roberto. Depois pensamos nela.

Lia considerou estranho o fato de Sabrina pedir para acordar às cinco da manhã e chegar a tempo de ver os portões da escola abrirem. Ninguém chegava esse horário. A única desculpa dada foi que não tiveram como fazer a lição de casa de Geografia, uma vez que supostamente estavam cansadas demais depois da primeira aula de ed. Física. Por fim, aceitou, ainda que emburrada. Não daria aula naquele dia e era sua chance de dormir até um pouco mais tarde. Normalmente professores comparecem mais cedo. Mas a hora que Sabrina queria chegar era exagero.

Seria perfeito. Mesmo que Roberto as pegasse seguindo-o, não poderia fazer nada contra elas na escola. Atacá-lo era a última opção. O observariam de longe, esperando que fizesse algo suspeito.

Dormiram assim que terminaram de jantar. Era mais ou menos dez da noite. Não seria assim tão difícil acordar as cinco, uma vez que Sorah sempre acordava esse horário, fazendo questão de chamar os demais de preguiçosos quando finalmente acordavam. Ainda assim Sabrina achava demais conseguir levantar seis da manhã sem ajuda do despertador.

Sorah os despertou puxando o cobertor de cada um sem a mínima delicadeza. Teve de lembrá-los do que fariam no dia para que se convencessem de que deveriam se levantar. Hebel ainda xingou e puxou a coberta de volta, voltando a dormir. Talvez nem tivesse acordado. Mas isso irritou a lifing (como se houvesse algo que não a irritasse) e a fez puxar o cobertor do rapaz novamente e ainda mirar um soco. A visão do punho de Sorah preparado para acertar seu nariz que mal havia se concertado direito de quando quebrou o fez cair da cama.

A casa estava silenciosa. Lia não havia levantado. Sabrina foi até seu quarto despertá-la e avisar que não queriam tomar café no dia para chegarem ainda mais cedo. A professora de Informática ficou brava, dizendo que a esta hora, a escola não tinha nem aberto para estudantes. Mas os levou, sem entender bem a situação, ainda que desconfiada. Nem se trocou direito. Tinha uma cara de sono que parecia não dormir à dias. Saiu com o cabelo despenteado mesmo. Os deixou em frente o portão ainda fechado, avisando que não conseguiriam entrar em menos de meia hora. Agradeceram do mesmo jeito e ficaram os seis parados em frente a escola fechada. Já havia quatro carros em frente, dos funcionários. Esperavam que um deles fosse de Roberto.

Decidiram-se por pular o muro de uns três metros. Poderia ser muito difícil, se já não estivesse acostumadas com esse tipo de coisa. Sorah e Dart saltaram e só pararam do outro lado, na grama fria devido ao orvalho. Os demais ainda tiveram que escalar para saltar para dentro. Foi consideravelmente fácil.

Não havia sinal de monitor ou professor ao redor. A escola estava fantasmagoricamente vazia. Nem os pássaros cantavam ainda, pois nem bem tinha amanhecido. Só o som dos grilos cantando nos arbustos podia ser ouvido.

Entraram no prédio, tomando todo cuidado para que o silêncio não fosse quebrado. Sorah ouviu o som de vozes quando passaram pelo corredor onde estava localizada a sala dos professores. Com gestos, avisou os demais. Sabrina e Mirian mostraram o caminho até lá.

Conforme se aproximavam, as vozes ficavam claras. Não poderia ser mais perfeito. Era Roberto conversando com Viviane. Isso as animou. Só foram parar quando estavam os seis encostados na parede ao lado da porta da sala dos professores.

- Eu poderia ter acabado com tudo ontem mesmo… - lamentou-se Roberto.

- Realmente. Teria acabado com tudo. Não só com elas, mas conosco também. Você não entende? Sorah poderá ser útil. – ele não disse nada em relação ao que ela estava dizendo. Depois de uma longa pausa, Viviane continuou, um pouco mais calma do que estava ao dizer as últimas palavras – Você descobriu o poder dela afinal?

- Não por completo. – confessou Roberto, um tanto desapontado. – Deve ter percebido o que eu estava fazendo. As outras não escondem muito bem a força, mas estão mais ou menos no mesmo nível. Eu tive que parar de lutar. Sorah poderia ter morrido. O que não seria nada mal…

- Não seja tolo. Sorah pode nos ajudar quando chegar a hora de uma das guardiãs ser eliminada.

- Mas Sorah já foi eliminada… - impacientou-se Roberto - não entendo o que você está falando. Sorah não é mais uma guardiã. Não há mais nada a se fazer com relação a isso.

- Não… Quando a terra é ameaçada, a lágrima reúne as guardiãs… o fato de Sabrina tê-la encontrado é a maior prova de que sob os olhos de Yume, Sorah ainda é uma guardiã. E uma ainda tem que ser eliminada.

- Mas quem afinal? Por que não posso matar aquela lifing? A lenda terá se cumprido como deve.

- Aquela lifing vai nos ajudar na hora de eliminar quem deve ser eliminada. Por enquanto não faremos nada.

- Vou confiar em você. Mas precisamos falar com Lia ainda hoje. É importante que nenhuma delas possa interferir em nossos planos. Tudo que… - Roberto parou de falar de repente. Sabrina sentiu um frio na espinha ainda maior do que o que já sentia ouvindo aquelas palavras. – Elas… estão aqui…

Sorah parara de respirar. Puxou a primeira pessoa que alcançou e correu até o fim do corredor. Os demais a seguiram, sentindo que Roberto e Viviane estavam bem atrás de si. Davam cada passo como se este fosse ser o último. Assim que o corredor acabou, viraram para um segundo corredor, jogaram-se contra a parede, respirando alto, esperando que ele não viesse atrás deles. Levaram um susto muito grande quando ele passou procurando-as. Se virasse a cabeça para a direita os veria. Mirian ia dizer alguma, concluindo para si mesma que ele já os havia visto, mas Nicka tapou sua boca com a mão.  Roberto passou reto sem vê-los. Fora procurar no restante do colégio. Assim que ele se foi, respiraram aliviados, se levantaram e correram para fora do prédio da escola.

- Uma de nós tem que ser eliminada? Pela… Sorah…? – desesperou-se Nicka.

Todos olharam para a lifing. Ela odiou essa desconfiança, mas não soube por que. Achou que, depois de tudo que fizera, depois de ter salvado a vida daquelas humanas, elas não tinham o menor direito de desconfiar dela.

- Eu não vou fazer nada que alguém me peça. Se eu matar alguma de vocês vai ser por vontade própria.

As humanas tiraram os olhos dela, voltando a si mesmas.

- Ouviram o que ele disse. Uma de nós tem que morrer.

Sabrina não estava prestando atenção na conversa. Seus olhos estavam vermelhos. Queria chorar, apesar de conter a vontade.

- Eles… mencionaram a Lia… O que eles… querem com a Lia? Será que… Vão matá-la?

- Não é por nada não, mas na minha opinião, a sua querida Lia é amiga deles. – opinou Sorah.

- O que quer dizer?

- Muito simples. Ela é tão forte quanto Roberto e Viviane. Assim como esses dois, eu também não consegui calcular a força dela. Além do mais, você também não é surda. “Precisamos falar com Lia ainda hoje”. Não me parece que eles querem matá-la.

- LIA NÃO É ASSASSINA!

- Cale-se! Eles podem nos ouvir, humana. O que ela é ou deixa de ser não vai mudar se você gritar.

- Eu vivi com ela durante treze anos e ela nunca tentou nada contra mim.

- Eu vivi com meu primeiro mestre durante quarenta anos até que ele resolveu que havia se cansado de mim e tentou me matar. Acho que ganhei. Então cale-se. Você os ouviu. Roberto e Viviane vão se encontrar com Lia hoje. É nossa chance.

Sabrina não disse mais nada. Estava assustada com o que Sorah havia dito, tanto sobre a própria lifing quanto sobre si mesmo. Não conversou com mais ninguém naquele dia.

Houve poucas conversas entre eles. Estavam com medo e curiosos demais. Mirian também gostava de Lia. Sempre foi sua professora preferida. Roberto nunca aparentou ser alguém especial, nunca demonstrou nada de anormal em suas aulas. Viviane então, tinha uma clara preferência por Sabrina e dentre todos os demais professores, era a mais gentil, calma e delicada… era estranho vendo-a falando sobre destruição ou mesmo dando uma bronca em alguém. Era muito difícil que ela alterasse a voz, mesmo em sala de aula. Tudo parecia tão anormal quanto realmente era.

A aula de História foi a coisa mais normal que ocorreu naquele dia. Ele a deu como se nada tivesse acontecido. Era simplesmente um professor passando sua matéria aos alunos e nada demais. Apesar dos olhares de Sorah agora estarem muito mais atentos. Provavelmente ela imaginava que ele fosse lhe virar um soco a qualquer momento. Cada vez que ele chegava perto, Sorah sentia um gosto amargo na boca, o gosto de uma derrota. Além da dor no estômago que parecia só doer quando ele passava ao lado da lifing. Ele ainda chegou a comentar a luta durante a aula. Fez elogios com a voz mais falsa possível, dizendo o quanto ela era forte.

- É melhor não chegarem muito perto da Sorah. Ela tem um soco de direita que é imbatível. – comentou enquanto conferia os cadernos dos alunos. – Faixa branca, mas muito forte, não é mesmo, Sorah?

- Não tanto quanto o senhor. – revidou a lifing, depositando na voz a raiva que estava sentindo no momento.

Mirando Roberto no fundo de seus olhos, fazia-o entender perfeitamente que sabia o que estava fazendo, ontem e hoje. Ele simplesmente riu, fazendo-se de inocente. Ela semicerrou os olhos de raiva. Roberto voltou-se aos cadernos, ainda dando um risinho de deboche. 

Apesar de não acreditar no que Sorah havia lhe dito, Sabrina olhou Lia de modo diferente ao vê-la quando foi buscá-los na escola. Tentava buscar em seu olhar algo que a incriminasse ou inocentasse. Não havia crime, mas ela era suspeita. A provável culpada de algo que não só não fez quanto nunca ocorreu. Algo ela tinha de anormal. Assim como Roberto e Viviane. Apesar de serem as últimas pessoas no mundo de quem se esperaria algo assim. Apesar de tudo, estavam todos estranhos, menos estes professores. Sorah era observada, Sabrina parecia nervosa, Mirian preocupada, Dart ansioso, Hebel confuso e Nicka com medo. A única reação estranha por parte de Lia foi estranhar as caras dos primos de Sabrina, da mesma e de Mirian. De resto, preparou o almoço como sempre fez. Sem deixar de ser vítima de desconfiança. Depois do que ouviram, ficaram com medo de serem envenenados por “saberem demais”. Mas acabaram comendo, já que nem Roberto nem Viviane tiveram tempo de terem conversado sobre o assunto com Lia e ela provavelmente não sabia de nada ainda.

- Eu vou precisar sair hoje. – avisou a professora de Informática no meio do almoço. Foi alvo da atenção de todos.

- Onde você vai? – perguntou Sabrina em tom sombrio.

- Reunião de professores.

Os presentes souberam muito bem no momento em que ouviram isso que significava que ela se encontraria somente com os professores de História e Matemática.

- Que horas?

- Lá pelas duas da tarde. – respondeu olhando no relógio.

- Tudo bem. – mentiu Sabrina. – Quero dizer… eu vou ficar bem… Nós vamos ficar bem. – corrigiu-se.

- Está nervosa? Aconteceu alguma coisa, Sabrina?

- Não… o que poderia ter acontecido…?

- Não sei… você nem tocou na comido direito…

“Quanto menor a dose do veneno, mais fácil é de tirá-lo do corpo”, pensou Sabrina afastando o prato com as mãos. “Se bem que dependendo do veneno, não importa a dose… então é melhor tomar logo tudo que é pra morrer mais rápido”. Esses pensamentos lhe pareceram cada vez mais absurdos. Lia era como uma mãe e jamais fará isso com ela, não importa o que Sorah dizia.

- Está ótimo… eu só não estou com muita fome…

“Melhor prevenir do que remediar”, concluiu, rindo dos próprios pensamentos.

- Então tudo bem… eu acho…

Assim que Hebel acabou de comer – foi o único com coragem o suficiente para comer tudo, ou simplesmente com fome suficiente – levantaram-se pedindo licença e correram para o quarto de visitas.

Lá pela uma da tarde, Sabrina saiu do quarto, procurando por Lia. Chamou-a algumas vezes, mas esta não respondeu. Concluiu que ela provavelmente já havia saído, apesar de ser muito cedo. Chamou todos para continuarem conversando na sala de estar.

No caminho para a sala, Sabrina parou em frente ao escritório de Lia. Fechado, como sempre. A humana não se lembrava de alguma vez na vida ter entrado ali ou mesmo de como era lá dentro. Mas nunca antes ficou curiosa em descobrir. É claro que antes Lia não era suspeita de saber tudo sobre ser uma guardiã e ainda por cima querer destruir uma delas. Pediu que os demais esperassem e colocou a mão na maçaneta da porta.

- Que lugar é esse aí? – perguntou Nicka.

- É o escritório da Lia. Ela nunca me deixou entrar. Quem sabe não descobrimos algo…

Girou a maçaneta devagar, ouvindo o clique seco que fazia. Estava destrancada. Abriu alguns centímetros. Viu uma cadeira giratória fazia em frente um computador muito mais moderno do que qualquer um que já tenha visto. Lia não estava ali e isso a acalmou de certa forma, pois temia que já que ela não estava em lugar algum da casa e era muito cedo para que tivesse saído, Lia estivesse em seu escritório.

Era uma salinha comum, sem muitos móveis, além da cadeira, do computador e da mesinha em que estava. E de um tapete de muito mau gosto.

Sabrina sentiu a espinha congelar-se ao ouvir a voz de Lia. Tentou fechar a porta, mas ela os vira antes disso. A professora parecia desesperada. Correu pra dentro de seu escritório, tampando com o corpo o computador e qualquer coisa que houvesse lá dentro e que por esperança, não tivessem visto.

- Sabrina, eu sei que ficou fora muito tempo, mas você sabe que não pode entrar aqui. – impacientou-se Lia muito mais nervosa do que queria aparentar.

- Eu sei, Lia, mas eu…

- Nada de mais! Eu vou trancar essa porta e você nunca mais vai abri-la. Entendeu bem? Nunca mais.

- Tudo bem, eu não vou mais abrir. – assegurou Sabrina, com cara de choro. Era a primeira vez que Lia gritava com ela.

- É bom. Eu… preciso ir agora.

Lia puxou uma chave pequena do bolso e trancou a porta. Caminhou apressada até a porta. Sua bolsa estava em cima da mesinha de centro da sala. Jogou a chave dentro dela, de modo que todos pudessem ver que a estava levando consigo. Saiu fechando a porta atrás de si e sem dizer mais nada.

- Tem que haver algo ali dentro… - comentou Nicka.

- Isso é óbvio. Mas o que poderia haver? Era só um computador!

- O que acham que tinha debaixo do tapete?

Todos olharam para Hebel. Só ele havia notado bem a existência do horrível tapete que estava naquela sala. Mirian por exemplo nem notou sua presença.

- Desculpe, mas… que tapete? – perguntou a guardiã da água.

- Vão dizer que não notaram? Ela não queria esconder o computador, queria esconder o tapete.

- O que pode haver demais num tapete? – estranhou Nicka.

- Hebel tem razão. – concordou Dart dando sua opinião – Ela entrou correndo e o ajeitou com o pé. Debaixo dele o som do piso é diferente, é oco. Temos que entrar aí de novo.

- A Lia me proibiu de abrir a porta… além do mais… ela trancou e levou a cha… - Sabrina se interrompeu ao ouvir o som da porta sendo perfurada com um soco de Sorah, o que a assustou bastante.

Em seguida foi a vez de Dart fazer sua parte, arrancando a fechadura. Nicka completou o serviço empurrando a porta com um só dedo. Que foi o suficiente para que ela se abrisse.

- Ai meu Deus… quando a Lia chegar…

- Quando ela chegar vai estar encrencada. Somos seis contra um. – acalmou Mirian.

Hebel afastou o tapete pelo piso de madeira. Havia um alçapão ali, com uma pequena porta cobrindo-o. Era na verdade um buraco escuro, que não se podia se ver nada.

- Vai você primeiro, Sorah. – pediu Sabrina.

- Eu por que?

- Porque não é uma guardiã e por tanto não faz falta.

- Repete isso, humana!

- Gente, a Lia vai chegar, dá pra vocês se apressarem? – implorou Mirian, dando um passo pra trás para não ser a primeira.

- Co-var-des. – disse Sorah pausadamente, enquanto pulava no escuro.

Nem bem Dart a seguiu, luzes foram acessas lá dentro. Não era uma queda muito alta, terminava numa sala ampla, muito bem iluminada. Era recoberta de metal resistente. Havia uma imensa porta lacrada à esquerda. À direita, quatro tubos estranhos, com água borbulhando e espadas dentro. Uma pra cada tubo. Eram enormes. Uma pessoa poderia ser mantida ali com muita folga. Na parte superior de cada um haviam canos e fios ligados num mesmo lugar do teto. Na frente deles, telas com botões e teclas, como se fosse um computador menor.

- Que lugar é esse…? – perguntou Sabrina pra si mesma, babando com o porão recém descoberto de sua casa.

- Se você morou a vida inteira aqui e não sabe, como agente vai saber?

- Não seja má, Nicka…

- Esse lugar é impressionante. – dizia Hebel enquanto girava sem sair do lugar, olhando para cima.

- Nunca vi tantas espadas desse tipo reunidas… - analisou Dart encostado num dos tubos. – Elas emanam energia como se estivessem vivas…

- Tem razão. – concordou Sorah ao seu lado – Sem duvida são espadas elementais. Minha nossa… Isso me traz péssimas recordações.

- Que bom que gostaram.

Lia surgiu de repente, saltando pelo mesmo lugar por onde entraram. Sabrina sentiu a espinha congelar. Todos que estavam na sala se assustaram, sem saber bem o que fazer. Aliás, não havia o que fazer. Nem como se explicarem. Haviam feito exatamente o que ela tinha dito para não fazerem e agora era tarde demais para qualquer explicação ou desculpa. Mentir também não era uma boa opção. Mesmo que houvesse alguma mentira a ser dita.

Poderia ter sido o maior susto do dia, não fosse que logo em seguida da entrada de Lia, entrasse Roberto e Viviane, com suas faces triunfantes, como um caçador que tivesse acabado de encurralar sua presa. Sabrina se sentiu traída. Quis gritar para que Lia se afastasse dos dois. Isso por que em sua cabeça, não entrara a idéia de que eles estavam juntos nisso.

- Lia, você deveria ensinar à Sabrina a não bisbilhotar… - aconselhou Roberto no tom mais irônico possível.

Mirian engoliu um seco. As entranhas dela davam cambalhotas. Sorah, apesar de não querer demonstrar, também estava nervosa. Em uma situação normal, partiria para cima dos “intrusos”, se bem que os intrusos no caso eram elas. À parte isso, a lifing conhecia um pouco da força de Roberto e sabia perfeitamente que seria a maior besteira que faria ao atacá-lo tendo além dele, Lia e Viviane. No entanto, era contra seus princípios deixar que alguém a assustasse. Normalmente esse era o seu papel.

- QUEM SÃO VOCÊ AFINAL? – Gritou Sorah.

- Mais respeito, Sorah… - pediu Roberto seguindo o tom irônico. – Sou seu professor, se esqueceu? Lifing maldita.

Foi como se os corações de todos parassem automaticamente. Ele sabia da existência de lifings e tinha sua opinião sobre eles. Era como se dissesse que veio da Ilha Eid.

- Cale a boca! Vocês não são nada! Vocês são só humanos!

- Ora, se somos só humanos, por que se preocupa tanto em saber quem somos? Impressiona-me que não nos reconheçam… Ou a derrota de ontem ainda está doendo? - perguntou Lia fingindo se preocupar. Esse tom de voz fez Sabrina se perguntar se ela era mesma Lia que conhecia.

- Mas é claro que eles não estão nos reconhecendo… - emendou Roberto olhando para os demais professores – Eles nos conhecem de outra forma.

- Tem razão. Então nos permita nos apresentar de melhor forma… Eu sou Mia, uma das guerreiras sobreviventes de Yume. – apresentou-se aquela que Sabrina conhecia como Lia, tirando uma máscara da bolsa e colocando sobre a face.

- Eu sou Íris. Devem me conhecer bem como uma das guerreiras de Yume, estou certa? – apresentou-se aquela que antes era a calma e gentil Viviane, professora de Matemática.

- E é claro… Eu sou Belthor.

Sorah ficou pálida. Não podia acreditar no que estava ouvindo. Perdeu para Belthor, o humano que mais despreza desde que soube de sua existência. Esteve perto dele todo esse tempo, sentindo sua energia, mas a raiva de não conseguir calculá-la por completo a cegou e nada mais importava. Estava lógico agora. E energia era mesmo a de Belthor. Quanto a Sabrina, mal podia acreditar que a mulher com quem viveu treze anos de sua vida era uma guerreira que um dia protegeu a mayle Yume.

- Não entendo… o que vocês pretendem nos revelando sua identidade? – perguntou Hebel, passado o susto.

- É claro que eu conheço muito bem Sabrina. – começou Mia – Eu sabia perfeitamente que ela não resistiria e acabaria me desobedecendo, entrando aqui. Isso era exatamente o que precisávamos.

- Ah, claro… para nos encurralar e nos matar… - concluiu Nicka.

- Não, não… de forma alguma… - defendeu-se Íris – Não estamos aqui pra machucar ninguém… Só queríamos explicar às guardiãs melhor os fatos que vem ocorrendo.

- E por que aqui? Por que não nos contaram tudo antes?

- Vocês vão compreender quando estiverem mais experientes. Por hoje, já temos muito que explicar. É melhor que se sentem, começaremos do início.

 


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