A Filha Do Sol - Parte II escrita por Taty B, Let B Aguiar


Capítulo 10
Capítulo XIX


Notas iniciais do capítulo

GENTEEE! MILHÕES de desculpas pela demora na postagem do capítulo 9! Essas últimas semanas andaram sendo muito corridas pra mim; trabalhos da faculdade, exames de vista, meu aniversário, compromissos inadiáveis... Foi difícil encontrar um tempinho para revisar o capítulo e postá-lo! Espero que vocês me perdoem e que a espera valha a pena. Boa leitura!



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CAPÍTULO XIX

         LEO



Não tive forças para sair do Bunker naquela noite. Eu não queria ter que lidar com nenhum tipo de forma de vida orgânica. Pelo menos, não até o dia seguinte. Adentrei em mais um de meus momentos introspectivos, onde minhas máquinas e ferramentas se tornavam meu conforto.
Conclui que só me acalmaria se começasse a trabalhar em algo. Peguei o Lemon Pledge no armário, um pano qualquer e comecei a limpar Buford. Isso de algum modo me acalmava. Não fui jantar e muitos menos compareci na fogueira. Eu era muito covarde para encarar Pattie depois de toda essa tormenta.
Conseguia me lembrar perfeitamente da voz de minha mãe dizendo ‘ Jamais faça para os outros o que não gostaria que fizessem para você, mi hijo. Esse é um conselho para a vida toda’. Ela me deu tal conselho quando a diretora do ensino fundamental a convocou para ir até a escola, pois eu havia passado cola de sapateiro na carteira de um dos valentões que sempre me machucavam na educação física. Foi prazeroso e engraçado vê-lo andando com a parte traseira das calças rasgadas. Mas a bronca que mamãe me deu na noite após o ocorrido fez eu me arrepender (bom, ela também escondeu meu kit de chaves de fenda preferido, mas vamos fingir que isso não conta). Mesmo assim, analisando minha trajetória, eu nunca deixei de fazer para os outros o que não gostaria que fizessem para mim. Eu era um monstro. Odiaria que Pattie me tratasse com rispidez e falta de tato. Então, por que diabos eu agi como um perfeito asqueroso com ela?
- Festus, você acha que a Pattie vai voltar a falar comigo depois dessa? – perguntei à cabeça do dragão de bronze que repousava numa mesa exclusiva. Festus soltou fumaça pelas suas enormes narinas e emitiu um ‘creak creak’ que, traduzido, só poderia ser um ‘Sei lá, cara. Se vira’.
Me descabelei de frustração. Eu necessitava me manter ativo e em movimento. Não queria me afundar em arrependimentos. Voltei a trabalhar nas asas dos pégasos autômatos, mas eu furei minhas próprias mãos tantas vezes que desisti de realizar a tarefa.
A inquietação e o pedaço vazio que cresceram dentro de mim atingiram um nível tão desesperador que eu optei por fazer algo que não costumava fazer com frequência. Na verdade, se o fiz duas vezes foi muito.
Eu me dirigi até os fundos do Bunker, onde uma televisão velha, provavelmente da década de 70, de transmissão preto e branco, jazia em cima de um criado mudo velho. Peguei o controle remoto que fora colocado da última vez por mim em cima da tv e apertei o botão de ligar. Hesitei, mas acabei apertando o botão de número 9, e os traços pretos e brancos indecifráveis que apareciam na tela foram tomando forma.
Um homem gigantesco estava sentado de costas em frente a uma mesa de trabalho numa oficina, vestindo um avental cheio de manchas, que com certeza eram de fuligem e graxa. Considerando que o homem era meu pai, não ficava difícil adivinhar. Seus cabelos desgrenhados tinham pequenos focos de incêndio, que desapareciam na mesma velocidade que apareciam. Suspirei e decidi emitir algum som a fim de ser notado.
- Boa noite, Hefesto.
O grandalhão deu um pulo no banco onde se sentava e virou-se para a fonte do som. Ele apertou as vistas e aproximou a carranca incrivelmente maltratada e desformada. Eu não sabia dizer quando me acostumaria com tanta feiura. Toda vez que o via, passava horas me encarando no espelho para me certificar de que não havia puxado seu lado da família.
- Garoto, você quer me matar de susto? Não que eu possa morrer. – ele deu uma risada irônica retumbante – E para você é boa noite, pai.
- Boa noite, pai. – revirei os olhos . – Hã então... O que estava fazendo?
- Consertando um dos aparelhos de som preferidos de Apolo. Ele é um metido a besta. O que você quer?
A voz de Hefesto era profunda e sempre expressava ressentimento. Ele se sentia menosprezado, excluído e estranho demais... Assim como eu e todos seus filhos, não se encaixava nem na própria família. Eu soltei um muxoxo resignado, inconformado com a coincidência na menção a Apolo. E me senti menos mal ao constatar que a falta de delicadeza era uma característica hereditária.
- Se lembra das caixas de césio 137 que eu pedi para você? – eu comentei casualmente.
- Lógico que me lembro, garoto. – ele suspirou, coçando a barba queimada – Não é só você que está querendo essas preciosidades. Eu também preciso de césio 137. Mas meus ajudantes não estão o encontrando com facilidade nos Estados Unidos. Vão ter que procurar em outro país.
- Certo... – não sabia mais o que dizer. Na verdade, não conseguia compreender o motivo de ter procurado meu pai. E de ele ter me respondido com benevolência.
- Vou fingir que você não me procurou apenas porque precisava conversar com alguém. – Hefesto resmungou, procurando por pedaços de engrenagens para começar a mexer. Ele passou a construir uma réplica de uma Lamborghini.
- Acho que a imortalidade está te deixando caduco. – ele fez uma cara triplamente mais feia ao ouvir minhas palavras. Apesar de saber que ele era um deus, meu pai e autoridade máxima perante a mim, eu ainda era incapaz de respeitá-lo plenamente. O ressentimento em relação à minha mãe e sua ausência era persistente. – Por que eu faria isso?
- Mais respeito, moleque. Eu posso te pulverizar com um piscar de olhos. – fiz sinal de rendição com as mãos. - É a garota, não é? Ela já começou a mexer com as suas ideias. Nada bom.
- Gostaria de responder que não.
- O amor pode ser mais maléfico do que benéfico, sabe. Muitas mentes geniais se anularam em função dele. Não queria que você entrasse para as estatísticas. – ele colocou a miniatura de Lamborghini em cima da mesa e deu corda. O carrinho saiu andando e escapou do meu campo de visão.
- Nunca imaginaria que você seria capaz de me dar atenção e falar de sentimentos comigo. – debochei mais uma vez.
- Pare de falar assim! – Hefesto ralhou – E de levantar essa maldita sobrancelha. É doloroso. Eu vejo Esperanza.
- Eu sou um ser do sexo masculino! – exclamei, fazendo uma careta. Eu odiava quando ele mencionava minha mãe. Ele não possuía esse direito. Mas decidi me conter. Não queria levar a conversa para um lado obscuro.
- Olha, Leo. – não me lembro do cara ter me chamado pelo nome alguma vez. Foi estranho. – A última pessoa para quem ofereci conselhos amorosos não me deu ouvidos e acabou indo parar nas profundezas do tártaro com sua amada. Se eu fosse você, moleque, escutaria seu pai. Mas eu não sou você, e você é tão teimoso quanto sua mãe e tão rabugento quanto eu.
Eu tive que rir. Pelo menos ele havia conseguido me proporcionar uma risada.
- Você mesmo se contradiz. É casado com a deusa do amor.
- E eu, mais do que ninguém, sei do que ela é capaz. Tome cuidado. Eu não posso te proteger o tempo todo. Na verdade, já fiz isso demais.
- Hum... Ok. Não vou mais tomar seu tempo. Pode continuar consertando o aparelho de som defeituoso. – decidi colocar um ponto final no diálogo. Não queria ir longe demais. Hefesto deu de ombros.
- Você vai me dar razão um dia. É melhor ir dormir, garoto. O sono faz bem para os pensamentos.
Ele mal terminou de falar e me deu as costas, desligando a televisão igual a que eu encarava, instalada por algum antigo campista no Bunker. Os traços pretos e brancos voltaram a tomar conta da tela e eu bocejei, sendo invadido por um sono anormal. Decidi voltar para o meu chalé, pois não havia mais nada com que eu pudesse me ocupar. Pelo menos lá eu poderia esclarecer meus pensamentos, repensar em tudo o que eu disse, e começaria formular um pedido de desculpas. Amanhã seria um novo dia, e eu não deixaria que Pattie se afastasse de mim por causa de uma briga idiota.
Deitei em minha cama e literalmente desmaiei. Quem dera se eu só tivesse dormido.

Uma luz forte me acordou. Meus olhos estavam fechados, mas mesmo assim doíam por conta da claridade. Tentei ignorar isso, porém meu cérebro foi mais rápido em me fazer constatar um erro. Meu quarto ficava no subsolo do chalé de Hefesto. Não apresentava nenhum tipo de claridade natural. A luz que me incomodava não parecia vir de uma lâmpada.
Abri os olhos e encarei um teto completamente diferente do meu quarto; amarelo e com pequenos cristais, que refletiam os raios solares aos poucos. Até cheguei a pensar que estava sonhando. Eu não estava no Bunker, porque me lembrava muito bem que adormeci na minha cama em meu chalé. E tinha certeza que não estava deitado em minha cama e muito menos em meu chalé. Será que era algum tipo de pegadinha dos Stoll?
A claridade era tanta que eu caminhei as cegas em direção a algum lugar, pois permanecia muito sonolento. Abri meus olhos e eu estava parado na frente de um espelho de corpo inteiro. O quarto em que me encontrava tinha três beliches e as paredes eram amarelas claro. Então, quando consegui focar minha própria imagem, a surpresa me assolou como uma tsunami.
- QUE PORRA É ESSA?
Eu estava no corpo da Pattie. Eu era exatamente ela. Meu rosto estava um pouco inchado, na verdade, demasiado inchado. Os meus cabelos, quer dizer, da Pattie...ah, você entendeu! Eles estavam bagunçados e armados. Eu me peguei encarando o mesmo corpo que tanto admirava discretamente. Agora, adivinha só? Eu estava dentro desse corpo. Ela/eu usava alguma coisa que incomodava e ficava no peitos, como se esmagasse-os. Deduzi que fosse sutiã, ou seja lá como chamam essa roupa debaixo desconfortável. Cara, como as mulheres conseguem usar isso? “Eu” vestia uma camisola amarela de cetim minúscula, com algumas rendas.
Me aproximei mais do espelho para ter certeza que não estava sonhando.
-Você só pode estar brincando comigo! – minha voz saiu feminina como a da Pattie, só que bem mais desesperada e ridícula. –O que, em nome de todos os deuses, aconteceu?
Passei as mãos pelo o meu rosto, digo, o rosto da Pattie. Eu literalmente estava no corpo dela. Só podia ser um sonho. Tinha que ser um sonho. Eu não podia ter peitos e uma vagina. Eu sou um homem com todas as partes muito bem conservadas, obrigado.
- Calma, Leo. – disse para mim mesmo. Na voz da Pattie, é claro. – Isso é tudo um sonho. Você vai acordar.
Me belisquei e fechei os olhos. Depois de alguns segundos, abri-os de novo e eu continuava no corpo da Pattie. Puta que pariu, definitivamente, não era um sonho, e sim um pesadelo!
Berrei e quase estourei meus próprios tímpanos e todos os vidros do quarto. Minha vontade era de chorar que nem uma menininha assustada. Ah, esqueci que naquele momento, eu era uma menininha!
Então, uma corrente elétrica me fez voltar à realidade e eu me lembrei de Pattie. Se eu estava no corpo dela, ela só podia estar no meu. E se já tivesse acordado, não demoraria em vir me procurar. Eu precisava ir até o chalé 9 encontrá-la antes dela sair gritando como uma louca pelo acampamento, e todo mundo ouvir que tinha trocado de corpo com o melhor amigo do nada. E é claro, iria dar um vexame, porque obviamente pensariam que ela enlouqueceu ou fez uso de drogas ilícitas.
Um semi-arrombamento na porta do quarto me lembrou de que, além de estar no corpo da Pattie, encontrava-me quase desnudo na presença de todos seus irmãos.
- Pattie, o que está acontecendo? – Will perguntou. Ele, como todos os outros, sustentava um semblante assustado e carregavam seus arcos nas costas. Alguns até seguravam bastões de beisebol. Todos ainda vestiam seus pijamas, que na verdade, se resumiam a uma coleção de sambas-canção. Ou seja, oito garotos quase pelados me fitavam de olhos arregalados. Quer dizer, olhavam para quem pensavam que ser sua irmã mais nova.
- Por que você gritou? Entrou algum esquilo aqui dentro? – O irmão bombadão perguntou. Adam, era o nome dele. Ele segurava um bastão.
- Saiam daqui! – tentei tampar as minhas pernas desnudas. Sério, eu não estava em meu corpo, mas morri de vergonha por Pattie por ter tantos homens me encarando, mesmo sendo um deles.
Leroy franziu as sobrancelhas.
- Você está bem? Nós somos seus irmãos.
- É, a gente já te viu de pijama, tipo, umas dez vezes. – Johnny completou, zombando.
Passei as mãos pelos meus cabelos, que agora eram estranhamente longos e lisos. Como iria fazê-los acreditar que eu não era sua irmã?
- Vocês não estão entendendo! – grunhi, exasperado. Minha voz saiu um tanto quanto agoniada. – Eu não sou a Pattie! Sou eu, o Leo. Acordei no corpo dela, e não faço a mínima ideia do que aconteceu! Vocês precisam me ajudar!
Eles trocaram um olhar confusão e riram. Até mesmo Matt, que era sempre tão sério, gargalhou alto como seus irmãos. Ah, ótimo! Eles não acreditaram em mim. Mas é claro que não iriam acreditar! Eu também não acreditaria se estivesse em seus lugares.
Matt tomou fôlego.
- Pattie, por que você está fazendo essa brincadeira idiota? Você é uma mulher! Sempre foi!
- Não! Eu não sou uma mulher! Eu sou Leo Valdez, e estou no corpo da sua irmã, Pattie! – desta vez gritei. Eles só riam e não procuravam interpretar o que eu falava. Será possível que todos os filhos de Apolo são burros?
Eles pararam de rir e me encararam com seriedade.
- Pare com essa brincadeira, Pattie. – disse Carlos, usando um tom severo. – Não tem graça. Precisamos limpar o chalé e tomar café-da-manhã.
- Brincadeira? – me aproximei. Ok, eu deveria estar com uma aparência horrível, mas eles me encararam receosos. – Vocês acham que eu estou brincando? Eu não estou brincando! – elevei minha voz de novo. – Vocês acham que é brincadeira dormir em seu chalé e acordar no outro dia no corpo da sua melhor amiga?
Eles me analisaram com mais credibilidade, como se tentassem notar uma certa protuberância entre as pernas da irmã. Mesmo assim, eu sabia que no fundo queriam rir. Então eu concluí que só era ameaçador porque estava no corpo da Pattie. E todo mundo tinha medo dela.
- Eu dormi com um pênis e acordei com peitos e uma vagina entre minhas pernas! E agora, vocês realmente acham que eu estou brincando?
Os garotos se chocaram com as minhas palavras. Ok, talvez eu tivesse surtado um pouco e gritado de um jeito que provavelmente faria todo o acampamento acordar, mas eu tinha razão. Tudo o que esbravejei foi para fazê-los se tocarem de que eu não estava brincando com a cara ninguém. Na verdade, eu estava tão perdido e com tanta raiva quanto eles.
Will travou o maxilar.
- Pare com esse showzinho ridículo. – ele falou severamente. - Não percebeu que ninguém achou graça? Você é a nossa irmã, Patricia Veloso, e é claro que tem peitos e uma vagina porque você é uma mulher! Você não é o Leo! Ele deve estar dormindo, enquanto você está fazendo essa atuação ridícula. Pare com isso agora. Você está agindo como louca!
Cerrei os punhos. Minha vontade era de socar todas aquelas caras bonitinhas, mas eu não o fiz. Eu estava no corpo da irmã deles, e se fizesse algo do tipo, eles nunca a perdoariam, e Pattie nunca mais falaria comigo de novo.
Suspirei. A batalha estava ganha. Eles nunca acreditariam em mim. Ninguém acreditaria em nós. Estávamos perdidos.
- Olhe, eu sei que vocês não acreditam em mim, só que eu não estou mentindo. – tornei a dizer. – Vocês estão achando isso uma piada, mas não é. Até porque eu não brincaria com uma coisa dessas. Eu não estou louco, e vou provar. Agora eu tenho que procurar a irmã de vocês, que por acaso roubou meu corpo.
Passei como um furacão por eles e sai em direção ao chalé de Hefesto. Eu estava de camisola curta e amarela, mas nem ligava. As únicas coisas que me preocupavam no momento era se conseguiríamos voltar para nossos respectivos corpos e o desconforto de ter duas bolas de handebol descendo e subindo no meu peito a cada passo que dava.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Eu acredito que essa foi uma grande reviravolta na história HAHAHAHA ou pelo menos um episódio que vai proporcionar grandes risadas para vocês! Peço que tenham paciência se demorarmos para postar os próximos capitulos, A vida não tá fácil pra ninguém HEUHEU
Beijinhos,
Taty xX