Além das lembranças. escrita por Amanda Rodrigues


Capítulo 5
Capítulo V - A Grande Noite - parte I


Notas iniciais do capítulo

Olá, queridos! Como estão? Gostaria de conversar um pouquinho com vocês sobre esse capítulo. Como vocês sabem, essa fanfiction é antiga e atualmente ela está passando por um processo de reescrita. Portanto, muita coisa foi alterada. E acho que, até agora, o capítulo que mais sofreu mudanças foi o 5. Por conta disso, ele ficou enorme (sendo que, antes, ele já era grande). Para deixar a leitura menos cansativa para vocês, decidi dividi-lo em três partes. Essa que vocês irão ler agora é a parte 1.



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— E então? Qual vai ser a primeira lição? — perguntei para Katso, assim que entramos em uma das salas desocupadas do palácio. Ela era extensa e o chão era coberto por um tatame.

— Primeiro, vamos ver o modo como você anda — disse o youkai num tom professoral.

— Eu ando normal.

— Esse é o problema — rebateu Katso. — Uma dama precisa caminhar com suavidade e graciosidade, ao invés de "normal".

Revirei os olhos.

— Quem aguenta fazer isso o tempo todo? É uma chatice.

— Você não quer ser elegante para agradar o lorde Sesshoumaru? — havia um toque de ironia no seu tom de voz.

— Sim, mas...

— Agora ande. Deixe-me ver a sua postura.

Era constrangedor, mas fiz o que ele pediu. Andei pela sala vazia conforme sentia o olhar de Katso sobre mim.

— Deuses! A sua postura é terrível! — exclamou o youkai, horrorizado.

— Ao contrário de você, eu não pertenço à nobreza.

— Deu pra perceber.

— Numa aldeia de camponeses temos outras prioridades, como se preparar para o inverno e se proteger de ataques de youkais. Nós não nos preocupamos muito com regras de etiqueta, sabe?

Katso me lançou um olhar intrigado.

— Eu não compreendo. Por que Sesshoumaru se interessaria por alguém como você? Você me disse que não possui nenhum poder. Mas eu não acredito.

— Não tenho poder nenhum — falei, enquanto revirava os olhos. Eu estava exausta desse assunto. — Agora, vamos focar no que interessa: quero que me ensine a como impressionar os convidados amanhã.

— Se eu a ajudar a obter o que quer, promete que me contará sua história?

— Eu já contei. Mas talvez eu possa fornecer alguns detalhes. Mas, vamos prosseguir com os ensinamentos.

Katso me deu algumas instruções e tentei incorporá-las ao meu andado. Porém, sem muito sucesso. Eu era péssima nisso.

— Erga a cabeça.

— Assim?

— Não, maldição — ele deu um leve rosnado. — Você não vai querer esbarrar em alguma coisa ou em algum youkai, certo? Eles não a perdoarão por isso.

— Eles não... Bem, não vão ficar furiosos quando me verem? Afinal, sou humana — perguntei ao youkai.

— É provável que a olhem de cara feia, mas não vão fazer nada, afinal você está sob a proteção de Sesshoumaru.

— E quanto ao senhor Sesshoumaru? Eles não vão julgá-lo por manter uma humana em seu palácio?

— Acho que Sesshoumaru pode fazer o que bem entender no palácio dele — disse Katso. — Se ele quiser dar abrigo a uma humana, ele fará e a elite nada tem a ver com isso. Muito menos, Arina.

Parei de andar quando ouvi aquele nome. Ele me era familiar.

— Arina? — encarei Katso com o cenho franzido.

— A mãe de Sesshoumaru. Não a conhece?

— Conheço. Eu a vi uma vez. O nosso encontro não foi muito amigável.

Dizer que o meu encontro com a Arina "não foi muito amigável", sem dúvidas, era um eufemismo da minha parte. A maldita me mandou para o inferno!

— Arina definitivamente não é alguém amigável — falou o youkai com um sorrisinho. — Mas, não se preocupe. Apenas fique fora do caminho dela e tudo ficará bem.

Dei alguns passos seguindo as instruções de Katso.

— Como estou? — indaguei.

— Erga o rosto. Isso. Perfeito. Agora, abaixe os ombros.

— Desse jeito?

— É. Agora, projete-os para trás. Isso mesmo.

— E agora?

— Alinhe a coluna — disse Katso observando criticamente os meus movimentos do outro lado da sala. — Depois, as pernas. Lembre-se: a distância entre seus pés deve ser a mesma em relação aos seus ombros.

— Katso, posso fazer uma pergunta?

— À vontade.

— O que sabe sobre os Youkais do Norte?

Quando fitei o rosto bonito de Katso, notei uma tensão se espalhar pelo seu semblante, mas logo o youkai a disfarçou.

— Por que está interessada em saber? — questionou, na defensiva.

— Curiosidade.

Katso semicerrou os olhos, analisando-me. Por fim, respondeu:

— São os inimigos do clã Taishou. Você já deve ter ouvido falar sobre rixas de sangue entre famílias, não é?

— É claro. Mas, o que ocasionou essa rixa?

— Você faz perguntas demais, ratinha — disse ele. O seu tom era leve e jovial, mas eu sabia que havia uma rigidez por trás daquelas palavras. O assunto estava encerrado e ponto final. — Vamos voltar às lições. Agora, vou ensiná-la a posição de seiza. É essa que deve adotá-la ao sentar.

Katso era um tutor rigoroso. Ele me deixou por longos minutos sentada à medida que verificava quanto tempo eu conseguia manter a posição de seiza.

Felizmente, suportei bem. Fiquei sentada como uma boneca esperando ansiosa o youkai dizer: "acabou. Volte ao normal." Sempre que estava prestes a relaxar a coluna, Katso me olhava de modo desafiador e zombeteiro, o que me motivava a suportar um pouco mais.

— Você aprende rápido. Será que esse foi o motivo de você ter conquistado o coração de Sesshoumaru? — provocou o youkai, encerrando o teste.

Ao ouvir aquelas palavras, por alguma razão, senti um solavanco no estômago. Katso era mesmo um idiota!

Passamos muitas horas falando sobre boas maneiras. Katso me fez andar novamente, disse que teria que ter doçura e sensualidade ao andar. Essa etapa vergonhosa da aula nos fez dar longas risadas. Sensualidade não combinava com a minha pessoa.

Além disso, Katso pegou dois gravetos no intuito de me ensinar a usar hashis de maneira educada e elegante. Também me instruiu a não comer em demasia.

Era divertido e, ao mesmo tempo, inacreditável. Como alguém conseguia seguir piamente todo esse protocolo de comportamento? Estava ficando cada vez mais tarde. Eu podia sentir o vento gélido da madrugada invadir a sala. Até que começou a chover. Quando ouvi o barulho da chuva, paralisei.

Por um momento, imagens do pesadelo que tive com os meus familiares desfilaram diante dos meus olhos.

— Rin? — a voz de Katso me trouxe de volta a realidade.

Pisquei.

— O quê?

— Está bem?

— Sim, desculpe. Acho que estou ficando com sono.

— Já está bem tarde. É melhor pararmos por aqui — disse ele. — Você fez grandes avanços. Acho que vai se sair bem amanhã.

Eu o encarei, insegura.

— Acha mesmo? Acha que vou conseguir fazer senhor Sesshoumaru se orgulhar de mim?

— Por que você tem essa necessidade? — Katso riu. — Não se preocupe, ratinha. Dê o seu melhor amanhã e isso bastará.

Eu sorri, satisfeita com o resultado daquelas aulas.

— Obrigada, Katso. Os seus ensinamentos foram muito valiosos para mim — e fiz uma rápida reverência para ele a fim de demonstrar o meu agradecimento.

Katso deu uma piscadela.

— E que venha a Grande Noite! — exclamou o youkai, sorrindo.

* * *

Abri cuidadosamente a porta do meu quarto e usei os meus sentidos mais aguçados no intuito de detectar algum feitiço. Para o meu alívio, não havia nenhum. O quarto estava limpo.

Quando me deitei, o sono não veio de imediato. Fiquei alguns minutos repassando mentalmente as regras de etiqueta que Katso havia me ensinado. Será que eu conseguiria lembrar de tudo amanhã? Além disso, algo me preocupou: eu não possuía nenhum kimono adequado para a ocasião.

"Amanhã tento solucionar esse problema", pensei, procurando uma posição mais confortável no futon.

Eu estava tão exausta que, assim que fechei os olhos, fui diretamente transportada para o universo onírico dos sonhos.

* * *

Aika conferiu as unhas e encontrou o olhar de Katso nas sombras. Ela não sabia o que o youkai imortal tinha ido fazer em seus aposentos naquele horário, mas estava curiosa. Ela cruzou as pernas se mostrando interessada no que ele tinha a dizer.

— Então, Katso, o que veio fazer aqui? — questionou a bela youkai. — Se não tiver nada de interessante para me contar, sugiro que vá embora.

As presas de Katso cintilaram na escuridão e ele avançou na direção de Aika. O assoalho de madeira rangia conforme ele caminhava pelo cômodo que exalava um aroma adocicado de incenso.

— Foi você quem pôs o feitiço das lembranças no quarto da humana. Por que fez isso? — perguntou Katso de maneira casual, sem apresentar irritabilidade.

Ela soltou uma risada incrédula.

— Ah, você está brincando comigo. Foi para isso que veio até aqui?

A resposta de Aika não o agradou.

— Nós dois combinamos de agir só quando tivéssemos certeza de quem ela é. Você não cumpriu com o trato — disse Katso entre dentes.

— Vá para o inferno, Katso! — rebateu Aika, indignada. — Eu não pus feitiço no quarto de ninguém!

E antes que a youkai pudesse se defender, a mão de Katso a capturou pelo pescoço. Os dedos lívidos do Daiyoukai eram fortes como aço e ela não conseguiu se livrar deles. Ele a ergueu do chão sem dificuldade enquanto a fitava com uma fúria glacial.

— Não minta para mim, Aika — ordenou Katso. — Você sabe que eu detesto mentiras.

Aika se remexia desesperadamente. As mãos da youkai se agarraram ao braço de Katso, na tentativa de se libertar. Mas, ele era mais forte que ela.

— Des...gra..çado — Aika conseguiu dizer, pausadamente.

Então, Katso a largou sem piedade no chão. Assim que foi libertada do aperto, a youkai tentou recuperar o fôlego. Enquanto isso, Katso caminhou despreocupadamente pelo cômodo e encontrou numa mesinha uma garrafa de saquê, o que o deixou satisfeito.

Ele pôs o conteúdo da garrafa num pequeno copo de cerâmica e bebeu à medida que esperava Aika se recompor. Se tivesse colocado um pouco mais de força no aperto, teria quebrado o pescoço dela.

Katso sentia prazer em tirar uma vida. Era fascinado pelo sangue escuro escorrendo em suas mãos e, acima de tudo, pelo glorioso momento em que os olhos da vítima se fechavam, despedindo-se de uma vez por todas do mundo dos vivos, isso o excitava. Ele adoraria dar um fim em Aika, mas precisava dela.

— A humana morava numa aldeia e não possui nenhum poder extraordinário. Ainda não faz sentido para mim. Quem ela é? Por que Sesshoumaru se interessaria por ela? — falou o youkai, como se divagasse.

— Pouco me importa quem ela é. Só a quero longe daqui — murmurou Aika, se recompondo.

— Você não percebe, não é?

Ela se pôs de pé com certa dificuldade.

— O quê?

— Eu finalmente encontrei o ponto fraco de Sesshoumaru. Sabe quanto tempo eu estou a procura disso? Agora, eu encontrei. Isso é... Fascinante — disse Katso, sorrindo.

— Eu não entendo. Se você quer matar Sesshoumaru, por que não se alia aos Youkais do Norte?

— Matar? — ele encarou Aika, confuso. — Quem falou em matar? Eu quero vê-lo sofrer. Eu quero tirar dele aquilo que ele mais ama, assim como ele fez comigo. Eu quero que Sesshoumaru sinta na pele o que eu senti. A morte seria muito fácil.

— Eu amo Sesshoumaru — confessou Aika. — É por isso que eu quero que aquela humana desgraçada desapareça. É tudo o que eu quero.

— Não se preocupe, minha querida — Katso bebericou o saquê. — Em breve, nós acabaremos com ela. Então, eu terei minha vingança e você terá Sesshoumaru só para você.

* * *

Acordei com o cantarolar dos pássaros. Bocejei e, contra a vontade do meu corpo, me sentei no futon. O meu maior desejo era voltar a dormir, porém eu tinha tarefas a cumprir e... Era inacreditável. Eu iria coordenar a equipe de limpeza do palácio! Era uma responsabilidade enorme, uma vez que teríamos um evento importante mais tarde.

Depois de outro bocejo, me pus de pé. Estava frio. Procurei rapidamente alguma vestimenta quente e, após vesti-la, arrastei a porta de correr que dava para o jardim. Quando a abri, meus olhos se arregalaram.

O céu estava prateado e flocos de neve rodopiavam no ar, acumulando-se na relva do jardim. Não pude deixar de sorrir. Então, o inverno havia chegado.

Arrumei o cabelo e, quando me senti aquecida o suficiente, deixei o quarto.

No corredor, encontrei senhor Jaken. Ele andava apressado, quase correndo, o que era um tanto engraçado.

— Você é a coordenadora da limpeza! — vociferou o pequeno youkai.

— É, eu acho que sim — disse, rindo.

— Então, o que você está fazendo aí?! — gritou Jaken.

— Bom, eu estava...

— Imprudente! Você deveria estar com os youkais da limpeza! — exclamou Jaken, cruzando os braços verdes.

— Ah, não. Eu estou atrasada! Adeus, senhor Jaken!

— Os servos estão esperando no jardim real! — informou o youkai enquanto eu corria pelo extenso corredor.

Cheguei o mais rápido possível no local informado por Jaken. Assim que pus os pés no jardim, me deparei com mais ou menos cem youkais, todos aguardando a minha chegada.

Quando me viram, eles pararam o que estavam fazendo e me encararam fixamente, aguardando o meu comando. Naquele instante, ficou mais claro para mim o peso da minha responsabilidade.

Eu me sentia idiota porque estava ali a pouco tempo. Eu nem sequer conhecia direito o palácio.

Naquele momento, pairou um silêncio sepulcral. Sem dúvidas, aqueles youkais me detestavam e não estavam nem um pouco afim de receber ordens de uma humana.

— Bom dia a todos! Peço que perdoem o meu atraso. Não irá se repetir — falei, nervosa. — Hoje é o meu primeiro dia como administradora do grupo da limpeza.

Nenhum deles respondeu o cumprimento, apenas me olhavam com curiosidade e rancor. Mordi nervosamente o lábio inferior.

Então, escutei alguém bufando em meio aos youkais ali parados. Não demorei muito para identificar.

Era Aika.

Ela se vestia apropriadamente para o frio. Suas roupas cinzentas anulavam por completo sua beleza.

— Até que ponto nós chegamos, não é mesmo? — disse ela, dirigindo-me um olhar de desdém. — Chegamos ao ponto de sermos controlados por uma humana! Ela nem mesmo sabe como exercer a sua função!

Um pequeno grupo de youkais pareceu concordar. Os outros, no entanto, apenas esperavam que eu fizesse alguma coisa, mas eu estava muda.

— Você deveria abandonar esse palácio, garota! Este lugar não é para você! O seu lugar é com os outros da sua espécie! — disse um youkai ao lado de Aika.

A youkai sorriu vitoriosa, adorando o caos que havia causado. Afundei as unhas na palma da mão. Minha paciência estava se esgotando.

— Vá embora deste palácio, humana! — gritou uma voz na multidão.

Todos os youkais estavam sendo induzidos por Aika a me expulsar do palácio. Uma bomba explodiu dentro de mim. Esses desgraçados não me fariam desistir de estar ao lado de Sesshoumaru, nem do meu cargo. Então, gritei a plenos pulmões:

— Eu sou a nova coordenadora da equipe limpeza e vou desempenhar a minha função. E não, eu não vou deixar este palácio. Tenho direito de estar aqui tanto quanto qualquer um de vocês. Se alguém tem algum problema com isso, por favor, fale diretamente com o senhor Sesshoumaru.

Quando terminei o meu discurso, notei que a multidão de youkais havia se emudecido. Até mesmo Aika baixou a cabeça. De repente, todos os youkais presentes fizeram uma profunda e tímida reverência. Eu observei aquela mudança de comportamento com perplexidade.

Aika ergueu a cabeça. Sua expressão estava completamente diferente. O que era brutal e raivoso em seu semblante transformou-se em doçura e respeito. Os lábios da youkai se moveram e sua voz ecoou em meio ao enorme silêncio instalado no jardim:

— Oh, príncipe!

Automaticamente girei a cabeça trás e o avistei. Lá estava ele, alto e possante atrás de mim. Eu estava tão ocupada fazendo um discurso para os youkais que nem o percebi chegar. O olhar dourado de Sesshoumaru estava direcionado exclusivamente para os seus servos. E era um olhar tão ameaçador que eu não pude deixar de sentir um frio na espinha.

Apesar de ser assustador, eu adorava isso em Sesshoumaru. Ele não precisava falar, pois o seu olhar encurralava o adversário de tal forma que era nítido que o indivíduo possuía apenas duas escolhas: obedecer ou morrer.

Sesshoumaru certamente viu que os seus servos se recusavam a cooperar comigo.

— Rin — Sesshoumaru não mudou o rumo do olhar

— Sim?

— Conto com você.

Sesshoumaru virou-se com elegância e retornou ao interior palácio. Quase ri, todos os youkais agora pareciam cordeirinhos dóceis e estavam muito dispostos a seguir minhas ordens, até mesmo Aika abandonou sua expressão rebelde.

Subitamente, uma meio-youkai saiu da multidão trazendo um papel enrolado nas mãos. Ao ficar diante de mim, ela fez uma mensura.

— Senhorita, aqui está um mapa do palácio.

"Senhorita? Mas que evolução! Senhor Sesshoumaru, por favor, apareça mais vezes", pensei achando tudo muito engraçado. Quando analisei o conteúdo do papel, eu compreendi como as áreas do palácio estavam divididas.

Tomando como base as informações do mapa, dividi o grupo de cem youkais em pequenos grupos de dez. Esses pequenos grupos iriam cuidar da limpeza de uma área específica do palácio.

Com o poder nas mãos, fiz total questão de encaixar Aika no grupo que teria o trabalho mais pesado. Ela merecia.

— Agora que todos sabem as áreas em que vão trabalhar, mãos à obra! Temos muito trabalho a fazer! — bradei.

E todos os youkais se dirigiram para as suas respectivas áreas.

Quando fiquei sozinha no jardim, soltei uma respiração. Por que youkais tinham que ser criaturas tão difíceis? Então, minha atenção se voltou para os flocos de neve que dançavam no ar.

A neve que caía estava transformando o jardim numa paisagem inteiramente branca. Os troncos das árvores estavam cobertos de geada assim como as flores que restavam. Fiquei alguns segundos hipnotizada com a imagem dos flocos cortantes de gelo caindo na palma da minha mão. Logo, as terras verdejantes de Sesshoumaru se tornariam um deserto branco.

Por um instante, eu me lembrei da conversa que ouvi entre Sesshoumaru e o seu informante. O youkai disse que o rei dos Youkais do Norte só iniciaria um ataque após a chegada definitiva do inverno.

Bom, o inverno havia chegado. Quando eles pretendiam atacar?

Enquanto pensava sobre essa questão, ouvi em meio a quietude do jardim um choro distante. Franzi a testa me perguntando de onde vinha esse som agourento.

Segui o barulho em meio a vegetação. Atravessei a ponte vermelha em forma de arco-íris. O seu reflexo cintilava de maneira estupenda na água do lago, mas não prestei atenção. Tudo o que eu queria fazer era descobrir a origem daquele choro sôfrego e fantasmagórico.

Então, finalmente encontrei. Era Chiye. Ela estava sentada num tronco de árvore caído, sob a luz mortiça da manhã. A youkai mantinha a testa lívida descansando no joelho e lágrimas escorriam incessantes pela sua face.

Imediatamente, me ajoelhei diante dela.

— Chiye, querida. O que aconteceu? — indaguei, preocupada. Ela continuou imóvel. — Chiye, você precisa me contar. O que fizeram com você?

Ela então se sentou ereta e me encarou com lágrimas nos olhos.

— É o inverno! Eu o odeio!

Arqueei uma sobrancelha.

— O inverno?

Chiye segurou minhas mãos.

— Oh, sim, querida Rin. O inverno é um vilão terrível! — disse ela, muito séria.

— Tudo bem. O que o inverno malvado fez com você?

— As minhas rosas estão com frio! Ele vai matá-las! — respondeu Chiye, desesperada. — Esse inverno maldito vai matá-las! Tudo morre no inverno, Rin! É um pesadelo!

Eu me sentei ao lado dela no tronco de árvore no intuito de tranquilizá-la.

— Está tudo bem, Chiye — falei, tentando acalmá-la. — O inverno é uma estação como qualquer outra. As suas flores podem não resistir a ele. Mas, lembre-se que, uma hora, ele termina. Nenhum inverno dura para sempre.

— Pobrezinhas! As rosas tentam parecer fortes, mas não são. Elas são muito frágeis, Rin — lamentou a youkai e, então, olhou-me nos olhos. — Elas me disseram algo sobre você.

— O quê?

— Elas me disseram que você precisar comparecer ao evento desta noite. O futuro deste palácio depende disso — falou a youkai. — Venha comigo.

Chiye então me puxou com uma força inesperada e me arrastou mata adentro.

— Espere, Chiye. Aonde estamos indo? Tenho tarefas a cumprir no palácio! — protestei, mas a youkai não me soltou.

Chiye era uma youkai visivelmente fraca. Não era difícil perceber. Ela era muito magra e de uma palidez severa. Enquanto ela me guiava em meio as árvores, observei o seu punho. Era tão lívido que era possível notar as veias azuladas ao longo de sua extensão. A sua pele era também naturalmente fria. Sem dúvidas, o seu aperto não era dos mais fortes. Qualquer youkai conseguiria se livrar dele com facilidade. Eu também conseguiria se me esforçasse um pouco, mas eu não queria rejeitá-la. Havia algo em Chiye que me transmitia uma sensação extraordinária de doçura e paz. Eu sabia que ela era boa. E, por isso, permiti que ela me levasse.

Porém, em algum ponto daquela caminhada, tive que perguntar:

— Para onde estamos indo, Chiye?

— Existe uma cabana ao norte. É onde eu moro. É para lá que estamos indo — respondeu ela. — Não se preocupe. Não vai demorar muito. Só preciso que você veja uma coisa.

Após alguns minutos de caminhada, avistei a cabana de Chiye. Era um lugar pequeno, rústico e isolado. Ao lado da cabana crescia uma cerejeira que sofria com os efeitos do inverno.

Quando ficamos diante da construção, Chiye olhou para mim com um sorriso orgulhoso.

— Esta é minha casa — disse ela. — Você pode vir aqui quando quiser, Rin. É sempre muito bem-vinda.

— Obrigada, Chiye.

Ela voltou a agarrar o meu braço.

— Venha, vamos entrar!

Assim que entrei na cabana, percebi que dentro o lugar era ainda mais simples. O chão era de terra batida e não havia muitos objetos. Tudo o que consegui avistar foi um futon, um baú antigo e alguns recipientes feitos de barro. Nada mais que isso. Além do mais, o ambiente era naturalmente escuro.

Como não consegui detectar nada de interessante naquela cabana, decidi perguntar:

— Então... O que você gostaria de me mostrar?

— Espere um instante — disse Chiye caminhando rumo ao baú.

A youkai abriu o objeto de madeira e retirou de lá, para a minha surpresa, uma vestimenta de tecido azul-marinho e de estampas douradas de dragão. Fiquei curiosa em relação àquela vestimenta, o que ficou claro para a Chiye que não tardou em relevar de que se tratava de um kimono. Um kimono muito luxuoso.

— Uau, Chiye! — exclamei, avaliando a vestimenta. — Nunca vi kimono tão belo! É ele que você vai usar esta noite?

— Não. É você quem vai usar — revelou a youkai.

Automaticamente, tive um sobressalto.

— Eu agradeço. Mas, não posso aceitar — disse. — É você quem deve vestir esse kimono.

Chiye meneou a cabeça.

— Não. Eu não irei comparecer ao evento. Portanto, é você quem deve usá-lo — argumentou a youkai. Contudo, continuei irredutível. — Rin, você se lembra quando eu lhe disse que as rosas me contaram que você deveria ir ao evento de hoje? Elas também me falaram que o futuro do palácio depende de você. Eu fiz uma promessa a elas. Eu prometi que iria garantir que você fosse à celebração.

— Eu não entendo. Por que eu seria o futuro deste palácio?

— Você vai entender. Por enquanto, tudo o que eu preciso é que você aceite este kimono e, mais do que isso, que aceite também a minha ajuda para se preparar para o evento de hoje — falou Chiye.

O meu rosto ficou enrubescido. Eu não queria ter que ocupar a youkai com algo como aparência e vestimenta. Não parecia certo.

— Eu... Eu não sei como agradecer, Chiye.

Ela segurou minha mão, encarando-me com um sorriso gentil.

— Não se preocupe com isso. Eu faço questão.

Eu retribui o seu sorriso, emocionada.

— Chiye, você tem sido uma boa amiga — disse, com lágrimas nos olhos. — Você não tem ideia de como a sua gentileza é importante para mim. As suas rosas podem não suportar o frio do inverno, mas eu estarei aqui. Seremos o apoio uma da outra. Nós não estaremos sozinhas.

Chiye alargou o sorriso. Era possível notar pelo seu semblante comovido o quanto ela havia ficado feliz por ouvir aquelas palavras.

— Você é uma boa menina, Rin — falou a youkai, apertando a minha mão. — Fico feliz em tê-la conhecido. Mas, agora você deve cumprir o seu dever no palácio.

Limpei as lágrimas dos olhos com rapidez.

— É claro! Preciso voltar!

— Agora você sabe o caminho até minha casa. Estarei esperando por você — disse minha amiga.

Sim. Agora eu sabia o caminho.

* * *

Eu estava supervisionando uma das áreas quando ouvi a voz de alguém:

— Coordenadora! Senhorita, por favor! — o timbre revelava que o indivíduo estava desesperado.

Cessei o meu diálogo com um dos servos que possuía dúvidas em relação à limpeza do tatame e logo me deparei com um meio-youkai de cabelos ruivos. Ele parecia aflito.

— Sim? — quis saber do que se tratava.

— Alguém quebrou um vaso no salão principal — informou ele. — Foi tudo tão rápido que nós...

— Certo. Substitua o vaso quebrado por outro imediatamente — ordenei. — Não temos tempo a perder. Ah, e não se esqueçam de limpar a sujeira.

— Sim, coordenadora. E quanto a punição?

Franzi o cenho.

— Punição?

Ele balançou a cabeça, afirmando.

— Sim, senhorita. Foi Yuriko quem cometeu esse deslize — disse o meio-youkai. — Ela está aguardando a sua chegada para saber de que forma a senhorita irá puni-la.

Soltei uma respiração exausta.

— Muito bem — falei. — Vamos até lá.

E me dirigi acompanhada do meio youkai até o salão principal. O único ponto positivo do trajeto foi que avistei Aika descontando toda a sua frustração num esfregão.

O dia já tinha avançado de tal forma que estávamos no período da tarde. Felizmente não faltava muito para o fim dos preparativos. A limpeza do palácio estava quase pronta.

Àquela altura eu estava cansada de andar para todos os lados do palácio disparando ordens e tendo que lidar com inúmeros contratempos que surgiam.

Agora apareceu essa punição que eu supostamente deveria dar a pobre Yuriko. Até então não tinha ouvido falar disso. Por essa razão, fiz questão de tratar do assunto pessoalmente.

Quando cheguei ao salão principal, os servos instantaneamente se puseram um ao lado do outro, formando uma grande fila. Yuriko estava alguns passos a frente dos demais, isolada e cabisbaixa.

Eles fizeram uma reverência quando me aproximei.

— Fui eu, coordenadora — confessou Yuriko, sem erguer a cabeça para mim. — Fui eu quem quebrou o vaso do daimyo.

— Fui informada, Yuriko — disse. — Agora, olhe para mim.

A meio youkai fixou os olhos em mim. Havia temor em sua expressão. Então, para a minha estupefação, ela se ajoelhou aos meus pés.

— Por favor, senhorita. Não diminua minha alimentação e dos meus filhos — rogou Yuriko. — Como a senhorita bem sabe, estamos no inverno. O inverno é uma estação difícil para todos nós.

— Yuriko, levante-se — pedi.

— Mas, senhorita...

— Yuriko, levante-se — repeti com mais firmeza.

A meio youkai ficou de pé e parecia prestes a irromper em lágrimas.

— Precisamos preservar os objetos do palácio — falei encarando todos os presentes. — Mas, eu compreendo que foi um acidente. Sendo assim, você não será punida por isso. Por favor, volte ao trabalho. Precisamos finalizar o salão o mais rápido possível.

— Muito obrigada, senhorita — Yuriko parecia emocionada. — Não cometerei esse erro outra vez. Obrigada. Aika sempre nos punia por qualquer coisa, mas você teve misericórdia de mim e dos meus filhos. Obrigada.

— Eu não sou Aika, mas isso não quer dizer que vou tolerar um serviço ruim — e, após verbalizar essa frase, deixei o salão.

Com o passar das horas, o serviço da limpeza foi terminado. As alas do palácio foram entregues num estado impecável de limpeza. Assim, eu e os demais meio-youkais respiramos aliviados sentindo aquela a sensação de dever cumprido.

À medida que todos deixavam o palácio e seguiam rumo ao manso servil (parte do feudo que pertence aos servos), eles faziam reverências para mim em forma de agradecimento. E eu notei que, agora, os meio-youkais me olhavam de modo diferente, como se eu tivesse conquistado uma parcela do respeito deles.

Por um momento, me senti triste porque eles, que tanto haviam trabalhado naquele dia, não iriam usufruir da Grande Noite.

No entanto, não havia nada que eu pudesse fazer.

De repente, ouvi a voz de Jaken ecoar no salão:

— Riiiiiin!

— Sim, senhor Jaken, está tudo bem? — questionei um tanto preocupada.

Quando o pequeno youkai ficou diante de mim, ele apoiou-se nos joelhos para recuperar o fôlego.

— A Majestade deseja vê-la — Jaken fez uma pausa enquanto enchia os pulmões de ar. — Agora.

Eu sabia que Sesshoumaru se encontrava no seu salão de guerra e me dirigi até lá. Durante todo aquele dia eu ainda não tinha o visto e, sem dúvidas, esse era o pior momento para fazê-lo. Após um dia inteiro de trabalho, minha aparência estava um horror e minhas roupas estavam sujas.

Tentei desfazer boa parte dos nós do meu cabelo conforme caminhava até o salão de guerra. No caminho, passei próximo da cozinha e o meu estômago roncou quando senti o aroma que vinha de lá.

Eu até teria entrado, mas o meio-youkai que supervisionava esse setor não era dos mais simpáticos. E quanto à alimentação, eu fiquei um tanto impressionada. Youkais não eram muito exigentes em relação a comida. Mas, Sesshoumaru fez questão de oferecer um banquete variado, o que significava que eu poderia aproveitar.

Quando fiquei diante da porta do salão de guerra, eu suspirei. Minha relação com Sesshoumaru, até então, era completamente diferente do que eu tinha imaginado. Ele era frio e distante. Bem, ele sempre foi assim, mas eu sentia que existia um abismo entre nós.

Dei uma última olhada nas minhas vestes e, então, arrastei a porta de correr. Ao fazer isso, me deparei com a figura imponente do Dai-youkai atrás de uma grande mesa, a qual possuía um mapa estendido repleto de peças posicionadas em pontos estratégicos.

Apesar de possuir uma silhueta esguia, o corpo de Sesshoumaru era inegavelmente forte, quase feroz em sua capacidade. Ele estava com a atenção totalmente voltada para o mapa, de modo que sequer ergueu os olhos para me encarar.

Decerto, ele estava de péssimo humor.

Fiquei alguns segundos esperando Sesshoumaru finalizar os seus assuntos bélicos, mas, como ele continuou imerso no estudo do mapa, decidi me pronunciar:

— Senhor Sesshoumaru — fiz uma reverência. — O senhor mandou me chamar?

— O que achou do seu primeiro dia coordenando a equipe de limpeza? — perguntou ele, enquanto movia cuidadosamente uma pecinha sobre a mesa.

Após essa pergunta, tomei a liberdade de me aproximar dele e, enquanto o fazia, notei que havia algo de errado com Sesshoumaru. Ele estava diferente. Usava um kimono de cor preta e havia sinais de cansaço em seu belo rosto.

Eu nunca tinha visto Sesshoumaru aparentar cansaço e isso me chocou. Além disso, ele parecia sombrio e taciturno. Também não pude deixar de notar a existência de uma garrafa de saquê descansando em cima de uma bancada.

Isso era, no mínimo, incomum. Certamente, havia algo de errado com ele.

Por um breve instante, senti o impulso de pedir que fosse descansar até os convidados chegarem. Porém, em virtude da distância que havia entre nós, optei por não comentar nada.

— Foi um tanto desafiador — respondi. — Mas consegui dar conta.

Então, finalmente, Sesshoumaru ergueu o seu rosto frio e aristocrático para mim.

No momento em que os nossos olhos se encontraram, uma sensação estranha se espalhou pelo meu corpo. Era uma espécie de inquietude. Eu não sabia qual palavra utilizar. Talvez, nem mesmo fosse capaz de compreender. Sesshoumaru possuía um olhar muito direto, muito penetrante.

Contudo, eu sustentei aquele olhar e constatei que, por trás da frieza daquelas órbitas douradas, havia uma centelha de melancolia. Eu sempre fui muito boa em decifrá-lo.

— E está satisfeita? — indagou o Dai-youkai.

Esbocei um sorriso discreto imaginando que aquela pergunta era um sinal de que ele se preocupava com a minha felicidade.

— É claro. É bom ter uma ocupação — respondi, alegre.

Ele se voltou novamente para o mapa e moveu mais uma pecinha.

E foi então que, consumida por uma coragem repentina, questionei:

— Está tudo bem? O senhor me parece diferente.

Sesshoumaru pareceu interessado naquela pergunta. Diria até que viu algum humor nela.

— O que quer dizer com isso?

Senti um rubor se espalhar pelas minhas bochechas ao pensar que poderia tê-lo insultado.

— Nada — corrigi rapidamente. — Eu não quis ofendê-lo.

— Não ofendeu — ele lançou um olhar analítico para o mapa e, então, voltou-se para mim, aguardando a explicação. — E então?

— Eu quis dizer que parece pensativo.

Sesshoumaru ficou alguns segundos em silêncio, como se refletisse sobre alguma coisa.

— Quando você chegou neste palácio, você se apresentou para mim como uma serva — disse ele, por fim. — E eu aceitei a sua permanência. Sendo uma serva, isso significa que você aceitará qualquer uma das minhas ordens.

— Sim. Qualquer uma — concordei, sem hesitar.

— E se eu ordenasse que você voltasse para a aldeia de onde veio? — questionou Sesshoumaru. — Você seguiria essa ordem?

Essa pergunta me sobressaltou e senti o coração disparar diante da possibilidade de ele me mandar embora. Contudo evitei demonstrar minhas emoções.

— Não. Essa ordem eu não poderia seguir — falei, calmamente.

— Este palácio não é seguro. Tenho muitos inimigos. O fato de você estar aqui é arriscado — disse ele num tom rígido.

— Eu sei me defender. Não preciso que se preocupe comigo — rebati, contrariada.

— Rin...

— Por que você não acredita em mim?! Por que quer tanto me manter longe de você?! — bradei, interrompendo-o. — Se um dia eu tentei me tornar forte foi por sua causa; porque você me considerava um fardo e por isso me deixou naquela aldeia por todos esses anos! Por anos eu não tive nenhuma notícia sua! Você simplesmente sumiu! Mas, agora as coisas não são mais como antes e, já que estou aqui, ninguém vai me tirar deste palácio!

Uma ruga se formou entre as sobrancelhas dele.

— Eu a considerava um fardo?

Àquela altura, eu estava com o rosto vermelho devido à raiva.

— É claro que considerava! Talvez, ainda considere! Mas, como eu disse, ninguém vai me tirar daqui, nem mesmo o senhor!

— Quando se tornou tão teimosa? — murmurou o Dai-youkai.

Cruzei os braços contra o peito, irritada.

— Se eu sou teimosa, então somos dois.

— Na noite de hoje, todos os encarregados de administrar os setores do palácio devem participar. Acredito que saiba disso — disse Sesshoumaru. Eu assenti. Em parte estava aliviada por ele ter encerrado o assunto anterior. — Imagino que também saiba que toda a elite youkai estará presente, incluindo Arina, minha mãe, e a Grande Bruxa.

Não consegui disfarçar a surpresa quando Sesshoumaru mencionou a presença da Grande Bruxa Youkai. Ela era uma espécie de lenda. Desde criancinha eu ouvia histórias sobre essa poderosa youkai que era capaz de prever o futuro.

Nas aldeias humanas, as mães e as amas de leite contavam histórias sobre ela para as crianças. Por muito tempo, eu achei que a Grande Bruxa não existia, que era fruto de lendas. Pelo visto, eu estava enganada.

— Grande Bruxa? — murmurei, estupefaça.

— Preste atenção, Rin — repreendeu o Dai-youkai. — Em determinado momento da celebração, Katso a levará para o seu quarto. E é importante que permaneça nele até o dia seguinte.

— Por quê? Para que eu esteja segura? — ironizei.

— Na noite de hoje será escolhida a minha esposa — informou Sesshoumaru. O sorriso cínico que eu ostentava em minha face se desfez. — Para essa escolha eu não estarei... Consciente. É assim que é feito entre os youkais. Portanto, você deve se manter no seu quarto até o dia seguinte. Isso é uma ordem.

Assim que soube dessa informação, levei alguns segundos para processar. Eu sabia que uma hora isso iria acontecer. Sesshoumaru era o daimyo daquelas terras. Ele possuía um palácio e servos. A decisão de obter uma esposa já era esperada. No entanto, por alguma razão, eu me sentia incomodada.

E, repentinamente, tudo fez sentido: o aspecto exausto de Sesshoumaru, a misantropia presente em seu olhar, a garrafa de saquê... Ele não queria ter que escolher uma esposa nessa noite. Mas teria que fazê-lo por força da tradição.

— Eu... Eu não fazia ideia — foi o que consegui dizer.

Intimamente, meu coração se encheu de compaixão por ele. Eu queria reconfortá-lo, mas sabia que já não possuíamos a mesma amizade de antes.

— Você não tinha como saber — retrucou o Dai-youkai, sério. — Mas, agora que sabe você terá que cumprir minha ordem.

— É claro — e esbocei um sorriso que saiu um tanto forçado. — Fico feliz em saber que o senhor vai encontrar uma esposa. Espero que ela seja boa.

Sesshoumaru fitou-me de soslaio.

— Não seja tola — disse ele, abruptamente. — Youkais não se casam por afeição. São alianças entre clãs. Agora, pode se retirar. Você já está avisada.

E eu obedeci a ordem que me foi dada: fui embora, deixando-o sozinho com o seu mapa e a sua indisfarçável angústia.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Comentem!! Gosto de saber o que vocês estão achando! ♥



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