Nicest Thing escrita por Nina Spim


Capítulo 19
Chapter Nineteen


Notas iniciais do capítulo

Oba! Eu voltei!
Ok, eu tive uns probleminhas.
1) como tinha escrito o final da fanfic em outro notebook, eu não sabia onde o restante da história estava.
2) daí eu não sabia onde estava o meu pendrive.
3) então percebi que não tinha salvado nada.
4) tive que reescrever esse capítulo da melhor maneira possível.
5) aqui, finalmente, ele está.
Sem contar que eu estou me dedicando a outra fanfic, que não é Faberry, e meio que não conseguia mais voltar ao universo de Nicest Thing.
Me desculpem. O no final original tinha apenas mais dois capítulos, mas acho que só vai ter mais um, depois desse. Ainda estou me decidindo. Não deixem de ler ;)
Beijos!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/383926/chapter/19

Sou a moça do copo de vidro.

O senhor dos ossos de vidro diria: “Ela é uma covarde”. É, talvez eu seja. Não há outra explicação. Não uma que seja capaz de convencer a mim e aos outros. Quase posso ouvir o senhor na sua gravação: “Então, vá. Pelo amor de Deus”.

Mas eu não consigo me mover. Eu quero ir, como eu quero ir. Mas ainda estou ali, sentada no meio e, ainda assim, não fazendo parte de nada. Excluída. Tento dar um jeito na vida de todos, mas não na minha própria. E quem vai me ajudar? Talvez, se eu tirasse uma foto, escrevesse um bilhete para logo em seguida a despedaçar... Mas sei que tudo pode acabar dando errado, mesmo assim. Não sou boa em espalhar pistas. Nem todo mundo tem a capacidade de remontar um quebra-cabeça.

E por mais que eu queira acreditar que tudo está melhor isso não significa que tudo esteja ajeitado. Não na minha vida. Quer dizer, já faz dois dias e Quinn não me contatou – nada de e-mails, ou SMS, ou até mesmo um telefonema. Silêncio total. Por quê, afinal? Se tudo foi remendado, por que não tenho essa sensação? Mas... Talvez seja esse o problema: um vaso quebrado e remendado nunca volta a ser como era antes; ele fica mais frágil e um tanto quanto... Bem, esquisito. As pessoas passam por ele e sabem que seus pedaços quebrados foram colados. Então é isso. Eu sinto – e talvez ela também – que os remendos não foram o suficiente para nos fazer parecer inteiras. Porque, no fundo, ainda estamos quebradas.

Constantemente, Santana aparece na minha mente – é inevitável; é como se ela, agora, fosse o meu subconsciente; é ridículo, na verdade. Desde aquela tarde na qual ela apareceu no loft e foi bastante... Hmmm, implacável, por assim dizer, Santana está vivendo na minha cabeça. Lembro com exatidão de cada palavra sua. Bem, as últimas – aquelas que ela não disse aos berros nem com raiva.

“Não dá pra ser feliz com medo de amar. Amar alguém exige muita coragem, pessoas covardes não amam ninguém”.

Eu sei que ela aprendeu isso da pior maneira possível, porque já relatou toda a sua experiência de ser aceita do modo que é – um pouco intolerante com todos e apaixonada por uma garota. Imagino que, na verdade, não seja fácil para ninguém. Não quando o mundo acha que você é de um jeito, e você é de outro – de um que ninguém entende muito bem e que todos têm certeza de que não é uma coisa normal. Mas, afinal, quem é normal? O que é ser normal? É estar condizente com a vida social entediante ditada por uma sociedade que dá o dízimo para a igreja, mas se recusa a dar um dólar para um mendigo? Tenho certeza de que, então, não sou nada normal. Especialmente depois de saber que sou a moça do copo de vidro.

E, segundo Santana, eu tenho que fazer por merecer. Mas qual é a minha recompensa? O que eu mereço?

Não posso sair provando algo que não faço a mínima ideia do que seja. E se eu não quiser provar? E se, na realidade, ninguém precise provar nada a ninguém? Há uma chance de Quinn entender isso, não? Por que não entenderia, se ela mesma não está tentando provar?

Quem sabe, nós duas estejamos apenas aguardando quem dará o primeiro passo. Por que eu preciso dar o primeiro passo? Por que sempre eu que tenho de dar o empurrãozinho? Eu já não fiz isso indo até ela para amenizar tudo? Eu disse que queria saber sobre ela, e ela me contou. Não foi difícil. Foi aquela coisa que Santana disse: reciprocidade. Ela disse, e eu ouvi. Dessa vez, eu estava prestando atenção. Estava me doando também. Ao menos, foi isso que me pareceu. Tudo bem, não chorei – nem ela tampouco, então por que eu deveria?

Agora que a conheço – por inteira, digo; não apenas alguns episódios de sua vida – é de se pensar que, sim, eu devesse parar de ser covarde e fazer por merecer algo que não tenho ideia. Se ao menos eu soubesse o que Quinn sabe que mereço...

Ela sabe mesmo? Ou Santana estava apenas blefando para me obrigar a enfrentar meu medo idiota de encarar a verdade?

Será que então – mais uma vez – eu devesse dar mais um empurrão? Dar o primeiro passo? Porque não sei se quero viver assim; ela lá, e eu aqui – ambas sem respostas. Ambas esperando eternamente por algo que, muito provavelmente, se ninguém sair do lugar nunca será desvendado.

Preciso quebrar o silêncio. Se não for eu, quem vai? Ela que não. Talvez ela esteja esperando ansiosamente por isto.

Oi. Quer seu scrapbook de volta?

Ela não responde. Passam-se muitos minutos. E depois duas horas. Um dia inteiro. E nada. Eu danço e canto na NYADA, mas nos intervalos, antes mesmo de pegar minha garrafa d’água, verifico minha caixa de entrada. Vazia, sempre vazia. Chacoalho e discuto sozinha com meu Iphone, implorando para que ele me ofereça uma resposta. Nada, sempre nada.

Quando desisto de ansiar, ela me retorna.

Ele é seu agora. Fique.

Não quero admitir a mim mesma que quero responder sua mensagem no mesmo instante. Mas finjo que estou ocupada, muito ocupada. Deixo alguns minutos se passarem. Vou para o loft e peço comida italiana.

O trabalho foi todo seu, não posso aceitar.

Janto com os olhos grudados na tela do celular. Por favor, responda! Não me deixe esperando de novo!

Você merece. Sem discussões.

Eu mereço. Mas por quê? E o que ela quis dizer com isso? Quer dizer, é só um livro idiota cheio de recortes! Ainda assim, acredito que se ela o tirasse de mim, eu ficaria chateada. Todas essas Rachels e Quinns são minhas, agora. E, por mais que minhas lágrimas se acumulem por conta dos sentimentos emaranhados sempre que olho para o livro, é inevitável que eu me sinta responsável por ele – porque ele, tal como Quinn, me cativou. E, você sabe. “A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixa cativar”. Isso é altamente verídico.

Sem discussões. Concordo.

Não demora nada para ela querer saber:

Ainda estamos falando do scrapbook?

Preciso mentir. Devo mentir. Tenho mentido este tempo todo. Ela nunca descobrirá, ainda mais por SMS. Todo mundo mente por SMS. Ou você acha que o último cara com quem saiu lhe mandou aquela SMS no meio da madrugada porque “não conseguia dormir por estar pensando em você”?. É bem mais provável que ele estivesse jogando online com um cara da Rússia um game que você nunca nem mesmo será capaz de pronunciar.

Não sei. Estamos?

E a medalha de Maior Idiota do Mundo vai para mim. Com certeza.

Eu que perguntei. Estamos, ou não?

Não. É claro que não.

Sim, é claro que sim. Sobre o que mais estaríamos falando?

Por favor, esqueça-se de responder. Esqueça-se de responder. Apesar de que, sem olhar no meu rosto, não há como ela descobrir. Certo? É, certo. Porque o benefício da dúvida é sempre a melhor opção em conversas estúpidas por SMS.

Não sei. Sobre tudo. Sobre Finn. Sobre mim. Sobre você.

Oh, droga! Ela enfim sabe. Mas sabe sobre o quê, exatamente? Sobre nada. Ela apenas supõe que sabe. E eu nem estava falando de mim! Estava? Será que ela interpretou assim? Não pode ser! Todo mundo se confunde em SMS!

Parece muita coisa.

Estou prestes a adicionar algo relacionado a ela não ter de se preocupar com nada, pois nossa conversa está encerrada, quando meu Iphone faz o barulhinho típico de mensagem recebida. Fico surpresa. E ainda mais surpresa quando leio o conteúdo sua mensagem:

Posso passar daí?

Não, é CLARO que não! Eu não me convidei para visitá-la! E ela não pode me visitar, assim, do nada! Bem, ao menos ela está pedindo permissão... Não que isso mude algo, ainda estou em pânico. Espere. Por que estou em pânico?

Agora?

Oh, meu Deus. Percebi que estou hiperventilando. Isso é esquisito. Quando foi a última vez que isso aconteceu, realmente? Por que estou em pânico?

Agora, sim. Posso, ou não? Prometo não atrapalhá-la em seus estudos.

Como se depois disso eu tivesse disposição para estudar! Que se dane as partituras!

Pode, tudo bem.

Solto o ar represado. Inspirar, expirar. Inspirar, expirar. Isso. Vai dar certo.

Você ainda está me devendo uma música, não pense que esqueci isso.

E agora acho que vou vomitar.

~*~

Nas aulas de Introdução à Metodologia de Pesquisa, a primeira lição ensinada é que caminho e caminhada são absolutamente diferentes. E quem contestar isso é estúpido. O caminho é sempre sabido, já a caminhada é incerta e permeada de imprevistos. Um método para solucionar uma questão é uma longa caminhada que consiste num conjunto de caminhos, também chamado de procedimentos metodológicos. Para se caminhar, você necessita, fundamentalmente, ter ciência de que pode tropeçar, que a chuva irá atrapalhá-la e que poderá querer desistir. Quando surge um problema você tem que encontrar um meio de se achar em um caminho, mesmo que ele te leve a uma incipiente caminhada incerta – que, com certeza, será um aprendizado. Com o planejamento (que, aqui, seria interpretado como todas as intempéries pelas quais passará), agora precisa adequar os métodos (que, aqui, seriam interpretados como a caminhada).

Tenho um planejamento. Estou no meio de um caminho – mais precisamente no meio de uma encruzilhada. É um caminho, certo? Para quaisquer lados que analiso consigo encontrar possibilidades que confirmam que meu objetivo está próximo de ser alcançado. Como uma luz no fim de um túnel. Mas, no caso, estou sentada no meio dos trilhos, aguardando o trem me lançar para frente – não sei se me importo com a dor, ou com as consequências; desde que ele me fazer desempacar, está tudo ótimo. Apenas não quero ficar ali, sozinha, sem saber o que fazer. Preciso que me compelem a sair andando e procurar um alívio.

Dentro do meu carro, que está estacionado no meio-fio em frente ao prédio que dividi com Kurt, Rachel e Blaine, meus dedos doem. Doem porque estou apertando o volante com extrema força. A verdade é que não sei o que devo fazer. Ainda estou no meio do túnel.

O que fazer?

Seguir em frente, subir os seis lances de escadas e me deparar com Rachel?

Ou então...

Retroceder, religar o motor e retornar para o apê, para junto de Sant e Britt?

Tenho ciência – e isso aprendi nas aulas – de que, se me acovardar, nunca encontrarei uma resposta. Não poderei concluir um ciclo de pesquisa. Se não saio do lugar, se não tenho informações para avançar, nunca completarei minha caminhada.

Ela ficará incompleta, para sempre.

Se tiver a coragem para sair do carro e enfrentar as consequências uma etapa se concluirá, dando chance para que outra, agora em aberta, possa me levar para outro caminho – e assim, minha caminhada continua.

A caminhada não pode parar. Se parar, é porque falhei. Não quero mais falhar.

Miro o retrovisor. A rua está movimentada. Há buzinas ecoando, mas finjo não me incomodar com isso. Mesmo com o ruído incessante, posso escutar meu coração martelando forte no meu peito e repercutindo em meus ouvidos.

Tum. Tum-tum. Tum. Tum-tum.

Não gosto disso. Gostaria de domesticar meu medo. Expiro com vontade, profundamente. Se eu apenas respirar com cadência, sem preocupação, vou conseguir. Vou me acalmar. Tento me convencer disso pelos próximos cinco minutos. Mas Rachel sempre retorna na minha mente, e isso ocasiona certo pânico em mim. Não consigo diminuir os meus batimentos. Sinto-me quente, e depois fria. Parece que estou suando. Minha pele nos braços está gelada, mas meu rosto está quente, fervilhando. Esquadrinho-me pelo retrovisor: não estou no meu estado normal. Estou roborizada e agitada. Fecho os olhos, inspiro, expiro. De novo. Mais uma vez. Até cansar de controlar minha respiração. Foco meu relógio de pulso: dois minutos se passaram. Insuficientes. Preciso de mais tempo. Cadê meu tempo?

A gente acaba se fechando por medo. Um medo absurdo de dar errado de novo. Um medo de confiar e quebrar a cara. De acreditar que é o certo e se deparar com o errado. A gente se fecha, se afasta, acolhe a ideia de se manter assim...

E assim tenho feito.

Tenho de distanciado para que não repita os meus erros. Não quero mais falhar, não quero mais ser a vergonha da família, não quero fingir que quero permanecer sozinha. Ninguém se acostuma com a solidão. Gosto de alguns minutos a sós, comigo mesma. No entanto, ficar assim... Para sempre? Quem gostaria disso? Nunca tive uma definição para o amor. Nunca defini a pessoa com quem gostaria de estar, com quem gostaria de dividir minha vida, por quem gostaria de ser consolada, ou incentivada a algo. Acredito que, na verdade, a gente não precisa ter uma definição. Se você tiver uma definição do que quer encontrar, vai ignorar todas as outras pessoas que seriam potencialmente um bom par pra você. Se você desejar uma definição vai estar colocando uma barreira imensa entre você mesma e aquilo que, supostamente, deseja.
Então Puck aterrissa na minha cabeça.
Ele não tinha a definição que procurava. Garotas dizem que adoram garotos como ele, pois ele é do tipo “transgressor” – e dizem que garotos “bonzinhos” nunca são valorizados o suficiente. Eu nem ao menos sabia o que tinha me atraído em Puck. Talvez eu tivesse cedido, pois ele fora o primeiro garoto que demonstrou interesse em mim – se é o que ele parecia nutrir pudesse ser chamado de interesse. Como eu poderia ter sabido que ele apenas estava a fim de me levar para cama? Eu tinha 14 anos e, como Rachel bem colocou, eu não sabia muito sobre a vida naquela época. Com 14 anos queremos ser aceitas, amadas, valorizadas. Ao estar com Puck, achei que encontraria tudo aquilo.

Mas ele estava longe de ser meu príncipe encantado.

Quando recordo das lágrimas de Rachel naquela noite na qual compartilhou sobre o trauma de ter sido largada por Finn, encontro minhas lágrimas também. Ainda sou uma derrotada sentimental, nutrindo-me do passado, remoendo o que ficou para trás.

E por isso preciso seguir em frente. Preciso me desvencilhar de tudo aquilo.

Rachel é meu caminho. Se eu chegar até ela, a partir daqui, minha caminhada pode me revelar muito mais possibilidades de vitória. De conquistar, também, uma resposta muito aguardada há tempos.

Assim, não a defino. Deixo que minhas definições com relação a ela caiam por terra. Não quero defini-la. Não quero me equivocar e estragar tudo.

Não quero ter uma definição para o que preciso. Se eu pensar demais, se eu desejar demais, acabarei por perder todas as milhões de chances que poderiam ter sido bem-sucedidas. Não preciso de definições, quero aceitar mesmo aquilo que não "se encaixa" comigo, conforme os padrões aceitáveis.

Se não é Puck, talvez seja outro alguém.

Alguém que não me deixa ficar calma e que está me provocando ataques de pânico a todo momento. E aquele scrapbook? Como Santana teve coragem de dá-lo à Rachel, se sabia que eu pretendia desaparecer com ele? Se meu nervosismo já não estivesse comprometendo minhas faculdades mentais, poderia ameaçá-la por aquilo. O scrapbook era uma prova consistente de que gostaria que aquelas Rachels e Quinns ainda estivessem juntas, unidas. Sei que ainda há uma união – mas tão ínfima e tão frágil que tenho medo de quebrá-la mais uma vez. Não quero falhar com sua confiança, mais uma vez. Quero juras de promessas, dedinhos entrelaçados e até mesmo aquela coisa.

Quero ser capaz de confessar a ela, de me abrir de uma forma que nunca tive a urgência – quando foi a última vez que me declararei para alguém? Puck? Não. Eu nunca falei de amor para ninguém. Sempre reservei este sentimento para eu mesma. Se eu falhasse com ele, somente eu saberia.

Quando falhei com Puck, apesar da angústia, carregar aquele segredo não foi tão caótico assim. Sim, eu acreditava que a maior parcela de culpa estava depositada em mim – eu me deixei seduzir, afinal. Não falhei com Puck, agora vejo; falhei comigo mesma. Desmantelei tudo de correto que havia em mim. Falhei com meu coração, com minha dor, com meu amor.

Amor, este, que nunca se fez necessário.

Nunca aceitei a solidão, mas aprendi a conviver com ela. Como um camaleão eu me adaptei àquela condição. À garota quebrada por dentro. Era fácil aceitar meu coração quebrado, humilhado, desvalorizado quando eu sabia seguir em frente.

Eu segui em frente. Até agora.

Agora, entretanto, estou aqui. Parada. Em pânico. Sustentando todo o meu oxigênio nos pulmão que parecem prestes a explodir.

Meu celular toca, assustando-me. A música está alta e temo que, lá do sexto andar, Rachel saiba que estou aqui. Por isso, toco a tela rapidamente, para cessar o ruído.

- Alô – não li quem está me contatando. Não me importo.

“Cadê você? Não me diga que...”, o tom de Santana está aborrecido.

- Estou aqui no loft. Quer dizer, estou aqui embaixo tentando me decidir o que fazer – corrijo rapidamente, sentindo-me ainda febril. Sinto náusea, também. Há uma pausa. Fico esperando que ela comece a gritar comigo, mas a linha esta silenciosa – Sant? O que eu faço? – peço seu auxílio.

“Ah, pelo amor de Deus”, ela exclama.

- Por favor, me diga. Estou completamente sem direção.

“Você está com medo. Quinn Fabray, você nunca foi covarde! Não me faça ter de me deslocar até aí para te dar um tapa na cara!”, Santana reage de forma irritadiça. Não tenho culpa. Não escolhi isso. Como posso explicar isso à Rachel? Ela nunca entenderá. Estou me acovardando, sim. Mas aceitar isso é mais satisfatório do que ser rejeitada – não serei capaz de passar por isso novamente; não agora quando estou convicta quanto à minha caminhada.

Por que perguntei sobre ir ao loft? Fui tão idiota!

- Me diga.

“Você sabe o que fazer”, ela respondeu e, em seguida, desligou. Na minha cara.

Santana é um amor, não? Nem dá pra acreditar que Britt consiga lidar com ela.

Claro que sei o que fazer, mas tenho receio da consequência. Mas eu já deveria ter aprendido: quaisquer atitudes nossa desenvolve uma reação. No meu caso, não sei se a reação será positiva ou negativa. Se não tenho uma previsão do que me espera, como posso agir?

Não sei se quero arriscar. Arriscar implica sofrer. Sofrer implica se importar. Se importar implica amar. Amar implica aceitar todas as consequências.

Não estou pronta para elas. Para as consequências.

Aspiro mais ar que o necessário e enfim abro a porta do carro. Ao pousar minhas sapatilhas no asfalto, parece que irei me desmontar: não sei se tenho condições de me sustentar. Com a chave do automóvel em mãos, estico meu corpo. A calçada também está abarrotada, não sei o que isso significa. Carnaval fora de época? Não sei, não sei mesmo. Estou avoada, imprecisa. Ergo meus olhos até o topo do prédio. Tento notar se há alguém me espiando nas janelas, mas chego à conclusão que a maioria dos residentes está ausente. A dos moradores do sexto andar, no entanto, está aberta. Imagino que, se Rachel está estudando agora, suas partituras estão se esvoaçando pelo loft, deixando-a louca da vida. Ou então – e isso me acerta abruptamente – a janela aberta indica o sinal do qual preciso: Rachel está me aguardando como prometido. Titubeio por um momento. Se Kurt ou Blaine estiverem presentes, não sei se conseguirei ser eu mesma. Não da forma como fui da última vez que nos encontramos, na Party City. Concluo que é impossível que eles tentem intervir em algo.

Como não tenho mais a chave que abre o portão principal do prédio, preciso interfonar. Não queria ter de fazer isso, mas é o único modo. Meu dedo indicador aperta o botão três vezes seguidas, muito rápido. Pareço estar mais nervosa do que nunca. Espero não deixar transparecer isso quando estiver na frente dela.

“Não acredito que você esqueceu as chaves de novo”, Rachel logo ataca. Sei que sua frase não está sendo dirigida expressamente a mim. Sei que quem vive esquecendo o molho de chaves é Kurt.

- Não é Kurt. Sou eu. Quinn.

Minha voz está tremida. Mau sinal. Péssimo sinal.

“Oh”. Há um grande silêncio. Então ela acaba dizendo: “Oi”. Nada mais. E então o portão se abre, simples assim. Tento escutar alguma estática do aparelho, mas ele está mudo. Rachel já não está ali. Pergunto-me se está ao meu aguardo na soleira da porta. Não, não deve estar. Seria ridículo. Subo os lances de escada. Tinha me esquecido do esforço que fazia todos os dias para tal feito. Parece que se passaram muito meses desde a última vez que estive ali, para retirar meus pertences do loft. Meu peito é corroído por uma nostalgia esquisita. Quase posso sentir o cheiro dos cookies de Blaine no forno e do perfume floral de Rachel. Assim como a sensação me ataca vai embora do mesmo modo: rapidamente. Quando enfim alcanço o corredor do sexto andar, estou ofegante. Uau, eu preciso fazer mais exercícios! Não quero morrer sedentária, muito obrigada! Afasto isso da mente, assim que ouço uma porta se entreabrir. Penso ser o vizinho, colocando o gato para fora, ou talvez as encomendas entregues no número errado, mas não. É Rachel. Ela entreabriu a porta e está me espiando de lá de dentro.

- Não dá pra acreditar que você se desacostumou tão rápido às escadas – Rachel diz. Detecto um pouco de riso por entre seu tom. Não tenho condições de sorrir, embora queira muito fazê-lo. Tenho medo de que meu riso se transforme em lágrimas. E isso seria ridículo.

Não digo nada, fico parada a poucos metros dela, séria e ansiosa. Noto que Rachel, agora, carrega uma peculiar chama nos olhos. Não sei distinguir muito bem, mas pressuponho ser desconforto. Não há raiva, e isso é um alívio.

Caminho em sua direção, e ela me concede espaço suficiente para me adentrar no loft. Minhas mãos estão gélidas e não param de alisar o tecido da jeans que estou vestindo. Estão se remexendo de uma forma jamais vista. Não sei bem ao certo quando essa mania estúpida começou. Não me lembro de nada com muita clareza. Decido, portanto, juntá-las, para evitar que deem indícios da minha loucura. Estou dizendo. Minhas faculdades mentais estão seriamente debilitadas! O que será que aconteceu? Será que o vodu de Santana finalmente deu certo, e ela errou o alvo? Seria uma explicação plausível.

Estou um pouco sem ação. Quieta demais.

- Está tudo bem?

Olho para Rachel. Ela está longe de mim, perto da bancada da cozinha, mas sua expressão revela preocupação, um misto de confusão com especulação, também. Entendo que ela não sabe como proceder.

- Yeah – assinto, embora não seja o que queira mesmo dizer. Só quero ficar em silencio observando-a enquanto se move de um lado para outro, como nos velhos tempos. Ah, os velhos tempos! Há quantas semanas isso aconteceu? Duas? Cinco? Perdi-me nas contas. Duvido que Rachel saiba. Parece que tudo ocorreu em outra dimensão, em outra vida.

- Então?

- O quê? – pisco para ela e franzo a testa.

Rachel dá de ombros. Não está sorrindo, mas sei que todo o seu autocontrole está agindo sobre ela.

- Por que você está aqui?

Meus olhos se arregalam por um instante. Acho que ela está me confrontando, obrigando-me a confessar algo que não estou pronta a revelar. Como poderia? Mal sei o que estou fazendo aqui. Meu carro me guiou o tempo inteiro, nem sei como não causei nem um tipo de acidente durante o percurso.

Por que lhe mandei aquela mensagem maldita, Deus? Sou muito idiota. Agora não sei nem mesmo o que lhe dizer.

- Queria ver você.

Não é uma mentira. Desde aquela noite na Party City estava doida para vê-la. Para averiguar seu rosto sereno, seus olhos e sua atitude. Será que ela estava inteira, ainda? Pensava naquilo, antes de nossas mensagens começarem.

Rachel, ao contrário do que eu esperava, não se desarma na minha frente. Seu olhar penetrante ainda é sustentado e seus braços estão abraçando seu tronco como se estivesse com medo de que, se deixar de fazê-lo, não saiba como se portar.

- Confesso que fiquei surpresa por saber que você gostaria de retornar aqui – Rachel diz de uma forma leve – Ainda tenho o scrapbook, como lhe disse. Achei que quisesse se livrar dele.

Faço que não com a cabeça.

- É seu agora.

Ela esboça um sorriso tímido.

- Gostei dele. Você é ótima nisso.

Mordo meu lábio, indecisa.

- Obrigada – agradeço sem jeito.

O silêncio reina. Não sei se quero me pronunciar. Poderia ficar mergulhada nesse momento para sempre, pois ele não me incomoda. E vejo que não provoca nem um sentimento irrequieto nela. Estamos ambas entregadas no silêncio; nos nossos gestos reprimidos, nos nossos olhares que derramam significados pelo espaço, nos nossos rostos tranquilos.

Poderia mirá-la pela tarde inteira. Talvez, por muito tempo.

- Então... – Rachel faz uma pausa, acho que tentando encontrar uma maneira de dizer o que precisa. Acho que ela não sabe ao certo como traduzir o que está em sua mente – Seu lugar ainda está reservado. Você vai voltar?

- Vou quer que eu volte? – rebato na mesma hora. Não expresso nada na minha voz, apenas um pouco de ânsia.

- Eu perguntei primeiro. Não interessa a minha opinião – ela é incisiva. Gosto disso nela. Essa certeza perante a tudo. Gostaria de ser assim, também.

- Interessa, sim – afirmo, tentando aparentar ser tão decidida quanto ela – Se você não me quer aqui, como posso conviver com isso?

- Eu... Quero você aqui, Quinn – ela pronuncia com dificuldade, colocando uma mecha do cabelo escuro atrás da orelha, num gesto acanhado – Senti sua falta.

Quando ela me confessa isso, sinto meus pulmões pressionados pelo peso de suas palavras. Minhas mãos tocam meu rosto quente. Estou surpresa, mas também um pouco cautelosa. Não quero interpretar nada de modo equivocado. Não quero ser iludida, me alegrar com algo inexistente. Tendo isso em vista, respondo:

- Não, você sentiu falta da Lucy.

Rachel nega rapidamente, ainda afastada de mim.

- Senti falta das duas. Das suas músicas, das suas meias no assoalho, das suas broncas por me ver tomando café demais. E todo o resto também. Senti falta de você, independentemente de quem você foi um dia.

Ela é certeira no que afirma. É segura. Mais segura do que achei que seria. Retomo a fôlego e pergunto, com o tom oscilante:

- Verdade?

- Totalmente – Rachel confirma na mesma hora, sem perder tempo – E então?

- Você sabe que não precisa fazer isso, certo? – tenho a necessidade de perguntar.

- Não, é justamente isso: eu preciso. Porque não consigo mais ficar sem você. Sem a Lucy e sem a Quinn. Vocês fazem parte da minha história. E quero que elas continuem fazendo.

Tento me conter. Não quero começar a chorar, a demonstrar a minha fraqueza diante disso tudo. Não quero que ela saiba que ela me afeta, que tudo nela me provoca da maneira mais sensível possível. Queria expurgar toda a dor que está em mim enquanto olho para ela, mas não sou capaz nem mesmo de dar um passo em sua direção. Juro que, se ela fizer menção de se aproximar de mim, é capaz de eu repeli-la. É uma atitude ridícula, mas quero impor algo entre nós – algo que lhe avise que ainda estou quebrada. Não sei se já tem ciência disso. Acho impossível saber, de tão longe. Ela não está fazendo um mapeamento explícito de mim, agora. Está tendo dificuldade em me esquadrinhar. Por quê? O que ela acha que farei?

- Não se afaste, por favor – ela diz. Agora, ela faz o que temo: seus passos vêm em minha direção. Ela está com uns chinelos bonitinhos, cor de rosa. Percebo que veste calça de ginástica cinza-chumbo e uma camiseta larga branca.

Faço o que ela implora para que eu não face. Afasto-me de sua menção de ficar mais próxima de mim. Minhas pernas dão um passo para trás, involuntárias. Não faço de propósito, apenas quero me proteger de sua decisão, e da minha também. Quando percebe o meu gesto, ela estanca. Fica estática na minha frente, me especulando com os olhos. Eles parecem sofridos. Não aprecio isso, mas não tenho poder algum de modificar isso. Não enquanto eu mesma estou exibindo sofrimento nos meus.

- Você não quer voltar.

Não é uma pergunta. Ela está afirmando. Adoro que ela esteja dentro da minha mente. Às vezes, isso incomoda, mas tem um lado bom: não preciso ficar explicando tudo a ela. Rachel sempre sabe o que pretendo.

- Preciso de um tempo.

- Você já teve isso. Você foi embora de Lima, da minha vida, como se não quisesse mais olhar para trás! – ela me acusa de um modo que me faz querer fugir para sempre. Não suporto que ela seja assim comigo. Isso me machuca por demais.

- E ainda não sei se quero, dá pra entender?! – retruco num tom alto, desesperado – Você acha que não sinto nada ao me lembrar das palavras que você já me disse, de todos os sentimentos ruins que lhe causei? Acha que não sinto nada ao estar aqui mais uma vez, como se nada disso tivesse me pertencido um dia?

- Vão continuar pertencendo, se você se abrir novamente – ela me alega. Seus passos são mais rápidos que os meus: quando percebo, ela está bem à minha frente, com as mãos aparando meus antebraços. Não sei se consigo respirar agora. Sei que parece clichê demais, mas não tenho capacidade nenhuma de resfolegar, ou de puxar um pouco de ar para evitar um desmaio desnecessário – Você não vê? Você regressou completamente ao estado que era quando veio para cá. Não a quero assim. Quero a Lucy e a Quinn que aprendi a amar e a admirar. Não me interessa o que veio depois. Fui estúpida por não saber separar isso. Você me conquistou há muito tempo, apenas nunca tinha me dado conta do quanto.

A ausência de frieza nela apenas me impelia a ceder à sensação arrebatadora que sentia de começar a derramar lágrimas. Não quero parecer fraca, mas seu tom doce e sincero me engolfa pra um estado completamente diferente do comum.

Abro minha boca, mas torno a fechá-la. Meu semblante está congelado.

- Você está me ouvindo? – Rachel aperta com gentileza meus braços. Assinto. Ela, subitamente, me aperta mais, mas agora numa abraço. Ela me encosta nela com cuidado, sem me machucar. Percebo que ela procurou fazer este gesto desde o início. E, ainda que eu não esteja dando total abertura a ela para fazer isso, Rachel não se afasta. Ela deita seu rosto no meu ombro e respira algumas vezes. Minha respiração está represada, não sei mais como se respira. É ridículo. Quero me desvencilhar desse medo – Quero que você volte. Para o loft, para os meninos e para mim.

Ela ainda está comigo. Está me apertando com leveza. Sua voz se infiltra pelos meus ouvidos com suavidade.

Entendo que ela me queira de volta no loft. Mas não para ela.

Desgrudo-me dela. Tento ser gentil, para que ela não entenda que eu a estou rejeitando. Não quero mais rejeitá-la.

- Por quê? – inquiro. Estou confusa, observando seu rosto perto do meu.

- Por que o quê?

Pisco.

- Por que você quer que eu volte... Para você?

Rachel recolhe as mãos de meus braços, como se eu estivesse lhe queimando. Sua atitude, agora, é esquiva. Quase tanto quanto a minha.

Olho-a com decepção.

Sou uma negação. Sou uma vergonha.

Não quero mais ficar me defendendo do amor. E se esse amor for o único que tenho?

Quando ela faz menção de abrir a boca e me dizer, balanço a cabeça e digo:

- Não diga. Está tudo bem.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não consegui fazer diferente esse final. Não lembro o que tinha escrito no outro final e, por isso, não quis me obrigar a fazer algo tão meloso assim. Como não conseguia escrever nada muito romântico, tive que terminar assim. Desculpem se ficou uma porcaria. O próximo deve ser melhor ;) Reviews? Beijos!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Nicest Thing" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.