Stranger escrita por Okay


Capítulo 15
Verdade.


Notas iniciais do capítulo

Beijos & Boa leitura! ♕
Capítulo revisado e reescrito 20/09/2018



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Capítulo 15 — Verdade.

Lucas olhava para a expressão de Marcus, derretendo-se com a empolgação dele.

— Por onde a gente começa? — O moreno inquiriu.

— Já? Tão rápido assim?

— Qual o problema nisso?

— Não, tudo bem, só achei engraçado. — O loiro riu baixinho. — Eu não tenho malas, só tenho uma mochila, mas eu também não tenho muitas roupas, então eu acho que dá.

— Tudo bem, de qualquer forma, eu vou te encher de coisa nova. — Riu, ainda imerso em entusiasmo. — Posso te ajudar a pegar as coisas?

— Pode ser. 

— Então você vai me falando o que precisa levar de importante. — Aproximou-se do guarda-roupa dele, prestes a começar. — Além dos seus documentos e tudo mais. 

— Ah, não, nessa gaveta não. — Lucas falou seriamente, com Marcus estranhando a mudança em seu tom de voz.

— Desculpa. — O moreno pediu, com a mão ao puxador, querendo uma explicação. — Mas por que não?

— Ah... São as minhas cuecas. Deixa que eu pego por último.

— A gente estava transando no banho meia hora atrás, qual é o problema de eu ver suas cuecas? — Rebateu, abrindo a gaveta, vendo apenas papeis amassados, canetas sem tampa, um canivete antigo e meias sem pares. — Você tá precisando lavar suas roupas, aqui já não tem nada.

— É... — Respondeu, soltando uma respiração pesada, transparecendo seu nervosismo.

— Só tem uma coisa que eu não entendi, Lucas.

— O quê?

— Quando você se trocou e abriu o guarda-roupa para pegar uma cueca, não foi essa gaveta que você abriu, foi a de baixo. — Marcus encarou-o, parecendo deduzir algo.

— Eu guardo nas duas. — Falou, dando um sorriso desconfortável. — Eu só não queria que você visse a bagunça...

— E se eu tirar o fundo falso dessa gaveta o que eu vou encontrar? — O moreno inquiriu, fazendo-o gelar. Não precisou olhar atentamente para a gaveta para perceber o desnivelamento em seu interior.

— Não. — Lucas impediu-o segurando seu braço, dando um passo para a frente.

— O que você está escondendo?

— Por favor, não. — Suplicou, olhando-o nos olhos.

— O que é que eu não posso ver? Fala pra mim. — Marcus exigiu.

— É segredo. — O loiro desviou o olhar do dele, constrangido.

— Um grande defeito meu é que eu sou curioso. — Não obedeceu, dando as costas para ele, conseguindo retirar o tampo falso, mesmo que ele lutasse contra. — Mas o que...

— Era isso. — Lucas falou nervosamente. — Eu sou obrigado a ficar com isso aqui...

— Você é traficante?! — Vociferou, sem saber se olhava para ele ou se olhava para um pacote de tamanho médio escondido. — Isso é cocaína?

— Eu não sou traficante. — O loiro tentou explicar. — É só até virem buscar... Eu sou obrigado a guardar isso, eu não vendo nada!

— Aham. E eu sou o papai Noel. — Marcus desdenhou.

— Por favor... — Respirou fundo, com o coração a mil.  

— Você não me respondeu, isso é cocaína?

— É. — Lucas engoliu em seco.

— É isso o que você fez para sobreviver daquela época até hoje?

— Você diz como se fosse uma escolha minha, mas não, não é! Eu não queria nada disso!

— Todos dizem isso. — O moreno falou, incrédulo, esfregando a testa. — Eu não acredito, não acredito, Lucas! Eu jurava que você era um coitadinho, ingênuo, que precisava da minha ajuda... Não acredito! Tudo o que eu acreditava era uma pura mentira?!

— Não! Você não entendeu! — Segurou aos braços dele, forçando-o a encará-lo. — Eu não procurei isso, eu não fui atrás disso! Mas se eu não colaborar, eles me matam! Eu não consigo me livrar disso!

— É claro, o que você acha que ia encontrar nesse mundo do tráfico? Pessoas que estão dispostas a te dar um abraço quando você precisa?! Tá louco, moleque?! — Marcus exclamou.

— Para de falar comigo como se eu fosse um traficante!

— Mas é o que você é! Não tenta dar outro nome pra isso, porque não tem! — Chacoalhou-o. — Você é um traficante!

— Nada disso teria acontecido se anos atrás você tivesse ido me buscar como me prometeu! — Lucas rebateu, vendo a expressão dele mumificar-se no mesmo momento.

Como um passe de mágica, o homem ficou em silêncio. Estava estático, parecendo profundamente decepcionado, como se procurasse algo a dizer. Marcus afastou-se dele, tomando coragem para encará-lo apenas depois de alguns minutos.

— Parece que você não ouviu nada do que eu te disse agora pouco... — Falou, com voz embargada. — Eu quis, mas não pude te buscar, não tive como. Jamais fale como se a minha promessa fosse falsa.

— Do que isso vai adiantar agora, afinal? — Lucas enfrentou-o. — Olha a merda que eu tô vivendo! Você podia ter evitado tudo isso! Eu te esperei!

Marcus desviou o olhar, não queria que ele visse seus olhos vermelhos, tanto por raiva, quanto pelo choro que ameaçava vir. Tomou o pacote da gaveta, decidido a acabar com aquilo.  

— Ei! O que você tá fazendo?! — Lucas apressou-se, querendo tomar de volta. — Me devolve isso!

— Você não acabou de dizer que não consegue se livrar disso? Quem sabe na marra você não consiga?!

— Me devolve!

Marcus ergueu o pacote para o alto, sendo o suficiente para que ele não alcançasse, Lucas tentava inutilmente puxá-lo para baixo, tentando alcançar desesperadamente. Seguiu-o pela casa, vendo-o entrar ao banheiro.

— O que você vai fazer?! — Gritou, desesperado ao vê-lo rasgar o pacote, libertando o conteúdo no vaso sanitário, em seguida dando descarga. — Marcus!

— Tá feito.

— Eu não acredito que você fez isso... — O loiro falou, rangendo os dentes.

— Você tem mais escondido em algum outro lugar?

— O que você acha que é?! Maconha?! Só nesse pacote tinha uns vinte mil dólares! Eu vou ter que dar o cu pra pagar essa merda! — Exclamou, levando as mãos aos cabelos, querendo arrancá-los. 

— Você vai me agradecer por isso. — O moreno falou, exibindo toda a frieza que conseguia carregar.

— Você tá doido?! Quem você pensa que é?! Acha que fazendo isso vai ser o salvador da pátria? Que vai conseguir combater todos os traficantes do mundo só com isso?! — Lucas não conseguia mais esbravejar sem sua voz ficar trêmula, deixando o choro de nervosismo tomar conta. — Você só me ferrou, só isso. E que você ganhou com isso? O que eu vou dizer quando vierem buscar e eu não tiver nada?!

— Aí tudo vai acabar.

— Vai mesmo. — Enxugou os olhos com força. — E eu espero pelo menos tenham piedade e não me torturem muito. E que seja uma morte rápida.

— Pode ter certeza de que não vai doer mais do que eu estou sentindo agora. — Afirmou, exibindo todo o seu descontentamento, dando as costas para ele. 

Lucas não conseguiu respondê-lo, em um misto de ódio, repulsa e tristeza por não conseguir entender o egoísmo daquele homem. Não o seguiu quando ele saiu do banheiro, apenas percebeu que ele havia ido embora quando ouviu a porta de entrada ser batida com força.

Seu coração ainda estava acelerado, sem conseguir raciocinar direito. Andou pela sala, olhando tudo ao redor, sua visão estava borrada pelo choro que agora não conseguia conter. Sentou ao sofá, encolhendo suas pernas nele, fungando algumas vezes e enxugando seu rosto.

Pensou que provavelmente seus vizinhos teriam ouvido a briga claramente e que provavelmente seria denunciado ao síndico. Seu medo era de que fosse expulso, se já não fosse grave o suficiente um escândalo como aquele, se tratando então do tráfico em questão, ficava receoso se teriam ouvido nitidamente a discussão ou não.

Lucas sabia que não tinha sido errado em ter desconfiado da oferta tão boa que Marcus tinha lhe feito mais cedo, sabia que estava certo em ter desconfiado, mas se sentia mal por ter fraquejado e, pelo impulso, aceitado a proposta. Nada daquilo teria acontecido se não tivesse acreditado.

Mas agora não adiantava se martirizar, tinha que resolver a situação antes que fosse procurado para devolver a cocaína que agora não tinha mais. Pegou sua mochila e colocou tudo o que conseguiu de mais importante dentro dela, ainda com lágrimas nos olhos. Algumas roupas ficaram para trás, mas pegou o que coube que mais precisava para ir embora dali.

Enquanto pensava no que fazer, tinha que resolver sua situação de uma vez por todas, não poderia enrolar Gustave. Agora que tinha visto quem Marcus verdadeiramente era, queria permanecer com o namorado, ao mesmo tempo que não se sentia mais digno pois havia o traído, sem saber o que fazer para prosseguir. Gustave era um anjo de pessoa, seria sincero com o risco de nunca mais vê-lo, ou não diria a verdade para não ter a chance de perdê-lo?

Pelo menos naquela noite, não quis pensar naquilo.

A madrugada daquele sábado estava sendo tortuosa para Marcus, que no momento em que pegou-se dormindo, um sonho para perturbá-lo começou. Fazendo-o com que se lembrasse de tudo o que aconteceu na noite de seu sequestro. As palavras de Lucas sobre tortura desencadearam um flashback em seu subconsciente que o perturbou pela noite toda.

O moreno revirava-se na cama enquanto se recordava do momento em que usaram clorofórmio para fazê-lo perder a consciência. Por mais que houvesse se negado com todas suas forças para não respirar do lenço encharcado com a forte substância, não conseguiu, pois eram dois homens lhe segurando pelos braços e um terceiro pressionando fortemente seu rosto.

Sem nada enxergar, retomou a consciência, suas mãos estavam amarradas em suas costas, além de seus olhos vendados. Pelos barulhos e movimentos, notou que estava em um carro, evitou dizer algo para que não fizessem algo pior consigo, ficando quieto para simular que ainda estava inconsciente, talvez assim pudesse ganhar alguma vantagem.

Chegando ao local, amoleceu seu corpo para que pudessem carregá-lo para fora do carro, quando sentiu que estava a uma boa distância do veículo, debateu-se. Pelos seus sentidos, um dos homens que o segurava havia caído e os outros dois se esforçavam para não deixá-lo fugir. Sua venda caiu ao chão e foi nesse exato momento em que parou de lutar, deparando-se com revólveres de cinco homens apontados em sua direção.

Engoliu em seco, seus esforços seriam em vão se continuasse a resistir. Ouviu ordens para se ajoelhar e foi assim que recebeu seu primeiro golpe, batendo o ombro ao chão, com um pontapé vindo pelas costas. Como não estava com suas mãos livres, ao cair jogou com força o ombro primeiro, para assim não bater a cabeça, o que funcionou, porém, foi doloroso.

Gemeu enquanto o puxavam pelos cabelos ainda longos. Com ódio, narraram tudo o que fariam consigo e o que seriam capazes para descobrirem qual era o motivo de tanta rebeldia da parte dele dos últimos dias. Sair da organização não era uma opção e muito menos uma boa resposta.

Marcus não tinha o que dizer, ficando em silêncio enquanto sentia juntarem seus cabelos com uma só mão. Sendo empurrado contra uma lâmina que estava tão perto de si que poderia ver seu reflexo, tremendo ao ver que uma grande mecha de seu cabelo caiu ao chão. Seu coração se apertou, mas continuou calado, apenas esperando o fim daquilo.

Sabia que não estava agradando a eles, mas não fazia diferença, não precisavam de um motivo em específico para dar uma lição em um colaborador. Ele poderia estar executando muito bem suas tarefas e, em um dia qualquer, receber a notícia de que um parente próximo foi morto misteriosamente. Assim como poderia estar sendo rebelde e receber uma lição para que se endireitasse, tudo isso sem qualquer mínima justificativa, na realidade, nada importava para eles senão o caos absoluto.

Quando viram que ele não abriria a boca, os outros rapazes se aproximaram para também se divertirem. Brincaram com o restante do cabelo que sobrou e terminaram passando a navalha onde o primeiro homem tinha começado. Sem noção alguma de cuidado, rasparam à força a barba do rosto de Marcus, que sangrou em diferentes pontos. O moreno apenas pedia mentalmente para que eles mantivessem seus olhos longe daquelas lâminas.

Ainda com as mãos amarradas, não podia evitar com que fizessem o que bem entendessem. E a cada vez que desviava o rosto ou encolhia seu corpo, recebia um golpe diferente, uns usavam o joelho, outros a ponta dos pés e os punhos fechados. Cerrou os olhos, grunhindo a cada vez que era acertado, sem nem mais saber de onde vinha cada ataque.

Já estava exausto quando todos eles deixaram-no ali sozinho. Estava tão dolorido que apenas o fato de estar em paz já era o suficiente. Não conseguia se mover, então faria do chão daquele galpão, seu colchão daquela noite.

Sentia-se tonto, nem sabendo quanto tempo exatamente tinha passado quando foi acordado por toques em seu pescoço. Ao abrir os olhos reparou que um homem estava abaixado perto de si, com dois dedos pressionando sua jugular, verificando se estava vivo.

— Ei, o que está sentindo? — O homem de cabelos castanhos indagou. — Consegue me enxergar bem?

O moreno apenas encarou-o em silêncio, incomodando-se com a claridade. 

— Onde te atingiram? Tem alguma parte de seu corpo dolorida? — Tocou nele, vendo que ele encolheu o corpo no mesmo instante. — Aparentemente está tudo dolorido, não é? Bom, seja lá qual foi o motivo de você estar aqui, eu posso cuidar desses cortes no seu rosto e se quiser que examine algo mais, é só me dizer.

 — Quem é você? É médico por acaso? — Marcus perguntou, mal-humorado.

— Meu nome é Derek. E ironicamente ou não, sim, sou médico. — Tirou um canivete do bolso. — Vem aqui, vou soltar suas mãos. 

Ainda receoso com a aproximação suspeita daquele homem, deixou com que ele se aproximasse de si com o objeto pontiagudo, afinal, já tinham lhe machucado tanto que caso ele quisesse lhe ferir mais um pouco, não faria diferença.

— Você não me disse seu nome. — Falou, após terminar de soltá-lo, vendo-o virar para si.

— É Marcus.

— Sabe de uma coisa, Marcus? Eu vejo pessoas sendo trazidas para cá quase todos os dias. — Afirmou. — É sempre o mesmo papo furado, no fim das contas, sim ou não é tudo a mesma coisa para eles.

— E o que você sabe disso tudo? — O moreno indagou, encarando os olhos azuis do médico.

— Olha, pela situação em que você está. Definitivamente não é o seu dia de sorte e eu sei o porquê que esses babacas trazem pessoas como você aqui. Saiba que qualquer motivo que esses ratos usaram para te impedir de fugir para bem longe, não vai valer de nada. — Explicou, parecendo indignado. — Eles não cumprem o que dizem. As ameaças deles nunca vão parar, você nunca vai viver em paz até perder a última pessoa que te resta, então vá embora o mais rápido possível. É só isso que eu te digo.

— E você sabe como é ser manipulado por eles, por acaso? Porque a impressão que eu tenho é que você está no topo de algum comando. — Falou, sentindo dor ao tentar levantar, permanecendo sentado mais um pouco.

— Topo? Só se for do clubinho de quem tá mais na lascado.

O médico agora levantava-se, encarando-o de pé. Estendeu a mão para ajudá-lo a se levantar também, percebendo que ele aparentava ter dor em cada canto, provavelmente teria sido espancado por horas.

Quando conseguiu se levantar, o moreno percebeu que era mais alto que o doutor, mesmo assim, não estava em condições de enfrentá-lo se fosse preciso. Alongou os braços, sentindo-se aliviado por finalmente poder colocá-los para frente.

— Bom... Eles nunca voltam tão cedo aqui quando deixam uma pessoa, então se você quiser, eu conheço uma pessoa que pode te dar uma carona até algum canto seguro da cidade. — Derek ofereceu. — Sei que eu posso não parecer muito confiável, mas é isso ou ficar aqui definhando. 

Ao perceber que ele permanecia em silêncio, o médico continuou:

— Bom, se você quiser também eu posso dar um jeito na sua cara, tenho um kit de primeiros socorros. Tá feia a coisa.

— Está tão mal assim? — Tentou tocar o próprio rosto, sentindo dor em suas bochechas. 

— Sim, vai precisar de uma cirurgia plástica de reconfiguração. — Derek esboçou uma expressão preocupada, parecendo sério, até não se aguentar e soltar uma risada em seguida. — Não, relaxa. Não tá tão ruim, só precisaria de um pouco de limpeza e curativos.

— Ah... — Esboçou, sem conseguir rir, parecendo pensativo — Ei, Derek. 

— Oi?

— Quem é você de verdade?

— Bom, sei que é complicado, mas ao contrário da impressão que você teve, eu não sou ninguém. A verdade é que eu e você estamos na mesma. — O médico ergueu os ombros. — E sobre o que eu disse, sendo sincero mesmo, o que eu posso dizer é: leva como um conselho de amigo. Só isso. 

Marcus respirou fundo, abrindo os olhos abruptamente, com seu coração disparado. Apalpou o colchão, agradecendo por não estar novamente no meio daquele galpão abandonado. Sentou-se na cama, vendo que ainda era madrugada, mas estava totalmente sem sono.

Esfregou o rosto, lembrando de cada palavra dita a ele naquele dia, elas eram valiosas.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Capítulo reescrito com muito carinho! Não deixem de dizer o que acharam! ♕

Obs: O Derek aqui citado é o personagem de um amigo meu. Nossas histórias estão coligadas, então se alguém saber um pouquinho mais sobre o Derek, aqui o link da história dele, é yaoi também:

https://fanfiction.com.br/historia/765484/Dois_Lados_de_Uma_Algema/