Eternidade escrita por Lyather, Drama Queen


Capítulo 1
Único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/381585/chapter/1

Ela está me encarando. Os mesmos olhos escuros, com um leve tom esverdado. Ah, como queria saber o que ela está pensando. Corro por entre as árvores, tentando fugir, ainda que ache ilusória toda essa ideia de fuga. Fugir de quê? Se toda a esperança se fora quando aqueles olhos esverdeados se fecharam por uma última vez. Olho por cima dos ombros mais uma vez; quero conferir se ela continua lá. E continua. Pergunto-me se ela se lembra de alguma coisa. Se está alterada porque se lembra; se está alterada porque não se lembra mais.

O vazio desses espaços infinitos me assombra.

Fecho os olhos e estamos de novo em nosso esconderijo. Nem sei se posso chamar de esconderijo. Era uma campina clara, aberta. Perigosa, alguns diriam. Mas não para Clove, para minha baixinha. Havíamos montado uma cabana, acendido uma fogueira; quem deles ousariam tentar algo com nós dois?

Thresh estava sozinho, bem como a Cara de Raposa. Desvantagem numérica. A garota das flechas tinha o Conquistador, mas ele estava tão ferido que ela sequer ousaria pensar em se livrar de nós. A baixinha comemorava uma possível vitória.

– Deveríamos começar com Thresh – sugeri – Depois, Foxface. Os amantes do doze ficariam sozinhos, seria mais fácil derrotá-los assim.

– Até pode ser – ela me encarou – Mas Katniss é minha, Cato. - Clove jogou mais alguns galhos na fogueira, pouco se importando que chamariam mais atenção. Se não a amasse tanto, teria medo de suas habilidades.

– Não acho prudente – encarei-a por mais um segundo – Melhor que eu vá.

– Por quê? Não me acha capaz? - ela revirou os olhos chutando alguma coisa por perto – Eu poderia muito bem te matar a qualquer momento, e você sabe disso. Não venha me dizer que não consigo matar uma garota fraca que se esconde atrás do brinquedinho.

– Clove, não é isso – balancei a cabeça – Eu quero acabar sozinho com ela. Eu quero ter esse gosto. - Menti. Não poderia dizer que queria manter minha baixinha a salvo. Não.

– Quer saber? Vamos acabar com o Thresh. E depois, é cada um por si, Cato. Por melhor aliado que você seja, não posso suportar alguém que não me compreende. E o jogo só tem um vencedor.

Aquilo acabou comigo. Não consegui dormir a noite. Clove sim. Estava tendo um sono agitado, eu soube. Virava-se a todo momento, e, por vezes, tive a vontade de passar meus braços em volta dela, confortando-a. Mas não devia, bem como não fiz. Eu queria acordá-la, pedir desculpas, e dizer a verdade. Dizer que a amava como nunca amei ninguém, como nunca amaria. Dizer que ela mexeu comigo desde o primeiro dia que pisou na arena de treinamento do distrito dois, com seu temperamento ácido, humor negro e habilidades incríveis. Dizer que me voluntariei pro jogos porque não conseguiria conviver com a culpa de que, se ela morresse, eu não haveria feito nada para impedir.

Já amanhecia e eu não havia pregado os olhos. Havia tomado uma decisão. Depois que acabássemos com Thresh, eu iria desabafar com ela. Contar-lhe tudo. Assim, talvez, ela me deixasse protegê-la dos outros. Eu precisava disso. Precisava da certeza de que faria tudo o que me fosse possível para mantê-la bem. Clove abriu os olhos, e xingou-me mais uma vez por não tê-la acordado antes do nascer do sol. Reclamava de que estávamos atrasados. Hoje eu daria de tudo para vê-la brava como naquele dia. Eu daria minha própria vida por isso.

Ela pegou uma espécie de bolsa, contendo suas facas. E eu bem sabia como ela poderia derrotar qualquer obstáculo que fosse com apenas uma delas. Não olhou-me nos olhos, notei. Apenas sussurrou para irmos, tão baixo que quase não ouvi. E fomos. Ela tomou a frente, impondo-se. Eu não discutiria, não.

Ouvimos um barulho assim que chegamos na cornucópia. Ela indicou para que eu contornasse o perímetro, pra cobrirmos uma área maior. E foi o que fiz. Estava a mais de trezentos metros de distância quando vi o que acontecia. A garota das flechas estava lá. Clove estava indo atrás dela.

A primeira faca arremessada passou de raspão pelo ouvido da garota do doze que atirou uma flecha no braço esquerdo de minha pequena. Eu já estava pronto para voltar e intervir. Acabar com a garota das flechas seria um privilégio, principalmente agora que ela ferira minha baixinha, mas quando Clove dominou a garota, eu tive a certeza de que ela sabia o que estava fazendo.

Escutei um pequeno ruído vindo da mata, virei-me e percebi que uma mancha vermelha se movimentava com velocidade para o meio da floresta. Encarei o duelo que acontecia na cornucópia mais uma vez, estava garantido que Clove ganharia a batalha, então decidi ir atrás da Cara de Raposa.

Corri a alguma distância da garota, distância suficiente para que ela não percebesse que estava sendo seguida. Quando ela parou para pegar ar, vi minha chance de destruí-la, mas um grito agonizante soou em meus ouvidos.

– Cato! – berrava ela – Cato!

– Clove! – sussurrei. Ela não podia estar em perigo; Não, ela estava com a vantagem.

Corri. Corri o máximo que pude, mas não foi o suficiente para salvá-la. Thresh,que antes a segurava pela gola da blusa largou-a fria no chão e correu de volta para a mata. Meu mundo caiu junto ao seu pequenino corpo. Lágrimas que antes não estavam ali presente se apoderaram de meus olhos e senti um forte aperto em meu peito. Andei em direção a seu corpo abatido e em ajoelhei a seu lado. Soltava soluços altos e gritava desesperadamente para que ela ficasse comigo, que não me abandonasse. Segurei em sua mão gelada e beijei-lhes os lábios quase mortos.

– Perdão, minha baixinha. Perdoe-me, por favor – dizia para ela em meio ao choro.

Um tiro de canhão foi solto, acabando com todas as minhas forças. Não havia mais esperança para ela, não havia mais esperança para mim, não havia mais esperança para nós!

Volto a abrir meus olhos. Ela ainda está lá, sei que está. Sei que não posso vê-la, mas sinto sua presença de uma forma inebriante. Estarei eu louco? Ou a garota dos olhos esmeralda realmente me observa? Não saberia responder, pois a única certeza que tenho é a de querer estar perto dela novamente.

Eu sou somente um corpo sem alma vagando pelo imenso universo; ganhar estes jogos não faz mais a mínima diferença para mim. Eu estou exausto; sozinho; morto.

Perco o olhar sobre um brilho familiar que vem de dentro da floresta. Este brilho rapidamente se transforma em um bestante de quase dois metros de altura que salta sobre mim, mais dois estão com ele. Sou atacado pelos três bestantes. Luto para tentar sobreviver, mas minha concentração está presa sobre a bestante menor. Aquela que possui os olhos em um tom de esmeralda.

Por um momento, livro-me das mordidas e corro em direção a cornucópia. Subo no metal gélido, jogando-me sobre ele e fechando meus olhos na esperança de nunca mais precisar abri-los.

Quem seria capaz de transformar pessoas em bestas assassinas daquela forma? Mas é isso que a Capital faz para se manter, não é? Transforma humanos em bestas e mandando-os para os jogos onde a morte é a anfitriã e desrespeitam sua áurea morta, transformando suas almas em bestantes. Percebo que por todos estes anos eu não fui nada mais que isso: um bestante criado para matar!

Saio de meu devaneio quando ouço alguém gritar não muito longe dali. Levanto-me rapidamente e vejo a garota que me tirou minha unica parte humana parada a minha frente, apontando seu grande arco de metal para mim. Ela atira, mas erra. Meu sangue sobe para minha cabeça, a adrenalina e a raiva andam juntas em meu corpo. Minhas ultimas forças servem para travar uma batalha corpo a corpo com seu namoradinho e com uma chave de braço prendo o conquistador na borda do chifre de ouro. A garota aponta seu arco diretamente para minha cabeça.

– Atire em mim, e ele cai comigo.

Vejo a garota hesitar por um momento; o desespero em seu olhar é claro. Ela não morreu quando deveria e isso me custou o amor, agora ela irá pagar. Porém, o olhar da doze se torna triunfante e a garota atira em minha mão. A dor agonizante me faz soltar o rapaz preso. Perco o equilíbrio e caio em meio aos ferozes animais.

Sinto minha pele queimar com mordidas frequentes. É um castigo cruel eu estar tão próximo da morte, tão próximo dela e não poder alcançá-la. Com um ato de bondade, a garota das flechas atira contra mim, levando consigo o que restava da minha trágica vida e fazendo-me feliz com minha baixinha pelo resto da eternidade.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

o que acharam? ♥ ♥