Belle French não pôde evitar rir quando abriu a porta da biblioteca e encontrou o grande lobo de pelo cinzento e úmido. Tinha olhos dourados e inocentes, brilhantes em meio à escuridão da noite. A cabeça estava levemente inclinada para o lado, dando um ar de filhotinho àquele animal supostamente assustador. Belle estendeu a mão e passeou com seus dedos pela pelagem grossa do topo de sua cabeça, acariciando com o polegar por entre os olhos e depois o focinho molhado com a palma da mão. A língua macia lambeu sua pele, fazendo Belle rir mais uma vez, encantada. O lobo deu um passo para frente, mas Belle o parou antes que pudesse entrar na biblioteca. O animal lhe lançou um olhar curioso e a mulher apontou suas patas que estavam sujas de terra. Como resposta, Belle recebeu um grunhido de escárnio e um suave empurrão para o lado, assim fazendo com que o animal entrasse na biblioteca, manchando o chão de madeira com suas pegadas. Belle suspirou irritadiça, mas logo seu olhar de reprovação se tornou um sorriso quando o lobo se sentou em frente a uma prateleira de livros, olhando expectante para ela enquanto balançava sua cauda.

—Você sujou meu chão, Ruby – Belle repreendeu logo depois de fechar a porta. Parou em frente ao lobo com as mãos na cintura – Você vai limpar depois?

Ruby a olhou por alguns segundos e deu um passo a frente, encostando sua garganta na barriga de Belle, que acariciou sua cabeça docemente. Ela fechou os olhos mediante ao carinho que recebia, desta vez balançando a cauda lentamente.

—Você está quase ronronando, Ruby. Até parece um gatinho – Belle gracejou.

Os olhos de Ruby se abriram e ela soltou um rosnado baixo, claramente incomodada com o que havia acabado de ser chamada. Afastou-se de Belle parecendo emburrada. Deitou-se ao pé da estante e ali permaneceu, olhando para todos os lados menos para a mulher a sua frente.

Belle soltou um risinho divertido e se aproximou de seu lobo, sentando ao seu lado, mas sendo ignorada. Ela dedilhou a coluna de Ruby, sentindo os pelos que secavam e os ossos sob seus dedos. Viu Ruby estremecer com a carícia, mas ela forçou-se a manter-se firme, não fechando os olhos como sabia que ela queria fazer.

—Ah, Ruby, não fique brava. Você sabe que eu estava brincando – Belle se desculpou, mesmo sabendo que Ruby não estava verdadeiramente brava com ela – Você não é um gatinho. Você é um lobo, um lobo grande e feroz. Um lobo mau que assusta criancinhas e donzelas indefesas.

O olhar que Ruby lhe lançou foi um claro “também não precisa exagerar” e tudo o que Belle pôde fazer foi rir novamente. O lobo havia cansado de ignorá-la e agora deitava a cabeça em seu colo, sendo recebido com o carinho reconfortante que já lhe era tão familiar. Ela podia sentir o amor transmitido pelos toques que recebia e também podia sentir o sentimento de Belle pelo seu olhar de olhos azuis que queimava prazerosamente em sua pele. Ruby havia trocado as longas corridas pela floresta nas noites de lua cheia por visitas até a biblioteca de Belle, onde recebia mimos que não recebia como humana. Estranhamente, ela sentia-se mais necessitada da presença de Belle quando era um lobo, o que deveria ser ao contrário, afinal, ela agora estava na pele de um grande lobo, o mesmo lobo que um dia fora extremamente cruel, o mesmo lobo que havia devorado seu namorado Peter.

Ruby jamais admitiria em voz alta, mas reconhecia que às vezes realmente parecia um gatinho necessitado de carinho. Tudo o que ela queria era passar seus dias com Belle na cama do apartamento que ficava em cima da biblioteca ou em sua cama na pensão de Granny. Ela queria sentir a pele quente de Belle sobre a sua e seu cheiro de livros antigos e chá de ervas. Queria fazer panquecas com bacon todas as manhãs e ouvir os murmúrios de como a comida estava saborosa. Queria ler livros infantis em sua companhia nos dias chuvosos e de ventania, queria beijar seus lábios vermelhos até que ficassem ainda mais vermelhos e depois observar a imensidão azul que eram seus olhos, satisfazendo-se ao constatar as pupilas dilatadas. Não se sentia tão feroz quando estava com Belle, mas o lobo uivava e se remexia inquieto dentro de si quando faziam amor, deixando-a levemente selvagem, mas nunca desprovida de delicadeza. A adrenalina de correr e saltar na floresta estava em suas veias quando Belle gemia e se contorcia sob seu corpo, mas voltava a ser um filhotinho domesticado quando ouvia a voz rouca de sotaque incomparável dizer as três palavras mais mágicas que poderiam existir: Eu te amo.

Belle estava concentrada em desenhar padrões irregulares no pelo agora seco de Ruby que se assustou quando ela levantou de repente. O lobo aproximou seu focinho do rosto da mulher e lambeu seu queixo carinhosamente, causando um sorriso nos lábios de Belle. A mesma abraçou o pescoço de seu lobo, sentindo a pelagem calorosa sob sua pele, sentindo o focinho molhado na lateral de seu pescoço. Belle podia sentir todo o amor de Ruby através daquele abraço entre humano e animal, e naquele momento desejou que Ruby estivesse em sua forma humana porque tudo o que ela queria era beijar sua boca e fazer amor com ela até que os primeiros raios de sol pintassem o horizonte de alaranjado. Ela estava um pouco decepcionada que teria que esperar até o amanhecer para fazer aquilo, mas ainda estava feliz em poder passar aquele momento especial com seu grande lobo mau que não passava de uma adorável e gentil criatura com grandes olhos bonitos.

As patas sujas de terra de Ruby haviam manchado o vestido de Belle, mas ela não se importava com aquilo no momento. Estava muito conectada com sua namorada para pensar em qualquer coisa. Elas sempre tiveram uma forte conexão desde a primeira vez que se conheceram, quando Belle bebia chá gelado atrás de chá gelado. E aquela conexão permaneceu e se intensificou com o passar do tempo, mas as duas tinham uma ligação diferente quando Ruby estava em sua forma de lobo. Talvez fosse porque Belle sempre se entendeu muito bem com feras e tinha o talento em transformá-las em criaturas indefesas – ou trazer seu verdadeiro eu à tona. Era um tipo diferente de conexão quando estavam em uma cama trocando beijos, uma cumplicidade que nenhuma das duas poderia explicar, mas que ambas eram felizes e satisfeitas em sentirem.

Ruby se separou de Belle apenas o suficiente para que pudesse olhar nos olhos de sua namorada. O dourado se encontrou com o azul e tornou-se a mais bela cor que pudesse existir. O lobo enfiou o nariz nos cabelos da namorada e inspirou fundo como se quisesse deixar o cheiro de Belle impresso em seus pulmões. Belle sorriu. Aquilo era algo que Ruby sempre fez, em forma de lobo ou não, Ruby sempre enterrava seu nariz em seus cabelos e cheirava os fios com aroma doce, deixando-a na dúvida se aquilo era seu instinto de lobo falando mais alto ou apenas uma característica pessoal de Ruby.

Afastando-se, o lobo deitou no chão, um claro aviso para que Belle fizesse o mesmo. Ela deitou a cabeça sobre a nuca de Ruby, rodeando seu corpo com seus braços e aquecendo-se com o calor natural de seu pelos. Acariciou as orelhas que agora estavam abaixadas e ouviu um muxoxo manhoso escapar no fundo da garganta de seu lobo.

—Amo você – Belle murmurou antes de fechar os olhos e cair na escuridão tranquila e segura de seu sono.

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Quando Belle acordou, não estava mais deitada sobre o corpo do grande lobo cinzento, mas estava nos braços de Ruby em forma humana. Sem abrir os olhos, aconchegou-se ainda mais no corpo de sua namorada, recebendo em troca um aperto mais firme em torno de seu corpo. Suspirou feliz quando ela começou a acariciar seus cabelos da maneira mais amorosa possível. Riu quando Ruby cutucou divertidamente suas costelas, encolhendo-se por causa das cócegas que sentiu. Abriu um olho e depois o outro, encontrando Ruby lhe observando com um suave sorriso nos lábios, seus olhos verdes brilhando como os olhos dourados do lobo na noite passada.

Ruby pincelou a ponta de seu nariz com o dedo indicador e sorriu grandemente em seguida.

—Bom dia, Bela Adormecida – Saudou Ruby.

—Hum… Princesa errada – Belle brincou.

A risada de Ruby ecoou pela biblioteca, batendo nas prateleiras cheias de livros e enchendo o lugar com o som quente de sua felicidade. Com seus braços fortes, puxou Belle para cima de seu corpo e enterrou sua mão direita em um mar de cabelos castanhos meio desordenados, enquanto a esquerda apertava firmemente sua cintura. Buscou os lábios de sua namorada, saciando a vontade que ambas sentiam de beijar uma a outra desde a noite anterior. Ruby deslizou sua língua lentamente sobre a de Belle, encontrando o encaixe perfeito para seus lábios. Ruby tentou aproximar Belle ainda mais de seu corpo, o que foi em vão, já que as duas estavam o mais perto possível. Com a necessidade de ar, se separam, mas Belle continuou a beijar o maxilar e o queixo de Ruby, descendo sua boca para seu pescoço. As mãos de Ruby passearam por suas coxas, arranhando levemente. Quando Belle chupou um ponto específico de seu pescoço, Ruby ronronou.

Belle se afastou rindo.

—Um gatinho – Disse com um sorriso.

—Quieta – Mandou Ruby, trocando suas posições e ficando por cima de Belle, beijando seus lábios de maneira mais ardente, tendo a plena certeza que fariam amor no chão daquela biblioteca.