A Aurora escrita por rkaoril


Capítulo 1
Meu diretor é uma galinha flamejante


Notas iniciais do capítulo

PRIMEIRÍSSIMO! Eu gastei um bom tempo desenvolvendo a história, então, divirtam-se!



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– SRTA FORBES! – exclamou a professora, enquanto eu fazia o melhor para me manter acordada. Levantei o olhar até minha horrível treinadora, que se mantinha em um short muito mais apertado do que deveria para seus 113 kg (como diabos pode uma treinadora estar acima do peso?) e um casaco da Nike. Humph, era tão ridículo que quase me cegou – Srta. Forbes, da próxima vez que te pegar dormindo na minha quadra, será chutada de volta para o Canada!
– Eu sou de Washington. – me defendi.
– Sem desculpas! Vá para a fileira e tome seu lugar. – ela indicou a fila de garotos do outro lado do ginásio, que parecia ter sido formada nos poucos 15 minutos nos quais adormeci em pé, coisa muito comum de dia.

Veja bem, embora eu tenha TDAH e Dislexia – que já não é bom – eu tenho Hipersonia. Ou pelo menos é o que os médicos dizem – primeiro me diagnosticaram com narcolepsia, porém não conseguiram me tratar. Então os idiotas decidiram que eu tinha Hipersonia idiopática, onde não sabem as causas do meu “problema” e então não podem me tratar com drogas. Até onde eu sei, não consigo dormir de noite sem passar umas boas 5 ou 6 horas me revirando na cama, mas chega de manhã e é como se eu de repente tivesse sono. Eu acho simplesmente acho que não nasci para ficar dormindo de noite – ou que meu sistema neurológico tem algo contra minha pessoa.

As outras garotas riam e cochichavam entre si, enquanto os meninos ficavam rindo e apontando para mim dizendo coisas como ‘esquisitona’ e ‘sonâmbula’. Eu suspiro e entro no fim da fina, esfregando os olhos e tentando mantê-los abertos mesmo que as fortes luzes fosforescentes do ginásio estejam fazendo-os arder. Reprimo um bocejo enquanto a Treinadora Swan explicava as atividades.

– Bem, como estava dizendo antes da Srta. Forbes me interromper, vocês devem pegar essas bolas.... jogá-las na...

Antes que eu percebesse, minha atenção não estava mais na Treinadora Swan, eu podia ouvir sua voz, cada palavra, mais entrava por um ouvido e saía por outro: eu não tinha a mínima ideia do que ela estava falando. Ao invés de tentar prestar atenção – coisa que eu acho que devia ter feito – olhei ao redor do ginásio e deixei meus pensamentos vagarem.

Era uma escola estranha, essa que Vovó Forbes me matriculou. Tinha cinco andares, e o ginásio era no último, ocupando todo um andar com várias quadras juntas. Como era no alto de uma colina em Long Island, dava para ver alguns prédios e o mar pelas grandes janelas de vidro sem persianas do ginásio – como diabos aquilo aguentava as tempestades de Long Island? - e era uma linda vista do Atlântico – de fato, parecida com a vista do meu prédio, que eu também podia ver – mas, por algum motivo, o mar sempre me deixava encabulada, como se estivesse fazendo todo o possível para me irritar, o que era ridículo, mas eu me sentia como se todas as ondas quebrassem como que para dizer “Hey sonambula! Venha se afogar!” para mim.

Suspirei descendo minha visão, para o pátio da escola. A entrada era linda, com canteiros de flores hortênsias mesmo no meio de Long Island, onde – até onde eu sabia – o solo não era lá muito ácido para tê-las. Hortênsias são minhas flores favoritas, então eu passava horas pesquisando sobre elas nos livros velhos e empoleirados de minha avó com páginas amareladas e gastas. Ela tinha uma boa coleção de ervas e enciclopédias familiares escocesas de flores e ervas medicinais.

Basicamente, hortênsias eram flores que cresciam em solo ácido, se usadas como chá ou estrato, era um veneno que em pequenas doses dava uma forte diarreia e em grandes doses causava morte. Quanto mais ácido o solo, mais fácil de criar as hortênsias, e se o solo fosse realmente ácido suas cores ficariam mais vibrantes.

Sabendo disso, fiquei impressionada que as hortênsias na Cherry High School – nós também tínhamos cerejeiras nos fundos* - fossem de tons tão vibrantes de roxo e rosa escuro logo no primeiro dia. Perguntei ao zelador da escola, o Sr. Pattrich – um velho carrancudo que anda de bengalas – se eles usavam algum agrotóxico ou algo do tipo – confesso que não entendo de agricultura, só de algumas plantas da enciclopédia da vovó que estavam em inglês - para deixar o solo mais apto para as hortênsias. Ele arregalou os olhos e não respondeu, apenas tossiu e se despediu sem jeito, o que é estranho já que o Sr. Pattrich era geralmente legal e gentil com os alunos, ou pelo menos comigo – eu havia presenciado muitas vezes quando ele repreendia os garotos por riscar com canivetes as árvores, e não era algo que eu desejaria para alguém – e eu fiquei cabisbaixa.

A neve daquela sexta-feira de janeiro deixava tudo parecendo mágico, e eu estava feliz pela escola inteira ter aquecedores de ultima geração – oque era impressionante para uma escola pública.

Eu estava quase caindo no sono de novo quando fui interrompida pela Treinadora Swan.

– SRTA FORBES EU VOU TER QUE REPETIR QUANTAS VEZES MAIS?! - eu arregalei meus olhos para ela, que parecia um touro em uma tourada: vermelha, com raiva e pronta para me chifrar. O pensamento me fez dar uma leve gargalhada, algo que eu me arrependi logo que vi a expressão da treinadora - ISSO JÁ FOI LONGE DE MAIS FORBES! PARA A SALA DO DIRETOR IMEDIATAMENTE! - eu engoli em seco.
– Mas treinadora, eu só... – tentei argumentar, ela obviamente não me permitiu defesa.
– JÁ! – exclamou, eu amarrei a cara para ela, decidida a não parar a minha expressão de desprezo por causa de um bocejo. O que pelo visto, funcionou: a treinadora olhou para mim como se estivesse vendo um fantasma ou algo do tipo, mais apenas apontou um dedo trêmulo para a saída.

Virei a cara para a mesma e saí do ginásio batendo o pé. Por mais linda que a escola fosse, era simplesmente ridículo o modo como os professores me tratavam. Não era minha culpa que eu não prestava atenção, não era minha culpa que eu não conseguia me manter acordada nas primeiras horas da manhã, não era minha culpa que eu – quando acordada – não conseguia me manter quieta, não era minha culpa que eu não podia ler! Era tudo culpa do TDAH, Hipersonia e Dislexia! Mas os malditos professores dessa escola assim como boa parte dos meus parentes tratava isso como preguiça, como se não houvesse neurologistas e psicólogos e estivéssemos nos tempos medievais. Era ultrajante, pois eu realmente tentava dar o meu melhor para conseguir boas notas.

Saí do ginásio e fui para o vestiário, vestindo meus habituais jeans preto e camiseta do modo mais raivoso que encontrei. Eu estava totalmente me segurando para não voltar naquela quadra e dar uns tabefes naquele hipopótamo de shorts – ela bem que merecia – mais eu já havia me descontrolado com um professor antes, razão pela qual eu saí da última escola, então decidi que seria melhor para minha ficha criminal – e minha futura faculdade – se eu tentasse me manter longe dela.

Saí do vestiário batendo minhas botas de combate negras no chão – o bom em ser mortalmente nanica era que você podia usar botas de plataforma na escola e parecer ter tamanho normal – e tentando fazer o maior barulho possível, sabendo que aquela mulher estaria ouvindo. Quase tive pena daquelas crianças que ficaram lá com ela – mas rapidamente me lembrei de que eles estavam rindo de mim, então estava feliz por sua sessão de tortura.

Amaldiçoei aquela escola que tanto me odiava, praguejando o como minha manhã estava ruim – mal sabia eu, iria ficar ainda pior.

A secretaria da Cherry High School era muito bonita. Tinha grandes janelas de vidro sem persianas que iam do chão ao teto, assim como o ginásio. Porém, a diferença era que o ginásio ficava no 5 ou 6 andar – eu não sabia – e a secretaria era no primeiro, com visão para as cerejeiras dos fundos em tons de rosa e laranja. A sala do diretor era feita por dentro de uma madeira amarela claríssima, com tapetes, estantes, a escrivaninha da secretária – que ficava bem ao lada da porta para a sala do diretor – e algumas poltronas aconchegantes, que eram perfeitamente confortáveis em tons de cinza, preto e azul marinho – minhas cores favoritas.

A Treinadora não se incomodou em me dar um passe para que eu chegasse em “segurança” até a sala do diretor – dito que os elevadores são apenas usados para carregar suprimentos e materiais de ginástica para o ginásio e para levar estudantes fisicamente especiais aos outros andares – provavelmente por que estava nem aí para eu sendo pega – o que me levaria para a secretaria de qualquer jeito – mas talvez por que soubesse que eu às vezes conseguia ser bem invisível – não literalmente, mais o suficiente para passar por vice-diretores pomposos que estava procurando por alunos e magicamente não ser notada.

Eu geralmente devo isso ao fato de não ser fisicamente atraente, mas isso é outra história em relação aos mais velhos.

De qualquer forma, eu podia ver meu reflexo naqueles vidros que eram polidos milhares de vezes por dia – eu ouvia os gritos do diretor para o Sr. Pattrich poli-los novamente e novamente durante as aulas – e eles me mostrava uma garota totalmente pirada. Olhos grandes de um tom tão escuro de azul que parecia ser negro, o que fazia muitas pessoas – até eu às vezes – pensar que era castanho, uma pele tão branca que parecia ser transparente, deixando a mostra diversas veias e artérias em verde e roxo. Um cabelo negro e grosso cortado reto e com franja, até minha cintura. Adicionando isso á minha camisa, jeans e botas de combate, eu parecia uma garota problemática – algo que eu, de fato, sou. Olhei para a secretária que havia acabado de me chamar.

A Srta. Bella era muito simpática, uma das únicas pessoas nessa escola (a segunda contando com Sr. Pattrich) que me tratava com um ser humano, não como um bicho preguiça. Ela sorriu calorosamente e gesticulou para a porta para a sala do diretor.

– Você pode falar com ele agora Evee. – disse a Srta. Bella, ela tinha um ar preocupado e gentil em seus olhos castanhos, era o tipo doce de mulher que todos os homens querem, que faz as pessoas se sentirem bem só de estar ao seu redor. Eu gostaria de ser como ela, e desde que cheguei nessa escola, ela tem sido preocupada comigo exatamente como uma mãe seria. Eu gostaria que fosse minha mãe, diferente da atual estranha na qual desapareceu e nunca mais veio nem se quer para dar adeus ao meu pai.

Afastei as memórias tristes e assenti para ela, entrando na sala do diretor.

A sala do diretor Félix era de longe muito escrota em relação a secretaria, que era sempre mantida limpa pela Srta. Bella e pelo zelador, sendo o a única preocupação do diretor com ela era deixar as janelas perfeitamente polidas. A diretoria não era lá essas coisas: milhares de embalagens de Cuple Noodles de frango pelo chão – que fediam – muitos livros que pareciam antigos jogados por todos os lados, mas não do tipo “pesquiso e sou esperto” que conserva seus livros no chão bagunçados porém sem prejudicar as capas e páginas, e sim do tipo “eu odeio ler mais tenho que fazer essa droga” que não encontra o que procura e joga os livros longe, fazendo-os ficarem com páginas amassadas, rasgadas e sujas de cuple noodles de frango velho e fedido. Devo admitir que ler não é a minha praia uma vez que sou dislexia, mais ver aqueles livros velhos que pareciam tanto com as enciclopédias ervais da vovó Forbes me deixara de estômago revirado. Parando para pensar agora, como eu conseguia ler as enciclopédias? Sempre pareceram leves deslizando por minha mente como uma folha desliza pelo vento...

– Srta. Forbes. - Disse o diretor Félix rispidamente, fazendo com que eu olhasse para ele pela primeira vez desde que entrara na sala.

Ele estava sentado na escrivaninha, que devia ter sido de madeira amarela claríssima como a da Srta. Bella algum dia, mais a negligência havia tomado conta e ela estava manchada, suja e grudenta com uma coloração horrível de bolor. Sentado em uma cadeira de rodinhas – aquilo tem nome próprio? Cadeira de laboratório? – almofadada, o rígido Sr. Félix que dirigia a Cherry High School como um sádico nazista estava com seus habituais olhos de um dourado alaranjado me olhando com desprezo. Sua pele era bronzeada – eu não conseguia imaginar o Sr. Félix numa praia de sunga tomando sol, a mera imagem disso me dava vertigens – e avermelhada, o rosto tinha rugas que poderiam ter milhões de anos e os cabelos vermelho com tons para dourado e arroxeado puxados com um gel para trás. Atrás dele, as janelas de vidro sem persianas estavam tão limpas e polidas quanto as da secretaria, oque me fez imaginar como ele poderia ter exigido do Sr. Pattrich para limpar as janelas sem arrumar a sala. Ele pigarreou para que eu voltasse para nossa realidade, de um modo muito bruto. Olhei para ele novamente sem quaisquer emoções exceto tédio, oque o deixou estupefato.

– Sim? – disse com a voz mais inocente que pude. Ele não pareceu convencido.
– Srta. Forbes, eu lhe avisei que da próxima vez que mostrasse sinais de risco seria cortada imediatamente do programa. – engoli em seco. De onde ele tinha tirado isso?
– Como é? Digo, o senhor nunca me disse isso. – ele abriu um sorriso medonho. Juro que geralmente não me deixo abater por caras assustadoras, mais aquele sorriso maquiavélico me deixou com um frio na espinha.
– Oh, não? Bem, isso torna as coisas menos simples Srta. Forbes. – ele se levantou, e pôs as mãos na cintura, um olhar grotesco em seu rosto feioso – Pois bem, aqueles que mostram sinais de risco são cortados imediatamente do programa. – levantei uma sobrancelha.
– Programa? – ele acenou.
– Sim, o programa. – eu nunca estive mais confusa.
– Que programa?
– Oh, não me diga que a senhorita não sabe Srta. Forbes. – ele cruzou os braços. Era impressão minha ou aqueles olhos cruéis dourado-laranja estavam cintilando em brasas? – Julguei que fosse mais esperta.
– Senhor, eu lhe dou minha palavra que não tenho a menor ideia do que está falando. – ele gargalhou. Tipo, gargalhou mesmo, como um vilão de desenho animado. O som parecia tão errado e assustador que eu recuei.
– Oh Srta. Forbes. – ele disse, e então começou: seu terno cinza irradiava um brilho cegante, seus sapatos derretiam, as janelas estavam embaçadas, seus olhos e cabelos brilhavam em chamas e o cômodo ficava cada vez mais abafado. Arfei com aquela visão impossível – Infelizmente para você, a senhorita demonstrou um grande potencial na sua metade deus. É claro, me deixou muito em dúvida com a névoa que tinha ao seu redor mascarando-a... mas agora...

Engoli em seco, nada do que ele dizia fazia sentido para mim.

Uma aura de fogo brilhava ao seu redor, ele parecia quente e doentio como se radiação estivesse emanando de seu corpo. Suas mãos... não melhor, garras estavam se abrindo com grandes auras de fogo ao redor, em chamas que não pareciam se extinguir. Eu não sabia o que ele estava falando, o que diabos ele era e o que queria comigo, porém fiz a coisa mais inteligente que pude pensar na situação: correr.

Quando suas garras estavam quase me tocando – eu podia sentir um calor escaldante emanando delas – eu me virei rapidamente e abri a porta, pronta para gritar pela Srta. Bella, mas ela não estava lá.

De algum modo, no momento em que ele ia me atingir eu me desviei girando os ombros para a esquerda, fazendo com que suas garras perfurassem a madeira clara da porta e transformando-a em carvão. Arfei um ar terrivelmente quente que queimou meus pulmões, mas me recompus rapidamente e me joguei com tudo para frente, batendo no chão gelado da secretaria no mesmo momento em que ele destruía o outro lado da parede. Com um ar morno que se aquecia rapidamente em meus pulmões, levantei-me e tentei ignorar a dor na minha coluna da queda com tudo no chão de acrílico.

Arrisquei uma olhadela para o Sr. Félix, e quase tive um ataque cardíaco quando vi que em vez de um nariz e boca como de costume, ele tinha um rosto de galinha.

O homem-galinha-flamejante gritou (cacarejou?) um som ensurdecedor que doeu meus ouvidos e fez todos os vidros se quebrarem, mandando um choque térmico com o ar frio de inverno. Eu não esperei por mais e deixei a secretaria inutilmente batendo a porta, que em um milésimo de segundo virou uma pilha de cinzas. Disparei pelo corredor feito de paredes de vidro enquanto ele gritava novamente, quebrando todos os vidros e fazendo pequenos cacos voares para todos os lados, assim como uns pedaços bem grandes e afiados.

Por algum motivo quando um pedaço bem grande vinha em minha direção como um disco de frisbee que eu tinha certeza que ia me decapitar, eu desviei graciosamente dando um rolinho no chão – como aqueles que meu pai me ensinou quando eu era pequena – e parei em pé, ainda correndo.

Chutei a porta com tudo e me lancei para dentro, onde o cômodo principal que direcionava os alunos para as escadas, corredores, salões e etc. estava deprimentemente vazio. Avistando a sala do zelador, eu corri em sua direção gritando pelo Sr. Pattrich, mas fui parada no meio do caminho quando a galinha flamejante me pegou no braço, fazendo com que eu gritasse de dor.

O meu braço ardia, era algo insuportável. Eu já havia me queimado milhares de vezes antes, mas aquilo era insano.

– Não é tão brava quando parece Srta. Fobres. – disse a galinha numa voz inumana entre uma galinha e um homem que urrava em meio às chamas – Meu senhor certamente superestimou seus poderes filha da noite.

Eu queria dize-lo que ele estava errado, que pegou a pessoa errada, mais doía tanto que todo o som que eu pude fazer foi um urro de dor.

A galinha flamejante levantou sua garra livre, aproximando do meu rosto lentamente. Era um calor insuportável, mesmo de longe eu sentia meu rosto assando. Quando estava prestes a me tocar, eu ouvi passos apressados em nossa direção, soava como algo mais duro que sapatos no chão de azulejos.

– Saia de cima dela peru de natal! – gritou o senhor Pattrich, arremessando uma tora de árvore (o que diabos?) no diretor, que largou meu braço no instante que a tora amassou seu bico. Eu suspirei quando o ar frio do cômodo tocou a queimadura enquanto ele voou para o chão esmagado pela tora, que lentamente queimava em cima dele. Parecia pesada.

Olhei sobressaltada para o senhor Pattrich que estava parecendo muito valente em cima dos seus... cascos?!

– O que diabos?! – perguntei com os olhos arregalados para aqueles cascos e pernas cabeludas. Ele não se deu ao trabalho de responder, apenas pegou meu braço bom e saiu correndo em direção à porta que dava para os fundos e os jardins de cerejeira, nos quais apenas funcionários podiam ir. Ele chutou a porta com um casco e disparou para a rua comigo. O ar frio bateu em mim como um tapa, mais não deixei perceber – até porque era bom para minha queimadura que ainda ardia, na qual não arrisquei uma olhadela.

Ele disparou pelo jardim ofegando tanto quanto eu, se locomovendo muito rapidamente. Eu não conseguia parar de encarar aqueles cascos batendo no chão coberto de neve, tanto é que escorreguei umas quantas vezes e fui erguida por seu aperto.

Após ter me arrastado até quase no portão dos fundos da escola no qual apenas carros com suprimentos entravam, ele parou um pouco para respirar – e foi quando eu disparei.

– O que aconteceu lá? Por que o diretor virou uma galinha? O que ele queria dizer? Por que você é meio cavalo? Por que estávamos fugindo? – perguntei em disparada, e então respirei o ar frio da manha. Estranho, era recém 10 da manhã e eu já estava bem desperta (nada como uma galinha flamejante para te acordar).
– Calma aí menina, não há tempo agora – ele olhou preocupadamente para os jardins de cerejeira dos quais nós tínhamos vindo – Agora, temos que nos preocupar em te manter segura antes de mais nada. Haverá tempo para respostas depois.

Suspirei, não era o tipo de coisa na qual eu era acostumada – me acalmar, mais eu assenti para ele pois não queria o resto do meu corpo transformado em carvão.

Ele pegou um chaveiro do bolço do casaco e abriu o portão, primeiro foi ele, e então eu saí, dando de cara com o Sr. Pattrich atirado no chão 5 metros depois de mim.

– O que diab...? – eu não terminei de dizer. Naquele mesmo momento a galinha flamejante pousou muito proximamente, outro grito estridente e senti que iria desmaiar.

Cambaleei para longe, tentando alcançar o Sr. Pattrich que parecia nocauteado, porém fui puxada com tudo para trás e colidi com o concreto frio. Quando eu decidi que deveria me levantar e correr, senti um forte calor muito próximo e rolei para a esquerda, desviando por pouco de garras em chamas que acertaram o concreto e perfuraram tão fundo que o concreto quebrou. Levantei-me com um pulo vendo que a galinha tinha perfurado muito fundo o chão, e estava presa.

Eu deveria provavelmente ter aproveitado o momento para pegar o Sr. Pattrich e fugir. Invés disso, tomei o momento para analisar rapidamente o lugar: era uma espécie de beco no qual eu estava quase cercada por um quadrado de concreto, a saída era de um tamanho sem portão no qual poderia passar uma vã grande. Nos cantos do beco, haviam latas de lixo feitas de ferro completamente vazias então supus que o lixeiro já tinha vindo.

Eu nem sequer pensei no que estava fazendo, mas quando dei por mim estava correndo em direção das latas de lixo.

Ouvi um CRACK de pedra quebrando e senti um calor ao meu redor. Aumentei ainda mais a velocidade e cheguei às latas de lixo com alguns segundos de dianteira, peguei a tampa da lata e virei a abertura na direção oposta e o fundo encostando na minha barriga.

Como estava com apenas alguns segundos de dianteira, a galinha percebeu muito tarde para parar e foi de cabeça para dentro da lata. Tive o cuidado de segurar a borda com toda a força, mas desapoiar o fundo rapidamente da minha barriga fazendo com que virasse para baixo, então larguei a lata que estava fritando minhas mãos e me afastei alguns passos.

A galinha teria se livrado rapidamente da lata, mais peguei a tampa em tempo suficiente para pegar seus pés, dar com a tampa neles e vira-los para cima, então aproveitei o momento forçando a tampa contra a lata para fechar. A galinha gritou e se rebateu deformando e derretendo a lata, meus dedos estavam criando bolhas mas continuei empurrando a tampa contra a lata de modo que ar nenhum pudesse entrar. Com o tempo, a galinha trocou gritos por um gemido alto, e então uma súplica. Depois que ficou quieta, esperei até a lata esfriar um pouco para ter certeza que o fogo tinha se extinguido, e então abri.

Dentro da lata deformada havia um bocado de cinzas, e uma bolinha pequena amarelada. Levantei as sobrancelhas e peguei a bolinha. Era do tamanho da minha palma, amarela com labaredas vermelhas e laranjas, era morninha e tinha um formato oval.

– Opa! Isso é um ovo! – exclamei examinando o negócio. Conforme eu girava pelas minhas mãos, percebi que o ovo tinha um efeito morno sobre elas e que conforme se aqueciam as bolhas e marcas desapareciam deixando uma sensação morna aconchegante como uma lareira. Sorri para o ovo – Legal, agora eu tenho um ovo de galinha flamejante que cura queimaduras.
– É seu prêmio. – disse o Sr. Pattrich ao meu lado. Dei um pulo e olhei exasperada para ele, o velho era um ninja se movendo pelo concreto com aqueles cascos sem fazer um único barulho – Você derrotou a fênix garota! – ele deu uns tapinhas no meu ombro, contente e animado.
– Uh fênix? Acho que é hora das respostas certo? – ele levantou as sobrancelhas, como se eu tivesse lembrado ele de lavar a louça ou algo do tipo, porém vi que era outra coisa quando ele pegou meu braço e saiu correndo para uma mini van, quebrando a janela com um casco e me jogando para dentro.
– Depois conversamos - ele disse, entrando no banco de motorista - Agora temos que nos livrar desses lestrigões.

Estremeci enquanto ouvia altos sibilos e um motor acelerando.


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Notas finais do capítulo

*Cherry = em inglês cereja. Então quando ela disse 'Cherry Highschool - nós tínhamos cerejeiras nos fundos' ela se refere à isso.Espero que gostem! Se tiverem alguma dúvida, elogio ou crítica, por favor comentem!

Leiam a minha história atual - http://fanfiction.com.br/historia/434398/A_Feiticeira/



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