Gil ainda estava sem palavras.

-Então por que aquela cena toda se o Dinho ia morrer de qualquer jeito?

-A gente não sabe, filho, mas ele está apavorado. A chance de cura é muito pequena! Eu acho que ele queria sofrer menos, entende?

-Mas voltou só pra fazer a Lia sofrer mais...

-Você acha? A Lia tem o direito de escolher se quer estar com ele nesse momento ou não. Por mais que o Dinho tenha errado, eles se amam muito!

-A Lia já esqueceu o Dinho, ela me disse que não sente mais nada.

-E você acreditou? A Lia mente o tempo inteiro, Gil... Por falar nisso, como ela deve estar se sentindo, hein? Não gosto nem de lembrar da carinha dela quando chegou...

Gil finalmente entendeu por que a mãe defendia tanto seu quase-rival. Sentiu-se culpado por todas as vezes em que julgou Dinho desde sua volta, mas ainda desconfiava. Adriano parecia aproveitar muito bem sua condição para se tornar o queriDinho da casa. Exceto por Lia. Tudo o que Dinho causava na garota agora era pena, pensou. Sequer podia entender como a garota havia se encantado por Adriano, não faria sentido estar tão abalada agora que sabia que ele não prestava.

-Gil, o que foi? – Ju havia acabado de chegar na casa de Marcela.

-Tudo bem, Ju? Eu vou deixar vocês a sós. – Marcela desconversou, não sabendo se devia contar.

-Nada, eu só estou preocupado com a Lia. Você tem notícias dela?

-Você diz por ontem à noite? Ela não voltou ainda?

-Sim, ela voltou, mas é que ela descobriu uma parada aí... Ela saiu com o Lorenzo e ainda não voltou.

Ju percebeu a expressão desconfortável de Gil.

-Q-que parada? O que aconteceu?

-Olha, Ju, eu não sei se é pra contar, mas eu não agüento mais esse teatrinho e vou falar de uma vez. Aquele idiota não tem o direito de ficar enrolando todo mundo assim.

-Do que você tá falando, Gil?

-O Dinho está entre a vida e a morte! Pronto, falei.

-Ele o que??? – Juliana não acreditava no que ouvia.

-Ele pegou a doença na África e voltou pra fazer a Lia se sentir culpada.

-GIL! – Marcela, que havia voltado para pegar um copo d’água, censurou o filho.

-Eu... – Ju não sabia o que dizer. – Como assim, Marcela? – algumas lágrimas caíram sobre seu rosto. – Então é por isso que ele anda tão fraco?

-Sim, é por isso... E foi também por isso que ele procurou a Lia ontem. Se você quiser dar apoio à sua amiga, ela deve estar no antigo apartamento com os pais.

-Não estou mais. – Lia falou com a voz fraca, ainda embargada pelo choro. Estava de volta com Tatá e Lorenzo, que abraçava as duas filhas. Tatá estava com o rosto inchado e ainda chorava.

Ju correu para abraçar a amiga.

-Como você tá? Quer dizer, pergunta idiota, eu sei, vem cá. – abraçou mais forte. Ju deixou escapar algumas lágrimas, mas, diferentemente de Lia, não tinha intenção de escondê-las.

-x-

-Então ela já sabe?

-Acho que sim...

-E agora?

-Agora... Eu não faço a menor idéia. Eu não quero que ela me perdoe por pena, entende? Por isso eu queria ter podido lutar pela Lia antes que ela descobrisse a doença, mas os sintomas foram mais rápidos que eu...

-Você também não ajudou, né, Dinho? Barracos na quadra, barracos íntimos na quadra, derrubar o namorado dela, quer dizer, tentar, né.

-Eu entendi, Fatinha, não precisa me lembrar!

-Foi mal, só tô querendo ajudar... – Fatinha fez cara de ofendida. Dinho riu.

-Ah, Fatinha... Na teoria parecia tão fácil... Eu ia me acertar com a Lia, ela me perdoaria e eu poderia encerrar essa história de uma forma decente...

-E se o tratamento não desse certo você só teria aumentado a dor por estar com ela... Ficar viúva não é fácil, garanhão!

Dinho riu.

-Eu nunca pensei que ela voltaria comigo, então o meu plano era perfeito sim, tá, ô periguete!

Os dois riam sentados na cama de Fatinha, se empurrando. Dinho parou de repente e encarou o nada. A loira percebeu a mudança na postura do garoto e o inquiriu.

-Que foi?

-E se ela não me perdoar?

Fatinha parou por um momento, tentando pensar em como apoiar o amigo. Lia era muito difícil e o tempo de Dinho, talvez, muito curto.

-Se você não aprontar mais e fizer essa carinha de cachorro abandonado que tá fazendo agora, eu duvido que ela resista. – sorriu para o amigo.

Pelo menos teria todo tempo do mundo para se acertar com Bruno, pensou.

-x-

Lia passou o resto do dia trancada em seu quarto, tentando digerir a notícia. Não sabia como encarar Adriano no dia seguinte, nem o que fazer em relação a ele. Ainda o amava, infelizmente, não tinha dúvidas quanto a isso. Quão valioso seria seu orgulho? Valeria ver Dinho morrer? Tentou ignorar o pensamento. Ele iria sobreviver. Iria sobreviver e aprontar de novo. Nunca desejou tanto que Dinho pudesse ter tempo para aprontar de novo. Queria ignorá-lo, mas não queria perdê-lo. Queria estar com ele nesse momento difícil, mas não confiava no garoto para se abrir tanto. Queria distância para não sofrer se algo desse errado – e as probabilidades não ajudavam-, mas não podia ficar mais nem um segundo longe de quem sabia ser o grande amor de sua vida, quando cada segundo poderia ser o último.

-x-

-É impressionante como esse cara sempre arranja um jeito de fazer a Lia sofrer!

-O amor não é seguro, filho.

-Ela não ama o Dinho! Ele é um imbecil, ela odeia ele!

-A Lia nunca odiou o Dinho, por mais que tentasse. Agora eu fiquei suspeita, hein, Gil? Essa sua implicância toda com o Dinho me lembra a Lia antes de admitir que era apaixonada por ele.

Juliana riu e todos a seguiram. Lorenzo se sentia grato a Ju por ter quebrado o gelo daquela maneira. Sabia que a melhor amiga de sua filha sofria com a novidade, também gostava muito de Adriano, mas pelo menos naquele momento poderiam esquecer as mágoas.