Forever Charmed escrita por Bella P


Capítulo 11
Trinta e Uma Semanas - Parte 2




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O Poder dos Três

Ryuichi

Tão rápido quanto o ataque começou, ele simplesmente terminou. Os demônios desapareceram em chamas ou bruxuleando como se tivessem recebido o chamado de nave mãe, me deixando parado no meio de um quarto semidestruído com uma cara de tacho.

– Tatsuha! - pulei de susto quando Ayaka surgiu atrás de mim e quase a atingi com um jato de chamas das minhas mãos, por puro reflexo. Felizmente ela já era escolada nesse negócio de ataque surpresa e rapidamente saiu do caminho, fazendo o jato terminar de destruir o espelho sobre a cômoda. - Conseguiram pegar Tatsuha!

O quê?

Senti o meu coração quase parar de bater em meu peito. Como assim pegaram o Tatsuha?

– Shuichi?! - Eiri entrou esbaforido no quarto, seguido por Mika, e Ayaka fez uma careta, virando-se para ele com uma expressão apologética.

– É... Pegaram o Shuichi também. - ela se explicou e a minha cara de pavor deveria ser a mesma que Eiri estava fazendo agora.

– Bem, ao menos Tatsuha terá companhia. - mirei Mika com raiva. Agora não era uma boa hora para usar o humor sarcástico dos Uesugi para aliviar a tensão.

Não esperei para que qualquer outra coisa idiota fosse dita, ou para que Eiri se recuperasse do choque de saber que Shuichi foi sequestrado de novo, simplesmente bruxuleei para o sótão, encontrando neste uma zona, e logo Mika, Ayaka e Eiri surgiram nele.

Peguei o Livro caído no chão, aberto na página do feitiço que levava à Escola de Magia, e o coloquei sobre o pódio. Vi Mika abrir gavetas até encontrar o cordão com o cristal localizador amarrado na ponta e um mapa. Eiri partiu para a mesa do caldeirão que estava virada, a ajeitando e arrumando tudo sobre ela, começando a jogar ingrediente atrás de ingrediente dentro do caldeirão, fazendo fumaça se espalhar pelo sótão.

E quanto a mim? Eu tentava captar Tatsuha em meu radar mas tudo o que conseguia de volta era estática. E enquanto tentava, folheava as páginas do Livro das Sombras a procura da entrada sobre A Fonte. Se alguém estava tentando trazer o demônio de volta a vida, precisava estar preparado.

Preparado para fritar esse filho da mãe até o último osso. Como assim ele ousava usar o meu parceiro, meu filho para voltar dos quintos dos infernos?

– Não creio que os métodos tradicionais vão funcionar. Eu esbarrei com eles por um acaso e nem sei se aquele será o lugar da cerimônia. Além do mais, algo deste tamanho com certeza requer proteção forte contra qualquer intruso. Quem quer que esteja planejando ressuscitar A Fonte não vai querer mexeriqueiros interrompendo a cerimônia. - o comentário de Ayaka fez Mika largar o amuleto sobre o mapa e grunhir.

Imaginei no momento em que tentei localizar Tatsuha sem sucesso de que esse deveria ser o caso. Mas já tínhamos conseguido o impossível antes, anos atrás, por que não conseguiríamos de novo?

– O feitiço para convocar bruxos perdidos? - havia funcionado antes em uma época que eu não tinha nem mesmo o controle que eu tenho dos meus poderes hoje. Então, tínhamos maior chance agora, certo?

– Não se não soubermos contra o que ou quem estamos lutando. Precisamos de um plano. - Eiri sugeriu e eu rosnei enfurecido, fechando o Livro com força.

Não precisávamos de um plano porcaria nenhuma! Precisávamos era agir, e rápido! Tatsuha estava sob o poder do inimigo e demônios pretendiam usá-lo, usar o nosso filho, para ressuscitar seja lá quem fosse. E eu não iria permitir isto! Havia jurado que os protegeria e cinco minutos depois eles são sequestrados sob o meu nariz? Ridículo, no mínimo.

– Ryuichi, eu sei que você está preocupado... - lancei um olhar assassino para Ayaka. O que ela sabia afinal? O maior problema dela no momento era explicar para o namorado sobre a sua sórdida história de família. Enquanto isto a minha família estava nas mãos do inimigo. - Mas eles precisam de Tatsuha vivo e é isto que nos faz ganhar tempo para nos organizamos.

– Tatsuha vivo é verdade. - zombei. - Mas e quanto ao Shuichi? - Eiri ficou pálido diante da minha sugestão.

Eu poderia estar sendo egoísta, pois a minha prioridade era resgatar Tatsuha, mas uma parte do meu cérebro que não estava nublada pelo pânico e raiva ainda racionalizava que Shuichi era o meu amigo e que também precisava ser resgatado. E parece que essa parte no cérebro de Eiri também se deu conta disto.

– Okay, vamos dividir e conquistar. - Mika tomou as rédeas da situação. - Ayaka, poções. As mais poderosas e devastadoras que você conseguir criar. - Ayaka deu um sorriso predador, nada semelhante aos sorrisos inocentes que ela costumava dar quando a conheci, antes de saber sobre a família dela.

Quando Ayaka foi à Tóquio atrás de Eiri para cobrar dele a promessa de casamento entre eles, eu fiquei por um bom tempo com a imagem da garota meiga e comportada que ela deixou transparecer após o primeiro contato. Obviamente que foi praticamente um tapa na cara quando, tempos depois, logo depois de eu ter descoberto a verdade sobre a minha família e começado o meu treinamento, eu fui iluminado sobre quem era Ayaka Usami.

Vê-la usando jaquetas de couro, calças justas modelando o corpo moldado por anos de treinamento em combate, cabelos presos e o rosto bonito contorcido em sorrisos de escárnio e prazer a cada caçada foi praticamente um choque. Hiro deveria estar tentando processar tudo até agora.

– Eiri, um feitiço!

– O quê? - Eiri fez uma cara embasbacada para a sugestão de Mika. - Já possuímos um feitiço para derrotar A Fonte e para encontrar Tatsuha.

– Você é o melhor nisto irmãozinho. Eu quero que você pegue o feitiço para derrotar A Fonte e o redobre. O torne mais poderoso do que já é e adicionaremos a ele uma poção. O mandaremos de volta ao inferno com uma passagem só de ida desta vez. - pela expressão de Eiri tive a sensação de que A Fonte estava prestes a sofrer a pior dor de sua vida. Eiri sabia ser cruel nessa coisa de escrever feitiços poderosos o suficientes para causar danos permanentes. - Ryuichi! Continue tentando localizar Tatsuha. A ligação entre vocês é forte, ainda mais agora com o bebê, você com certeza conseguirá uma brecha que for para passar as barreira de onde quer que ele esteja.

Inspirei profundamente, fechando os olhos para me concentrar, abstraindo os sons a minha volta de Ayaka fazendo a poção e Mika e Eiri trabalhando no feitiço. Expandi os meus sentidos, tentei procurar o pulsar de energia familiar que era Tatsuha. Aquele calor gostoso e acolhedor que me atraía em qualquer parte do mundo, mas nem mesmo um sopro eu estava obtendo como resposta e os meus chakras vibravam apavorados pela ausência daquele que nos completava.

Uma explosão me fez sair do meu transe depois de minutos e eu mirei um olhar irritado em Ayaka que me deu um sorriso sem graça antes de começar a colocar a poção dentro de pequenos vidros. Eiri e Mika permaneciam debruçados sobre o Livro das Sombras, rabiscando uma coisa ou outra em um bloco de papel até que Mika ergueu-se em um pulo e lançou um olhar longo para Eiri.

– O que foi? - perguntei preocupado. A ligação entre os irmãos era tão forte quanto a minha ligação com Tatsuha, além de existir a mais tempo. A probabilidade deles sentirem algo antes de mim era enorme.

– Eu sinto a magia de Tatsuha me chamando. - murmurou Mika e pela expressão de Eiri, parecia que ele sentia a mesma coisa. - Ayaka me dá a poção! - ordenou e Ayaka arremessou a cada irmão um frasco de poção que eles guardaram nos bolsos de suas calças. - Ryuichi, foque-se em nós e nos siga assim que desaparecermos.

– O quê? - ofeguei no segundo em que vi orbes dourados começarem a envolver os irmãos ao mesmo tempo em que uma pontada de dor cruzava a minha barriga.

– Ryuichi! - Ayaka me chamando e apertando o meu pulso com força me fez ignorar a estranha dor e me concentrar nos Uesugi assim que eles desapareceram.

E então, usando Mika como âncora, bruxuleei atrás deles, trazendo Ayaka comigo e rezando para que estivéssemos indo para o local certo. E que não fosse tarde demais.

Tatsuha

– Kitazawa? - a voz de Shuichi continha uma mistura de raiva e pavor que eu compreendia muito bem. – O Yuki Kitazawa?

É, eu compartilhava a sua confusão.

Yuki Kitazawa estava morto e não propriamente enterrado. Mas eu tinha certeza, eu lembrava claramente, que ele tinha virado pó no segundo em que meus irmãos e eu terminamos de recitar o feitiço.

Kitazawa somente riu da confusão de Shuichi. Um riso debochado que me deu nos nervos e, se eu pudesse, o explodiria em caquinhos agora mesmo.

Ele nunca foi flor que se cheire e Mika e eu sempre protestamos sobre o relacionamento dele com Eiri. Por um tempo demos à ele uma chance, pelo nosso irmão, aceitamos que ele pudesse se redimir, mas não ficamos surpresos quando ele se mostrou incapaz de abdicar de sua natureza demoníaca. Do prazer que ele sentia em causar dor a pessoas inocentes. Do prazer que ele sentiu ao causar dor em meu irmão.

Dor essa que retribuímos na mesma moeda se o feitiço que Eiri fez na época fosse alguma indicação. Kitazawa era um demônio de nível mediano, do tipo que não daria muito trabalho de extinguir se a situação fosse outra. Portanto, o feitiço que Eiri fez deixava claro o quão sentido e traumatizado ele estava. Havia poder demais por detrás daquelas palavras, poder o suficiente para fazer Kitazawa ganir de dor por uns dez segundos antes de finalmente desintegrar-se.

– Em carne, osso e – um raio de energia saiu da mão dele e quase atingiu Shuichi se não fosse o meu reflexo rápido ao empurrá-lo para fora da linha de tiro. - com novos poderes. - ele riu de uma maneira que me fez trincar os dentes de raiva e vi de rabo de olho Shuichi apertar os dedos em um punho, demonstrando que também não estava nada feliz em estar na presença de Kitazawa.

– É você que está tentando ressuscitar A Fonte. - falei quando percebi a implicação daquela situação.

Vários demônios atacam a minha casa, me sequestram, me trazem para uma gaiola onde os meus poderes não funcionam e quem aparece para cantar vitória era Kitazawa. Bem, a lógica da situação estava mais do que óbvia, não é?

– Tsc. Não exatamente. - ele se aproximou das grades e em um gesto instintivo eu recuei, trazendo Shuichi comigo e o colocando atrás de mim. Kitazawa enfiou os dedos por entre as barras de ferro e eu franzi as sobrancelhas. Ele conseguia ter acesso de fora para dentro, assim como os poderes dele, mas o inverso não acontecia. Interessante. - Não quero A Fonte de volta, não sou do tipo de receber ordens. Mas os poderes d'A Fonte... Ah, essa é outra história.

Ele se afastou e eu soltei a respiração que nem sabia que estava prendendo.

– Parece que me apaixonar por um Encantado me contou pontos no outro mundo. Ao invés de ir parar no inferno, fui para o purgatório. Estada interessante, entediante, mas interessante. Sabe o que é mais interessante ainda? - demônios e a sua mania de contar vantagem ou a história de sua vida, ou morte neste caso. Pelos Antigos, eu ia morrer de tédio antes disto tudo terminar. E pelo rolar de olhos que vi Shuichi dar, ele concordava comigo. - No purgatório é cada demônio por si e derrotá-los nos faz adquirir algumas vantagens.

Vi Kitazawa conjurar uma bola de energia que eu sei que não fazia parte do pacote dos poderes dele.

– Você roubou os poderes de outros demônios... - conclui e ele deu aquele sorriso de dar nos nervos.

– E consegui sair do outro mundo. - ele gargalhou e eu rosnei.

– Então curta enquanto pode Kitazawa, pois desta vez o mandaremos diretamente para o inferno! - ameacei e ele não pareceu se sentir nem um pouco ameaçado, apenas riu novamente.

– Não quando com os meus novos poderes e os poderes dessa criança eu me tornar a nova Fonte. Poderoso o suficiente que nem mesmo os Encantados serão páreos para mim. - senti um arrepio de pavor descer a minha espinha e recuei um passo, colocando a mão sobre a minha barriga em um gesto protetor.

Mais uma vez ele me deu um sorriso macabro que despertou o meu ódio e o meu pavor e nos deu as costas no momento em que vários demônios bruxulearam e flamejaram dentro daquele buraco que mais me parecia um velho templo subterrâneo. Tinha colunas, alguns amuletos e um pedestal onde um livro grosso estava. Um livro o qual Kitazawa agora folheava com prazer.

Os ignorei, me abaixando vagarosamente até me ajoelhar no chão da gaiola e Shuichi imitou os meus movimentos. Os demônios pareciam preocupados demais em assistir o que quer que Kitazawa estava fazendo para prestar atenção em mim. Inspirei profundamente, com a mão ainda pousada sobre a barriga, ainda mais que agora sentia algumas leves pontadas de dor me incomodar. Pontadas que em nada se assemelhavam aos chutes que o bebê andava me dando nas últimas semanas.

A adrenalina pulsando em meu corpo havia me feito esquecer do ferimento em minha coxa, mas o sangue quente escorrendo pela minha pele me fez lembrar dele rapidinho.

– O que você está fazendo? - Shuichi sussurrou para mim, desviando os olhos dos demônios para mim e para os demônios de novo. Comprimi os lábios quando outra pontada fez dor subir pela minha coluna enquanto ouvia o latejar do meu coração em meus ouvidos. Levei o dedo médio e indicador ao ferimento e o apertei, engolido um gemido de dor, até que as pontas ficaram banhadas de sangue.

Ainda ignorando Shuichi comecei a desenhar o símbolo de nossa família no chão da gaiola, a famosa Tríquetra, com o meu próprio sangue. Uma coisa que eu tinha aprendido desde cedo é que os feitiços que requeriam sangue sempre eram os meus poderosos. E os feitiços que atrelavam sangue a símbolos mágicos eram os mais eficientes.

Que os poderes dos bruxos se levantem e venham através dos céus neste instante...– comecei a recitar enquanto terminava de desenhar a Tríquetra. Os meus poderes não funcionavam de dentro para fora, mas o contrário não acontecia. Talvez, se eu conseguisse sintonizar a minha magia com as dos meus irmãos eu pudesse trazê-los até mim. Os Encantados juntos teriam mais chances nesta batalha do que separados.Venham à mim e se fixem aqui. Sangue do meu sangue eu convoco a ti. Sangue do meu sangue, retorne à mim.

Senti o familiar tilintar da minha magia se expandido, procurando pelo universo aqueles que compartilhavam do sangue da linhagem Uesugi, até que ela se focalizou em dois pontos. Aqueles que eu procurava. Com dificuldades me levantei, sendo amparado por Shuichi, no mesmo instante em que luzes douradas surgiram dentro da gaiola, materializando-se pouco a pouco nas formas dos meus irmãos.

– Tatsuha! - o chamado de Mika me fez dar um sorriso fraco para ela, assim como chamar a atenção dos demônios.

– Ora, ora, ora. Mas isso é uma surpresa. - a voz irritantemente familiar fez a minha irmã me soltar do abraço apertado que me dava, assim como Eiri largar Shuichi o qual também abraçava e virar-se para Kitazawa.

– Filho da mãe! - Mika rosnou e fez um gesto com a mão, com certeza na intenção de arremessar Kitazawa longe, mas tudo o que conseguiu foi ter o seu ataque refletido pelas barreiras da gaiola antes mesmo que eu pudesse abrir a boca para avisá-la. No fim, foi Mika que fez um voo curto até o lado oposto, se chocando dolorosamente contra as grandes.

E então Kitazawa começou a se vangloriar de ter todos os Encantados a sua mercê, a bater boca com uma Mika furiosa e tentar provocar Eiri, achando que teria alguma influência sobre o meu irmão. O que ele não teve. Para a minha completa surpresa, confesso.

Ao fazer o feitiço não pensei exatamente nas consequências que este teria. Em qual seria a reação de Eiri ao ver vivo a criatura que quase arruinou a sua vida. Por um momento achei que o meu irmão iria despedaçar no instante em que pusesse os olhos sobre Kitazawa, mas o que eu via era completamente o oposto. Eiri apertava Shuichi contra o seu corpo e mirava Kitazawa de uma maneira como se desejasse que o demônio sofresse combustão espontânea naquele momento.

É Shuichi, palmas para você que conseguiu depois de tantos anos o impossível: curar Eiri.

Um movimento nas sombras ao fundo daquele estranho templo me chamou a atenção e eu vi em um relance de luz o rosto familiar da minha bruxa assassina favorita. E isto significava que se ela estava aqui, Ryuichi também estava. Eu podia sentir a presença dele e me concentraria nela para acalmar o meu coração aos pulos se não fosse o fato de que as pontadas de dor em meu abdômen estavam ficando cada vez mais intensas, como agulhas quentes penetrando os meus músculos.

– Mas não é como se vocês pudessem fazer alguma coisa, não é mesmo? Então, aproveite esses últimos momentos enquanto podem. - Kitazawa cantou em triunfo, fazendo a minha atenção voltar para ele e vê-lo retornar ao livro que agora estava aberto e ser circundado pelos demônios.

– Ah se eu pudesse explodi-lo. - resmunguei, levando a mão a barriga como se isto pudesse aliviar a dor e esconder dos meus irmãos o fato de que os meus dedos estavam trêmulos.

– É, sobre isto. - Mika falou contrariada. - Deixe-me ver se eu entendi: você nos convocou para uma gaiola onde os nossos poderes não funcionam. Para quê? Para que possamos morrer todos juntos?! - ri, mas o movimento fez a dor piorar.

– Tatsuha? - ouvi Eiri me chamar em um tom preocupado. Com certeza ele deve ter notado na pouca luz que eu deveria estar pálido e que transpirava mesmo com aquela caverna sendo fria pra cacete.

– Eu estou bem. - menti.

– Bem? - os olhos dourados dele pareciam querer ler a minha alma. - Está pálido como uma vela e... - Eiri franziu o cenho e grunhiu baixinho no segundo que outra pontada me fez retesar os ombros.

Parece que a dor estava me fazendo perder o controle dos meus sentimentos a ponto de Eiri captá-los, o que não era nada bom, ainda mais quando ele deu um passo em minha direção e estendeu a mão, segurando com força o meu pulso.

– Você está em trabalho de parto. - atestou o que eu já desconfiava desde que a primeira pontada de dor cruzou o meu corpo.

– Como? - Shuichi mirou olhos largos em mim e eu sacudi a cabeça em negativa. Não queria a atenção deles em mim, porque isto poderia chamar a atenção de Kitazawa que ria das novas ameaças que Mika soltava e o faria acelerar os planos, o que não era uma boa coisa.

De rabo de olho vi Ayaka mexer-se nas sombras da caverna e vi que Ryuichi a acompanhava, ambos silenciosos como os predadores que eram.

Ao meu lado, ouvi Mika ranger os dentes de raiva e recuar um passo quando percebeu que as suas ameaças não intimidavam em nada Kitazawa, apenas o divertia mais e o fez afastar-se por um minuto o pódio e aproximar-se da gaiola, o que nos obrigou a recuar um passo instintivamente.

Eiri pôs Shuichi às suas costas como forma de proteção, Mika colocou-se ao meu lado e segurou em minha mão trêmula e suada. Mordi o lábio inferior para impedir um gemido de dor e quando Kitazawa deu as costas, resmungando algo sobre começarem logo o ritual, lancei um olhar por sobre a cabeça dele para Ryuichi que esgueirava-se mais e mais ao longo da caverna.

Ocupado em prostrar-se sobre o palaque construído no centro daquele templo improvisado, enquanto sacerdotes aproximavam-se do pódio onde estava o grimoire, o livro de feitiços dos demônios, Kitazawa nem ao menos percebia que um ataque estava prestes a vir.

Ele poderia ter ficado poderoso em sua estada no purgatório, mas Ryuichi ainda era um Dragão do Tempo, o último de seu clã, e portanto acumulava em suas veias todos os poderes de seus antepassados. Além do mais, não éramos mais os mesmos Encantados de doze anos atrás. Crescemos, evoluímos, nos tornamos mais poderosos. Com Ayaka também era a mesma coisa. Se Kitazawa achava que seria fácil assim nos derrotar, de ascender ao trono d'A Fonte, estava muito enganado.

Os sacerdotes começaram o ritual e eu pude sentir a magia estalando no ar, assim como a tensão que emanava de Ayaka e Ryuichi enquanto eles esperavam o momento certo para dar o bote.

– O poder dos três? - ouviu Eiri murmurar ao meu lado, com os olhos fixos no grupo de demônios no centro do palanque. Shuichi fez uma expressão confusa, sem entender a pergunta dele, mas Mika e eu compreendemos muito bem.

O feitiço do Poder dos Três foi o primeiro e feitiço que aprendemos como Encantados.

Era simplório no quesito rima, mas absurdamente poderoso pois consistia em unir a nossa magia para transformá-la tanto em um ataque ofensivo como defensivo.

Mika apertou mais a minha mão na sua e segurou a de Eiri. Shuichi, mesmo sem compreender o que o meu irmão tinha sugerido, ainda sim escondeu-se mais atrás dele o usando como escudo. O ar na caverna ficou carregado, a magia estalou sobre nossas cabeças, as dores aumentaram em minha barriga e quando Kitazawa virou-se com os olhos completamente brancos e uma expressão vazia, pusemo-nos a recitar.

O poder dos três irá nos libertar, o poder dos três irá nos libertar...instantaneamente uma barreira subiu dentro da gaiola no segundo em que Kitazawa ergueu a mão em minha direção e ambas as magias se chocaram: o ataque dele contra a barreira, e foi neste instante que a confusão começou.

Gritos ecoaram na caverna e demônios começaram a sumir em bolas de fogo após serem eficientemente esfaqueados por Ayaka que movia-se com a graciosidade de um tigre em pleno ataque. Ryuichi defendeu-se de um ataque de demônio e o meu coração parou por um milésimo de segundo em meu peito quando o vi ser encurralado por outros três. Por um segundo perdi a concentração e se não fosse os dedos de Mika apertarem com mais força a minha mão, eu teria parado o feitiço por completo.

A barreira tremulou, por um momento achei que ela iria ceder diante da minha gafe, ainda mais que outra pontada de dor, uma que me subiu pela espinha e fez os meus músculos retesaram, me fez gaguejar por um segundo. Eiri me lançou um olhar preocupado, lhe dei uma negativa de cabeça como resposta e voltei a recitar o feitiço. De rabo de olho vi Ryuichi tropeçar sobre os pés, vacilar no ataque e me lançar um olhar apavorado.

Por um momento não compreendi o porquê do olhar até que senti algo quente e viscoso escorrendo pela parte interna da minha coxa, manchando a calça que eu usava e tornando-se visível para quem estivesse prestando atenção em mim.

Era sangue.

Mas de onde ele vinha?

Eu não era mulher para ter aparatos para sangrar devido a complicações do parto, mas o fato de isto estar acontecendo me fez prender a respiração e apertar ainda mais a mão de Mika, procurando por apoio.

Eiri e ela também me lançaram olhares apavorados, ainda mais que a tragada de ar de Shuichi denunciou a minha situação, mas não pararam de dizer o feitiço. Kitazawa continuava alheio ao mundo, com o olhar vazio e esbranquiçado sobre nós, as mãos erguidas enquanto tentava roubar os poderes do meu filho que tinha escolhido uma hora muito imprópria para nascer.

Inspirei fundo, continuando a recitar o feitiço e ignorando os pontos negros que começavam a surgir em frente aos meus olhos. O ataque de Kitazawa tornou-se mais intenso, chacoalhando a barreira de maneira perigosa. Mika apertou mais os meus dedos, Ayaka e Ryuichi atacaram com mais ferocidade e quando o meu noivo resolveu apelar, deixando o cantor famoso de lado e transformando-se no enorme e imponente dragão que era, os seguidores de Kitazawa rapidamente bateram em retirada.

Esta movimentação pareceu ter chamado a atenção dele, porque em um momento Kitazawa estava nos atacando, no outro ele se virava na direção de Ryuichi e Ayaka e disparava duas bolas de fogo, uma sobre cada um.

Ayaka saiu da linha de tiro em um pulo ágil e Ryuichi somente usou a asa esquerda como escudo, o que dissipou a bola de fogo. Quis rir, mas a visão ficando turva, as dores e o sangue me impediram e acho que só me mantinha em pé por causa da mão de Mika apertando a minha fortemente. Era realmente ingenuidade de Kitazawa achar que poderia ferir um dragão usando justamente fogo.

E Ryuichi achou a mesma coisa ao rugir de modo a fazer a caverna inteira tremer.

Isto pareceu fazer Kitazawa acordar de seu transe mágico, pois os seus olhos voltaram ao tom cinzento de antes e ele recuou um passo ao ver a enorme criatura na sua frente. A confiança pareceu lhe abandonar rapidamente e de volta estava o demônio covarde que conhecemos anos atrás.

Ryuichi deu um passo à frente, Kitazawa recuou outro e vi que os olhos dele percorriam a caverna a procura de uma rota de fuga. O problema era que Ryuichi havia se posicionado na frente da única saída.

Kitazawa ergueu um braço, não sei se para cometer a burrice de lançar outro ataque sobre Ryuichi ou usar uma magia que fosse para fugir, mas antes que ele pudesse fazer qualquer coisa Ryuichi mostrou para ele o que era realmente poder de fogo.

A última coisa que ouviu antes de finalmente sucumbir a dor foram os gritos de Kitazawa enquanto era queimado pelas chamas de Ryuichi.

Depois disso não lembro de mais nada a não ser escuridão.


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