- Senhor Parker?

            Uma voz distante ressoou. Normalmente, eu me importaria e inclinaria a cabeça. Não naquele dia. O professor Tyler estava revisando física, e eu já estava cansado de ouvir sobre aquele assunto.  Preferi desenhar um logotipo de aranha na contracapa do caderno. Sabe, algo assim, bem sugestivo.

- Senhor Parker!  

Senti-me ligeiramente incomodado. A voz originou outros sussurros que definitivamente me atrapalhavam. Com um gesto mecânico, empurrei meus óculos mais para perto do olho e voltei minha atenção ao mundo real.

Desconcertado, percebi que o professor me chamava. Johnny Storm ria ao meu lado com a clara expressão de “eu te avisei”. Bobby Drake tentava se refrear, mas também não conteve o riso.

- Estou incomodando o senhor? – Perguntou meu professor.

Ele era um cara de meia idade, baixo e com cabelos grisalhos cuidadosamente penteados. Um legítimo professor de física do colegial, extremamente inteligente e rígido.

- Claro que não, senhor. – Eu falei prontamente, endireitando-me na carteira.

- Acho bom mesmo. O que eu dizia sobre a associação de circuitos, senhor Parker? – Retomou ele.

Não bastava ter apenas chamado minha atenção?

Obviamente, fiz o que qualquer um faria, tentando salvar a reputação que lhe resta.    

Comecei a explicar tudo o que sabia sobre a matéria de eletrodinâmica. Não durou mais que um minuto, e o professor me mandou calar a boca e continuou a aula. Voltei aos meus desenhos, mas tendo o cuidado de prestar atenção na aula de quando em quando.

Pelo visto, seria mais um dia comum.

De repente, alguém bateu à porta.

Ninguém ligou de imediato. Afinal, podia ser qualquer um vindo dar recados. O professor Tyler pareceu resignado em abrir a porta. Era a segunda interrupção de sua preciosa aula.

- Senhor Smith! – Cumprimentou o professor Tyler, abrindo a porta majestosamente.

Ele recebia o nosso diretor, Senhor Martin Smith ou qualquer outra coisa. Não me lembrava do nome.  O Senhor Smith era negro, alto e era conhecido pela maleabilidade. Até então, eu nunca tinha ouvido problemas ou reclamações em relação a ele.

Ao lado do diretor, tinha uma garota. 

Não pude deixar de notá-la. O lápis, antes firme em minhas mãos, agora deslizava lentamente entre meus dedos. Ela abaixou a cabeça, porque pressentiu todos os olhares sobre ela. Tyler e Smith trocavam alguma informação que ninguém escutava perfeitamente.

Johnny me cutucou com agilidade, já que se sentava do meu lado direito.

- E aí, Peter? O que achou dela? – Disse, com cobiça.

Esse cara não perdia tempo, não é?

- Está de brincadeira, não é, Johnny? – Indaguei, olhando para ele de relance.

Johnny me deu um soco no braço e foi conversar com Bobby.

Bom, a garota era realmente bonita. Tinha os cabelos surpreendentemente compridos e negros, e uma franja reta que a ajudava na tarefa de ocultar o rosto. Não pude ver os olhos, mas a face era branca e fina. Diria que essa garota precisava de mais proteína, porque era magra e parecia que ia desmontar no tablado. Ela parecia quase vergar com o peso da mochila nas costas.

- Senhores! - O senhor Smith chamou nossa atenção. Os burburinhos cessaram imediatamente. – Essa é Megan Walker. Ela foi transferida para cá e será a nova colega de vocês. Mostrem como os alunos da Academia Bryant são receptivos.

O diretor acenou para a nova aluna, que o ignorou. O professor Tyler voltou-se para a lousa e continuou sua aula. A menina parecia meio perturbada e foi alvo de alguns risinhos vindo da ala dos populares.

Ela procurou um lugar vago, correndo os olhos furtivamente pela sala. Finalmente eu os vi: Eram de um verde intenso.

Foi com um sobressalto que percebi que o único lugar vago era um a minha frente. Johnny pareceu ter percebido isso antes, porque trocou olhares comigo que somente um amigo de verdade entenderia. Não. Esse Johnny não mudaria nunca.

A garota andou apressadamente até o lugar disponível, mas estava claramente insatisfeita. Ela percorreu a sala várias vezes com os olhos verdes, em busca de qualquer outro lugar para se sentar.

Pensei tê-la visto olhar pra mim de um jeito estranho. Um jeito que geralmente era usado por quem realmente me conhecia. Mas devia ser só impressão. De qualquer forma, fiquei irritado com a garota. Ela não tinha motivos para agir dessa maneira comigo.

Passado isso, a aula transcorreu normalmente.

Eu sentava no fundo, e isso me dava alguma vantagem. Consegui dormir dez minutos durante a aula de literatura. Fui acordado por um ligeiro tremor que vinha da carteira da frente.

Alarmado, quase com os sentidos de aranha tinindo, vi que Megan tremia convulsivamente. Ele não devia estar nada bem. Mesmo assim, acho que só eu tinha notado isso, porque metade da sala dormia.

- Você está bem? – Perguntei, sussurrando e cutucando-a.

Megan virou-se de súbito, fitando-me furiosamente com seu olhar profundo. Qual era o problema dessa garota?

- Isso não tem nada a ver com você. – Disse ela brutalmente, evitando meu olhar.

- Talvez tenha. – Repliquei, observando que os tremores da outra estavam quase incontroláveis.

Megan deu uma risada descrente.

- É, Parker, não é?

- Sim. – Disse. Como ela sabia meu nome?

- Então, Parker. Fica longe de mim. – Disse Megan, aparentemente tentando controlar novamente o surto em que se encontrava.

Meus sentidos de aranha estavam certos. Tinha alguma coisa muito errada com aquela garota. Talvez eu devesse chamar o Tocha Humana, o Homem de Gelo e o Homem Aranha para dar uma investigada.