An Answer. escrita por SevenSeasTreasure


Capítulo 1
Capítulo único.




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— River, você acredita em um Deus?

Ele perguntou-me aquilo como se fosse algo insignificante e sem importância. Talvez por isso eu não soube responder. O que ele queria dizer com “acreditar em um Deus”?

Certamente, depois de passar por tudo o que passei, é difícil ter alguma fé. Depois de tanto viajar pelo universo, conhecendo tantos planetas, tantas espécies e culturas diferentes, deixamos de ligar para a existência de um ser onipotente e onipresente. Além disso, eu não soube de que tipo de entidade o Doutor estava falando. Existem milhões, bilhões de planetas nesse universo, cada um com uma cultura diferente. Há os que acreditem em um único Deus. Há os politeístas. E até mesmo os que não acreditam em nenhum tipo de força sobrenatural. Como eu poderia saber qual o conceito dele de “Deus”?

— Como o dos humanos? — eu respondi.

— Como qualquer um.

— Não entendo.

Ele virou o rosto e olhou para mim. Por um momento, apenas sustentou meu olhar, até que direcionou seu corpo para a minha direção.

— Você sabe, River, pelo tempo e espaço existem trilhões de raças alienígenas. O que todas elas têm em comum é que acreditam em alguma coisa. Algumas acreditam em teorias criacionistas, e outras na sua respectiva ciência. Mas vamos pegar uma raça em especial: os humanos. Mesmo entre eles, há várias crenças diferentes. Não há um povo tão diversificado quanto eles. A humanidade já acreditou em muitas coisas. Em Zeus, em Rá e em Odin. Alguns acreditam em Allah. Mas o mais comum é acreditarem em Deus, com “D” maiúsculo. Já acreditou-se em deuses maus e deuses bons. Mas, falaremos da atualidade: você consegue definir como é esse Deus que os humanos acreditam agora? E com agora, eu digo na época de Amy e Rory, onde o cristianismo predomina. Como é esse Deus dos humanos?

Eu estava confusa. Onde ele queria chegar, eu não sabia. Ver o Doutor falando de religião era algo que eu jamais pensei que iria ver. Mesmo assim, tentei dar a melhor resposta que pude.

— Bem... esse Deus é supostamente onipotente, onisciente e onipresente. Ele pode tudo, sabe de tudo e consegue estar em todos os lugares. É bondoso e justo. Está sempre buscando ajudar suas criaturas, sem interferir no livre-arbítrio. E, mesmo sendo oni-alguma-coisa, fez os humanos a sua imagem e semelhança.

Nessa hora, o Doutor chegou mais perto de mim. Curvei um pouco as costas, apoiando-me no painel de controle da TARDIS. O Doutor não se afastou. Pelo contrário: apoiou as mãos no painel, uma de cada lado de mim, aproximando-se mais.

— O conceito de Deus é muito antigo. Com certeza sofreu alterações ao longo dos anos. Como em uma brincadeira em que as crianças sussurram uma palavra ou uma frase, uma para a outra: começa de um jeito e termina de outro, completamente diferente.

— Onde quer chegar?

— Ah, minha cara River, vamos por partes. — ele estava com aquele sorriso meio debochado no rosto, como se a resposta fosse óbvia. — Podemos substituir essa “onisciência” por “sabedoria”. Deus é um ser muito sábio. Até que alguém confundiu isso com “saber tudo”, e o boato se espalhou. Podemos substituir “onipotência” por “grande poder”. Afinal, temos o livre-arbítrio na jogada. Deus pode fazer muita coisa. Mas não tudo. Ele não pôde criar um Universo livre do mal sem interferir no livre-arbítrio. Se Ele permitiu que o mal – que nada mais é que a ausência do bem – existisse para testar seus discípulos, ele não é onisciente. Pois ele saberia o que iria ser escolhido. E há os paradoxos. Deus pode criar uma pedra que Ele não consiga levantar? Se não, Ele não é onipotente. Se sim, a onipotência também deixa de fazer parte dEle – afinal, que tipo de onipotência é essa que não lhe permite levantar uma pedra?

Ele falava devagar e com calma. Fiquei grata por isso. Refleti por alguns momentos, e logo o pedi que continuasse.

— E chegamos a “onipresença”. O poder de estar em todo e qualquer lugar ao mesmo tempo. Isso é quase possível. Basta termos uma máquina do tempo. — e ele sorriu.

Acho que foi nesse momento que comecei a entender o que ele queria dizer.

— Mais alguma coisa? — perguntei.

— Muitas. Vamos concluir nosso raciocínio.

            “Você é o único que está raciocinando aqui”, eu pensei. Mas fiquei quieta.

            — Deus não é onipotente, onipresente, nem onisciente. Mas é quase. Ele fez o homem a sua imagem e semelhança, e é por isso que humanos não são perfeitos. Porque Deus também não é. Ele é bom? Sim. É justo? É. Mas também falha. Como todo humano, ele comete erros. Porém, Ele tem o seu poder. A Ele pertence o espaço e o tempo. Ele pode estar no fim dos tempos, e cinco segundos depois, no início de tudo. Ele tenta. Tenta ser o melhor possível.

            Eu havia entendido.

            Entendi o que o Doutor queria dizer.

            — Deus realmente criou tudo? — perguntei.

           — Do ponto de vista dos humanos, sim. Do ponto de vista do próprio Deus... ainda não. E não existem apenas homens na Terra. Uma mulher é necessária para servir de inspiração a todas as outras.

            Eu sabia que meu marido era importante. Mas com essa conversa, percebi o quanto.

            — Senhores do Tempo são parecidos com humanos. — foi o que eu consegui dizer.

            — Não, River. Humanos que são parecidos com Senhores do Tempo.

            E essa era a resposta para “a pergunta que não deveria ser respondida”.


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