This Sadness Is Unbearable escrita por Lasanha4ever


Capítulo 5
Capítulo 5




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  Quando eu me dou conta, já é segunda feira. Eu dormi enquanto chorava nos braços do Lucas. Isso é vergonhoso. Nós não dormimos de conchinha. Nós dormimos de frente para o outro, o que é muito pior. Ele está com o braço em volta da minha cintura, e eu estou encolhida em seu peito.

  - Bom dia. – ele murmura com aquela voz rouca e sedutora que alguns garotos têm quando acabam de acordar.

  - Oi.

  - Desculpa por ter te perguntado aquilo, não pensei que você ficaria tão triste.

  - Só esquece o que aconteceu, por favor. – só falta eu ficar de joelhos para completar a cena.

  Levanto da cama, deixando-o com cara de porta – porta tem cara? – e vou colocando o uniforme e o casaco para esconder as cicatrizes.

  - Não precisa fingir que é forte perto de mim. Não vou julgar você por ter chorado.

  Não posso acreditar nele.

  Não posso acreditar nele. 

  Não posso acreditar nele. 

  Não posso acreditar nele. 

  - Você precisa trocar de roupa, não? O ônibus sai daqui a vinte minutos. – tento ser evasiva, mas não sou muito boa nisso.

  - Sem problemas, eu me arrumo em dois minutos.

  Ele sai da cama e fica a centímetros de distancia de mim. E então tira a camisa de manga comprida que está vestindo.

  - Na boa, dá pra ficar pelado no seu quarto? – vou empurrando ele em direção à porta, mas escuto sua risada e paro.

  - Não vou ficar pelado. Só quero te mostrar uma coisa.

  Sem a camisa, eu consigo ver perfeitamente todos os cortes. As cicatrizes que eu tenho são poucas em relação às dele. Os antebraços todos, tórax, até na palma da mão. Ele tem uma cicatriz enorme na palma da mão direita. Alguns cortes do tórax e dos pulsos estão muito recentes, de modo que se eu tocar, ele ainda vai sentir dor. Igual aos meus.

  - O que você acha que vai acontecer agora? Quer que eu te conte tudo o que se passa comigo, e você desabafa comigo, e então seremos melhores amigos para sempre? – eu, sarcástica? Imagina...

  - Er... Meio que sim. Tenta entender. Eu estou sozinho há quase tanto tempo quanto você, sei o que é precisar de ajuda e ninguém ajudar. E eu sou mais velho que você. Eu já tenho dezessete anos de experiência. E não vou me assustar com qualquer coisa que você desabafe comigo, porque eu sei o quão ruim pode ser a nossa vida. Tá, eu não sei o quão ruim pode ser, mas tenho uma noção.  

  - Não.

  - Não o que?

  - Você disse que é bipolar desde quando tinha quatorze anos. Eu estou sozinha nessa desde os seis anos. Tem uma grande diferença de anos.  

  - Eu não disse que a minha vida era boa antes de eu descobrir que sou bipolar. O que eu tô tentando lhe dizer é que, você pode ser verdadeira comigo, porque eu entendo um pouco o que você sente.

  - Você não tem ideia do que eu passei, não venha falar que me entende.

  Ele levanta as mãos como quem diz: “eu me rendo”.

  - Eu tô indo lá pro meu quarto, mas não desisti de você não, falou? Só para deixar bem claro.

  Reviro os olhos e me viro enquanto ele coloca a blusa e abre a porta. Mas ele não sai. Ele aparece atrás de mim.

  - Só para constar, você fica muito linda dormindo. – ele sussurra em minha orelha, fazendo-me tremer dos pés à cabeça. Isso é o meu ponto fraco, sussurros perto da orelha. Os lábios dele quase que se se encostam à minha orelha. E então, só então, ele vai embora.

  Com as bochechas quentes – de raiva, só explicando – acabo de arrumar minha mochila e coloco um curativo sobre um dos cortes, porque está sangrando um pouco.

  Vou para o ponto de ônibus e quem está lá me esperando? Ele. O Lucas versão 10 anos mais velho que o meu Lucas.

  - Ei, Luana, topa em fazer uma loucura? – ele fala baixinho enquanto entramos na escola.

  - Só se você não ficar querendo bancar o psicólogo.

  - Vou aceitar isso como um sim. E não tento bancar o psicólogo. Tento bancar o seu amigo.

  Dou de ombros e ele me puxa pela multidão de alunos até a minha sala de aula.

  - Espera só o recreio acabar, aí nós vamos lá para a piscina do colégio. Hoje só tem aula por lá até das dez.

  - Você é maluco.

  - Eu moro num manicômio, isso serve como desculpa?

  - Baka.

  - O que?

  - Baka.

  - O que é isso?

  - Você. Você é um baka.

  - Isso nem português é, cara. Qual é!

  Cada um faz a prova que precisa fazer, eu fiz álgebra, geometria e aritmética. Ele fez de línguas. Espanhol, inglês e se bobear, ainda deve ter tido uma de português.

  No recreio, ficamos conversando sobre as provas, logo que nenhum de nós queria comentar sobre o passado. Ficamos conversando isolados do resto da escola, em uma escada que dá para o terceiro andar, um andar desabitado porque sempre está em reformas.

  - Ei, os dois, podem ir voltando para as salas de aula. Aqui não é lugar para aluno! – um inspetor velho e rabugento resmunga.

  Disfarçadamente, fomos até a sala de aula, mas, com o tumulto para os alunos entrarem nas salas, conseguimos entrar em um banheiro vazio – aqui banheiro é para ambos os sexos.

  - Tem alguém no banheiro? A aula já começou! – uma inspetora com voz nasalada berra. – Eu tô vendo a porta trancada, pode ir saindo!

  - Eu tô passando mal, - enquanto eu dou a desculpa, o Lucas se começa a fazer uns barulhos nojentos e parece que eu tô soltando um barro. Ok, soltando um barro é bem estranho, mas enfim, a inspetora acredita.

  - Ótima ideia, baka. – reviro os olhos e ele dá uma risada alegre. – Agora ela deve pensar que vou entupir o vaso com tanta merda.

  - Ao seu dispor.

  Esperamos mais dois minutos e saímos do banheiro. A inspetora ainda está no corredor, mas não reparou em nós. Corremos feito desesperados até a piscina do colégio. Chegamos lá esbaforidos e sorridentes.

  Deixamos nossas mochilas no chão. Eu subo a calça até o joelho, mas ele é mais radical ainda. Ele tira a roupa até ficar só de cueca box preta.

  - Por que diabos você tá pelado? – pergunto tentando disfarçar minha vergonha.

  - Ué, não quero molhar toda a minha roupa. Vai dizer que não gosta do que vê?

  Não posso negar. Ele é lindo. Tórax perfeitamente moldado, braços musculosos, pernas musculosas... E uma coisa que eu gosto nele é que ele não se depila. Odeio homens que se depilam. Olho com mais atenção para seu corpo. Além dos cortes nos pulos, na palma da mão e na barriga, ele tem muitos, mas muitos cortes mesmo, na coxa. Onde ninguém pode ver porque ele sempre está ou de calça comprida ou de bermuda.

  - Você é a primeira garota que vê as cicatrizes, sabe... Mas até agora eu não vi as suas.

  - Por que acha isso tão importante?

  Ele não responde. Entra na piscina e faz uma careta nos primeiros segundos. Vem em minha direção e fica boiando ao lado dos meus pés.

  - É algo íntimo, sabe.

  - Não vou ficar pelada na sua frente. Só para avisar.

  - Só tira o casaco, então. Eu quero que você fique a vontade perto de mim, assim como eu fico perto de você.

  Tiro o casaco.  Enquanto eu fico observando o corpo dele, ele vê o meu.  Tento não ficar envergonhada. Ele faz meu lado menininha inocente – nem tão inocente - aparecer, e o lado garota assustadora sumir. Passa o dedo delicadamente sobre as cicatrizes do meu pulso.

  - Gosto de pensar que sou o seu porto seguro. – ele desabafa. – Uma pessoa com quem você pode contar tudo e ser você mesma.

  - Você quer ser? – eu sei que posso estar cometendo um erro grande ao confiar nele, mas ele é um bom amigo.

  - Não precisa nem perguntar, Luaninha. É claro que sim.


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