Eu ainda estava meio atordoado com o que aconteceu, não sabia que as coisas eram assim para Amanda e Victoria. Talvez realmente não fossem, talvez estavam piorando.

Não tinha percebido que meus braços ainda envolviam Victoria que olhava John ir embora. Ela parecia decepcionada com ele, de novo. Ela tinha as mãos apoiadas em mim, estava com os punhos cerrados de raiva. Ela olhou pra mim por um momento e nós nos afastamos devagar.

Nós ouvimos um soluço e Victoria se virou bruscamente, era Amanda chorando, ainda ajoelhada no chão, numa poça de refrigerante e gelo. Eu não sabia o que fazer, acabei de chegar e mal as conheço, queria ajudar na medida do possível.

- Amanda, levanta, por favor, está tudo bem.

Amanda tinha o rosto entre as mãos e soluçava baixinho.

- Não está Vic, não está.

- Está sim, vamos esquece eles, precisamos pegar umas roupas pra você.

- Eu sonhei com ele hoje Vic... Sinto tanta falta.

- Com quem Amanda? Com o John?

- Com o meu John, não esse.

Victoria apoiou a mão sobre as costas da Amanda, que levantou vagarosamente e a abraçou. Victoria não ligou para o refrigerante nas roupas de Amanda, só correspondeu ao abraço.

- Eu o amo Vic...

Victoria deu um suspiro e passou a mão pelo cabelo de Amanda.

- Escute, vai passar, tudo isso vai passar. Mas o seu John, não está mais aqui. Nós precisamos seguir em frente.

- Eu sei ...

Victoria afastou o cabelo do rosto de Amanda, enxugou uma lágrima no rosto da amiga e a ajudou a se sentar em um banco próximo.

- Daniel, você pode ficar com ela enquanto eu busco roupas e uma toalha nos armários? Prometo que não demoro.

Victoria parecia abalada também, John provavelmente foi um grande amigo dela junto com Amanda.

- Claro, pode ir tranquila.

Ela sorriu pra mim e saiu correndo. Eu fui andando até o banco onde Amanda estava com as mãos enfiadas no bolso, não sabia o que dizer, não sabia pelo que Amanda e Victoria tinham passado nos últimos meses.

- Você está melhor?

Amanda estava com a cabeça inclinada pra trás e com as costas na parede, ela virou um pouco o rosto pra mim e sorriu, seus olhos azuis estava um pouco vermelhos do choro.

- Estou sim, muito obrigada Daniel. – Ela apertou minha mãe por um segundo e soltou. – É bom que você tenha chegado.

- Tento ajudar no que posso – Dou de ombros e sorrio pra ela.

Amanda é tão bonita, fico pensando como John pode fazer isso com ela, uma garota tão simpática e animada.

- Acho que vamos precisar de você daqui pra frente sabe Daniel...

- Precisar de mim?

- Sim, Victoria vai precisar. – Achei estranho o jeito como Amanda deu ênfase no nome de Vic.

- Mas ela parece saber se cuidar sozinha.

- E ela sabe, muito bem. Victoria é uma pessoa forte.

- Então, por que vai precisar de mim?

- Porque acho que tenho uma escolha a fazer.

Quando ela disse isso engoli em seco, não sabia bem o que ela queria dizer, mas desconfiava.

- Você não sabe como John era antes né? Victoria te falou?

- Muito pouco, sobre ele ser mais dia do que noite.

- O que ela disse é verdade, ele sempre foi mais dias, assim como eu. Mas também não era um extremo do dia, tinha coisas pequenas da noite, como eu tenho. Ele andava comigo e Vic antes, éramos muito amigos, Vic e ele eram muito brincalhões um com o outro, ele era o melhor amigo dela e meu melhor amigo também, às vezes até mais que um melhor amigo... Era um cara animado e sorridente, às vezes tinha os momentos criança dele, de brincar e fazer caretas ou palhaçadas, às vezes era sério e cuidava da gente, participou do time de futebol americano da escola e nadou em algumas competições, sempre amou a natureza e cachorros, dia de sol pra ele era um dia que tinha que ser aproveitado.

- Não se parece nada com o John que eu vi... O que houve Amanda?

- Eu e Victoria gostaríamos de saber. Teve uns dias que ele sumiu, a gente não teve notícias dele, nem mensagem, nem telefonema. Ficamos preocupadas, até o dia que ele chegou à escola acompanhado de Bradley. Ele ainda falou um pouco com a gente, mas era praticamente nada comparado a antes, com o tempo isso diminuiu ainda mais. Em uma das noites que fomos até a Retirada ele apostou racha pela primeira vez. Foi quando Victoria disse que ele não voltaria mais.

- Por quê?

- Para uma pessoa competir na Retirada ela tem que estar praticamente entregue à noite. A maioria das pessoas do dia tem medo das rachas. Victoria aceitou a escolha de John de queixo erguido, ficou decepcionada, se ela chorou de raiva aquela noite eu não sei, sei que por mais que ela tenha sentido, ela chegou inteira na manhã seguinte. Pegou toda a decepção que tinha e jogou no lixo, seguiu em frente sem conversar com John a menos que seja inevitável. Nunca mais me chamou de Mandy, como ele chamava.

- E você?

- Eu fiquei abalada com o que a Vic disse, a ficha demorou pra cair, que ele tinha mudado e que não seria o mesmo nunca mais, independente do que aconteceu pra ele mudar. Se você me conhecer bem Daniel, eu sou uma pessoa animada, gosto de sorrir o tempo todo, de cores mais vivas e brilhantes, sou positiva e gosto de estar num clima leve com as pessoas, mas ao contrário da Vic eu não sou tão forte. Ainda não aceito totalmente a escolha de John, Victoria também não, nunca vai aceitar cem por cento, mas ela encara isso muito melhor que eu. Ela me ajuda a encarar isso.

- Vic parece ser uma grande amiga.

- Ela realmente é. O que falta em mim tem nela e o que falta nela, tem em mim, por isso nós nos sustentamos entre o dia e a noite, sem escolhas. Ela é a pessoa que mais desaprova essa obrigação inconsciente que eles nos impõem. Todos aceitam naturalmente, ela não. Ela queria que todos pudessem andar com quem quisessem, onde quisessem e quando quisessem. Ela gosta de liberdade e não gosta que as coisas funcionem como um sistema em que ou você abandona uma coisa, ou abandona outra. Ela pode ter uma enorme tendência para a noite, mas não vai se entregar enquanto tiver opção.

- Entendi...

- E você Daniel? Falei tanto de mim e da Vic, mas não sei nada de você.

- Bom... Na verdade tenho sérios problemas em descrever a mim mesmo.

- Tenta

- Eu sou meio fechado às vezes, se não fosse por você ainda não teria falado com ninguém aqui, sou tímido. Não sou nada estudioso e curto um bom rock como você e Vic gostam também. Sou apaixonado por velocidade, foi isso que fez com que eu concordasse em morar aqui, no mais não sei o que mais contar sobre mim.

- Sério? Você gosta de correr então?

- Gosto, de pisar fundo na estrada e dar uma volta, fiquei com vontade de ir a Retirada quando ela estiver vazia durante o dia pra correr lá, me sinto livre correndo, mas nunca apostei rachas.

- Victoria tinha razão, ela disse que acha que você tem tendência pra noite, agora eu posso concordar.

- Se vocês dizem... Ainda tenho dificuldade de entender isso, é muita informação nova pra mim.

- Se pra nós já é difícil, imagina você que chegou agora.

- Pois é...

Amanda deu um suspiro.

- Você acha que Vic faria tudo isso de novo?

- Tudo isso de agora?

- É, de se revoltar contra Bradley e querer bater nele.

- Se ela agiu assim porque se importa com você, acho que faria de novo. Não foi isso que aquele John e a própria Victoria falou? Que ela se importa demais com os outros?

- Foi

- Então acho que ela repetiria tudo.

- Isso pode não ser bom... Agora Bradley sabe que ela é assim com quem gosta...

- Você acha que ele vai usar isso contra ela?

- Não só acho, sei que vai usar, agora que John contou pra ele e funcionou, ele não vai parar tão cedo.

- Porque essa obsessão pela Victoria?

- Porque ela é inalcançável pra ele, jamais se entregaria a noite mesmo tendo a personalidade, ele consegue atenção até das meninas mais bobinhas do dia por ser o mais popular, mas Vic o odeia.

- Mas e você?

- Eu também o odeio, mas tinha uma época que éramos até amigos, estudamos juntos quando menores. Então só sobra a Vic. Por isso ele vai usar desse lado dela, pra conseguir o que quer.

- Como ele vai usar disso, com você?

- Comigo, com o irmão dela, com você, tanto faz. Ele vai usar, disso eu sei. – ela parou um pouco pensativa - Daniel?

- Hum?

- Me promete que vai estar do lado dela

- O que? - Perguntei meio surpreso

- Prometa!

Fui protestar, mas Amanda me lançou um olhar que atravessou minha alma, os olhos azuis dela pareciam delicados e frios como gelo, ela estava praticamente suplicando e ao mesmo tempo me impondo essa promessa.

- Prometo.