Três Estações De Metrô escrita por Leh Cullen


Capítulo 1
Capítulo Único




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Quarta-feira, hora melancólica das cinco e meia, quando chove. A chuva era úmida e fria naquela tarde antes sufocante de novembro. Ela caminhava na direção do metrô, os sapatos molhados a irritava e seu guarda-chuva quebrado não tinha quase serventia alguma. Pelo menos o metrô lhe parecia um progresso no meio dos tempos decadentes. Dava-lhe a sensação de estar em outro país. A decadência em torno a assustava parecia outro tempo, outra era. Ela não se sentia parte daquele ambiente. Embora pertencesse a ele desde que se lembrava. Estava acostumada aos sons a sua volta e a poluição visual dos cartazes políticos colados nas paredes que a cercavam ao longo do seu caminho. Rostos que pareciam amigáveis, mas que escondiam atrás de afáveis sorrisos víboras venenosas da pior espécie.

Normalmente o metrô estaria vazio, mas naquela tarde, após fazer hora extra em seu maçante trabalho, apenas havia algumas pessoas distintas no local. Um homem de aparência maltrapilha judiado pelos tempos difíceis em que se encontravam parecia conversar com sigo mesmo em pé, escorado em um suporte de dentro do metrô, apesar dos diversos locais vazios. Uma senhora tossia descontroladamente a alguns bancos de distancia, a poluição fez seu efeito na saúde daquela mulher ao longo dos anos e agora seu corpo lhe cobrava cuidados, que talvez ela não fosse capaz de dar. Uma garota na casa dos 16 anos tentava acalmar uma criança em seu colo que não parava de chorar exigindo a atenção de sua mãe para algo que lhe acontecia no momento. Um casal de asiáticos dialogava em sua língua natal, como se o resto do mundo não lhe tivessem importância alguma.

Ela se sentou em um banco vago perto da entrada do próximo vagão, ela costumava se sentar ao lado da janela quando algum banco estava vazio e assim o fez naquela tarde. Gostava de ver a paisagem a sua volta, como se fosse algum tipo de quadro abstrato em movimento, vendo as imagens escorregar em alta velocidade em seu campo de visão. Aqueles eram seus poucos minutos de paz. O metrô parou na próxima estação e alguns passageiros embarcaram e foi assim nas duas próximas estações.

Na ultima apenas um passageiro entrou, pelo que ela viu refletindo no vidro a sua frente. Um garoto encapuzado, carregando uma pesada mochila em suas costas. O garoto caminhou ao longo do corredor e se sentou no banco contrario ao dela, de costas a mureta de aço que separava este vagão do próximo, deixando o capuz cair e revelando seu rosto cicatrizado. Como de costume ela apenas o observou por alguns minutos, deixando seus olhos vagarem por suas cicatrizes.

Sempre que ela saia mais tarde do trabalho, o que significava quase todos os dias, e pegava o metrô deste horário ela tinha oportunidade de ver aquele ser humano que agora era alvo de seus olhares furtivos. Ela não sabia o porquê, mas algo nele lhe atraía como nenhum outro rosto era capaz. Talvez as tristezas que aquelas cicatrizes carregavam lhe despertassem curiosidade, ela decidiu naquele momento que era apenas curiosidade, mas continuou a encará-lo.

-O que você vê de tão interessante em mim? –ele lhe dirigiu a palavra pela primeira vez ao longo de todos esses meses.

-Não sei. –ela respondeu assustada por ser pega no flagra observando-o, ela achava que ele nunca havia percebido.

-Devo ser muito interessante então, para lhe despertar tanta curiosidade. –as palavras não combinavam com a figura a sua frente, palavras tão bem faladas e colocadas de forma inteligente.

-Confesso que você é sim. –ela deu de ombros.

-Prazer, sou Devon e você? –ele lhe estendeu a mão através do curto espaço do corredor.

-Annie. –ela tocou sua palma com a dele, sentindo os grossos calos em suas mãos, mãos que deveriam pegar pesado em seu trabalho.

Aquela não foi a ultima conversa. Depois daquele dia, Annie sempre fez hora extra para poder pegar o metrô no horário que poderia encontrar com Devon. Ela descobriu que ele era muito inteligente e teve certeza de que ele deveria ter algum passado obscuro, porque com certeza suas mãos calejadas, as cicatrizes e as roupas surradas não combinavam com a cultura que suas palavras carregavam. Todos os dias por meses e meses aquele era o único momento do dia que Annie se deixava levar, ser ela mesma e ter um pouco de paz. Apesar de seus momentos com Devon durarem apenas três estações de metrô à frente.


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Notas finais do capítulo

Espero que gostem. deixem seus comentarios okay! *-------------------------*